PARECER JURÍDICO “EMENTA: Reprodução de trechos de obra preexistente em obra nova sem a devida citação do autor e obra. Legislação Nacional e Internacional sobre a matéria”. Consulente: Danilo Fernandes Blog Genizah 1. INTRODUÇÃO O presente parecer é baseado na obra portuguesa “Direito Ecclesiastico1” de José Ferreira Marnoco e Sousa e “Manual Prático de Direito Eclesiástico2” de Tais Amorim de Andrade Piccinini, através de confrontações de textos de ambas as obras enviadas pelo Sr. José Danilo Fernandes, editor do Blog Genizah. O Consulente solicita o pronunciamento técnico jurídico dos consultores firmatários sobre a possibilidade de reprodução de texto, mesmo que em pequeno trecho, de obra preexistente em obra nova, sem a devida citação de autor e obra, bem como a legislação interna e internacional que rege a matéria. Define-se Parecer Jurídico como um documento por meio do qual o jurista (advogado, consultor jurídico) fornece informações técnicas acerca de determinado tema, com opiniões jurídicas fundamentadas em bases legais, doutrinárias e jurisprudenciais, auxiliando o consulente em sua tomada de decisão. Assim sendo, o presente parecer jurídico visa orientar o Consulente sobre o questionamento apresentado. 2. PEQUENO CONCEITO DE DIREITO AUTORAL A própria conceituação de determinado instituto jurídico pode ser objeto deste alegado "direito autoral". No dizer de Pontes de Miranda, "os direitos autorais são um feixe de direitos"3. Não existe apenas "um" direito do autor; sua natureza jurídica é híbrida, pois, assim como a existência humana é multicomplexa, o que disciplina a criação do espírito também o é. Desta forma nasce uma trindade de direitos quando se fala do assunto em voga, que, também na lição do mestre, podem ser definidos como (A) direito autoral de 1 MARNOCO E SOUSA, José Ferreira. Direito Eclesiástico. Coimbra: Universidade de Coimbra, [~1901]. PICCININI, Tais Amorim de Andrade. Manual Prático de Direito Eclesiástico. Ed. Saraiva, 2013. 3 PONTES DE MIRANDA. Tratado de Direito Privado. Tomo XVI, §1.836, Rio de Janeiro: Ed. Borsoi, 1971, p. 10. 2 personalidade, ou direito moral; (B) direito autoral de exploração; e (C) direito autoral de nominação. O autor Roberto Senise Lisboa assevera que “Os direitos autorais não são direitos meramente patrimoniais, pois se constituem como categoria com especificidade própria, ante a existência de direitos morai do criador da obra, a serem devidamente protegidos. Pelo fato de s direitos intelectuais possuírem aspectos morais e patrimoniais, pode-se afirmar que os direitos autorais são direitos sui generis, o que perfeitamente explica a sistematização própria que lhe é conferida”.4 Neste passo importante ressaltar que, da tríade de natureza jurídica deste "Direito Autoral", o direito de personalidade, ou moral, é o que tem a precedência sobre os demais. É inalienável, irrenunciável. É a maneira de se perpetuar a memória de seu criador, que, no dizer conhecido, "vive" na sua obra. Vilipendiar este direito equivale à impossível tentativa de viver a vida de outrem. Assim sendo, é o direito autoral aquele catalisador de direitos, desde o fundamental de personalidade, decorrente do princípio vivificante da constituição, qual seja, o da dignidade da pessoa humana, até o direito de identificação entre autor e obra, e também, quando dentro das limitações da lei, do gozo e fruição econômica desta criação de seu espírito. Como requisitos para entender o feixe protetivo com relação a determinada obra, há que se buscar identificar três aspectos, quais sejam, criatividade, originalidade e exteriorização A criatividade é o elemento primeiro e mais sensível, pois é a gênese do ato humano de pensar artística ou cientificamente, sentir e canalizar esta experiência sensorial ou acadêmica em um produto denominado "obra". 4 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: direitos reais e direitos intelectuais. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, v.4, p. 501. A originalidade é o traço distintivo entre o que está no plano da existência e o que ainda não houve manifestação anterior por obra de espírito. O ineditismo é a cabal evidência de autoria. Finalmente a exteriorização é de fundamental importância, pois, como sabido, o que o direito protegerá é justamente a forma como esta criação veio ao mundo, pois é aí que nasce para o direito. 3. DO PLÁGIO O "plágio" pode ser definido como um verdadeiro "assalto moral". Ocorre que os direitos autorais são protegidos, antes de tudo, pelo fato de que decorrem de uma verdadeira parte da personalidade do autor. A "obra" é fruto da criação do espírito humano, no próprio dizer da Lei de Direito Autoral. Portanto o ato de apropriar-se desta criação é um insulto à personalidade do autor, roubando-lhe (i) o crédito moral de ser associado à sua criação, (ii) a sua memória, depois de falecido e (iii) o devido reconhecimento financeiro que acompanha o direito autoral. Num conceito resumido, pode-se dizer que a contrafação (nome técnico jurídico dado ao plágio pela Lei Federal n. 9.610/98 - a Lei do Direito Autoral) é toda "reprodução não autorizada" (art. 5º, VII). Isto mostra que a regra da lei é que existe a necessidade de autorização do autor para a reprodução de sua obra. Isto é lógico na medida em que o autor tem o direito de controlar a maneira pela qual se dissemina seu trabalho, e a quem quer (ou não) ver vinculada sua imagem. É necessário lembrar que, como parte de sua personalidade emprestada à obra, há que se resguardar o direito do autor de ver (ou não) seu nome atrelado a determinada pessoa ou instituição. Neste passo a própria autora da obra nova analisada concorda com a regra geral quando diz, "portanto, a autorização para reproduzir uma obra escrita por outrem não é uma faculdade, mas sim um obrigatoriedade, sob pena de obstar a publicação de determinada obra". 5 Há exceções à regra de autorização prévia, como se verá adiante, mas o 5 PICCININI, Taís. Op.Cit. p. 202. que fica patente é que, quando se nota, em uma obra, uma conduta de dissimulação por parte do contrafator, ao fazer-se passar por autor de trecho ou do todo de obra já tornada pública, não lhe dando a devida menção, tem-se aí, em tese, o famoso "plágio". Fica bem claro, pela leitura da lei, que a intenção do legislador é proteger a forma dada à obra, e não a ideia da mesma, uma vez que o próprio art. 8º, I 6, do Diploma Legal diz que as ideias não são protegidas pelo direito autoral. É importante frisar que o plágio se caracteriza, uma vez acessada a doutrina e jurisprudência pátria que grassa sobre o assunto, não apenas pela similaridade entre os textos, mas sim a intenção de cópia da obra contrafeita. Este conceito é necessário inclusive para diferenciar o plágio da chamada "apropriação de obra alheia". Ambas são infrações ao direito moral do autor, mas nesta não há a intenção de dissimulação, de esconder a obra copiada; já no plágio há uma intenção de enganar o público que terá acesso à obra, a partir da prática de inserir modificações na forma original para que não se veja tratar-se da obra contrafeita. 3. NORMAS INTERNACIONAIS SOBRE PROTEÇÃO DO DIREITO AUTORAL O direito moral do autor sobre sua obra é regido internacionalmente pela Convenção da União de Berna, atualmente administrada pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual – OMPI, na qual a República Federativa do Brasil é signatária desde de 09 de Fevereiro de 1922 (Decreto n° 4.541 de 1922, e aprovou o texto atual, revisão de Paris de 1971, através do Decreto n° 75.699, de 6 de maio de 1975) e a República Portuguesa desde 29 de Março de 1911. A Convenção de Berna garante ao autor os direitos morais sobre sua obra, independente de quando foi criada, nos 165 (cento e sessenta e cinco) países signatários que compõem a União de Berna. Segue artigos do Tratado Internacional: "Art. 6 bis “Art. 8º Não são objeto de proteção como direitos autorais de que trata esta Lei: I - as idéias, procedimentos normativos, sistemas, métodos, projetos ou conceitos matemáticos como tais;”. 6 1) Independentemente dos direitos patrimoniais do autor, e mesmo depois da cessão dos citados direitos, o autor conserva o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a toda deformação, mutilação ou outra modificação dessa obra, ou a qualquer dano à mesma obra, prejudiciais à sua honra ou à sua reputação. Art. 9 1) Os autores de obras literárias e artísticas protegidas pela presente Convenção gozam do direito exclusivo de autorizar a reprodução destas obras, de qualquer modo ou sob qualquer forma que seja". O art. 10, item 3, da Convenção de Berna arremata quaisquer dúvidas: "Art. 10 (...) 1) São lícitas as citações tiradas de uma obra já licitamente tornada acessível ao público, com a condição de que sejam conformes aos bons usos e na medida justificada pela finalidade a ser atingida, inclusive as citações de artigos de jornais e coleções periódicas sob forma de resumos de imprensa. 3) As citações e utilizações mencionadas nos parágrafos antecedentes serão acompanhadas pela menção da fonte e do nome do autor, se esse nome figurar na fonte". Como já referido alhures a Convenção de Berna foi aprovada pelo Decreto n° 4.541 de 1922, bem como sua Revisão (Revisão de Paris, 1971) através do Decreto n° 75.699, de 6 de maio de 1975, oriundo do Decreto Legislativo do Congresso Nacional de nº 94/1974, aprovado em cada Casa com quórum qualificado (PDC 106/1973 e PDS 18/1973, Câmara e Senado, respectivamente). Reza a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: "Art. 5º (...) § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais". Ou seja, a Convenção de Berna possui força constitucional em solo brasileiro visto que foi aprovada pelas duas Casas do Congresso Nacional, promulgada pelo Decreto 76.699/1975, aplicando-se suas regras no Brasil a todos os autores que pretendam se utilizar de trechos de obras de autores estrangeiros. Por derradeiro, apenas para reforçar o argumento acima esposado, o Código de Direito Autoral Português, pais de origem da obra preexistente, prescreve: "Art. 9º 3 – Independentemente dos direitos patrimoniais, e mesmo depois da transmissão ou extinção destes, o autor goza de direitos morais sobre a sua obra, designadamente o direito de reivindicar a respectiva paternidade e assegurar a sua genuinidade e integridade". "Artigo 56.º 2 – Este direito é inalienável, irrenunciável e imprescritível, perpetuando-se, após a morte do autor, nos termos do artigo seguinte". 4. CONFRONTAÇÕES DOS TEXTOS DE MARNOCO SOUSA E PICCININI A obra “Manual Prático de Direito Eclesiástico” possui 11 (onze) trechos em seu capítulo I, entre as páginas 21 a 27 que, confrontadas com a obra preexistente “Direito Ecclesiastico”, entre as páginas 8 a 13, percebe-se a reprodução, com apenas e tão somente a correção para o português vigente, além de uso de anafóricos para concatenação de parágrafos, que não se afastam da forma original usada pelo autor legítimo. A ideia central da obra nova, conforme sua apresentação7, é de ser um manual prático às organizações religiosas, tendo como “objetivo primário proporcionar entendimento de forma ampla a respeito da Ciência do Direito eclesiástico 8”. Aqui vislumbra-se que, além de ser um manual prático, a autora pretendeu primariamente levar seu leitor ao conhecimento da ciência em si da matéria apresentada, o que faz em seu capítulo 1. Pode-se dizer inclusive que, em uma primeira leitura deste capítulo isoladamente, há a pretensão de iniciar uma sistematização científica de elementos de conexão entre os diferentes ramos autônomos do Direito e o fenômeno da religiosidade formando assim um novo ramo de estudo da ciência jurídica. Nos onze trechos reproduzidos na obra nova, apresentados pelo Consulente, apenas o primeiro possui uma citação direta de rodapé, esta inserida nas referências bibliográficas: Neste aprofundar, temos que muitas são as definições que são dadas ao Direito Eclesiástico. Basicamente, estas definições, foram perpetradas por três escolas – francesa, italiana e alemã -, as quais possuem diferentes entendimentos, embora não sejam totalmente conflitantes. 9 Este mesmo trecho consta na obra preexistente, nos seguintes termos: Muitas são as definições que teem sido dadas do direito ecclesiastico. Estas definições encontram-se dominadas por tres escolas — francesa, italiana e allemã — que seguem a respeito deste assumpto critérios differentes10. A citação da autora PICCININI acima referida é de Eschbach e outros, como se fosse da autoria destes, todavia, ao analisar a obra preexistente, o autor português cita Eschbach e outros em trecho anterior de sua obra. Ou seja, o trecho de autoria de Eschbach é outro trecho e não o que foi citado pela autora PICCININI. O texto de autoria de Eschabach, citado por MARNOUCO E SOUSA é o seguinte: “A expressão jus canonicum só foi introduzida no seculo XII. Antes de esta epocha não se conhecia tal denominação, e por isso ou se invocavam simplesmente os canones ou se usavam as expressões canonum statuta, forma, disciplina, e a 7 PICCININI, Tais Amorim de Andrade. Manual Prático de Direito Eclesiástico. Ed. Saraiva, 2013, ps. 17-18. Idem, p. 18. 9 PICCININI, Tais Amorim de Andrade. Manual Prático de Direito Eclesiástico. Ed. Saraiva, 2013, p. 21. 10 MARNOCO E SOUSA, José Ferreira. Direito Ecclesiástico. Coimbra: Universidade de Coimbra, [~1901], p. 10-11. 8 partir do seculo IX canonica sanclio, lex canonica e canonum jura. Foi tambem por aquelle tempo, seculo XII, que appareceu pára significar a mesma idéa a expressão jus ecclesiasticum, visto-o o direito canonico dizer respeito principalmente ás pessoas e cousas ecclesiasticas e derivar da autoridade ecclesiastica que o constitue e confirma11”. Demonstra-se que a única citação realizada pela autora na obra nova não corresponde ao mesmo autor, todavia, se fosse o caso, quando se extrai um trecho de um autor citado por outro autor, existe também a obrigação de sua indicação, nos termos da NBR10520:2002 com a utilização da expressão “APUD”, ou seja, “segundo Eschbahc apud Marnouco e Souza”. 5. DAS POSSÍVEIS SANÇÕES DECORRENTES DA VIOLAÇÃO Importante também conhecer como a Lei de Direito Autoral resolve a eventualidade de violação de uma obra, posto que toda violação autoral é uma ofensa à personalidade do autor, sua memória e seu direito de fruir de sua criação e gozar os louros morais e financeiros. Embora já mencionado anteriormente, repisa-se que há limitadores ao direito do autor. Assim diz o art. 46 da LDA: "Art. 46. Não constitui ofensa aos direitos autorais: I - a reprodução: a) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos; b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza; c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros; 11 Idem, p. 10. d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários; II - a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro; III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra; IV - o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização prévia e expressa de quem as ministrou; V - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e transmissão de rádio e televisão em estabelecimentos comerciais, exclusivamente para demonstração à clientela, desde que esses estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam a sua utilização; VI - a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fias exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro; VII - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou administrativa; VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores". O capítulo 1 da obra nova de PICCININI tem como título “Introdução ao Direito Eclesiástico: conceitos, origem, evolução e influência nos dias atuais12”, possuindo diversas transcrições da obra de Marnoco e Sousa, infringindo, assim, o artigo 10, parágrafos 1º e 3º da Convenção de Berna, bem como a legislação pátria sobre a matéria, a Lei nº 9.610/98, conforme transcrição acima. A legislação de regência permite a reprodução de pequenos trechos de obras literárias pré-existentes desde que seja indicado o nome do autor e a origem da obra, nos termos do artigo 46, inciso III e VIII da Lei 9610/98. Ou seja, o inciso VIII 12 Idem, p. 19. deve ser interpretado restritiva e sistematicamente com o inciso III do artigo 46, sob pena de antinomia entre os próprios incisos da norma. No caso apresentado, além de não existir citação do autor português na obra nova, também, salvo melhor juízo, parece-nos que os trechos reproduzidos não são pequenos no conceito do inciso VIII acima reproduzido, visto que seu capítulo I possui 10 páginas, sendo 3 páginas reprodução da obra preexistente, o que perfaz 30% do capítulo sub exame, parece claro que, numa interpretação teleológica, a exegese que deve se extrair do inciso VIII é da vedação de reprodução de grandes trechos, pois a reprodução de pequenos trechos deve ter citação nos moldes do inciso anterior, III. Os textos literários são objeto de proteção do ordenamento internacional e do ordenamento pátrio, nos termos da Lei 9610/98: "Art. 7º (...) I - os textos de obras literárias, artísticas ou científicas"; "Art. 24. São direitos morais do autor: (...) II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra"; Assim sendo, uma vez que não existe, no caso prático, a incidência das excludentes de responsabilidade, vê-se que a contrafação existe na medida em que a obra reproduzida não aponta os créditos a quem de direito. Resta saber a quais sanções o infrator está sujeito. Primeiramente cumpre dizer que a contrafação é um ilícito civil. A definição é da própria lei, in casu, do art. 186 do Código Civil brasileiro que diz, ita lex dicit: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Desta forma, se um determinado texto é inserido dentro de uma obra sem referir o autor do mesmo, o que equivale dizer que está sem autorização e em descumprimento da obrigação legal do art. 46 da LDA existe uma violação deste direito, mesmo que apenas moral e é, portanto, ilícito. Esta violação contém um danum in re ipsa, ou seja, não há necessidade da verificação de um dano comprovado, como um prejuízo financeiro quantificável. O simples fato deste ato ocorrer no mundo já causa dano e obriga o infrator a uma reparação, como diz o art. 927 do mesmo Código Civil, que diz: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. A reparação em questão pode ser exigida perante o Poder Judiciário. Ali há previsão de busca e apreensão do material, além da proibição da continuidade de divulgação da obra contrafeita, além de pretensões indenizatórias. Importante ainda ressaltar que não só o contrafator está sujeito a tais sanções, mas, igualmente, qualquer pessoa que tenha concorrido para a reprodução ilegal, nos termos do art. 104, da LDA: “Art. 104. Quem vender, expuser a venda, ocultar, adquirir, distribuir, tiver em depósito ou utilizar obra ou fonograma reproduzidos com fraude, com a finalidade de vender, obter ganho, vantagem, proveito, lucro direto ou indireto, para si ou para outrem, será solidariamente responsável com o contrafator, nos termos dos artigos precedentes, respondendo como contrafatores o importador e o distribuidor em caso de reprodução no exterior". Além das sanções civis há que se falar também em responsabilização criminal. Porque, além de uma agressão à pessoa do autor em sua moral e personalidade, há, em última análise, uma agressão à toda a sociedade, com conduta tipificada e passível de punição restritiva de liberdade. Diz o art. 184 do Código Penal brasileiro: “Art. 184. Violar direitos de autor e os que lhe são conexos: (Redação dada pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. (Redação dada pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)”. Porém a lei pune de forma mais veemente esta prática quando ocorre em função da obtenção de vantagem econômica: “§ 1o Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente: (Redação dada pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003) Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.695, de 1º.7.2003)”. Assim sendo é de se notar como o ordenamento jurídico pretende proteger tanto o direito individual quanto o arcabouço de valores sobre a qual é erigida a nação e seus valores. Há uma gradação de pena em relação à gravidade do ato, respeitando a proporcionalidade. Há também uma busca de desestimular toda uma cadeia de roubo da indústria criativa: o contrafator, quem ajuda a disseminar, quem vende, tem em depósito e até mesmo quem consome esta obra. Expor a sociedade a esta fragilidade é uma conduta reprovável, civil e penalmente. Em suma pode-se dizer que todo o adquirente da obra, uma vez que toma consciência da contrafação, se nada faz, é como um cúmplice ou partícipe de conduta criminosa. 6. CONCLUSÕES: 1. O Direito Internacional que rege os direitos do autor se aplicam em solo brasileiro nos termos da Convenção de Berna. 2. A reprodução de trecho de obra preexistente já tornada pública em obra nova na tentativa de se passar como autor, não dando a devida menção ao autor original, configura-se, em tese, o famoso "plágio", inclusive quanto a forma dada à obra, e não a ideia da mesma, nos termos do art. 8º, I da Lei 9610/98. 3. Toda e qualquer reprodução de trechos de obra preexistente deve possuir a citação do autor e da obra, sendo que apenas a reprodução de pequenos trechos, com a devida citação, que não caracteriza ofensa ao direito moral do autor, grandes trechos, mesmo com citação do autor, caracteriza-se, também, como ofensa ao direito autoral. Lei 9610/80, art. 46, inciso III e VIII. 4. Os textos da obra preexistente e da obra nova enviados pelo Consulente são reproduções do último ao primeiro, com pequenas adaptações para o português corrente e outras de estilo, sem quaisquer citações do autor da obra preexistente, pelo menos na edição de 2013 da obra nova. 5. A única citação existente no capítulo 1 da obra nova é de obra distinta da preexistente, feita por esta, sendo ainda equivocada, e, se estivesse correta, deveria ser feita na forma da ABNT 10520:2002, em que pese a inexistência de qualquer citação nos outros dez trechos. 6. Nos termos do item 5 acima, a autora da obra nova analisada, tanto quanto aqueles que concorreram para sua produção podem, em tese, ser responsabilizados administrativa, civil e penalmente, bem como aqueles que adquiriram a obra, e, tendo conhecimento da obra preexistente não denunciaram o plágio e a contrafação, ambos em tese. Por derradeiro, a título ilustrativo, qualquer pessoa que produzir uma obra literária, na introdução desta obra, não pode “tomar” emprestado, como sua fosse, grande parte da introdução da obra “O Banquete” de Platão, escrito em 380 a.c., sem citá-lo, e, mesmo citando-o, poderia reproduzir apenas pequenos trechos. É o parecer, S.M.J. Porto Alegre, 26 de junho de 2014. Dr. Thiago Rafael Vieira OAB/RS 58.257 OAB/SC 38.669-A OAB/PR 71.141 Dr. Jean Marques Regina OAB/RS 59.445