RACIONALISMO OU EMPIRISMO Francis Bacon 1 Francis Bacon afirmou em sua obra Novum Organum que a arte da impressão, a pólvora e a bússola haviam causado mudanças infinitas em todo o mundo, muito mais do qualquer império, seita, ou estrela pareciam tê-lo feito. A história de Francis Bacon é a história de uma vida inteiramente dedicada a uma grande idéia. Para ele o saber deveria estar diretamente relacionado com a prática, a ciência deveria servir à industria e os homens tinham por obrigação organizar-se para melhorar e transformar suas condições de vida. Essa idéia foi por ele desenvolvida e influenciou todo a trajetória da história humana. A partir desta máxima, Bacon submeteu à análise toda a cultura humana, de modo a entender como ela poderia ser aperfeiçoada. Quando ainda estava na universidade sentiu que estava, pela primeira vez, contrariado à filosofia de Aristóteles, não por desprezo ao filósofo, mas sim pela inutilidade de seu método. Considerava a filosofia aristotélica útil apenas para as disputas e controvérsias, mas pouco vantajosa para a vida do homem. Bacon é o anunciador, na história do Ocidente, de um novo movimento intelectual. Crítica ao saber mágico-alquimista A magia procura causas ocultas. É um saber privado ou de iniciados e só alcança o conhecimento por mera coincidência. É saber de um indivíduo com objetos de domínio sobre outros. Deve ser mantido em sigilo pelos magos e alquimistas. Corrompe a experiência. Em completa oposição, o novo saber que propõe Francis Bacon é um saber de naturezas experimentáveis, alcançável ou, no mínimo, acessível a todos, sendo produto de colaboração. Alcança seus resultados a partir de um método e de autênticas experiências. É útil aos homens e não possui nada de secreto, visto que é público e pretende ser exposto em termos claros. Tem em vista a transformação do mundo em benefício de todos os homens. E em função deste ideal, é que Bacon irá romper contra tradição filosófica, na tentativa de substituir esta, que ele chamou de filosofia das palavras, por uma filosofia das obras. Crítica à Lógica tradicional Existem dois caminhos para a pesquisa e conhecimento da verdade: um deles segue-se a partir dos sentidos e dos particulares, ascende logo os axiomas gerais, julgando segundo esses 1 Texto adaptado de: REALE, Giovanni. ANTISERI, Dario. História da filosofia: do humanismo a descartes, v. 3. São Paulo: Paulus, 2005. p 321. princípios, já fixados em sua imutável verdade, daí extraindo então os axiomas médios. Porém o fim de nossa ciência, segundo Bacon, não deve ser descobrir argumentos, mas artes; ao invés de se buscar pelas conseqüências que derivam de princípios postos, destinarmos nossa atenção para os próprios princípios. E para se chegar a tais princípios é necessário outro método que não o aristotélico, onde os axiomas fossem extraídos continuamente, elevando-se por graus, para somente por fim se chegar aos conceitos gerais. Antecipações e interpretações da natureza O mecânico, o matemático, o alquimista e o mago se utilizam da natureza buscando entender os seus fenômenos, mas também é verdade, segundo Bacon, que todos eles se ocuparam da natureza de forma limitada o que ocasionou pouco sucesso e, continuaria desta forma caso não recorresse a métodos ainda não tentados. Sendo assim, estabelece a distinção entre as antecipações da natureza e as interpretações da natureza. As antecipações da natureza são as noções que se constroem a partir de métodos equivocados, retiradas de poucos dados, sobretudo dos que se repetem frequentemente. Tomam o intelecto e preenchem a fantasia. Mediante as antecipações não se pode obter nenhum progresso na ciência, visto que suas noções são falsas e chegam a constituir os ídolos (ídola), ou seja, os preconceitos e as falsas noções. Já as interpretações da natureza são alcançadas a partir do método verdadeiro, à luz da natureza e da experiência, recolhidas de dados diversos e distantes entre si. Não podem tomar o intelecto e, justamente por isso, parecem difíceis e estranhas a opinião comum. São essas últimas que constituem o verdadeiro saber, obtido com um verdadeiro método, eficaz para se chegar à verdade. Para instauração deste saber deve-se primeiramente limpar da mente esses ídolos que tomaram o intelecto, para somente depois, aplicar o método de conhecimento à realidade. A teoria dos ídola Os ídolos (ídola) são as falsas noções que invadiram a razão humana impedindo-lhe o acesso à verdade. A função dessa teoria é tornar os homens conscientes destas falsas noções que criam obstáculos em sua mente. São quatro os tipos de ídolos que afetam a mente humana: Ídolos da tribo: Fundados sobre a própria natureza humana que deforma e transfigura a sua natureza com a das coisas. Ídolos da caverna: advém do próprio indivíduo em toda a sua singularidade, de sua natureza, de sua educação e de seus hábitos. Ídolos do Foro: São dependentes do contato recíproco dos seres humanos. A fala, que estabelece essa relação é carregada de controvérsias e considerações vãs. Ídolos do Teatro: atingem o espírito humano a partir das filosofias e ciências. Considera que as filosofias acatadas não passavam de fábulas, mundos de ficção, para serem representadas no palco. O objetivo das ciências: a descoberta das “formas” Segundo Bacon, a finalidade da ciência humana consiste na forma de uma natureza dada. Esta forma de que fala Bacon é a causa formal aristotélica (que admitia outras três causas: a material, eficiente e final). O conhecimento das formas das várias coisas ou naturezas significa adentrar nos mistérios mais profundos da natureza e fazer do homem o seu senhor e dominador. Neste sentido, a idéia de forma pressupõe outros dois conceitos: Processo latente: Não é o processo visível nos corpos, como as medidas, os sinais e as escalas, mas sim um processo continuado, que em sua maior parte escapa aos sentidos. É uma lei que regula a geração e a produção do fenômeno. Esquematismo latente: a estrutura de uma natureza, a essência de um fenômeno natural. Nesse sentindo, compreender a forma significa antes compreender a estrutura de um fenômeno e a lei que regula seu processo. A indução por eliminação Após purificada a mente do ídolos e fixado o objetivo do saber verdadeiro no conhecimento das formas da natureza, o método para se alcançar tal objetivo se divide em dois momentos: 1) extrair os axiomas da experiência; 2) derivar experimentos novos dos axiomas. Para se fazer surgir da experiência esses axiomas, Bacon nos direciona ao caminho da indução por eliminação da hipótese falsa, que segundo ele está em condições de captar a natureza, a forma ou a essência dos fenômenos. A indução por eliminação acontece pelo seguinte processo: 1- Tábuas de presença: ao se indagar sobre uma natureza é preciso, antes de mais nada, classificar todos os casos em que o fenômeno se apresenta. Por exemplo, em relação ao calor: raios de sol, chamas, meteoros incandescentes, águas quentes naturais, etc. 2- Tábuas de ausência: é preciso classificar os casos semelhantes aos precedentes, porém onde o fenômeno não se apresenta. Por exemplo, os raios da lua (luminosos, mas não quentes). 3- Tábuas dos graus: Todos os casos em que o fenômeno se apresenta segundo maior ou menos quantidade. Deve-se atentar para a variação de calor em um mesmo corpo, em ambientes diversos ou condições particulares. Apoiado nessas três tábuas, Bacon prossegue com a operação de indução, a partir da exclusão ou eliminação, que consiste exatamente na exclusão da hipótese falsa. Seguindo com o exemplo do calor: considera-se as três tábuas e elimina da forma da natureza do calor todas as propriedades não encontradas em algum corpo quente, as propriedades encontradas em algum corpo frio e as que permanecem invariáveis sob o aumento do calor. Tal eliminação deve ser feita até que se chegue a uma primeira hipótese coerente. O experimentum crucis Chegando à primeira hipótese, Bacon toma-a como guia para a pesquisa posterior, que consiste na dedução e no experimento, no sentido de que, da hipótese obtida, devem-se deduzir os fatos por ela implicados e previstos, experimentando em condições diversas se tais fatos implicados e previstos pela hipótese se verificam. Assim inicia-se uma rede de investigações, da qual surge uma série de interrogações a que a natureza é forçada a responder. A estratégia do experimentum crucis se dá quando, durante a pesquisa de uma natureza, o intelecto está incerto e como que em equilíbrio no decidir sobre a qual de duas naturezas, ou mais de duas, deve ser atribuída a causa da natureza examinada; pelo concurso frequente e ordinário de varias naturezas, as instâncias cruciais mostram que o vínculo de uma dessas naturezas com a natureza dada é constante e indissolúvel, ao passo que o das outras é variável e separável. Assim, a questão resolve-se, e é acolhida como causa a primeira natureza, enquanto a outra é rejeitada e repudiada. Tais instâncias trazem, portanto, muita luz e apresentam uma como que forte autoridade, de modo que, algumas vezes, chegando a elas, nelas se detém o processo de interpretação. Podemos, então, concluir, que Bacon trilhou um caminho único, diferente tanto dos empiristas quanto dos racionalista. Bacon compara os empiristas às formigas: acumulam e consomem; e os racionalistas às aranhas: extraem de si mesmos a própria teia; considerando-se,então, seguidor de um caminho intermediário, como o caminho das abelhas: extraem a matéria prima das flores do jardim e a transforma e digere em virtude de suas capacidades próprias. O trabalho da verdadeira filosofia não deve ser diferente, deve se estabelecer na união, estreita e sólida, entre essas duas faculdades, a racional e a experimental. 2 DAVID HUME Hume constata que a partir do método de conhecimento experimental introduzido por Francis Bacon, Newton elaborou sua sólida visão sobre a natureza física. O que se faz necessário, então, é precisamente aplicar este mesmo método de Bacon à natureza humana, ou seja, ao sujeito do conhecimento e não apenas ao objeto do conhecimento. Para Hume, a ciência da natureza humana é ainda mais importante do que a física e as outras ciências, visto que todas elas dependem em algum momento da natureza do homem. Sendo assim, para se alcançar incalculável progresso em todos os âmbitos do saber, se faz necessário explicar a fundo o alcance e a força do intelecto humano. As “impressões” e as “idéias” e o “princípio de associação” Hume chama de percepções todos os conteúdos da mente humana e a divide em duas grandes classes: as impressões e as idéias. Ele atribui duas diferenças entre elas: 1- A diferença entre impressões e idéias está no grau diverso de força e vivacidade com que as percepções atingem a nossa mente. As impressões nos atingem com maior força e violência (sensações, paixões e emoções). As idéias ao contrário nos atingem mais languidamente. As impressões estão relacionadas ao sentir e as idéias ao pensar. Toda percepção, portanto, é dupla: é sentida (de modo vivo) como impressão e é pensada (de modo mais fraco) como idéia. 2- Em relação à ordem e à sucessão temporal com que se apresentam, a impressão sempre vem primeiro, é originária; a idéia a sucede, é sempre dependente. Para que uma criança tenha a idéia da cor vermelha, ou do sabor doce, eu lhe apresento objetos, ou seja, faço com que receba certas impressões, mas nunca tento tirar-lhe essas idéias a partir do seu puro pensamento. O primeiro princípio da ciência da natureza humana diz justamente que todas as idéias simples provêm, mediata ou imediatamente, de suas correspondentes impressões. Esse princípio lança por terra a questão das idéias inatas dos racionalistas, quando afirma que, as idéias só nos vem depois de termos recebido as impressões. Idéias simples e idéias complexas Há uma importante distinção a se fazer entre as impressões simples (por exemplo, vermelho, quente etc.) e as impressões complexas (por exemplo, a impressão de uma maçã). As impressões complexas nos são dadas imediatamente como tais. Já as idéias complexas podem ser copias das impressões complexas, mas também podem ser fruto de combinações múltiplas, que ocorrem de vários modos em nosso intelecto. Com efeito, com a faculdade da 2 Texto adaptado de: REALE, Giovanni. ANTISERI, Dario. História da filosofia: de Spinoza a Kant, v. 4. São Paulo: Paulus, 2005. p 433. memória, que reproduz as idéias, nós também temos a faculdade da imaginação, capaz de transpor e compor as idéias entre si de vários modos, juntando idéias simples em idéias complexas. As idéias simples tendem a se agregar entre si em nossa mente não somente segundo o livre jogo da fantasia, mas também segundo um jogo bem mais complexo, baseado em alguns princípios que se mostram conformes em todos os tempos e em todos os lugares. Hume defende que somente o acaso não poderia reunir as idéias simples em idéias complexas. Seria necessário um laço que as ligasse entre si, uma propriedade associativa. Eis, então, o princípio de união entre as idéias, que nos diz que a natureza indica para cada um as idéias simples mais apropriadas para serem reunidas em idéias complexas. As propriedades que dão origem a essa associação e fazem com que a mente seja transportada de urna idéia para outra são três: 1- Semelhança: urna fotografia me faz vir a mente a personagem que representa; 2- Contiguidade no tempo e no espaço: a idéia de sala de aula me recorda a das salas de aula vizinhas, ou então a do corredor adjacente ou a do prédio em que se localiza; a idéia de levantar âncora suscita a idéia da partida do navio; 3- Causa e efeito: quando penso no fogo, sou inevitavelmente levado a pensar no calor ou então na fumaça que dele se desprende, e vice-versa. Esses são os princípios de união ou coesão entre as nossas idéias simples, que, na imaginação, ocupam o lugar da conexão indissolúvel, com a qual estão unidas na memória. Para provar a validade de cada idéia sobre a qual se discute é necessário apresentar sua relativa impressão. No caso das idéias simples isso não trás problemas, visto que para estarem presentes em nós devemos ter experimentado sua impressão correspondente. Porém, no caso das idéias complexas isso constitui um problema devido a sua origem múltipla e variada. É exatamente sobre elas que se concentrara o interesse de Hume. A negação das idéias universais e o nominalismo humiano Hume é favorável a tese de Berkeley na qual todas as idéias gerais nada mais são do que idéias particulares conjugadas a certas palavra, que lhe dá um significado mais extenso, e ocorrendo leva a recordação de outras individuais semelhantes. Em favor desta idéia, Hume contexta vigorosmente os defensores das idéias universais quando dizem ser possível distinguir mentalmente aquilo que não está separado na realidade a partir de operações mentais autônomas. Para ele somente é distinguivel o que é também separável. Defende também que as impressões só podem ser particulares e, portanto, só determinadas qualitativa ou quantitativamente. Do mesmo modo deve proceder com as idéias, visto que estas são cópias das impressões. Para Hume, cada idéia nada mais é do que imagens, individuais e particulares. Sendo assim, como é possível, então, um idéia particular ser usada como idéia geral? Como a simples conjunção com uma palavra pode tornar isso possível? Nós tomamos certa semelhança entre as idéias de coisas que nos aparecem pouco a pouco, uma semelhança que nos permite dar a elas o mesmo nome, prescindindo das diferenças de grau, qualidade e quantidade que elas podem apresentar. Desse modo, é pelo hábito adquirido que, ao ouvirmos um certo nome ou certa palavra desperta em nossa memória uma outra idéia particular que já haviamos associado com aquele nome ou palavra. Por exemplo, diante da palavra homem, me vem a mente a idéia de um único homem específico, mas como tal palavra é usada para se referir aos muitos homem vistos por mim, então acontece que a palavra não sendo capaz de me trazer a idéia de todos esses homens, limita-se a tocar-me de modo a reviver em mim uma idéia individual de homem. O hábito chega a ser tão perfeito que a mesma idéia pode ser ligada a muitas palavras diferente e entrar em raciocínios diversos sem que, com isso, corra-se o risco de se enganar. Relação de idéias e dados de fato Relação de idéias: Todas as proposições que operam baseadas em conteúdos ideais, sem referencia ao que existe ou pode existir. Estabelecidos os números, por exemplo, obtemos por mera análise racional, ou seja mera relação de idéias, que dois vezes dois é a metade de oito. Essas proposições são descobertas pela simples operação do pensamento, independente do que de fato existe no universo. Mesmo que não existissem triangulos na natureza, as verdades demonstradas a seu respeito continuariam existindo. Trata-se de uma proposição que conseguimos baseando-nos no princípio de não-contradição. Os dados de fato: ao contrário não são obtidos desse modo, já que é sempre possível o contrário de um dado de fato qualquer, já que ele nunca pode implicar uma contradição, sendo concebido pela mente com a mesma facilidade e a mesma distinção como se fosse extremamente conforme à realidade. O problema que surge, portanto, é o de procurar a natureza da evidência própria dos raciocínios relativos aos dados de fato, quando eles não estão imediatamente presentes aos sentidos (quando digo que o sol irá nascer amanhã, não me encontro diante do fenômeno). Hume o resolve afirmando que todos os raciocínios relativos à realidade dos fatos parecem fundados na relação de causa e efeito, somente assim podemos ultrapassar a evidencia de nossa memória. A crítica das idéias de causas e efeitos Causa e efeito são idéias distintas entre si e o fundamento de todas as nossas conclusões referentes à elas é a experiência, que se fundamenta por sua vez sobre o habito de constatar que deva necessariamente existir entre dois fenômenos uma regularidade de contiguidade e sucessão; Sendo assim torna-se natural esperarmos certos efeitos diante de certas causas. Embora o costume seja basilar para a relação entre causa e efeito não é suficiente para explicar inteiramente tal fenômeno. Uma vez criado, esse costume gera em nós urna "crença”, que nos dá a impressão de estarmos diante de urna "conexão necessária" e que nos imprime a convicção de que, dado aquilo que chamamos "causa", deve seguir-se aquilo que chamamos "efeito" (e viceversa). Portanto, segundo Hume, a chave para a solução do problema está na "crença", que é um sentimento. Substancia material e substancia espiritual Em relação ao conceito clássico de substância, Hume estabelece uma crítica, tanto para os objetos corpóreos quanto para o sujeito espiritual. Para ele, tanto as coisas, quanto o eu, não passam de feixes de impressões e de idéias. Se desconsiderarmos a cor, o som, o sabor, a figura e as outras propriedades dos corpos como existências que não podem existir isoladamente, deveremos pressupor, pelo hábito, que existe um ser inerente que os sustente. Para Hume, esse ser inerente, que seria o princípio, não existe. O que percebemos é uma sucessão constante de feixes que se apresentam a nós. Quanto ao eu, Hume afirma que não é uma impressão, mas sim algo a que são referidas as nossas impressões ou idéias. As dores e prazeres, vicissitudes e alegrias, paixões e sensações se alternam continuamente, nunca existindo todas juntas. A idéia do eu, não pode vir de nenhuma dessas impressões, nem de nenhuma outra, portanto, tal idéia não existe. Sobre as paixões e a liberdade As paixões são completamente naturais ao ser humano, não dependem da razão nem podem ser dominadas por ela. Podem ser divididas em diretas - dependem imediatamente do prazer ou da dor, como o desejo, a aversão, a tristeza, a alegria, a esperança, o medo, o desespero, etc - e indiretas - o orgulho, a ambição, o amor, o ódio, a inveja, a piedade, a malignidade, etc. Hume afirma que as paixões dizem respeito ao eu, cujas ações e sentimentos cada qual está intimamente convencido". Para Hume, livre arbítrio seria sinônimo de não-necessidade, de causalidade. O que comumente chamamos de liberdade trata-se apenas de simples espontaneidade, ou seja, a não coação externa. Ao agirmos, podemos nos livrar dos motivos externos, mas nunca deixamos de ser determinados pelos motivos internos, considerado aqui como a nossa vontade. Eis o ponto característico da filosofia moral de Hume, onde a razão nunca poderá se contrapor à paixão em relação à vontade. As paixões acabam por negar a razão prática. Para Hume é impossível que o discernimento entre o bem e o mal moral seja estabelecido pela razão, visto que a moral suscita paixões e promove ou impede ações, coisas que, pelos motivos expostos, a razão não está em condições de fazer. A razão poderá no máximo, dispor-se a serviço das paixões e contribuir para despertá-las e orientá-las. O prazer ou a dor moral é algo muito peculiar. Eles devem ser cuidadosamente distintos de todos os outros tipos de dores ou prazeres. O prazer da virtude trata-se de um prazer desinteressado. Para recorrer à ética Hume recorreu também à ética utilitarista. O útil move nossa concordância. Mas não o útil particular, e sim o útil aos outros, o útil à felicidade de todos. A razão cética e a crença arracional Hume considerava-se cético moderado. Para ele o ceticismo moderado beneficia o gênero humano desde que limita a suas investigações aos temas que melhor são apreendidos pelas capacidades limitadas de seu intelecto. Assim, as ciências empíricas baseiam-se na experiência, a moral no sentimento, a estética no gosto e a religião na fé e na revelação. Hume nega a valência ontológica do princípio de causa e efeito ; à razão cética problemática, contrapõe o instinto e o elemento alógico, passional e sentimental, portador de uma segurança incontida e, portanto, dogmática. A própria razão filosófica aparece algumas vezes como uma espécie de instinto. Em suma, percebemos uma grande valorização do instinto, em outras palavras, do arracional; a razão deve submeter-se sempre às paixões.