João Guimarães Rosa
Introdução
João Guimarães Rosa foi um fenômeno dentro da literatura brasileira. Surgiu
com um volume de contos que marcou nossa literatura. Sua linguagem
experimental, sua capacidade, seu modo fictício apuraram o a obra literária,
ampliando-lhe extraordinários caminhos.
Sua obra foi questionada, filmada e consolidada internacionalmente. Vários
analistas estrangeiros se interessaram por ela e vieram ao Brasil para estudála. A complexidade de sua linguagem não impediu que sua obra fosse
traduzida, embora deva ter perdido a beleza de sua forma original.
Seu nome foi indicado para o Prêmio Nobel, na França, tamanho sucesso teve
sua obra internacionalmente.
Espírito criativo era sensível e emotivo. Emoção que causou sua morte ao
tomar posse na Academia Brasileira de Letras: três dias aos esta data veio
falecer sozinho em sua casa, na mesa de trabalho.
Em seu discurso de posse, falou sobre um colega falecido (João Neves da
Fontoura) como se falasse de si mesmo, como se prenunciasse a sua partida.
“Cordisburgo” foi a primeira e última palavra de seu discurso. Prestava, assim,
uma última palavra de seu discurso. Prestava, assim, uma última homenagem
a sua querida terra, que sempre simbolizou para ele um mundo afetuoso e ao
mesmo tempo grandioso que transportou para a literatura.
Estamos homenageando JOÃO GUIMARÃES ROSA como agradecimento pela
rica obra que ele nos deixou.
Dados biográficos
João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo, Minas Gerais, em 27 de junho
de 1908. Aprendeu a ler com Mestre Candinho, e francês com Frei Esteves.
Mostrou-se sempre excelente aluno, surpreendendo a todos pela inteligência e
bom comportamento.
Em 1918, veio para Belo Horizonte, juntamente com o avô e padrinho Luís
Guimarães, que o matriculou no Colégio Arnaldo, onde também estudaram
Carlos Drummond e Gustavo Capanema.
Entusiasmado com os livros, passa a freguentar a biblioteca da cidade. Sua
grande paixão era o estudo de línguas, das quais estudava com afinco as
gramáticas.
História natural também era uma matéria de sua preferência. Durante sua
infância colecionou insetos e borboletas. Amava os animais e aprendeu a
conhecê-los particularmente. Nas férias, em visita a Cordisburgo, explorava o
campo à procura de cobras.
Ingressa na Escola de Medicina e durante o curso conhece, no hospital da
Santa Casa de Misericórdia, o Dr. Juscelino Kubitschek de Oliveira, de quem
se torna grande amigo.
Por necessidades financeiras começa a escrever contos na revista “O
Cruzeiro”. Concorre quatro vezes, sendo premiado em todas elas.
Forma-se em medicina em 1930 pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Exerce a profissão de médico durante dois anos em Itaguara, município de
Itaúna. Aproveitava todos os momentos para estudar, e de tal modo se
familiarizou com a profissão que conseguia diagnosticar apenas peã fisionomia
do paciente. Cobrava as consultas pelas distâncias que tinha que percorrer a
cavalo.
Médico dedicado tornou-se respeitadíssimo naquela região. Como era muito
emotivo, não aceitava naturalmente perder o paciente e ficava transtornado
quando isso acontecia. Mais tarde, durante a Revolução Paulista de 1932, atua
como médico voluntário da Força Público. Encontram-se novamente com o Dr.
Juscelino, com quem estreita os laços de amizade
Em seguida, entra no quadro da Força Pública, através de concurso, tornandose capitão – médico. A vida mais calma lhe dá oportunidade de se dedicar aos
estudos linguísticos, sem, contudo se descuidar da medicina.
Em 1934 ingressa na carreira diplomática. Ocupa vários cargos em Hamburgo,
Paris e Bogotá. Chefe do Serviço de Demarcação de Fronteiras faz muitas
viagens pelo interior do Brasil e durante todo o tempo mantém suas ligações
com a literatura.
A região de Urucuia, onde passou a maior parte de sua infância, é o principal
cenário de suas obras.
Foi premiado pela Academia Brasileira de Letras pelo seu primeiro livro de
poesias “Magma”; apesar disso, tal obra nunca foi publicada.
Em 1937, a saudade da terra fez com que Guimarães Rosa escrevesse a
coletânea de contos “Sagarana”; onde com estilo expressivo, revelam a
paisagem mineira com toda a beleza agreste, a vida rural, estórias de gente
simples, reais e imaginárias; o mundo no qual passou sua infância e também a
juventude. Colocava em sua obra a linguagem rica e original daquela gente,
registrando regionalismos nunca antes usados na literatura.
Côncul-adjunto do Brasil, em Hamburgo, é preso em Baden-Baden quando o
Brasil rompe relações com a Alemanha. Aproxima-se de Cícero Dias, de quem
se torna amigo e mostra-lhe os originais de “Sagarana”. O pintor se agrada do
livro e anima-o a publicá-lo.
Libertado, volta aos originais de “Sagarana”, retifica seu texto e publica-o em
1946. Recebe vários prêmios e, a partir daí, sua obra merece destaque e sua
fama de escritor cresce e ultrapassa as fronteiras do Brasil.
De 1948 a 1950, exerce o cargo de embaixador na França. Em 1951 retorno ao
Brasil e ganha um caro no Ministério, como Chefe de Gabinete de João Neves.
Em 1956, publica “Corpo de baile”, novelas, tendo como cenário o mesmo
sertão mineiro. A linguagem de grande riqueza apresenta forte plasticidade,
com descrição detalhada das regiões.
Nesse mesmo ano, apresenta seu único romance “Grande sertão: veredas”
focando numa nova dimensão a religião e o povo simples do sertão de Minas
Gerais. Nele exibe com brilhantismo sua capacidade de divulgar seu mundo.
Com isso, ficou reconhecido como figura singular no panorama de nossa
literatura moderna, e o romance foi considerado verdadeira obra prima.
Passa um grande período sem publicar novo livro, mas interesse do publico
continua aumentar.
Em 1958, torna-se Ministro das Relações Exteriores. Em 1961, recebe o
prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de
sua obra.
Em 1962, reaparece com nova obra, “Primeiras estórias”, reunindo vinte e um
contos curtos, caracterizados por uma grande delicadeza e surpreendente
poesia.
Em 1963, é eleito membro efetivo da Academia Brasileira de Letras, mas não
toma posse, receando a emoção da noite.
Seus livros são traduzidos para vários idiomas: inglês, italiano, alemão.
Em meados de 1967 publica “Tutaméia”, outra coletânea de contos, que
revelava uma obscuridade em suas particularidades e foi considerada uma
bomba atômica da literatura brasileira.
No dia 16 de novembro de 1967, finalmente decide tomar posse na Academia
Brasileira de Letras, vindo a falecer três dias após, em 19 de novembro de
1967.
Na manhã seguinte, seu corpo foi transportado para a Academia Brasileira de
Letras, onde pôde ser visitado por centenas de pessoas, desde anônimos a
figuras ilustres da nossa política e da nossa literatura.
Sua morte teve grande repercussão na imprensa do Brasil e do exterior.O
jornal “O Estado de São Paulo” publicou a notícia de sua morte ressaltando
uma das frases de seu discurso de posse na Academia: “As pessoas não
morrem, ficam encantadas”.
A obra de Guimarães Rosa
Guimarães Rosa conseguiu universalizar o regionalismo mineiro. Sua obra
flutua entre o realismo épico e o realismo mágico, adaptando o natural, o
místico, o fantástico e o infantil em novas perspectivas.
“Faz-se travesseiro com o paletó dobrado e deitar-se no capim, à sombra dos
ingás, namorando a ravina florejante... voou uma ave; mas não era hora de
canto de passarinhos. Foi Lalino quem cantou: Eu estou triste como sapo na
água suja”. Sagarana.
Seu estilo é requintado e elaborado; experimentava linguagem própria,
articulada sob uma lógica inexorável. Seus personagens são brilhantemente
criados fisicamente e também na sua personalidade marcante de homens
rústicos.
“De mim, pessoa, vivo para minha mulher que todo modo-melhor merece, e
para a devoção. Bem dela, graças. Amor vem de amor. Em Diadorim penso
também, mas Diadorim é minha neblina.” Grande Sertão: veredas.
O cenário é descrito com riqueza de conhecimento da terra, dos animais e
plantas do sertão.
“Lhe mostrar os altos claros das Almas: rio despenha de lã, num afã, espuma
próspero, gruge; cada cachoeira, só tombos. O cio do tigre preto na Serra do
Tatu. Já ouviu gargaragem de onça?... Quem me ensinou a apreciar essas
belezas sem dono foi Diadorim.” Grande Sertão: veredas.
Uma de suas preocupações é o aprofundamento da visão pessoal das coisas e
seres.
“Por mim, o que pensei, foi: que eu não tive pai; quer dizer isso, pois nem eu
nunca soube autorizado o nome dele. Não me envergonho, por ser de escuro
nascimento. Órfão de conhecença e de papéis legais. É o que vi mais nestes
sertões.” Grande Sertão: veredas.
Em alguns de seus livros, ele radicaliza sua pesquisa lingüística e alcança
excelentes efeitos na sonoridade de suas frases.
A arte de Guimarães Rosa é extremamente difícil. Ele repelia o improviso e,
com grande esforço, escolhia palavras comuns dando vida às caatingas, às
atitudes dos caboclos e aos diálogos cheios de provérbios matutos,
aproximando-se inteiramente da língua do interiorano.
“- A onça, o povo dizia que ela tinha vindo de longe. Onça-tigre macha, das do
mato-grosso... Onça é bicho doido para caminhar, e que anda só de noite,
capeando o que sangrar... Pois, naquela ocasião, eu estava crente que ela
estava a muitas léguas de onde é que eu estava... Pensei que andasse pelo
Maquine.” Burrinho pedrês.
Seu primeiro livro, “Sagarana”, consagrou-o como escritor, pela inovação e
revolução que provocou. Recebeu críticas e ataques, mas não se inova nem
renova sem revolução. Foi considerada a melhor prosa regionalista de um
período extremamente rico em obras centradas na vida rural brasileira.
“No pastinho. Debaixo de um itapicuru, eu fumava, pensava, e apreciava a
tropilha de cavalos, que retouçavam no gramado vasto. A cerca impedia que
eles me vissem. E alguns estavam muito perto.” Sagarana.
O impacto de “Sagarana” foi abrandado com a apresentação de “Corpo de
baile”, em que sua técnica se aprimorou.
“Ia haver a festa. Naquele lugar – nem fazenda, só um reposto, um curraus-degado, pobre e novo ali entre o Rio e a Serra das Gerais, onde o cheiro dos bois
apenas começava a corrigir o ar áspero das ervas e árvores do campo-cerrado,
e nos matos, manhã e noite, e os grandes macacos roncavam como engenhode-pau moendo.” Corpo de baile / Manuelzão e Miguilim
Mas voltou mais violento com “Grande sertão: veredas”, seu único romance, o
livro mais incomum de nossa literatura e um dos romances mais importantes da
literatura brasileira. O contato com essa obra empolga e perturba ao mesmo
tempo. Empolga pelo imprevisto e pela criatividade inventiva que o
singularizaram. Perturba pela capacidade inovadora de sua linguagem e pelos
problemas apresentados, envolvendo o leitor no desequilíbrio do personagem –
narrador. Lírico e epopéico reconsidera a dimensão do homem simples do
interior, mostrando sua luta numa lição de vida.
“Grande sertão” é a história do jagunço Riobaldo, desde a sua entrada num
bando até assumir o lugar de chefe pelo voto dos companheiros. Nesse bando
conhece Diadorim, misteriosa figura humana, por quem Riobaldo desenvolve,
atormentado, uma paixão inconfessável.
“E o pobre de mim, minha tristeza me atrasava, consumido. Eu não tinha
competência de querer viver, tão acabadiço, até o cumprimento de respirar me
sacava. E Diadorim, às vezes conheci que a saudade dele não me desse
repouso; nem o nele imaginar.” Grande sertão: veredas
“A hora e a vez de Augusto Matraga”, conto que foi considerado um dos mais
notáveis de nossa literatura, foi transformado em filme, pelos cineastas Roberto
Santos e Luís Carlos Barreto.
Outros contos como: “Burrinho pedrês”, “Duelo”, “Conversa de bois”, também
foram considerados obras-primas. O mesmo podemos dizer de suas novelas:
“Corpo de baile” que foi dividida mais tarde em: “Manuelzão e Miguilim”, “No
Urubuquaquá, no Pinhém”, e “Noites do sertão”. Em “Primeiras estórias” e
“Tutaméia”, foi minucioso ao afirmar e reafirmar maravilhas.
“Esta é a estória. Ia um menino, com os tios, passar dias no lugar onde se
construía a grande cidade. Era uma viagem inventada no feliz; para ele,
produzia-se em caso de sonho.” Primeiras estórias
O restante de suas obras foi publicado postumamente: “Estas estórias” em
1969 e “Ave, palavra” em 1970.
“No mar tanta tormenta e tanto dano tantas vezes a morte apercebida. Só que
nada disso me tirava do ordinário, porque eu me achava à altura, com o que
me estava atrás da consciência: os anos de aspiração, estudo e prática.” Estas
estórias
Alguns leitores consideram a linguagem de Rosa cheia de obstáculos difíceis
de ultrapassar, pois se trata de uma língua diferente da maioria dos escritores.
Ele funde o universo cultural do sertão com sua própria cultura universal.
“Aqueles homens, quando estavam precisando, eles tinham aça, almiscravam.
Achavam, manejavam. Deus me livrou de endurecer nesses costumes
perpétuos.” Grande sertão: veredas
Há quem goste e quem não goste de Guimarães Rosa; mas geralmente a
maioria esmagadora gosta. Aliás, podemos dizer que a maioria entusiasma-se
com sua obra. Guimarães Rosa tem sido amplamente estudado e dissecado,
mas sua obra sempre engrandecida e unanimente louvada. E não se pode
negar a sua importância para a literatura brasileira.
Sobre “Guimarães Rosa” se disse:
“Rosa dos seus e dos outros,
Rosa da gente e do mundo,
Rosa de intensa poesia
De fino olor sem segundo: Rosa do rio e da rua,
Rosa do sertão profundo!”
Manuel Bandeira
“João era fabulista?
Fabuloso?
Fábula? (...)
Ficamos sem saber o que era joão
E se João existiu
De se pegar.”
Carlos Drummond de Andrade
“Autor absolutamente inqualificável,
a não ser nas categorias do gênio.
isto é, dos grandes isolados.”
Tristão de Athayde
É hoje –
como a arquitetura de Brasília,
uma das conquistas mundias da cultura
brasileira.”
Afonso Arinos
Conclusão
Nas obras de Guimarães Rosa, aparece como traço fundamental sua total
confiança na liberdade de inventar. A fantasia nos seus livros funde-ser com a
realidade, complementodo-a, e revela o quanto de irreal existe na realidade
aparente.
Criou seu regionalismo através de pesquisas particulares. Ele viajou, viu,
conversou e estudou jagunços, vaqueiros, coronéis, peões, prostitutas e
beatas. Tomava anotações de todas as conversas e observava as
peculiaridades que lhe pareciam diferentes. E daí surgiu a mais importante de
suas características: o uso da linguagem viva, tal como é empregada pelo povo
da terra que lhe serviu de braço.
As histórias de Guimarães Rosa tem caráter de fábulas, que revelam uma
visão global da existência, que revelam uma visão global da existência, fundido
tudo numa realidade em que estão presentes os planos geográfico, folclórico,
social, econômico, político e psicológico, transmitidos pela sua arte de escritor.
“João Guimarães Rosa é tudo isso: passado, presente e futuro, bem e mal,
divino e demoníaco, uno e múltiplo, microcosmo e universo, tudo visto em uma
única e enorme dimensão como um dos grandes para muitos, o maior dos
escritores brasileiros.”
Bibliografia
CASTRO, Nei Leandro de. Universo e vocabulário de grande sertão. Rio de
Janeiro: José Olympio, 1970.
ENCICLOPÉDIA ABRIL. S. Paulo: Abril Cultural, 1972, v.6.
GARBUGLIO, José Carlos. O mundo movente de Guimarães Rosa. S. Paulo:
Ática, 1972.
NOVO CONHECER. S. Paulo: Abril Cultural, 1977, v.1.
ROSA, J.G. Burrinho pedrês. R. Janeiro: N. Fronteira, 1996.
____. Em memória de João Guimarães Rosa. R. Janeiro: J. Olympio, 1968.
____.
Corpo
de
baile.
R.
Janeiro:
J.
Olympio,
____. Estas estórias. R. Janeiro: J. Olympio, 1969.
____. A hora e a vez de Augusto Matraga. R. Janeiro: N. Fronteira, 1986.
____.Grande sertão: veredas. R. Janeiro: N. Fronteira, 1986.
____. Primeiras estórias. R. Janeiro: J. Olímpio, 1977.
____.Sagarana. R. Janeiro: J. Olympio, 1958.
1964.
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