Dossiê: História, Religiões e Religiosidades II
História, Religiões e Religiosidades,
caminhos inesgotáveis!
Religiões e Religiosidades são inquestionavelmente domínios
inesgotáveis. Boa comprovação deste campo é a consulta que se pode
realizar nas diversas Revistas Acadêmicas especializadas e também dentre
aquelas que abrem os seus Dossiês para tais temáticas. Assim sendo, a
Revista Estudos Amazônicos, do Programa de Pós-Graduação em
História Social da Amazônia, da Universidade Federal do Pará (UFPA),
tem o prazer de publicar – neste Dossiê – mais oito artigos que versam
sobre a complexidade destes assuntos no interior da Amazônia, ou seja,
são reflexões que “iniciam” na Colônia portuguesa, “passando” pelo
Estado do Pará de 1930 e “chegam” à cidade de Bragança da
contemporaneidade, por exemplo.
Desta forma, com a sinalização destes eixos, nota-se o quanto Religião
e Religiosidade são assuntos tratados por Historiadores e outros
intelectuais em distintos períodos e espaços, e que eles constituem
temáticas capazes de explicar como alguns segmentos pensavam a vida e
suas estratégias nos interstícios dos mundos que deveriam enfrentar. Em
conformidade com esta concepção, seja na Colônia, seja na
contemporaneidade é visível que a Religião sempre desempenhou papel
essencial às metas individuais e coletivas das pessoas que nela se envolve.
As Religiões e as Religiosidades, no tempo e espaço em tela, “sempre”
foram pensadas por parte (e/ou por boa parte das sociedades que os textos
analisam) como dinâmicas onde se poderiam encontrar respostas a
Revista Estudos Amazônicos • vol. XI, nº 2 (2014), pp. i-iv
assuntos de difícil decodificação; exemplar neste sentido é a compreensão
de como os aldeamentos jesuíticos da Amazônia colonial foram
instrumentos essenciais de evangelização de pessoas que deveriam
conhecer o “caminho da verdade”, mas igualmente importante – onde
seus autores procuraram compreender – é a influência do “Santo Preto”,
São Benedito, de Augusto Corrêa, na vida de indivíduos que elaboram e
reelaboram a festividade, isto é, como o Santo faz intercessões no
cotidiano dos seus devotos.
Estes são fragmentos da riqueza do mundo das Religiões e das
Religiosidades da Amazônia em recortes espaciais e cronológicos
diferentes. Desta forma, repita-se, que seus autores buscaram vislumbrar
mundos diferentes, porém que se interseccionam por meio das palavraschave (História, Religiões e Religiosidades) que compõem mais este
número da Estudos Amazônicos.
Em conformidade com isso é coerente pensar que nas diversas formas
de pensamento dos indivíduos, nos seus interstícios as concepções de paz,
de tensão, de incompreensão estão ao mesmo tempo convivendo e
formando formas diversas de interpretação do fenômeno religioso. Assim,
História, Religiões e Religiosidades trazem em seu interior aspectos vários,
por exemplo, a fascinação, o amor, a vida, a sedução, a doutrinação, o
fanatismo, as certezas da salvação bem como quais caminhos não devem
ser percorridos, mas também podem e trazem significados em torno da
morte e possíveis perigos que o Ser Humano pode passar. Sabe-se que
estes caracteres estão no seio de códigos interpretativos de cada
personagem social, eles no geral não se apresentam de forma cristalina a
qualquer outro agente, eles podem ser ditos de maneira “direta”, todavia a
sua essência trata-se de experiências únicas, pessoais, intransferíveis.
História, Religiões e Religiosidades podem ser interpretadas de maneira
multifacetada; e se assim compreenderes, prezado leitor, elas cabem ser
ii • Revista Estudos Amazônicos
verificadas também como profundas lutas pela sobrevivência, seja
religiosa, seja cultural, seja econômica, assim neste viés torna-se uma
ingenuidade pensá-las (as Religiões e as Religiosidades) enquanto campo
estritamente do religioso, repita-se. Por sua expressão e força, este
pensamento é muito significativo ser estendido à Amazônia, porque ela
pode e possui energia para expressar a imensidão que se ancora no
fenômeno religioso da Região Amazônica.
Ademais, a Amazônia como nas demais Regiões do País, trata-se de
lugar fértil à entrada dos mais diversos estudiosos da expressão do
religioso. Como os artigos a seguir comprovam, o espaço é um convite
aos pesquisadores para se criar interpretações, aprofundar as existentes,
estabelecer leituras e releituras das mais diversas e múltiplas formas de
manifestação do ato religioso aqui existente. Então, ela nos interstícios da
Religião e Religiosidade jamais comportou e, provavelmente, nunca
comportará entendimentos cristalizados a respeito da força desenvolvida
pelos elos da fé das pessoas. O parado não ocupa lugar nesta Região,
conforme as interpretações em tela.
Com efeito, enfatize-se que as motivações em torno dos estudos do
fenômeno religioso neste novo número da Revista Estudos Amazônicos
são bem variadas, todavia é de suma importância perceber que as
interpretações a seguir estão sustentadas na lógica de que seja na Amazônia
colonial (texto de Karl Heinz Arenz), seja no Estado do Pará da década de
1930 (texto de Mayara Mendes Leal), seja na “Pajelança Ecológica” em
Belém-PA (no de Gisela Macambira Villacorta), seja no Imaginário da
salvação no cenário das curas alcançadas (no de Yleana do Socorro dos
Santos Lima), seja na festividade de São Benedito em Augusto Corrêa
(reflexão de Francisco Pereira Smith Júnior, Armando de Araújo Monteiro
e Gesiel Matos dos Santos), seja nas “coisas do criador” (no de Elenilda
do R. Costa), seja nos terreiros de Belém (de Taissa Tavernad de Luca) ou
seja no artigo “A festa como expressão do sagrado na ilha de Caratateua”
Revista Estudos Amazônicos • iii
(de Maria Roseli Sousa Santos), os seus autores compreendem as
experiências do sagrado como fenômenos particulares das pessoas neles
inseridos.
Aqui há apenas um fragmento das dinâmicas religiosas, da(s)
noção(ões) de Religiões e Religiosidades do mundo chamado Amazônia.
Assim apresentada suas características de maneira bastante sumária, os
seus amplos significados remetem a heranças diversas as quais apenas são
possíveis verificá-las em fragmento. Por conseguinte, cada qual (cada
personagem social) festeja, procura chegar e alcançar às concepções de fé
à sua forma, à sua maneira, isto é, nos seus limites de força, nas suas
certezas, nos seus domínios gigantescos do que pode expressar a
proximidade com o que chamam de vitória, de conforto pessoal, de
certeza, de paz interior, enfim, do que compreendem ser o espaço
“elementar” à própria sobrevivência pessoal. Dessa forma, cada sujeito
social ocupa e desempenha o lugar que lhes compete nas instâncias, nem
sempre tranquilas, da Religião e da Religiosidade.
Deste modo apresentadas, e considerando de maneira clara que as suas
organizações concentram-se em espaços eminentemente variáveis ao
longo do tempo, o fenômeno religioso exige lugares que proporcionem o
movimento, ou seja, exige que as pessoas não o identifiquem enquanto
instrumento da tradição estagnada, passiva, porquanto as razões das
Religiões e Religiosidades nunca puderam, jamais se deram ao prazer de
tal esquema reduzido, demasiado simples; então, é mister vislumbrar que
ao longo das décadas e dos séculos – por exemplo – eles sofreram
mudanças por meio das pessoas, e igualmente as mudaram.
Excelente leitura a todos.
Ipojucan Dias Campos
Professor Adjunto III da Faculdade de História do IFCH/UFPA
iv • Revista Estudos Amazônicos
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