ATUALIZA ASSOCIAÇÃO CULTURAL
ENFERMAGEM EM EMERGÊNCIA
KARINE SOUZA NEVES
ATUAÇÃO DA ENFERMAGEM NO ATENDIMENTO PRÉHOSPITALAR À VÍTIMAS DE ACIDENTE DE TRÂNSITO
Salvador – BA
2011
KARINE SOUZA NEVES
ATUAÇÃO DA ENFERMAGEM NO ATENDIMENTO PRÉHOSPITALAR À VÍTIMAS DE ACIDENTE DE TRÂNSITO
Artigo apresentado à ATUALIZA ASSOCIAÇÃO
CULTURAL como requisito parcial para a
obtenção do título de Especialista em Enfermagem
em Emergência, sob a orientação do Profº
Fernando Reis do Espírito Santo.
Salvador – BA
2011
Atuação da Enfermagem no atendimento pré-hospitalar à vítimas de
acidente de trânsito
Karine Souza Neves*
Orientador: Fernando Reis do Espírito Santo**
RESUMO
Este estudo trata sobre o atendimento pré-hospitalar (APH) às vítimas de trauma, decorrente
de acidente de trânsito, no que se refere à organização do processo de trabalho, identificando a
inserção da enfermagem nesse campo. Os acidentes de trânsito têm sido alvo de grande
preocupação no Brasil e no mundo, pelo elevado número de vítimas jovens que atingem e
pelos impactos sociais, econômicos e pessoais que provocam. Assim, o APH tem
desenvolvido um importante papel no atendimento as vítimas por acidente de trânsito,
prestando uma assistência adequada no atendimento inicial e imediato, sendo a equipe de
enfermagem, profissionais que estão na linha de frente desse atendimento. Com o objetivo de
evidenciar, a partir da literatura, a atuação da Enfermagem no atendimento pré-hospitalar à
vítima de acidente de trânsito, realizou-se uma pesquisa do tipo exploratória e retrospectiva
bibliográfica, com apreciação sistematizada e qualitativa. Os resultados dessa pesquisa
mostram a importância da enfermagem no socorro à vítimas de acidente de trânsito, deixando
claro, a necessidade dos profissionais cada vez mais de se atualizarem e investirem na sua
prática profissional. Há também uma necessidade de mais estudos sobre o tema,
principalmente voltados para a enfermagem. Conclui-se que os altos índices de acidentes de
trânsito estão envolvidos com o comportamento da população, sendo o atendimento préhospitalar um dos principais responsáveis pela diminuição da morbi-mortalidade. É
evidenciado que as vítimas sejam atendidas por uma equipe multidisciplinar, com assistência
imediata e no menor intervalo de tempo possível com prestação de atendimento adequado e
transporte a um hospital devidamente capacitado para amenizar as possíveis seqüelas futuras.
Palavras-chave: enfermagem; atendimento pré-hospitalar; acidente de trânsito.
___________________________________________________________________________
* Graduanda concluinte do curso de Especialização em Enfermagem em Emergência pela
ATUALIZA ASSOCIAÇÃO CULTURAL.
** Doutor em Educação pela PUC / SP. Professor Adjunto da UFBA.
1 INTRODUÇÃO
Apresentação do objeto de estudo
Os acidentes de trânsito representam relevante papel no conjunto das principais causas de
morbimortalidade no mundo contemporâneo. Alguns fatores têm sido destacados como
determinantes da origem e da gravidade dos acidentes de trânsito. Dentre esses, são
freqüentemente citados a idade, o gênero, as condições socioeconômicas, o desrespeito à
legislação de trânsito – especialmente o abuso de velocidade e o consumo de bebidas
alcoólicas previamente à direção de veículos automotores -, associados, em geral, a uma
inadequada fiscalização do trânsito. (ANDRADE et al., 2003).
Prestar um cuidado adequado a essas vítimas pressupõe a existência de um sistema de
atendimento de urgência que inclua um serviço de atenção pré-hospitalar articulado a
hospitais com crescentes níveis de complexidade. (LADEIRA e BARRETO, 2008).
O atendimento pré-hospitalar (APH) envolve todas as ações que ocorrem antes da chegada do
paciente ao ambiente hospitalar. De acordo com Ribeiro (2001), compreende o atendimento
na cena do acidente, o transporte e a chegada ao hospital e essa assistência qualificada é
fundamental para que a vítima chegue com vida.
Na normatização existente sobre o APH está prevista a composição da equipe de saúde com
enfermeiro, auxiliar ou técnico de enfermagem e médico, conforme a complexidade do
atendimento a ser prestado e do veículo (ambulância) que será deslocado para essa ocorrência.
Além da equipe de saúde podem participar do atendimento as equipes de resgate e de
segurança. Assim, atuam bombeiros militares no resgate e, no campo da segurança, policiais
militares ou agentes de trânsito municipais. (BRASIL, 2002).
O Ministério da Saúde, pela Portaria nº 2048, estabelece as competências e atribuições dos
trabalhadores que podem atuar no APH, sejam da área da Saúde ou não, sem preocupação
com o processo de trabalho em equipe, com o cotidiano de cada profissional, com a interrelação das áreas envolvidas, determinando uma dependência aos protocolos de atendimento e
às decisões do médico regulador.
Esse campo de trabalho na saúde Pública é muito recente, os pioneiros no APH são os
profissionais da Segurança e Defesa Civil, em particular os bombeiros militares, e não os
profissionais da Saúde. Os bombeiros militares têm uma trajetória no APH, visto que o
salvamento e o resgate – sua atribuição legal – integram o espectro de atividades desse
atendimento no que diz respeito ao trauma. (FERNANDES, MINUZZI, KUHN, 2000).
Thomaz e Lima (2000, p. 60) relatam que “o tipo de trabalho desenvolvido pela equipe de
enfermagem no APH é uma prática nova para os padrões de enfermagem tradicional”. Nos
serviços existentes, a configuração das equipes é variada e nem sempre os profissionais da
Enfermagem têm seu lugar assegurado, especialmente o enfermeiro.
Acredita-se que é preciso conhecer melhor a dinâmica desse serviço, para entender-se o papel
de cada um dos profissionais e o que é necessário para que o objetivo de atender as vítimas de
trauma, com qualidade e eficiência, seja alcançado. (PEREIRA e LIMA, 2006).
O APH, na maior parte das vezes acontece em ambiente adverso e hostil e, de acordo com
Dantas e Seixas (1998), alguns fatores como a habilidade pessoal do profissional e recursos
disponíveis, assim como o alcance dos meios de comunicação, entrosamento da equipe e,
principalmente, treinamento específico intervém de forma decisiva nos resultados do trabalho.
Segundo Thomaz e Lima (2000, p. 60) o enfermeiro passou a atuar na assistência direta às
vítimas atendidas no pré-hospitalar a partir da década de 90, quando foram incorporadas aos
serviços as unidades de suporte avançado. As autoras relatam que, a partir daí, “... o
enfermeiro é participante ativo da equipe de atendimento pré-hospitalar e assume em conjunto
com a equipe a responsabilidade pela assistência prestada à vítimas”.
Justificativa
A motivação para realizar este estudo partiu da observação através da mídia do constante
aumento do número de acidentes de trânsito no estado. A minha preocupação tem sido
pautada na organização do trabalho no atendimento pré-hospitalar à vítima de trauma e a
inserção da Enfermagem, nesse contexto. É necessária a Enfermagem, construir a sua história,
buscando caracterizar a sua atuação no campo pré-hospitalar e o papel que desempenha junto
à equipe multiprofissional e intersetorial.
Problema
O que diz a literatura sobre a atuação da Enfermagem no atendimento pré-hospitalar à vítima
de acidente de trânsito?
Objetivo
Evidenciar, a partir da literatura, a atuação da Enfermagem no atendimento pré-hospitalar à
vítima de acidente de trânsito.
Metodologia
Esta é uma pesquisa do tipo exploratória e retrospectiva bibliográfica, com apreciação
sistematizada e qualitativa, que segundo Gil (1999), a pesquisa bibliográfica é desenvolvida
mediante material já elaborado, com a finalidade de colocar o pesquisador em contato direto
com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto.
Segundo o mesmo autor, a pesquisa exploratória é desenvolvida no sentido de proporcionar
uma visão geral acerca de determinado fato, com o objetivo de proporcionar maior
familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito. (GIL, 1999).
Richardson (1999, p.80) menciona que “os estudos que empregam uma metodologia
qualitativa podem descrever a complexidade de determinado problema, analisar a interação de
certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais”.
O estudo teve como população as produções científicas nacionais relacionadas ao assunto nos
últimos 13 anos. A coleta de dados foi feita nas bases de dados BDENF, LILACS,
MEDLINE, SCIELO, acessados através da BIREME, empregando-se os conjuntos de
palavras-chaves: “atendimento pré-hospitalar”, “acidente de trânsito”, “enfermagem
serviços APH”, no mês de maio de 2011.
A coleta das informações bibliográficas se deu diretamente das bases citadas e foi secundada
pela seleção de produções referentes ao assunto e análise qualitativa das indicações
selecionadas.
Os textos foram selecionados por sua pertinência ao assunto, foram levados em consideração
os que continham informações sobre a estrutura e a história do atendimento pré-hospitalar no
Brasil. Para tanto foram lidos e analisados os resumos de todas as obras citadas e excluídos
aqueles que discorriam sobre o funcionamento atual do APH em outros países.
Após proceder a leitura dos resumos; foi realizada a leitura na íntegra dos textos selecionados,
seguidos de um fichamento contendo: referência bibliográfica, síntese da produção e
comentário pessoal da pesquisadora principal.
As produções foram, então, agrupadas por similaridade temática, no qual se construiu o
esquema para elaboração do relato dos achados. As categorias de análise encontradas foram:
a) Aspectos epidemiológicos do trauma causado por acidente de trânsito, b) Atendimento préhospitalar à vítima de trauma: organização e equipe e c) Atuação da Enfermagem no
Atendimento Pré-Hospitalar.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1- Aspectos epidemiológicos do trauma causado por acidente de trânsito
Segundo Malvestio e Sousa (2002), o trauma envolvendo “veículo a motor”, o chamado
acidente de trânsito, tem forte impacto nas estatísticas de mortalidade por esta causa. Além da
potencialidade para altas taxas de mortalidade, os acidentes de trânsito têm em comum, a
capacidade de provocar às vítimas um padrão de lesão semelhante.
Este padrão de lesão e sua gravidade são influenciados pela aceleração, direção da força
envolvida no acidente, a posição da vítima no veículo e sua idade, o uso de equipamentos de
segurança, e ainda, tipo e tamanho dos veículos envolvidos. (Ibid).
Os acidentes de trânsito são um dos principais responsáveis pela mortalidade, no Brasil e no
mundo, de vítimas jovens e, para Andrade et al. (2003), a população jovem é a mais
vulnerável à ocorrência de acidentes de trânsito, sendo sua alta incidência relacionada à falta
de experiência na condução de veículos, além de características próprias da juventude, como a
impulsividade e a necessidade de auto-afirmação perante o grupo.
Como agravante, os jovens, geralmente, consomem mais freqüentemente bebidas alcoólicas e
drogas do que os adultos, bem como tendem a exceder mais os limites de velocidade e a
desrespeitar outras normas de segurança no trânsito, o que, sabidamente aumenta as chances
de ocorrências de acidentes. (Ibid).
No Brasil, as causas externas representaram no ano de 2005, 12,5% do total de mortes; entre
estes, 83,5% ocorreram na população masculina. Segundo dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), referentes às duas últimas décadas, os acidentes de trânsito
situam-se logo após os homicídios, como a segunda causa de morte no País, prevalecendo o
grupo etário de jovens.
Estes dados, segundo Pereira e Lima (2006), demonstram o impacto que a mortalidade por
causas externas representa no quadro geral de mortalidade, sendo considerada um grande
problema de Saúde Pública, não só no estado e no Brasil, mas no mundo. Isto, sem se falar
nos custos para o Sistema de Saúde e para a sociedade, no que se refere aos “sobreviventes”,
que exigem tratamento intensivo, de alta complexidade, especializado e de reabilitação.
Para Whitaker, Gutiérrez e Koizumi (1998, p. 115),
O trauma determina conseqüências sociais e econômicas importantes, pois as lesões
podem ocasionar a morte ou incapacidade temporária ou permanente da vítima,
determinando um alto custo com a recuperação, além de muitas vezes comprometerlhe a qualidade de vida.
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) desenvolveu um estudo em que buscou
quantificar os custos relacionados aos acidentes de trânsito nas aglomerações urbanas do
Brasil, e os principais componentes desses custos são a perda de produção, os custos médicoshospitalares e os mecânicos, numa proporção de 85% do total. Os custos médicoshospitalares, que estão presentes apenas nos acidentes com vítimas, respondem por 16% dos
custos totais e incluem o resgate das vítimas e a reabilitação. Segundo o relatório divulgado
pelo IPEA um acidente de trânsito tem um custo médio de R$ 8.782,49, quantia essa que, no
caso em que haja vítimas eleva-se para R$ 35.136,15. (INSTITUTO DE PESQUISA
ECONÔMICA APLICADA, 2003).
Ao contrário de várias doenças, que vêm sendo controladas através dos anos, a incidência dos
traumas tem aumentado e, segundo Rodrigues e Miller (2001), cerca de 50% deles decorrem
de acidentes de trânsito. Esse agravo é considerado um grande problema de Saúde Pública no
Brasil e no mundo.
No Brasil, a maior parte das internações por causas externas, em 2001, deveu-se a quedas,
com 43%, seguidas pelos acidentes de transporte, numa proporção de 17%. (BRASIL, 2003a).
Já Arruda (2000), em seu estudo sobre o perfil dos diagnósticos de Enfermagem que ocorrem,
com maior freqüência, em pacientes vítimas de trauma, admitidos em Centro de Tratamento
Intensivo, constatou que os acidentes automobilísticos estão entre os principais mecanismos
de ocorrência do trauma, representando 31,8% dos pacientes atendidos, ficando apenas um
pouco abaixo das quedas (36,4%).
Acontece no País, um acidente de trânsito a cada minuto, o que caracteriza esse agravo como
o segundo maior problema de Saúde Pública, só ficando abaixo da desnutrição. São 45000
mortes/ano, incluindo os óbitos após 24 horas do acidente, em que a maior parte das vítimas
têm menos de 45 anos e 60% dos sobreviventes ficam com lesões permanentes, trazendo, com
isto, prejuízos sociais incalculáveis. (DRUMOND e ABRANTES, 2001).
Segundo Queiroz (2001, p. 10), “o trânsito no Brasil mata oito vezes mais do que nos Estados
Unidos, cinco vezes mais do que no Japão e na Inglaterra, três vezes mais do que na França e
na Alemanha”.
Os custos sociais decorrentes do trauma, aliados à elevação dos índices de mortalidade por
acidentes e violência, têm apontado para a necessidade de se desenvolverem ações de
prevenção e assistência em todos os níveis de atendimento, para minimizar essa problemática.
(WHITAKER, GUTIÉRREZ e KOIZUMI, 1998).
2.2- Atendimento pré-hospitalar à vítima de trauma: organização e equipe
O atendimento às vítimas de trauma no local da ocorrência caminha desde o período das
grandes guerras, mais precisamente no século XVIII, período napoleônico. Neste período, os
soldados feridos em campo de batalha eram transportados em carroças com tração animal,
para serem atendidos por médicos, longe dos conflitos. Em 1972, o cirurgião e chefe militar
Dominique Larrey, começa a “dar os cuidados iniciais” a soldados feridos, no próprio campo
de batalha, a fim de prevenir possíveis complicações. (RAMOS e SANNA, 2005).
Tempos depois, os combatentes receberam treinamento de primeiros socorros a fim de prestar
atendimento a seus colegas logo após a ocorrência de uma lesão no campo de batalha. As
vítimas também recebiam os cuidados durante o transporte até o hospital de guerra.
Experiências em guerras, neste tipo de atendimento, no local da ocorrência, conjugadas a um
transporte rápido, diminuíram a morbimortalidade por causas externas; mas isto só ficaria
evidenciado décadas depois. (Ibid).
Whitaker; Gutiérrez e Koizumi (1998, p.111) acrescentam que a existência de um serviço de
atendimento pré-hospitalar integrado ao Sistema de Saúde pode influir positivamente nas
taxas de morbidade e mortalidade por trauma. Os autores dizem que “a avaliação da gravidade
do trauma e a instituição de manobras para manutenção básica da vida, no local do evento,
podem representar a oportunidade de sobrevida para as vítimas de trauma até a sua chegada
ao hospital”.
Malvestio e Sousa (2002, p. 589) também enfatizam que o cuidado às vítimas de trauma deve
começar antes mesmo da chegada ao hospital.
... a rapidez de chegada à cena e ao hospital, bem como as intervenções iniciais
apropriadas, previnem agravamento do quadro e o surgimento de novas lesões,
melhoram condições para alguns casos e até atrasam resultados fatais, dando à
vítima a chance de chegar ao tratamento definitivo e se beneficiar dele.
Nessa perspectiva, segundo Filipak (2001, p. 589) a literatura internacional especializada tem
indicado que “um atendimento rápido e adequado, no local da ocorrência do acidente,
possibilita a diminuição dos óbitos por traumas, bem como evita o agravamento dos danos e a
geração de seqüelas”.
Para Pereira e Lima (2006), a organização dos serviços de APH no Brasil e a constituição de
suas equipes têm sido muito diversificada, não seguindo um único padrão. O APH no Brasil
teve início a partir do movimento de duas vertentes: uma militar, representada pelo Corpo de
Bombeiros e outra civil, liderada pelos médicos, especialmente da área cirúrgica. Cada um
desses grupos constitui-se como elemento fundamental na implantação de serviços de APH,
que na maioria dos locais organizaram-se a partir de parcerias entre as Secretarias da Saúde e
da Segurança Pública.
No Brasil, existem dois sistemas públicos de atendimento pré-hospitalar: o do telefone nº 192,
desenvolvido e operacionalizado pelo Governo Municipal, e o do sistema 193, de caráter
estadual, a cargo do Corpo de Bombeiros. Em algumas cidades, ambos têm a presença do
profissional médico. Não há relatos, nas portarias do Ministério da Saúde, da presença do
profissional enfermeiro nos serviços de APH existentes. (BRASIL, 2001).
O desenvolvimento de APH teve início no Estado do Rio de Janeiro onde, em 1986, foi criado
o Grupamento de Socorro de Emergência (GSE), gerenciado pela Secretaria de Estado da
Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ). A
missão do GSE é atender às emergências médicas clínicas e traumáticas ocorridas nas vias
públicas e as ambulâncias ficam baseadas nos quartéis do Corpo de Bombeiros. (CANETTI et
al., 2001).
No Grupamento de Socorro de Emergência (GSE), as ambulâncias avançadas são equipadas
para realização de suporte básico de vida, imobilização e suporte avançado de vida, sendo sua
equipe chefiada por um médico. Já as ambulâncias básicas, só possuem equipamentos de
suporte básico de vida e imobilização e são tripuladas por um Técnico de Enfermagem em
Emergências Médicas (TEM) e um socorrista. (Ibid).
O APH, como um serviço vinculado ao setor Saúde, iniciou-se no Brasil em 1989, no Estado
de São Paulo, por meio de um convênio entre as Secretarias de Saúde e da Segurança Pública
do Estado de São Paulo que criou o “Projeto Resgate”. (GONÇALVES e RODRIGUES,
2001).
Em 1987, a partir de um grupo de trabalho em Curitiba, Paraná, deu-se início à criação de um
sistema para o atendimento ao acidentado de tráfego. O Serviço Integrado de Atendimento ao
Trauma em Emergência (SIATE), que é “um serviço concebido para prestar atendimento préhospitalar ao traumatizado em áreas urbanas de cidades com população superior a 150000
habitantes”, iniciou os atendimentos em 26 de maio de 1990. (FILIPAK, 2001, p. 590).
O SIATE serviu de modelo para a estruturação do APH em nível nacional, iniciada a partir de
1990, com a criação do Programa de Enfrentamento às Emergências e Traumas (PEET) pelo
Ministério da Saúde, operados por profissionais civis vinculados às Secretarias de Saúde
estaduais e/ou municipais. (RAMOS e SANNA, 2005).
Em 1995, em um encontro realizado em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, envolvendo
gestores públicos da saúde e outros profissionais, foi criada a rede 192, posteriormente
denominada, Rede Brasileira de Cooperação em Emergências, que tem como objetivo
principal ajudar a construir uma política para o atendimento às emergências no Brasil, estando
representada em vários estados. (GONÇALVES e RODRIGUES, 2001).
Em novembro de 1995, foi inaugurado o Serviço de Atendimento Médico de Urgência
(SAMU), com apoio de cooperação técnica francesa. Este serviço nasceu da cooperação entre
o Governo Municipal de Porto Alegre e o SAMU francês da cidade de Lille, localizada ao
norte da França, seguindo o modelo dos serviços franco-germânicos, nos quais o trabalho préhospitalar baseia-se na equipe de saúde e, principalmente, na regulação médica. (SCHITZ,
2002).
O perfil dos serviços de atendimento pré-hospitalar e a definição dos procedimentos a serem
realizados já vêm sendo discutidas há alguns anos. Velho (1994) apontava que poucos estudos
conseguiam demonstrar vantagens do atendimento mais estruturado, em comparação à
remoção imediata, de forma pura e simples. O autor sinalizava que o APH deveria ser pautado
na constituição de equipes treinadas para realizarem um número restrito de procedimentos
capazes de influir na sobrevida dos pacientes vítimas do trauma, sem promover retardo na
remoção, mas com supervisão médica constante, seja de forma direta e indireta.
A história dos serviços de APH relatada por Canetti et al. (2001); Filipak (2001); Gonçalves e
Rodrigues (2001) não deixa clara a participação da enfermagem, em particular do enfermeiro.
Em alguns momentos, esses autores fazem referência ao pessoal da enfermagem sem, no
entanto, identificar tratar-se de enfermeiros ou de auxiliares e técnicos de enfermagem; em
outros momentos fala-se dos enfermeiros, mas apenas participando de atividades educativas.
Canetti et al. (2001, p. 598) relatam que no GSE do CBRJ, onde atuam médicos, profissionais
de enfermagem e socorristas, as equipes têm diferentes configurações, envolvendo sempre
três trabalhadores em sua composição: “um médico e dois profissionais de enfermagem ou um
médico, um profissional de enfermagem e um socorrista ou um técnico de enfermagem em
emergência médica e dois socorristas”. Os membros da equipe devem conhecer suas funções
no atendimento e os procedimentos que cada um pode exercer no socorro.
O enfermeiro tem sua atuação no APH vinculada às atividades de formação e de educação
continuada. Filipak (2001, p. 591) relata que “o socorrista é treinado a partir de um curso de
formação de 540 horas de duração, ministrado por médicos e enfermeiros”. O autor
complementa que “além da capacitação inicial, este profissional submete-se a um processo de
educação continuada, ininterrupta, conduzida por médicos, enfermeiros e socorristasinstrutores”.
O médico, além de exercer a regulação médica, é o responsável pela orientação técnica à
equipe de socorristas que está no local da ocorrência e escolha do serviço de saúde que deverá
receber o paciente, assim como também pode intervir no próprio local do trauma, prestando
suporte avançado de vida. O socorrista, por sua vez, “exerce a função delegada pelo médico
de prover suporte inicial às vítimas, sendo-lhe vedada qualquer possibilidade de realização de
procedimentos invasivos”. (FILIPAK, 2001, p. 591).
Canetti et al. (2001) também trazem a descrição das funções e atividades desenvolvidas pelos
socorristas (médico e técnicos de enfermagem em emergências médicas) que atuam junto às
equipes do GSE. Dizem os autores:
O socorrista líder (médico ou TEM) faz o exame da vítima e os procedimentos
devem ser divididos entre os integrantes da equipe, levando em consideração suas
capacidades técnicas e limitações profissionais. Procedimentos como intubação,
cricotireoidotomia, ventilação translaríngea e descompressão de tórax só podem ser
executados por médicos. O acesso venoso e a reposição volêmica podem ser
executados pelo TEM, desde que sob orientação médica. (CANETTI et al., 2001, p.
598).
O enfermeiro, desde a década de 90, quando passou a atuar na assistência direta à vítima, no
APH, realiza atividades antes, durante e após o atendimento. No primeiro momento ele se
prepara, organizando seus materiais e preparando os equipamentos necessários para a
atividade em si; no momento seguinte ele realiza o atendimento na cena, segundo protocolos
previamente estabelecidos e, após o atendimento, reorganiza o material utilizado, efetua
limpeza e desinfecção de equipamentos e veículo e faz os registros da ocorrência. (THOMAZ
e LIMA, 2000).
Os serviços de atendimento pré-hospitalar móvel devem contar com equipe de profissionais
oriundos da área da saúde e não oriundos da área da saúde. Considerando-se que as urgências
não se constituem em especialidade médica ou de enfermagem e que nos cursos de graduação
a atenção dada à área ainda é bastante insuficiente, entende-se que os profissionais que
venham a atuar nos Serviços de Atendimento Pré-hospitalar Móvel (oriundos e não oriundos
da área de saúde) devam ser habilitados pelos Núcleos de Educação em Urgências. (Brasil,
2002).
De acordo com o Ministério da Saúde (2002), a equipe de profissionais que fazem parte do
atendimento pré-hospitalar à vítima de trauma, é composta por: médicos intervencionistas,
enfermeiros assistenciais, auxiliares e técnicos de enfermagem.
2.3- Atuação da Enfermagem no Atendimento Pré-Hospitalar
O atendimento pré-hospitalar (APH) tem como finalidade dar assistência à pessoa que sofreu
acidente de trânsito mantendo-a viva até a chegada ao local onde será possível a cura,
diminuindo as seqüelas, possibilitando melhor a qualidade de vida ou mesmo sua própria
vida. (PEREIRA, 2009).
Atualmente, no Brasil, o atendimento pré-hospitalar está estruturado em duas modalidades: o
Suporte Básico à Vida (SBV) e o Suporte Avançado à Vida (SAV). O SBV consiste na
preservação da vida, sem manobras invasivas, em que o atendimento é realizado por pessoas
treinadas em primeiros socorros e atuam sob supervisão médica. Já o SAV tem como
características manobras invasivas, de maior complexidade e, por este motivo, esse
atendimento é realizado exclusivamente por médico e enfermeiro. Assim, a atuação do
enfermeiro está justamente relacionada à assistência direta ao paciente grave sob risco de
vida. (RAMOS e SANNA, 2005).
A incorporação do enfermeiro no APH não é nova, mas só é bem evidenciada no Brasil a
partir da década de 90, quando a estruturação do atendimento às urgências/emergências ganha
um novo foco. (Ibid).
A função do enfermeiro, em qualquer área de atuação, necessita de demanda, conhecimento
científico sempre atualizado, habilidade na realização dos procedimentos, entre outras tantas
características. No APH hoje são requeridas características gerais como em outras
especialidades, de formação, experiência profissional, habilidade, capacidade física,
capacidade de lidar com estresse, capacidade de tomar decisões rapidamente, de definir
prioridades e saber trabalhar em equipe. (THOMAZ e LIMA, 2000).
O enfermeiro é participante ativo da equipe de atendimento pré-hospitalar e assume em
conjunto com a equipe a responsabilidade pela assistência prestada as vítimas. Atua onde há
restrição de espaço físico e em ambientes diversos, em situações de limite de tempo, da vítima
e da cena e portanto são necessárias decisões imediatas, baseadas em conhecimento e rápida
avaliação. (Ibid).
Thomaz e Lima (2000) informam que o enfermeiro participa da previsão de necessidades da
vítima; definindo prioridades; iniciando intervenções necessárias, fazendo a estabilização,
reavaliando o estado geral e realizando o transporte da vítima para tratamento definitivo.
Todavia a atuação do enfermeiro não se restringe à assistência direta. Participa na
estruturação dos serviços, desenvolvimento de ações educativas e gerenciamento desta
modalidade de atenção, que ainda requer um esforço organizado para a sua ampliação. O
enfermeiro que atua no ambiente pré-hospitalar não desenvolve apenas habilidades e
competências no cuidado do paciente clínico ou politraumatizado, também é preparado para
enfrentar desafios que são encontrados diariamente no ambiente de trabalho. (RAMOS,
2005).
Para Calil e Paranhos (2007) o enfermeiro necessita lançar mão de estratégias que lhe
assegurem preparo adequado para desempenhar suas atividades quanto ao APH, pois, são
requeridas características gerais, experiências profissionais e habilidades técnicas. A
enfermeira deve coordenar a equipe de saúde a fim de organizar o serviço tornando-o mais
ágil.
Thomaz e Lima (2000) informam que a Emergency Nurses Association propõe que o grau de
dependência ou independência nas intervenções do enfermeiro esteja relacionado com as
ações práticas da enfermagem e com uma política institucional e educacional. Entre as
proposições daquela entidade está o desenvolvimento de protocolos de atendimento ao
trauma, que têm possibilitado, à enfermeira, atuar com um grau maior de independência,
conservando o aspecto de interdependência das atividades da equipe de atendimento ao prover
os cuidados aos pacientes vítimas de trauma. Em relação aos protocolos é importante registrar
que, no Brasil, são utilizadas referências internacionais, com adaptações à realidade nacional.
Os protocolos devem ser organizados de forma a garantir consistência na avaliação rápida,
prontidão no início das intervenções e estabilização das condições respiratórias, ventilatórias e
hemodinâmicas da vítima possibilitando ao enfermeiro e à equipe de APH, menor tempo
gasto para o atendimento, eficiência, menor possibilidade de erros e maior eficácia na
assistência no atendimento prestado. (THOMAZ e LIMA, 2000).
É o que complementa Calil e Paranhos (2007) a definição dos protocolos de atendimento,
especificamente desenvolvidos para esta situação de emergência, é importante para a melhora
dos procedimentos. Devem ser organizados de forma a garantir consistência na avaliação
rápida, início de intervenções e estabilização da vítima. Essa elaboração de protocolos de
atendimento nos serviços é recomendada e obedecida pelo Conselho Regional de
Enfermagem (COREN).
Dentre as várias atividades que o enfermeiro deve realizar no APH, encontra-se o que deve
ser feito antes, durante e após o atendimento. Antes do atendimento, o enfermeiro deve
organizar o seu equipamento de proteção individual, realizar o “check-list”, preparando e
verificando os equipamentos, materiais e medicações para a atividade afim. (SOUZA, 2009).
Os equipamentos são todos portáteis, o que facilita muito na hora do atendimento, tanto os
materiais quanto as medicações são acondicionadas em mochilas padronizadas, ou seja, cor
azul (material de assistência respiratória), cor vermelha (material para reposição volêmica),
cor amarela (medicação), de forma a facilitar sua utilização na assistência à vítima, nas quais
deve haver todo o material necessário para o atendimento imediato. (Ibid).
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo constata que os altos índices de acidentes de trânsito estão envolvidos com o
comportamento da população, o que tem sido cada vez mais perigoso no trânsito, sendo o
atendimento pré-hospitalar um dos principais responsáveis pela diminuição da morbimortalidade. O atendimento pré-hospitalar em todas as suas ações, seja de remoção ou de
atendimento de urgência, é realizado, majoritariamente, pelas equipes de suporte básico, no
qual o enfermeiro ampliou o seu espaço de atuação nesse campo, nos últimos anos. Além do
trabalho de gerência e administração, ele tem maior inserção no trabalho assistencial, seja no
âmbito do atendimento com suporte avançado ou suporte básico de vida.
Apesar da boa atuação exercida pela equipe, identifica-se a necessidade de aprofundar o
conhecimento nessa área, buscando subsídios para prevenção desses agravos, a formação e
qualificação
dos
trabalhadores
e
a
estruturação
do
trabalho
baseada
numa
interdisciplinaridade.
A prática de enfermagem no âmbito pré-hospitalar envolve não apenas habilidades bem
treinadas e competência no cuidado do paciente, nas diversas circunstâncias e situações, mas
também o preparo para enfrentar desafios que não são encontrados na prática da enfermagem
hospitalar.
Cabe ressaltar ainda, após esta revisão, que o enfermeiro deve-se procurar interagir com os
diversos profissionais que compõem a equipe de emergência, empreendendo um trabalho
conjunto no atendimento às vítimas de trauma, garantindo condições necessárias para que
possam sentir-se confortados, apoiados e informados durante o atendimento.
É possível afirmar, após esta pesquisa, que existe a necessidade de maior atenção na formação
do enfermeiro para atuação no APH, pois, devido a determinações legais respaldadas pelos
órgãos de classe como os Conselhos de Enfermagem, esse profissional é imprescindível para
o bom andamento de tais serviços, pois ao enfermeiro compete garantir assistência de
qualidade onde quer que esteja atuando, quer no intra ou no pré-hospitalar.
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Nursing action in pre-hospital care to the victims of traffic accident
ABSTRAT
This study focuses on the pre-hospital care (APH) to victims of trauma resulting from traffic
accidents, as regards the organization of the work process, identifying the inclusion of nursing
in this field. Traffic accidents have been of great concern in Brazil and abroad, the high
number of young victims who reach and the social, economic and personal cause. Thus, APH
has developed an important role in serving the victims of traffic accidents, providing adequate
assistance in the initial care and immediate, with a team of nursing professionals who are in
the forefront of care. In order to evidence from the literature, the role of nursing in pre
hospital care to the victim of a traffic accident, there was a kind of exploratory research and
retrospective literature, with qualitative and systematic examination. The results of this
research show the importance of nursing in emergency aid to victims of traffic accidents,
making it clear, the need for more professionals to update and invest in their professional
practice. There is also a need for more studies on this topic, mostly for nursing. It is
concluded that high rates of traffic accidents are concerned with the behavior of the
population, and the pre hospital care a major contributor to the reduction of morbidity and
mortality. It is evidenced that victims are treated by a multidisciplinary team with immediate
assistance and in the shortest possible time to provide adequate care and transportation to a
hospital equipped to adequately mitigate the possible future sequels.
Key words: nursing, pre-hospital care; traffic accident.
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ATUALIZA ASSOCIAÇÃO CULTURAL