Programa Institucional de PIBIC/CNPq/IBMEC-RJ Bolsas de Iniciação Científica – Relatório Final 2013/2014 Título do Projeto: “Estruturas paradiplomáticas e sua atuação no processo de inserção econômica internacional de atores não estatais brasileiros” Aluno: Laura Cibele Valente da Silva Curso: Relações Internacionais Orientador responsável (seguido da maior titulação): Renata Ferreira Barbosa, Doutora em Relações Internacionais, PUC-Rio Três palavras-chave: paradiplomacia, Subsecretaria de Relações Internacionais, inserção econômica internacional brasileira contemporânea 1-Introdução As relações no sistema internacional se estabeleceram nos princípios definidos no Tratado de Westfália, de 1648 e desde então, as diversas formulações de Estado que se desenvolveram ao longo as décadas seguem seus parâmetros centrais, i.e, soberania e não intervenção. Nesta conjuntura, a ideia de Estado como principal ator das interações no sistema internacional é majoritariamente aceita e difundida, fazendo-se apenas uma ressalva para o surgimento de um novo sujeito de DIP a partir do século XX, as Organizações Internacionais. Há, porém, um movimento contemporâneo que aponta para uma nova forma de relacionamento entre atores no plano externo. Este fenômeno é decorrente do crescimento da participação de atores não estatais no sistema internacional, motivados pelo crescimento das demandas políticas e econômicas internas de cada estado, nem sempre abarcadas pela diplomacia tradicional. Essas atividades paralelas são denominadas paradiplomacia, na qual as ações dos novos participantes questionam a exclusividade dos governos centrais como atores protagonistas das Relações Internacionais. Esses atores subnacionais ganham extrema relevância num contexto de globalização no qual as fronteiras físicas entre os países são subjugadas pela intensificação do intercâmbio de informações, comércio, pessoas e finanças. O avanço tecnológico intensificou as relações internacionais e permitiu que estes atores pudessem atuar externamente sem a mediação do governo central. É relevante comentar a congruência entre o movimento paradiplomático e a teoria da Interdependência Complexa, proposta por Keohane e Nye. Para os autores, os vínculos de interdependência têm base nos canais múltiplos de comunicação e negociação entre as sociedades, através de conexões formais (como as relações diplomáticas) e informais, que são dão entre elites governamentais e não governamentais.1 A participação dos novos atores em negociações transnacionais reforça a construção de complexas redes de interação no sistema internacional que, de certa forma, são independentes da política central dos Estados. A paradiplomacia surge, portanto, não só do desejo, mas da necessidade de atores não estatais – ONGs, empresas multinacionais, secretarias municipais para assuntos exteriores, de favorecer o desenvolvimento de áreas específicas, relacionadas intrinsecamente com o crescimento desses atores ou das localidades nas quais estão inseridos. A paradiplomacia no Brasil Historicamente, é comum atribuir-se no Brasil as decisões de política externa a um único ator, cabendo destacar o papel do Itamaraty neste contexto. A instituição possui arraigado em si certo insulamento do debate político (PINHEIRO; MILANI, 2013) o que consequentemente dificulta o reconhecimento e até mesmo a participação de atores não centrais dos debates sobre as relações internacionais adotadas no país. O sistema internacional, porém, passou por grandes transformações nas duas últimas décadas do século XX, modificando as interações entre Estados e atores subestatais, que passam a atribuir a si próprios novas funções, que já não podem ser compreendidas pelo realismo tradicional. Já não existe grande discrepância entre alta e 1 Site CEDIN – Centro de Direito Internacional, Coleção Relações Internacionais – Interdependência Complexa. Out. 2013. baixa política, tendo em vista a ascensão de temas como meio ambiente, cooperação para o desenvolvimento, imprescindíveis para a projeção de poder de países emergentes. Mas principalmente, o processo de globalização, crises financeiras de natureza sistêmica, revolução tecnológica na área de informação2 e outras grandes mudanças comuns a este período reforçam a impossibilidade de manter o Estado como uma caixapreta, onipotente frente às decisões externas. Letícia Pinheiro e Carlos Milani constatam que: [...] As relações internacionais, na atualidade, não apenas englobam um leque mais amplo de questões (meio ambiente, direitos humanos, migrações, pobreza, internacionalização da educação, da saúde e da cultura, cooperação para desenvolvimento etc.) que demandam conhecimentos e expertises particulares, como também implicam, de forma cada vez mais densa e institucionalizada, uma diversidade de atores agora envolvidos em inúmeros assuntos internacionais. Empresas, organizações não governamentais, mídia, movimentos sociais, igrejas, organismos públicos municipais ou estaduais, por exemplo, passaram a atuar internacionalmente de maneira mais orgânica e articulada, agindo em muitas ocasiões à revelia do próprio Estado, em nome de interesses privados ou ainda na defesa de causas políticas das mais diversas. A partir destes pressupostos, já é possível observar o delinear da prática paradiplomática, a partir do momento em que estes atores subnacionais assumem identidades mais independentes do Estado central, a fim de perseguirem seus próprios interesses. No Brasil, os acontecimentos no período pós-ditadura foram essenciais para incentivar a atuação de atores não estatais, desenhando uma política paradiplomática incipiente. Álvaro Chagas discorre que:3 [...] verifica-se que o processo de democratização do país, iniciado em 1982 com a eleição de governadores, deu inicio aos primeiros casos do que poderia se chamar “política externa federativa” . A partir daí, até mesmo em razão dos problemas estruturais que propiciam o desenvolvimento da paradiplomacia no Brasil, a atuação externa dos entes subnacionais vem crescendo a cada dia. O processo de redemocratização vivenciado neste período deu aos governadores maior independência, quando antes estavam vinculados a uma série de diretrizes impostas pelos militares. Essa mudança foi significativa, pois permitiu que o foco de atenção fosse redirecionado a problemas locais que demandavam esforços específicos. Os problemas estruturais supracitados referem-se à dificuldade das políticas centrais de abarcar totalmente as necessidades dos entes subnacionais, não apenas em assuntos externos, mas também em relação à políticas públicas, como educação e segurança. A paradiplomacia ganha força neste contexto, na medida em que alguns atores não estatais possuem a capacidade de satisfazer demandas que o Governo Central não atende de maneira satisfatória. 2 PINHEIRO, Letícia; MILANO, Carlos. Política externa Brasileira: Os desafios de sua caracterização como Política Pública. Contexto Internacional (PUC), VOL. 35 nº1 – jan/jun 20123, p. 14 3 CHAGAS, Álvaro. A paradiplomacia como forma de inserção internacional de unidades subnacionais, p 49 Ressalta-se que no Brasil, o processo de redemocratização foi acompanhado por um crescente movimento de liberalização econômica, contexto que impulsionou o surgimento de diversos atores, com interesses e expertises distintas que passaram a reivindicar maior participação internacional como forma de alcançar seus objetivos. (PINHEIRO; MILANI, 2013). Com base nessas premissas, utilizamos a Subsecretaria de Relações Internacionais do Rio de Janeiro como estudo de caso, a fim de perceber a relevância que os novos atores paradiplomáticos possuem no processo de inserção econômica do Brasil no cenário internacional contemporâneo assim como a sua contribuição no crescimento econômico do país como um todo. 2-Objetivos Tendo em vista o contexto supracitado, o objetivo geral deste projeto foi analisar a construção da política paradiplomática contemporânea no Brasil, atentando para a importância dos atores não estatais para o desenvolvimento econômico no país. Especificamente, analisamos a Subsecretaria de Relações Internacionais do Rio de Janeiro, que representa a evolução do que pode ser considerada talvez a primeira unidade administrativa designada para se ocupar especificamente da formulação de estratégias de inserção internacional de um estado da federação brasileira.4 O propósito do estudo de caso foi observar a forma como este ator paradiplomático se estrutura e de quais mecanismos dispõem para atuar no âmbito econômico internacional. A interação do ente subnacional com a jurisdição brasileira também foi um foco de análise, assim como quais foram os resultados obtidos a partir da construção de relações com atores externos no desenvolvimento do estado do Rio de Janeiro. Ressalta-se aqui principalmente o auxilio da Subsecretaria na construção de redes de empresas exportadoras e importadoras que impulsionam o comércio exterior do estado através de prospecção de mercado feita sob medida para as necessidades econômicas da região, aspecto que não é considerado pela diplomacia tradicional. A partir desses pressupostos, questiona-se o papel destas e de outras unidades paradiplomáticas na consolidação da imagem do Brasil como um país em pleno desenvolvimento econômico no cenário internacional. O estudo de caso representa um recorte metodológico a fim de facilitar o estudo de um amplo cenário que engloba inúmeros atores paradiplomáticos. Mas a intenção por trás deste projeto é chamar a atenção para o grande avanço da paradiplomacia brasileira como um todo, incitando o debate sobre sua relevância no crescimento econômico através do desenvolvimento de áreas específicas. Por fim, uma vez obtido os resultados das análises, objetivamos encontrar deficiências estruturais ou mesmo burocráticas que dificultassem o progresso deste projeto paradiplomático, considerando alternativas e possíveis soluções. Neste sentido, o principal objetivo é buscar os mecanismos que possam aperfeiçoar esta experiência, que, por suas características intrínsecas, pode contribuir fortemente para o desenvolvimento econômico brasileiro. 4 SPADALE, Pedro; Subsecretario de Estado de Relações Internacionais da Casa Civil do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Relações Internacionais de unidades subnacionais: a experiência do estado do Rio de Janeiro. Janeiro de 2014, p. 2. 3-Metodologia utilizada Foi considerado o marco teórico construtivista e toda a literatura concernente aos estudos da sociedade civil global e sua participação nas relações econômicas internacionais contemporâneas. A pesquisa tem proposta metodológica qualitativa e tem por principais referenciais James Rosenau, Kathleen Sikkink e demais autores comprometidos com os estudos de globalização, atores transnacionais, economia política internacional e sociedade civil global. 4-Desenvolvimento da pesquisa O projeto teve início com a coleta de biografia, essencial para a pesquisa, principalmente quando considerado a escassez de material sobre o desenvolvimento da paradiplomacia no Brasil. A princípio, o estudo de materiais que abordavam o regimento jurídico das relações internacionais de entes subnacionais foi imprescindível para compreender os limites de autonomia destes atores e permitiu compreender o contexto legal no qual a paradiplomacia está inserida no Brasil. O ambiente jurídico brasileiro e o desenvolvimento da paradiplomacia Não há, no ordenamento jurídico brasileiro, um modelo institucionalizado que preze pela independência dos entes não centrais para a realização de paradiplomacia. Apesar disso, como veremos adiante, o fato de não haver um regimento específico para estes novos atores não limita seu direito de atuação. Na Constituição pátria, o art. 21, inciso I, prevê: “Art. 21. Compete à União: I manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;”. Este artigo define o Estado central como principal ator de política externa. Porém, essa definição deriva da capacidade jurídica dos Estados e Organizações Internacionais dentro do direito internacional para celebrar tratados. Os estados federados e os demais entes subnacionais não possuem personalidade jurídica internacional, assim sendo, não poderiam assinar acordos revestidos de formalidades tais que configurem um tratado. A paradiplomacia, no entanto, acontece sem a necessidade desse tipo de acordo. Primeiro porque as relações se estabelecem entre atores subnacionais e também porque muitas vezes a cooperação internacional promovida por atores paradiplomáticos acontece de maneira informal. Pedro Spadale afirma – no contexto das Secretarias de Relações internacionais - que “uma boa cooperação bilateral não precisa estar necessariamente respaldada por algum tipo de ato jurídico”. Outro artigo que remete à atuação de entes subnacionais é o artigo 52 da Constituição da República, que define: Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: [...] V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios; Entre todas as ações internacionais de um governo estadual ou municipal brasileiro, o processo de contratação de financiamentos externos é o único que possui a necessidade prévia de aprovação por parte de instâncias federais. 5 Isto revela certa autonomia por parte dos atores não centrais, o que mais uma vez aponta que a maior barreira ao desenvolvimento da paradiplomacia no Brasil não é legal. Em 2005, o Deputado André Costa (PDT-RJ) propôs uma emenda constitucional, acrescentando parágrafo ao art. 23 da Constituição Federal para permitir que Estados, Distrito Federal e Municípios pudessem promover atos e celebrar acordos ou convênios com entes subnacionais estrangeiros. O inteiro teor da proposta dizia: “§2º Os Estados, Distrito Federal e Municípios, no âmbito de suas respectivas competências, poderão promover atos e celebrar acordos e convênios com entes de subnacionais estrangeiros, mediante prévia autorização da União, observando o artigo 49 e na forma da lei”. O Deputado Ney Lopes (PLF- RN) deu seu parecer alegando inadmissibilidade da proposta, uma vez que estes entes subnacionais já possuem o direito de celebrar atos internacionais sem necessidade do aval da União: “Nada há no texto constitucional que impeça Estados, Distrito Federal e Municípios de celebrar atos internacionais (com pessoas físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, contratos, acordos ou convênios, etc...) [...] É possível celebrar tais atos com quaisquer pessoas estrangeiras, sejam elas dotadas ou não de personalidade jurídica de direito internacional. [...] Para a prática de tais atos, os entes estatais não precisam de “autorização” da União, como sugerido na proposta. Autorizar, neste caso, é exercer poder sobre a vontade de outrem.”. Os argumentos de Lopes reiteram mais uma vez que a ausência da institucionalização da paradiplomacia no Brasil não afeta seu funcionamento. Existem outros impedimentos, como barreiras burocráticas e oscilação política que são muito mais prejudiciais ao seu desenvolvimento. Uma vez apreendido o contexto, as leituras seguintes permitiram construir uma visão das estruturas paradiplomáticas nacionais e seu papel econômico, o que orientou a escolha dos atores a serem estudados de forma mais profunda ao longo da pesquisa. O estudo de caso da Subsecretaria de RI do Rio de Janeiro foi eleito, portanto, levando em consideração que este ator atende três demandas básicas: cooptação de recursos para financiamento de projetos que não são devidamente custeados pelo Governo central, maximizando os resultados; auxiliando a internacionalização de entidades privadas, como empresas multinacionais e ampliando a visibilidade do país nas relações de Comércio Exterior. Ao longo da pesquisa, uma dificuldade percebida foi a ausência de material bibliográfico representativo acerca da organização interna das Secretarias municipais, seu funcionamento e funções específicas. Foi feita então uma pesquisa de campo com o objetivo de preencher as lacunas deixadas pelas análises teóricas. Entramos em contato com Pedro Spadale, Subsecretario de Estado de Relações Internacionais, e Joan França, especialista em Relações Internacionais e Sustentabilidade, que nos cederam o artigo “Relações Internacionais de unidades subnacionais: a experiência do estado do Rio de 5 SPADALE, Pedro; Relações Internacionais de unidades subnacionais: a experiência do estado do Rio de Janeiro. Janeiro de 2014, p. 13. Janeiro” e o decreto que define o regimento interno da SSRI. Estes documentos foram imprescindíveis para o andamento da pesquisa. A Subsecretaria de Relações Internacionais do Rio de Janeiro As Secretarias de Relações Internacionais são extremamente relevantes dentro da paradiplomacia brasileira, por serem os entes subnacionais com melhor estruturação, o que garante maior escopo de atuação. Além disso, as Secretarias representam o ideal paradiplomático de utilizar acordos e relações internacionais de forma a alcançar objetivos específicos das localidades nas quais estão inseridas. Como será abordado a seguir, as Secretarias trabalham de acordo com as demandas do estado e da população, atuando de maneira estratégica e personalizada, o que maximiza a eficiência das soluções. O Rio de Janeiro pode ser considerado o estado com maior experiência em inserção internacional do Brasil, dada seu histórico como capital do país por dois séculos. Isto impulsionou a criação da primeira unidade administrativa com o objetivo específico de formular estratégias de inserção internacional de um estado da federação brasileira, a Assessoria de Relações Internacionais em 1983. Atualmente, o objetivo principal da Subsecretaria é reposicionar o Rio perante potenciais parceiros e investidores. Para alcançar este objetivo, destaca-se a iniciativa estratégica de buscar em outros países experiências bem sucedidas de políticas públicas e paradiplomáticas. A busca por exemplos de sucesso no exterior é imprescindível para construir uma identidade de personagem ativo no cenário internacional, ainda incipiente no Brasil. A Subsecretaria está dividida em quatro eixos de atuação, através dos quais exerce um trabalho de articulação internacional objetivando desenvolver parcerias que proporcionem o desenvolvimento do estado. Os dois eixos principais, abordados a seguir envolvem o setor econômico-comercial e a questão da cooperação técnica internacional. 1- Promoção do comércio exterior e atração de investimentos O objetivo principal desta assessoria é atrair investimentos externos diretos (IED’S) e promoção do comércio exterior do Rio de Janeiro, fomentando as exportações e importações. No Brasil, o comércio internacional é extremamente afetado por deficiências crônicas estruturais e arranjos econômicos que dificultam o desenvolvimento de pequenas e médias empresas, principalmente. O economista e professor de Relações Internacionais do Ibmec- RJ, Márcio Sette Fortes, aponta: “Empresas grandes enfrentam o Custo Brasil; empresas pequenas, além dele, enfrentam a si mesmas e a sua falta de capacidade competitiva, sua falta de conhecimento dos mercados e sua incapacidade de financiamento para obter ganhos de escala, diante de juros bancários proibitivos, a despeito da existência de programas específicos de fomento ao setor oferecidos pelo Governo Federal.”6 6 Entrevista realizada com o professor Márcio Sette Fortes, no dia 16 de maio de 2014 Neste sentido, a atuação da Subsecretaria passa a ter grande importância no desenvolvimento e até mesmo na manutenção de pequenas e médias empresas que desejam internacionalizar seus produtos ou serviços. Há um mapeamento dos setores estratégicos do estado a serem estimulados, por meio da atração de investimentos ou mesmo pela promoção de exportações e importações. O trabalho de prospecção de potenciais mercados internacionais é extremamente importante para guiar empresas que estão iniciando e, como mencionado por Fortes, não possuem conhecimento destes mercados. Os investimentos atraídos a partir de missões da Subsecretaria para o exterior também fomentam o desenvolvimento destas empresas, assim como a cooperação técnica recebida, como será visto a seguir. É fato que a atuação da Subsecretaria no setor econômico-comercial tem contribuído para o desenvolvimento econômico do Rio de Janeiro, unidade federativa brasileira com o segundo maior PIB. Apesar disso, esse trabalho poderia maximizado se disponibilizasse dos recursos necessários. Pedro Spadale comenta em seu artigo que o desafio dessa área é conseguir atender a forte demanda que chega principalmente do exterior, pois há uma limitada capacidade de recursos humanos próprios. A escassez de pessoal é incompatível com a importância das atividades desempenhadas pela Subsecretaria e revela o quanto as atividades paradiplomáticas no Brasil ainda são consideradas de menor importância. Uma solução encontrada para este problema foi criar parcerias com empresas juniores de universidades com curso de RI, e mesmo este recurso é pouco divulgado. Este é um exemplo de barreira estrutural que dificulta que a paradiplomacia se desenvolva e alcance resultados mais expressivos. Um maior apoio do Governo do Rio de Janeiro, que possibilitasse a contratação de mais funcionários e disponibilizasse capacitações, expandiria o escopo de atuação da Subsecretaria e facilitaria o atendimento da demanda internacional. Há também um grande desconhecimento da população, não só em relação ás atividades econômicas e comerciais que estão sendo praticadas, mas da existência da Subsecretaria de Relações Internacionais. Uma vez que esta trabalha em prol dos interesses do estado e de seu povo, maior esclarecimento, promovido através de ações públicas, feiras, também é importante. A construção de pontes com universidades é uma iniciativa memorável, uma vez que permite a prospecção de futuros profissionais que podem ajudar na construção desse trabalho. Porém é necessário divulgação, publicidade. O crescimento econômico e social do Rio de Janeiro através da Subsecretaria depende não só da divulgação no cenário internacional como também internamente. 2- Desenvolvimento de cooperação técnica internacional O setor de cooperação técnica está relacionado ao desenvolvimento de relações cooperativas no qual o estado do Rio recebe capacitações ou assistência técnica de outras entidades subnacionais, em sua maioria de países mais desenvolvidos. Dentro dessa assessoria, há um grande esforço para mapear as prioridades em cada área pública do estado, para que estas possam ser desenvolvidas, tomando por base políticas públicas bem sucedidas no exterior. É fato que o escopo de atuação deste setor da Subsecretaria não está diretamente relacionado a questões econômicas como as abordadas anteriormente. Mas a grande questão é a forma como a cooperação recebida através desse agente supre, muitas vezes, carências que deveriam ser sanadas pelo governo. Mais uma vez, as relações internacionais construídas pelo ator paradiplomático atende as demandas da região na qual está inserida. Em relação ao desenvolvimento da educação pública a partir da cooperação internacional é possível mencionar a parceria do estado do Rio com o Estado de Maryland, EUA. Esta “irmandade” possibilitou a construção de uma escola primária no município de Nilópolis e a instalação de uma escola pública de ensino médio, de tempo integral e com ensino bilíngue, em parceria com educadores da Prince George County Public Schools.7 Esta parceria estendeu-se para a saúde, com a inauguração em São Gonçalo, de um núcleo especializado no atendimento de pacientes politraumatizados. Os profissionais que atuam neste núcleo foram capacitados no Centro de Trauma da Universidade de Maryland, EUA. É válido destacar que o fluxo de informações, capacitações e mesmo o número de parcerias entre atores não centrais de diversos países tem crescido tanto que já é possível apontar redes de entidades subnacionais. O Rio de Janeiro, por exemplo, participa da ORU-FOGAR, Organização das Regiões Unidas. No quesito de cooperação técnica é possível ver o delinear de uma via de mão dupla, na qual a Subsecretaria do Rio de Janeiro tem se empenhado em também oferecer auxílio para outros países em temas específicos, como segurança e saúde. A cooperação é, sem dúvida, uma maneira efetiva de desenvolver o estado. Mas é necessária que as parcerias sejam realizadas em prol da população e não como um meio de promoção política. A Subsecretaria é parte da estrutura da Casa Civil, que é responsável pela coordenação de todas as ações do governo. Desta forma, é impossível segregar interesses políticos das atividades realizadas. A grande questão é que projetos duradouros sofrem com a oscilação de poder, assim como a estruturação da Subsecretaria como um todo. Pedro Spadale problematiza esta questão em seu artigo: Importante salientar que aproximações institucionais levadas a cabo única e exclusivamente por motivações políticas nem sempre geram parcerias frutíferas, o que deve ser evitado. [...] (acordos) podem simplesmente representar uma boa “Photo Opportunity”, mas não gerar resultados concretos. Para que sejam frutíferos, os instrumentos assinados devem ser tratados como projetos que precisam ser integralmente executados para atingir efetivamente seus propósitos. A partir destas premissas, torna-se imprescindível garantir certo afastamento político não só dos projetos em andamento, mas em alguma medida, dos funcionários e da burocracia inerente a Subsecretaria. O objetivo é conceder a este ator alguma liberdade para que possa atuar em prol dos interesses da região, sendo esse o objetivo principal, e não secundário. 7 Dados retirados do artigo Relações Internacionais de unidades subnacionais: a experiência do estado do Rio de Janeiro. 5- Resultados alcançados O objetivo final da presente pesquisa era observar como se estabelece o cenário das políticas paradiplomáticas brasileiras, identificando os principais atores sub-estatais em exercício de paradiplomacia no Brasil e selecionando os casos mais relevantes cuja atuação contribuísse para o crescimento econômico do país. Em grande medida, este objetivo foi alcançado, a partir da construção de um debate que trás à luz a grande importância das iniciativas dos atores paradiplomáticos no desenvolvimento econômico das localidades onde estão inseridos. No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, o potencial de investimento estrangeiro gerado a partir da assistência direta da Subsecretaria é estimado em mais de oito milhões de dólares. No Brasil, a interpretação de que a política externa e as relações internacionais são feitas de maneira homogênea por um ator específico é bastante comum. Pinheiro e Milani apontam em seu artigo: No campo de estudo sobre a política externa brasileira (PEB), atribuir a um único indivíduo ou a uma única instituição a origem das decisões da política externa tem sido fato recorrente.8 Desta forma, este material de estudo almeja contribuir para esclarecer o imenso potencial que a paradiplomacia tem no país, desmistificando esta interpretação de atores unitários nas relações internacionais brasileiras. Esta pesquisa, na medida do possível, também buscou identificar alternativas para as deficiências encontradas ao longo do estudo de caso apresentado, de forma a colaborarmos para o processo de otimização da paradiplomacia no Brasil. 6- Conclusão A paradiplomacia no Brasil vem se desenvolvendo de forma significativa e seus atores estão e mostrando cada vez mais relevantes no cenário econômico do país. As estruturas paradiplomáticas, apesar de incipientes, tem um grande potencial, muitas vezes desconhecido pelos próprios agentes. A Subsecretaria de Relações Internacionais do Rio de Janeiro atua de maneira extremamente personalizada, atendendo de maneira específica as necessidades da região. A busca por investimento estrangeiro direto e prospecção para mercados para as empresas privadas de exportação, por exemplo, contempla os setores econômicos estratégicos do estado a serem estimulados. O desenvolvimento de cooperação técnica internacional também funciona a partir do mapeamento exato de quais são as prioridades em cada área da administração pública (p.e. saúde e educação), de forma a conseguir parcerias externam que as contemples. Em seu artigo, Spadale afirma que a atuação da Subsecretaria é result-oriented, ou seja, atua de forme congruente com as necessidades objetivas da administração pública estadual e dos interesses da população. A grande questão é que apenas um ator paradiplomático, orientado para interesses específicos de um grupo ou região pode alcançar esse tipo de resultado. 8 PINHEIRO, Letícia; MILANO, Carlos. Política externa Brasileira: Os desafios de sua caracterização como Política Pública. Contexto Internacional (PUC), VOL. 35 nº1 – jan/jun 20123, p. 11 Desta forma, o desenvolvimento dessa forma de atuação é essencial para o crescimento econômico do país como um todo, a partir do desenvolvimento particular de regiões específicas. A experiência do Rio de Janeiro teria muito a acrescentar a outras regiões do país se “exportada”. Como foi analisado durante a pesquisa, não é o ambiente jurídico brasileiro o maior impedimento ao crescimento destes atores, mas a ausência de empreendedorismo, esclarecimento e reconhecimento do próprio Governo Central, ainda muito focado em relações internacionais feitas essencialmente pelo Itamaraty e também – característica muito típica dos países latino-americanos – pelo Presidente da República. A parcela de contribuição de entidades como as Secretarias de Relações Internacionais poderiam ser infinitamente maiores se estes órgãos recebessem maior apoio governamental, seja com apoio financeiro, capacitações ou mesmo abrindo maior espaço para esses atores debaterem os rumos da política externa nacional. A ausência de conhecimento também alcança a população. Abordamos aqui as parcerias que a Subsecretarias constroem com universidades, mas que muitos alunos desconhecem. Mesmo pequenas e médias empresas que desejam a internacionalização, muitas vezes não sabem que podem contar com a ajuda desse ente paradiplomático. Há uma grande necessidade de divulgação do projeto como um todo, e não apenas divulgar os eventos realizados – como a Rio+20 9 – ou parcerias feitas em nome da boa imagem política. O Ministério das Relações Exteriores tem se comprometido, em certa medida, com ações para integrar esses novos atores não estatais, como a semana de Diálogos sobre política externa, que reuniu atores estatais e não estatais para discutir as necessidades do país neste âmbito. Esta ainda é uma iniciativa incipiente, mas sinaliza uma intenção do governo central de se aproximar dos atores periféricos. A integração da diplomacia tradicional e a paradiplomacia maximizaria o crescimento econômico brasileiro de forma a beneficiar não só os atores envolvidos, mas toda a população nacional. 9 A disputa do Rio de Janeiro para sediar eventos como a Conferência Rio+20, Jornada Mundial da Juventude Jogos Olímpicos 2016 faz parte da estratégia da Subsecretaria do Rio de Janeiro e do Governo do estado para atrair visibilidade internacional para a região. 7-Bibliografia DIAS, Reinaldo. Artigo Um tema emergente nas Relações Internacionais: A paradiplomacia das cidades e municípios ; publicado no site ambitojuridico.com.br http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura &artigo_id=8156 BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Emenda à Constituição 475/05. Acrescenta parágrafo ao art. 23 da Constituição Federal para permitir que Estados, Distrito Federal e Municípios possam promover atos e celebrar acordos ou convênios com entes subnacionais estrangeiros, 2005. 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