Estado e mutualismo no Rio Grande do Sul (1854-1940) Adhemar Lourenço da Silva Jr. (UFEPel, Brasil) Há poucos estudos sobre o mutualismo no Rio Grande do Sul e no Brasil. Ressalvado meu desconhecimento, acredito que os há mais sobre o fenômeno na Argentina e Uruguay, conquanto ainda pouco desenvolvidos para permitir comparações mais sistemáticas. Ainda assim, este trabalho tenta desenvolver um modelo de análise das relações entre mutuais e Estado – testando o modelo no Rio Grande do Sul – pressupondo a configuração de três esferas: A esfera normativa é aquela na qual o Estado define a situação jurídica das mutuais e a competência para administrá-las, ação recíproca às disposições constantes em estatutos dessas entidades sobre sua relação com o Estado, ambas explicitando valores sobre os quais se assentam expectativas de relação. A esfera administrativa é aquela na qual o arbítrio do dirigente (seja o público, seja o da mutual) dispõe sobre a utilização do outro como meio para a ação política ou realização de valores, trazendo apenas implícitas as motivações. A esfera política propriamente dita dispõe sobre os valores ou motivações que sóem utilizar como meio as disposições da esfera administrativa. Pelo fato da esfera política poder indicar a existência de projetos que permitam interpretar as disposições de outras esferas como passíveis de interpretação por sua regularidade, e essas regularidades não foram identificadas no universo empírico aqui tratado, abstenho-me de supor a existência de tais projetos. Isso também significa pensar o mutualismo não como um ideário em prol de uma forma específica de organização, mas como uma forma suficientemente genérica de organização para a consecução de certos fins que têm pouco de coletivos. Assim, aquilo que denominamos “mutualismo” é apenas o termo genérico para o fenômeno de constituição de associações voluntárias, autônomas, autocéfalas e democráticas, cujo objetivo principal é assegurar seus membros contra eventos capazes de levar ao descenso social. Claro deverá ficar, que essa definição é tendencial, quando não ideal-típica, sobretudo porque a extensão geográfica e temporal do fenômeno permitirá que variantes apareçam, e as próprias entidades se modifiquem. Quê motivos levam a lançar mão de uma definição que não necessariamente coincide empiricamente com o que estudarei? Além da orientação por certos pressupostos, uma definição desse tipo permite distinguir mutuais de outros tipos de associações, ao mesmo tempo que indicam variáveis importantes para sua análise. Interessa agora sua definição como associações autônomas, autocéfalas e democráticas, explicitando algumas das principais questões que permeiam o estudo das mutuais, que envolvem o controle externo de suas atividades e a forma de gestão. No caso de controle externo das atividades, este pode ser feito pelos Estados – inclusive os de origem de imigrados –, pelos prepostos do patronato, no caso de caixas de empresa, ou por párocos e bispos, no caso de irmandades. Essas últimas, que não são aqui incluídas como mutuais, não o são exatamente pelo caráter hierático das funções de gestão. A forma de gestão é o caráter distintivo das mutuais democráticas, de um lado, e empresas de prestação de socorros, inclusive cooperativas de médicos, de outro, ao passo que eventuais processos de burocratização, como bem indica Linden (1996, p. 32), são possíveis quando, gradualmente, assembléias gerais são suprimidas administrativamente, mesmo que garantidas por estatutos. Por outro lado, a garantia de democracia – mesmo contra a ingerência do Estado brasileiro que, entre 1860 e 1882, tem a prerrogativa de aprovar estatutos – orientará muito da preocupação dos associados. +++++++ 2 No Brasil, a esfera normativa, por parte do Estado, tende a ser de competência nacional, não regional. Podem-se identificar duas grandes fases nessa esfera: a primeira, quando o Estado não dispõe de um sistema de previdência público e a segunda, quando o Estado toma iniciativas para constituí-lo. Identificam-se quatro marcos temporais na primeira fase. O primeiro seria o Decreto Imperial 2711, de dezembro de 1860, que regulamentava a fundação de mutuais, entre outras entidades coletivas. A norma prescrevia que as entidades só funcionariam, com direito a certas prerrogativas, depois de um parecer do Presidente de Província (ou Imperador) o autorizando: “Os estatutos deveriam ser enviados à autoridade competente especificando o nome da entidade, a sua sede, os seus fins, a duração prevista, o valor da contribuição mensal, a forma como se pretendia empregar os fundos sociais, os serviços prestados, as atribuições dos administradores e da assembléia geral, o modo de administração, as condições para admissão e eliminação dos sócios, bem como o número destes.” o Dentre os limites previstos pelo mesmo Decreto (§ 5 do art. 32), conferia-se ao Presidente de Província o poder de nomear o presidente da associação. Tânia de Luca (1990, p. 14-15) aponta a semelhança da lei brasileira e da legislação francesa, inclusive na capacidade de nomeação do dirigente da associação. A autora destaca que o objetivo dessas prescrições, na França, vinculava-se “ao interesse do governo em formar uma clientela, para além dos quadros de administração, que lhe fosse fiel”, ao passo que no Brasil não teria havido tal objetivo, dado o não exercício dessa faculdade pelos Presidentes de Província e a aprovação de estatutos que contrariavam a norma legal, delegando à assembléia geral da entidade a capacidade de eleger dirigentes. Esse padrão também tenha foi encontrado no Rio Grande do Sul, mas há indícios de que, eventualmente, houve envolvimento político mais claro por parte de associações. Ainda que em 1872 se tenha revogado a capacidade de nomear o presidente da entidade, garantindo-se a autocefalia, a revogação completa da lei só ocorreria em 1882, nosso terceiro marco, retornando à situação não-regulamentada anterior a 1860. Em 1893, quarto marco, sancionou-se nova legislação, grosso modo ainda vigente, que permite a constituição de pessoa jurídica após o registro de estatutos em cartórios e publicação de extratos em Diário Oficial. Se a norma de 1893 permitia a aquisição de personalidade jurídica, a norma de 1860, mais restritiva, obrigava o registro da entidade, a ponto da Sociedade de Beneficência Brasileira União, fundada antes de dezembro de 1860, colocar a discussão em assembléia geral nos seguintes termos: “se se deve remeter ao Presidente da Província os estatutos desta sociedade e solicitar para eles a aprovação do Governo, ou se deve dissolver a Sociedade”. Como seria previsível, aprovou-se a primeira opção. Em regiões onde houve imigração, a normatização por parte do Estado pode significar tanto disposições legais no local de destino dos imigrados, quanto as do local de origem. Apesar da norma de 1860 promover a padronização de estatutos, impondo limites ao arbítrio dos que voluntariamente se reuniam para o socorro mútuo, é fácil identificar interferências da legislação dos países de origem na constituição de entidades de imigrantes. Assim, a Sociedad Española de Socorros Mútuos em Porto Alegre fizera seus primeiros estatutos em 1893 segundo a lei espanhola, que previa maioridade (e, portanto, direitos políticos) aos 25 anos. No entanto, discutiu-se que uma Comissão em 1908 não completara essa idade, o que levou à adequação dos estatutos à maioridade brasileira, 21 anos (Vargas, 1979, p. 42). A condição de cidadão dos países de origem dos imigrados era básica como critério para associações italianas, país onde o mutualismo integrou projetos políticos e foi pensado como instrumento de secularização da sociedade, sendo então positivamente avaliadas e impulsionadas tanto pelo Mazzinismo quanto por liberais moderados, contrários à Igreja Católica. O caráter mais fortemente 3 político do mutualismo na Itália pode ter levado as entidades de imigrantes no Rio Grande do Sul a não serem capazes de separar previdência e política, a ponto de fazerem de suas mutuais instrumento do nacionalismo italiano. Apenas como exemplo, embora houvesse uma prescrição nos Estatutos da Unione e Philantropia de que não eram permitidas discussões políticas na entidade, havia restrições àqueles que “sentar[em] praça, ou que voluntariamente tomar[em] armas sob qualquer governo estrangeiro”. Há indícios de que o Estado brasileiro tolerava limitadamente o pretenso caráter extraterritorial do mutualismo de imigrados. Um parecer de 17 de março de 1869 do Ministério de Negócios do Império, anexo ao Relatório desse ano, versava sobre a pretensão de aprovação de uma Sociedade de Beneficência Brasileira em Lisboa, assinalando que devia ser “organizada segundo as leis portuguesas e aprovadas por autoridades portuguesas”. O parecer assume um caráter genérico a seguir, evidenciando a posição estatal sobre as mutuais de imigrados: “o competente para autorizar a incorporação de tais sociedades [é] o governo do país onde elas têm seu domicílio”. O padrão das sociedades de socorros mútuos era a neutralidade política e religiosa, mas podem-se encontrar casos em que os estatutos prescrevem a luta contra ou a favor de leis, ou seu cumprimento. O Montepio Militar, fundado em 1881 em Porto Alegre, assumia a tarefa de pleitear o cumprimento da concessão de pensão a viúvas e órfãos de associados. O Congresso Operário, de 1887, tinha dentre seus objetivos fazer “representações aos poderes do Estado, protestando contra as medidas tomadas pelo governo, quando elas o exigam (sic!)”. O Grêmio dos Artistas, fundado em 1882 em Porto Alegre, se dispunha a combater leis consideradas nocivas a seus associados e, eventualmente, promover a responsabilidade de autoridades. Para não nos estendermos mais em outros exemplos do século XIX, basta assinalar que a União dos Caixeiros Viajantes do Rio Grande do Sul, fundada em 1913 em Santa Maria, tinha como fim explícito nessa época a luta pela diminuição dos valores de passagens ferroviárias. Se isso parece pouco em um universo de mais de 400 mutuais fundadas no Rio Grande do Sul entre 1854 e 1940, devemo-nos lembrar que a normatização disposta por estatutos de entidades pode ser apenas sumária ou mesmo implícita: é sumária, por exemplo, a definição da competência do Conselho Administrativo da Sociedade Italiana Vittorio Emanuelle II, fundada em 1877 em Porto Alegre, quando prescreve que o órgão deveria “representar e sustentar os direitos da sociedade perante as autoridades públicas”. É implícito, por exemplo, O socorro, freqüente em estatutos, de pagamento de advogado ou concessão de diárias em caso de prisão, deixa implícita a capacidade de definir um envolvimento com a disputa legal de maneira mais ampla que o explícito nas normas (Silva Jr., 1999). A segunda fase por nós identificada vai de 1907 ao término do período de pesquisa. Outros autores levariam essa fase para período posterior, como 1923 ou mesmo a década de 1930, quando, respectivamente, instituem-se formas de arrecadação compulsória para fins previdenciários e quando o Estado participa como contribuinte desse sistema (a discussão é feita em Malloy, 1986, p. 48 e ss.; Oliveira, Teixeira, 1985, p. 20 e ss.). Retrocedemos para 1907, porque é nessa data em que se aprova a primeira lei de sindicalização que, dentre outras prescrições, permite a sindicatos a constituição de caixas de socorros mútuos e cooperativas com autonomia financeira e escrituração em separado(Dec. n. 1637, de 5 jan. 1907, art. 3o alínea c). Embora não date de 1907 a constituição de um sistema público de previdência no Brasil, é nesse momento que se configura a ação do Estado no fomento a associações que podem concorrer com as mutuais. Essa atitude, com suas contramarchas, se estenderá pelo menos até o final de nosso período de análise. Nesta fase, podem-se identificar várias démarches. Em 1915, um projeto na Câmara dos Deputados permitiria às mutuais a operação de seguros de acidentes de trabalho (Lacerda, 4 1960, p. 106-107), mas, abandonado, só será retomado em 1919, quando tais seguros viriam a ser operados por empresas comerciais. O que seria um desestímulo à participação das mutuais no sistema previdenciário contrasta com a convocação a elas feitas para indicarem um delegado à OIT em 1919 (Lacerda, 1960, p. 106-107 e 212; Gardelin, 1988, p. 119). Em 1923, com a criação das Caixas de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários (estendidas em anos seguintes a outras profissões), configuram-se mudanças na esfera normativa da relação Estado-mutuais. A criação de sistemas estatais de previdência em espaços onde existem mutuais coloca o problema da incorporação ou negação das entidades privadas no sistema público (Linden, 1996, p. 36-37) e as hesitações na montagem desse sistema público – e, portanto, na relação deste com as mutuais – tornam difícil identificar projetos políticos claros, sejam de incorporação ou negação. Na montagem do sistema público de previdência, a rara norma que menciona mutuais ou congêneres caixas patronais é o decreto n. 5109, de 20 de dezembro de 1926, que reforma o decreto que cria a Caixa dos Ferroviários (4682, de 24 de janeiro de 1923), estendendo-o a outras categorias e permitindo, em seu artigo 63, que houvesse acordo com entidades já existentes, incorporando seu ativo. Aparentemente não ocorreram acordos desse tipo no Rio Grande do Sul, pois em 1939 ainda existiam pelo menos 7 entidades de socorro mútuo entre ferroviários. Em 1934, com a recriação do Conselho Nacional do Trabalho, o decreto n. 24784, de 14 de julho de 1934 institui o registro geral de “todas as instituições de previdência social e associações de auxílios mútuos”, medida que limita as operações das entidades, ao prescrever a quase impossibilidade de operarem em concorrência com a aposentadoria pública (art. 29 § 5o). Embora não tenha consultado a documentação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, acredito que a possibilidade de concorrer com o Estado nesse tipo de benefício era tacitamente negada pelo órgão, quando vemos o mesmo tipo de prescrição 40 anos depois (cf. Lei 6.435, de 15 de julho de 1977, art. 42, § 5o). Mesmo não sendo o momento para discutir políticas públicas de previdência no Brasil dos anos 30, observamos que as contramarchas na normatização do mutualismo articulam-se com as dúvidas dos governantes sobre aquelas. Uma dúvida sempre presente é a forma com que deveriam ser tratadas a previdência e a assistência sociais, e várias normas dispunham sobre a obrigatoriedade (ou possibilidade) das Caixas e Institutos de Aposentadorias fornecerem assistência médica. Ainda em 1937, um artigo definiria como “previdência falha, parcial, ineficiente e imprevidente” aquela que não prestasse assistência médica (BMTIC, n. 31, mar. 1937, p. 257). Por outro lado, a montagem do Estado Nacional nos anos 30 separou o Ministério do Trabalho Indústria e Comércio, com seus órgãos fiscalizadores da previdência, e o Ministério da Educação e Saúde Pública. Pesquisas posteriores podem vir a indicar que a forma assumida pela previdência pública no Brasil – responsável também pela Saúde – originou-se do fato de mutuais usualmente responsabilizarem-se pela cobertura de ambos os riscos e que a precedência do Estado na securitização – ideológica, mas não cronológica – só seria possível se satisfeitas duas condições: cobertura igual ou mais ampla de riscos subjetivos na esfera do trabalho e adequada previsão orçamentária. O fato do Estado participar com a Quota de Previdência das Caixas e Institutos de Aposentadoria e Pensões, por um lado, aumentava a despesa pública, mas, por outro lado, não gerava consenso sobre a natureza desses órgãos autárquicos, se de direito público ou privado (BMTIC, n. 6, fev., p. 134 e n. 12, ago. 1935, p. 89) e, sob outro ângulo, se deveriam ser responsáveis exclusivamente pela previdência ou também pela assistência públicas, fornecendo serviços médicos. Ainda em 1937 o Ministro do Trabalho Indústria e Comércio manifestava certo desconforto ao se referir às mutuais que, “tendo um caráter de previdência, não se [enquadravam] no regime das instituições de aposentadorias e pensões” (MTIC, 1937, p. 107). 5 Ainda dentro de nosso período, uma norma nacional a mais dispõe em parte sobre o mutualismo, aparentemente com grande repercussão no Rio Grande do Sul. O decreto-lei n. 383, de 18 de abril de 1938, embora dirigido às associações de estrangeiros em geral – e sua eventual atividade política – revela, à medida que o lemos, um cerceamento progressivo das possibilidades de manter mecanismos de previdência. O Artigo 2o, proíbe que entidades façam propaganda política de partidos de países estrangeiros, mesmo entre compatriotas. A medida aparentemente não interferiria no sistema previdenciário, mas nas motivações de diferentes grupos, como fascistas, nazistas ou comunistas, para ingressarem nas mutuais. O artigo 3o permite a associação “para fins culturais, beneficentes ou de assistência”, mas proíbe a subvenção de governos estrangeiros, atentando contra uma das fontes de receita de algumas mutuais e esvaziando justificativas para a manutenção de fortes vínculos entre as entidades e a diplomacia. Mas é o artigo 5o, no entanto, aquele que, de fato, “nacionalizará” as entidades, quando proíbe a associação de brasileiros “natos ou naturalizados, e ainda que filhos de estrangeiros”. A medida coloca as mutuais perante a opção: ou se mantém como entidade “estrangeiras”, o que só seria possível em cidades com grande número de compatriotas não-naturalizados, porquanto não poderia haver subvenções, ou a entidade deixa de ser “estrangeira”, mantendo seu corpo social com os de fato estrangeiros, os naturalizados e os descendentes. Essa é a medida que de fato naturalizará as mutuais exatamente por causa da necessidade de associar os mais jovens para sustentarem os mais velhos. No Rio Grande do Sul, como se poderia prever, os mutualizados, perante essas medidas, orientaram-se sobretudo para a nacionalização, embora tenha havido casos de extinção da entidade. Mas nem mesmo a opção pela nacionalização viria a ser uma boa alternativa para a manutenção do caráter previdenciário. No Brasil, ao invés do sistema tentado na Inglaterra onde as mutuais foram integradas ao sistema público, ao longo da década de 1930 foi progressivamente adotada uma política de negação das mutuais em meio à legiferação sobre a previdência pública. Como teria ocorrido em países com política pública semelhante, as entidades que continuaram a existir (fossem elas étnicas ou vinculadas ao mundo do trabalho) perderam, de qualquer modo, seu caráter previdenciário e só se mantiveram como clubes de sociabilidade (Linden, 1996, p. 35-37). +++++++ Os conteúdos até aqui trabalhados permitem destacar dois aspectos da relação do estado com as mutuais no plano normativo. O primeiro, bastante evidenciado, é a inexistência de normatização a médio e longo prazo para esse tipo de associação. Com exceção do período imperial, as hesitações do Estado nacional com respeito ao tipo de entidade que são as mutuais – e, de resto, mesmo a previdência pública – fariam com que os principais momentos nos quais ambos setores interagem possam ser definidos como pertencentes à esfera administrativa, e isso ficará claro na seção a seguir. Menos evidentes são os porquês da relativa inação das mutuais com a inexistência de projetos políticos que, ao se configurarem no sentido da negação ao longo da década de 1930, não levam as entidades a se comportarem como grupos de interesse. Uma possível explicação seria a insignificância relativa das entidades, o que, contudo, carece de comprovação empírica, pois, enquanto em 1938 havia 237 sindicatos de empregados, empregadores e profissionais reconhecidos no Rio Grande do Sul, havia pelo menos 351 sociedades de socorros mútuos. Mesmo não se tendo dados para comparar a filiação a sindicatos e mutuais, sabe-se que 21,82% da população vinculada a alguma forma de previdência (incluindo-se a previdência pública) era filiada a mutuais em 1942 no Brasil (IBGE, 1946, p. 375-376; 1939, p. 153). É isso que surpreende sobre a inação das mutuais e a ausência de comportamento como grupo de interesse. Creio que essa inação se deve a quatro fatores. O primeiro, semelhante ao poder público nacional, é a dificuldade em identificar projetos políticos de médio e longo prazo nas mutuais estudadas no Rio Grande do Sul. O 6 segundo, relacionado ao primeiro, é que os projetos das mutuais incluem a garantia de benefícios a seus associados a médio e logo prazo, mas isso diz pouco sobre projetos políticos mais amplos. Desde a perspectiva do membro, uma mutual é principalmente uma associação capaz de securitizar contra riscos subjetivos na esfera do trabalho, como a possibilidade de adoecer e não poder perceber salário (Offe,1989). O terceiro desses fatores é que, na ausência de projetos políticos amplos, não se configura a necessidade de articulação de mutuais com vistas à representação de interesses, e, como a configuração do sistema público de previdência foi estruturado em nível nacional, as redes de mutuais que, para temas localizados poderiam operar em conjunto, não foram suficientes para pressionar o poder público em nível nacional. O quarto fator, talvez decorrente do terceiro, é que, na montagem da previdência pública, as mutuais foram explícita e institucionalmente excluídas do rol dos grupos de pressão. Precisando melhor cada um desses fatores, é fácil constatar a ausência de projetos políticos por parte das mutuais. Nas raras vezes em que encontramos o termo “mutualismo” em documentação, ele não se refere a qualquer forma de movimento social, mas ao espírito de colaboração em geral, contrário ao “struggle for life” (Fuhro, 1909, p. 12). Aparentemente, um projeto político se configura melhor no que diz respeito a algumas mutuais de estrangeiros, sobretudo as de italianos. Nesse país, as mutuais eram pensadas como instrumento de secularização da sociedade, sendo então positivamente avaliadas e impulsionadas tanto pelo Mazzinismo quanto por liberais moderados, contrários à Igreja Católica. Isso configurava uma relação mais estreita das mutuais com o Estado italiano, inclusive por este subsidiar atividades desde que garantida a restrição de filiação aos não-peninsulares. Não seria de admirar que o fascismo no exterior procurasse intervir nesse tipo de associação (Tomassini, 1996, p, 248 e ss.; Iotti, 1996, p. 52, 95, 99, 102; 111; Silberstein, 1985, p. 84; Devoto, 1984, p. 329; Girón, 1994). Da mesma forma que o fascismo, o nazismo procurava imiscuir-se em mutuais de alemães, mas muito da luta anti-nazista em Porto Alegre se fazia também por meio das entidades. Uma declaração de janeiro de 1933, de parte dos moradores dos bairros Navegantes e São João, em Porto Alegre, criticava asperamente as “calúnias dos suásticos” e sua conduta, que “tem gerado desarmonia entre a colônia alemã da forma mais deprimente”. Conquanto tenha havido vínculos de nazistas, e mesmo do nazismo propriamente dito, com mutuais ou atividades dessas mutuais étnicas (como é o caso do Ginásio Teuto-brasileiro Farroupilha ou do Hospital Alemão, ambos vinculado à Hilfsverein), o grupo de entidades vinculadas à Associação das Caixas Funerárias e de Doença parece ter mantido por bastante tempo uma posição anti-nazista. (Gertz, 1989, p. 146-147 e 150; 1991, p. 52 e 54). Ousaríamos apontar o caso dos espanhóis como o mais dramático, pois o país de origem passara toda a década de 1930 em guerra civil intermitente ou contínua. Entre a proclamação da República Espanhola (14 de abril de 1931) e 13 agosto de 1932, a entidade em Porto Alegre não parecia envolver-se muito com os acontecimentos, demonstrando adesão e conformidade. Mas nessa última data, o Cônsul e alguns diretores da Sociedad Española enviaram telegrama ao Chefe do Governo, “interpretando [el] sentir [de la] colectividad española”, cumprimentando pela repressão a um movimento insurrecional. A entidade protesta pelos jornais e envia telegrama semelhante, agora ao Chefe de Estado. Internamente, avalia-se que o primeiro telegrama, mesmo tendo levado o cônsul a combater à boca pequena a mutual, fora enviado apenas por ser ele “inexperiente em questões sociais”. Serenados os ânimos, a República, por meio do cônsul, segue subvencionando a entidade. O ardor das disputas na Espanha levou à constituição de grupos no interior da Sociedad Española e nova mudança de governo ocorre em abril de 1936, com o presidente da entidade sendo nomeado cônsul, o que gera nova crise: o ocupante do cargo diplomático já era, por estatutos, presidente honorário e, por outro lado, o novo governo não era considerado legítimo. O presidente e agora cônsul renuncia ao cargo na entidade. A seguir, a Guerra Civil levou à constituição do Centro Nacionalista que se 7 opunha ao Centro Republicano. Em 31 de janeiro de 1937, uma assembléia da entidade, “homogenea y sin descrepancias”, prefere mencionar antes a “generosa hospitalidad del pueblo brasileño” do que o repúdio ao grupo que mantinha um programa de rádio pró-Franco. A assembléia avalia que os membros da entidade ou eram neutros, ou favoráveis ao ”gobierno legal” da Espanha. A guerra termina em 1939, mas a nacionalização do Estado Novo, as disputas internas e o rompimento com a representação diplomática já haviam deslegitimado a entidade. Na década de 1950, a disputa pela representação da colônia espanhola em Porto Alegre é acirrada entre a Sociedade Espanhola e a Casa de Espanha, e a primeira ainda é vítima de crises internas e disputas entre anarquistas, comunistas republicanos e demais forças que haviam estado em guerra. Talvez se pudesse dizer que a guerra civil continuara na Sociedad Española, pois a fusão entre as duas entidades não ocorreu pelo menos até 1990. Consta que a entidade espanhola de Bagé preferia não convocar seus sócios para reuniões durante a guerra civil ”para evitar a concentração de pessoas e, conseqüentemente não alimentar discussões de ideologias políticas de espécie alguma” (Vargas, 1979, p. 339-366, 370, 390-397). Todos esses casos de grupos étnicos com mutuais revelam a eventuais projetos de Estados estrangeiros para obter apoio internacional, mas pouco de projetos propriamente ditos das mutuais, afora relações estreitas com diplomatas dos países de origem. O principal motivo para a manutenção dessas relações estreitas com os diplomatas é a possibilidade de receber subvenções do poder público – e isso é válido mesmo para as mutuais que não se compunham de imigrantes, como veremos na seção a seguir. O principal objetivo de qualquer mutual é o fornecimento de socorros a seus membros, e estudos sobre diferentes entidades já destacaram hiatos existentes entre pretensões políticas e de prestígio de dirigentes que utilizam a mutual para esses fins e o padrão dos associados que quer simplesmente receber benefícios (v. por exemplo, Fernandez, 1989; Marquiegui, 1994). Com isso, duas variáveis não excludentes deveriam pautar a ação das mutuais para o incremento de receita: subvenções e compensações simbólicas capazes de, por um lado, associar estratos sociais mais altos capazes de contribuir, sem necessariamente requerer socorros e, por outro lado, associar os mais jovens de forma a que estes sustentem os mais velhos. Ainda que os mais jovens possam optar pela associação em função dos bens que a entidade dispõe, de qualquer modo, ambos os grupos, os de jovens e os de estratos superiores se filiariam em função de benefícios simbólicos, relacionados ao orgulho de pertencer a tal ou qual grupo ou entidade. Esses benefícios simbólicos podem ser considerados “políticos”, se os valores aos quais se relacionam forem interpretados de forma ampla como uma “política”, como a dignidade ou o orgulho de pertencer a tal grupo étnico ou sócio-profissional. É nesse ponto que se poderia aprofundar o estudo de valores pelos quais se pauta a associação, extrapolando considerações genéricas sobre formas de solidariedade horizontal. O terceiro dos fatores, a inexistência de articulações capazes de representar interesses por parte de mutuais, é apenas parcialmente verdadeiro, quando, por um lado, pode-se constatar a existência de redes de reciprocidade entre mutuais de um mesmo tipo, eventualmente acionadas para a representação de interesses, mas nada que configurasse uma federação dessas entidades. Pode-se encontrar casos de federações de entidades de imigrantes (não exclusivamente mutuais), como a Liga das Sociedades Germânicas, mas a Associação das Caixas Funerárias e de Doença só teria funcionado enquanto durou seu jornal (Mitteilungsblatt des Verbandes deutscher Kranken und Sterbekassen, okt. 1931-jul. 1934). Também em Porto Alegre, a Deutscher Hilfsverein tende a rejeitar, em 1882, a fusão com outra mutual, a Deutscher Krankenverein, mas, um ano depois, funde-se com a Deutscher Schulverein, que não era uma mutual (Telles, 1974, p. 46-47). Entre os italianos, cujas sociedades eram, em sua grande maioria, de socorro mútuo, houve pelo menos duas tentativas aparentemente infrutíferas de federação, uma 8 em 1890 e outra em 1911 (Gardelin, 1988, p. 101 e 111; Cinquantenario, 1925, p. 395-396). Entre os espanhóis, houve tentativas de uma federação brasileira em 1912, a adesão da entidade porto-alegrense à União Iberoamericana de Madrid, em 1919 e uma tentativa de federação estadual em 1932. Com respeito a esse último caso, houve concordância de pelo menos quatro entidades do estado, mas mesmo assim ela não se concretizou (Vargas, 1979, p. 317-324). Entre os poloneses, cujas entidades nem sempre eram mutuais, chegou a existir em 1930 uma Federação estadual (Gardolinski, 1958, p. 98). Entre as mutuais de brasileiros, chegou a haver troca de ofícios para uma espécie de tratado de reciprocidade, por meio do qual, todos os membros de associações do país “gozassem de benefícios recíprocos”, mas aparentemente isso não foi adiante. Por outro lado, a possibilidade de fusão das duas que existiam em Porto Alegre, quando ambas tinham problemas financeiros, foi rejeitada devido às exigências que foram consideradas “um grave insulto” pela Beneficência Porto-Alegrense, como a proibição de que libertos fossem dirigentes (LIVROS de atas das sessões da Sociedade de Beneficência Porto Alegrense.1856-1860 e 1867-1873). Mesmo entidades que surgiram aproximadamente no mesmo momento, agregando o mesmo tipo de grupo sócioprofissional e mantendo relações de reciprocidade (quando o membro de uma poderia se beneficiar dos socorros de outra entidade, quando em trânsito), como o caso dos Clubes Caixeirais e das Associações dos Empregados no Comércio, não chegaram a constituir federações. Avaliamos que isso ocorria em função das entidades não abrirem mão de sua autonomia, autocefalia, ou democracia interna, tanto que uma entidade já criada como regional, como a Beneficência Portuguesa, ao cabo de cinco anos já se cindia em outras entidades de âmbito local. Essa situação permitia às mutuais funcionarem como grupo de pressão em nível local, e , eventualmente regional, mas as incapacitou para uma pressão em nível nacional. O quarto fator, decorrente do terceiro, é que as mutuais foram explicitamente excluídas do sistema de previdência pública, a menos que se transformassem em sindicatos legalizados, que poderiam eleger representantes para as Caixas e Institutos de Aposentadorias e Pensões. A despeito de parte da historiografia mencionar a transformação de mutuais em sindicatos, foram raros os casos em que esse fenômeno foi observado. Essa possibilidade se acentua pela própria legislação de sindicalização, tanto a de 1907, como a dos anos 30, que efetivamente permite a mutuais profissionalmente diferenciadas obterem o reconhecimento legal como sindicatos, embora haja razões para crer que um percentual mínimo das entidades requereu a legalização e, portanto, permitiuse pressionar o sistema de previdência público.1 Como se pode inferir, as relações entre Estado e mutuais se pautaram por condutas de curto prazo, que seriam tipificadas como pertencentes à esfera administrativa, acionadas por ofícios típicos do dia-a-dia das entidades e do Estado. Desde a perspectiva das mutuais, tais ofícios seriam basicamente de dois tipos: os requerimentos, de um lado, e as informações, comunicações e convites. Desde o ponto de vista do Estado, que é chamado a certas decisões pelos requerimentos, este ainda pode requerer informações e o uso dos recursos das entidades. Aquilo que as diferentes instâncias do Estado têm competência para realizar seriam expressas pelas normas e, pelo que já vimos, uma das principais medidas administrativas concernentes a ambos é o reconhecimento e autorização para o 1 Para casos ocorridos em São Paulo, v. Luca, 1990, p. 99. Para quatro casos ocorridos em Pelotas e Rio Grande, v. Loner, 1999, p. 675 e 693. Embora faltem maiores dados sobre o fenômeno no Brasil, a raridade dos registros de sindicatos cujo nome remete ao mutualismo e que indicam data de fundação como anterior a 1930 é flagrante no Distrito Federal (1 caso), São Paulo (2 casos), Rio de Janeiro (1 caso), Alagoas (1 caso), Amazonas (1 caso), Maranhão (2 casos), Pará (3 casos), cf. BMTIC, n. 14, out., p. 377; n. 15, nov., p. 365; n. 16, dez. 1935, p. 375; n. 17, jan., p. 360; n. 19, mar., p. 384; n. 20 abr. 1936, p. 377, 381-382. 9 funcionamento das entidades. A legislação que vigorou entre 1860 e 1882 permitia ao Presidente da Província aprovar ou rejeitar estatutos no todo ou em parte, além de, até 1872, nomear o presidente da entidade. Se o padrão da ação da Província do Rio Grande do Sul foi a simples aprovação e a não-nomeação do dirigente – e mesmo estatutos que definiam a eleição do presidente em assembléia geral –, em alguns casos isso não ocorreu. Em 1862, por exemplo, os estatutos da Sociedade Auxiliadora da Picada Dois Irmãos foram rejeitados, sobretudo pelo descumprimento da norma que permitia a nomeação do Presidente. Com isso a entidade sequer poderia funcionar, mas consta que a mutual funcionou pelo menos até 1923 (Moehlecke, 1978, p. 211; Petry, 1923, p. 72). Um caso mais complexo ocorreu depois de uma crise interna na Sociedade de Beneficência Porto Alegrense. Após três meses de uma renúncia coletiva da diretoria no final de 1868, o presidente honorário da entidade, Antônio José Lourenço, convoca uma Assembléia Geral, onde comunica que enviou os novos estatutos e uma lista dos sócios ao Presidente da Província para que este escolhesse o presidente. Lourenço, um dos fundadores da entidade, é bastante criticado nessa Assembléia Geral por ter submetido a crise da entidade ao arbítrio do Presidente da Província, que o nomeou presidente. Essa atitude, ao invés de simplesmente resolver o problema, criou outros. A assembléia chegou a cogitar pedir os estatutos e a lista de sócios de volta ao Presidente da Província, o que foi recusado por ser “atentatório à lei e às autoridades”, porque isso ofenderia “a sensibilidade” do governante. A discussão terminou em “desarmonia” e a sessão foi suspensa. Na sessão seguinte, novas críticas à atitude do presidente honorário, que causara “um mal para a sociedade”. Um extenso requerimento à assembléia pediu a nomeação de uma comissão de advogados para verificar a legalidade do ato do Presidente da Província e, se fosse o caso, pleitear sua nulidade. Rejeitado o requerimento, seu autor e outros membros se retiram irados da sessão. A entidade, que já trazia disputas intestinas anteriores, passou a ter cada vez maiores dificuldades em reunir a assembléia geral (e mesmo a diretoria) e deliberar qualquer coisa sem muita discussão. O presidente da entidade só voltou a ser eleito quando se revogou em 1872 o § 5o do art. 32 do Decreto 2711 (LIVROS de atas das sessões da Sociedade de Beneficência Porto Alegrense. 1867-1873). O caso da Beneficência Porto Alegrense é ilustrativo porque, ao mesmo tempo, exemplifica o valor atribuído à autonomia, autocefalia e democracia interna das mutuais, sem que isso implicasse qualquer posição anti-estatista. O funcionamento clandestino por décadas da Sociedade Auxiliadora da Picada Dois Irmãos contrasta com a posição da Beneficência Porto-Alegrense, que tentou reverter o erro de seu dirigente sem melindrar autoridades. Acredito que a diferença também tem origem na possibilidade de receber subvenções, o que era possível somente com o funcionamento legal da entidade. Tais subvenções seriam de dois tipos: a direta, com simples aumento de receita, e a indireta, com isenção tributária. Ao longo do período imperial e início do período republicano, as subvenções diretas se faziam por meio da concessão de rendas de loterias, e a legislação provincial e estadual está repleta desse tipo de medida. É verdade que essa forma de subvenção nem sempre corria a contento, pois se pode verificar que outros requerimentos propõem procedimentos para adiantar valores (Requerimentos 152, 1870; 258, 1888). Mas é possível verificar importante diferença normativa e administrativa entre os governos provincial e estadual, este último de inspiração positivista comtiana. Enquanto o primeiro era licencioso ao conceder subvenções, mesmo a entidades italianas, portuguesas, de negros e de brasileiros, o governo republicano do estado pouco concedeu subvenções diretas a entidades de imigrantes, que ocorreu apenas até 1892 (Ato n. 456, de 9 jun. 1891). A extinção das loterias pelo governo republicano fez ainda com que as subvenções tivessem que sair do caixa do Estado, e os destinos prioritários eram as entidades benemerentes, como Casa de Caridade, ou mesmo o Hospital psiquiátrico (que, embora público, era consignado como “instituição pia” até 1913, inclusive). O governo republicano não beneficiava mais do que duas ou três mutuais, todas em Porto Alegre e todas do “grupo étnico” 10 brasileiro, e entre 1891 e 1922, apenas por cinco vezes o valor das subvenções a esse tipo de entidade excedeu 2% do total da rubrica (exclusive o hospital psiquiátrico). Depois desse período, no entanto, dois momentos merecem destaque: o período entre 1923 e 1927, quando as subvenções a mutuais elevaram-se a índices superiores a 15% da rubrica, beneficiando também entidades do interior do estado; e o ano de 1929, quando o governo chegou a subvencionar entidades de fora do estado. Conhecedores da história do Rio Grande do Sul não se surpreendem com a menção a esses momentos, pois o primeiro, em meio ao qual ocorre uma guerra civil, é quando os partidos tradicionais buscam apoio político, ao passo que o segundo, semelhante ao primeiro, é quando Getúlio Vargas concorre á presidência da República e, usando de seu poder em nível regional, subvenciona entidades de migrantes gaúchos em São Paulo e Rio de Janeiro. De 1923 a 1929, a entidade mais subvencionada é a Associação dos Funcionários Públicos estaduais, fundada em 1912 e que jamais antes recebera dinheiro do governo, que, aliás, pouco demonstrou interesse por formas de previdência para com seus funcionários. Se é verdade que em 1854 o Presidente da província, como se lê em seu relatório, é capaz de adiantar aos funcionários públicos a quantia necessária para o ingresso no Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado, essa entidade nacional era subvencionada (por meio de loterias) exclusivamente pelo Estado nacional (não o provincial), e raros são os Relatórios do Ministério do Império que a deixam de mencionar. É difícil dizer o quanto as subvenções representavam para as entidades, porque suas relações com o Estado são diferentes, por um lado, e por outro, os balanços enviados aos órgãos de estatística não trazem as entradas provenientes de governos estrangeiros, indiscriminadas na rubrica “doações e legados”. Em um pequeno levantamento realizado entre 1920 e 1923 (Tabela 1), verificamos que a Sociedade de Beneficência Portuguesa, de Porto Alegre, compunha no máximo 5,2% de sua receita anual com “Doações e legados”, ao passo que a co-irmã de Rio Grande chegou a 37%. A sociedade Mutualidade dos Funcionários Municipais de Rio Grande tinha cerca de 25% de sua receita proveniente da Intendência Municipal, ao passo que o Centro Español, da mesma cidade, chegava a 47%. Desde a perspectiva do Estado, no entanto, e temos motivos para crer que nossa afirmação valeria para todos os países que subvencionavam associações de emigrantes, seriam valores minúsculos, a despeito de sua eventual importância para as entidades. As subvenções indiretas, por meio da isenção tributária, foram verificadas em nível municipal, sobretudo no que diz respeito ao imposto predial. Semelhantes à outra forma de subvenção, dependiam do arbítrio do governante, mas não parecem contemplar formas de alinhamento político como contrapartida. Diferentes das subvenções diretas, que não foram concedidas a entidades de imigrantes (com exceção do município de Montenegro à entidade italiana em 1923), as indiretas parecem ter sido facilmente concedidas, pelo menos em Porto Alegre. Não obstante, o arbítrio da concessão como resultado de uma decisão racional é claro no caso narrado a seguir ocorrido em 1914. Apesar de entidades de alemães e italianos o ganharem, a isenção foi negada ao Bürgerklub porque falassem alemão e pertencessem “à raça caucásica”. A comissão do Conselho Municipal pediu o indeferimento do pedido, porque representava uma instância do Estado “cujo idioma pátrio é o português e cuja população compõe-se de descendentes de várias raças, todos contribuintes diretos ou indiretos do erário público” (Pedidos de isenção de impostos prediais por instituições assistenciais e educacionais 1893-1915). Não está claro se as subvenções diretas e indiretas eram concedidas exclusivamente às entidades que diziam prestar socorros também a não-membros, ou se a todas as entidades de socorro mútuo, sendo mais provável a segunda alternativa, porque o termo preferencial para qualificá-las é sempre “beneficente”. Isso difere da história recente, quando a Sociedade de Assistência Média e Social (Santos-SP) solicitou isenção de impostos, o que foi negado, em requerimento que chegou a tramitar, em 11 recursos, até o Supremo Tribunal Federal, cujo acórdão não caracterizou a entidade como “instituição de assistência social”, pois “a recorrente (...) só presta serviços de assistência onerosa a seus associados (...), como entidade de previdência privada ou auxílios mútuos” (STF, 1988). As comunicações e convites também faziam parte da vida administrativa das entidades: posse de diretorias, envio de relatórios (principalmente daquelas subvencionadas), solenidades, etc. poderiam integrar copiosos maços de correspondência passiva (por exemplo Conselho Municipal 1764-1937, Correspondência com instituições sociais, culturais, assistenciais, religiosas e privadas. – 1.3.4.1). É possível que o lançamento da pedra fundamental da Casa de Caridade em Santa Maria, em 25 de dezembro de 1897 e patrocinada pela Artística Beneficente Santamariense, fosse apenas uma solenidade para a qual o intendente municipal tivesse sido convidado a discursar, e não que este presidisse a entidade (cf. Beltrão, 1958, p. 102), pois esta só admitia “artistas” em sua diretoria (Estatística, 1897). Claro que, dependendo do caráter da festividade, nem sempre as autoridades públicas eram convidadas: a primeira vez que a Sociedad Española de Socorros Mútuos comemorou seu aniversário, convidou o Intendente Municipal José Montaury para presidir a sessão, mas não consta que tenham sido convidadas autoridades brasileiras para as Fiestas de la Raza em 12 de outubro de cada ano. Por outro lado, dentre as conferências promovidas pela entidade, pelo menos uma não era sobre o “genio” ou a “raza” espanhola: em março de 1933, o governador Flores da Cunha abordou o tema “Transformações sofridas na vida administrativa do Estado e do País nos último anos” (Vargas, 1979). Mesmo na ausência de registros de um “convite”, supõe-se que eram amiúde trocados e, alargando um pouco o que compreenderíamos por Estado, há mutuais que se comportam e são concebidas como representantes, se não de Estados, pelo menos de “Povos”. O advento da República e o centenário da Independência brasileira contaram com várias solenidades em mutuais, conquanto as de imigrantes participassem de forma ambígua e desconfortável com relação aos eventos. Já o centenário da imigração alemã contou com a participação de mutuais espanholas e italianas, ao passo que o centenário da Revolução Farroupilha foi eivado de declarações de orgulho étnico na nova pátria, com monumentos e sanatórios presenteados ao Brasil (A Federação; Correio do Povo; O Brasil; Gazeta de Alegrete, 7 set. 1922; Vargas, 1979, p. 228-377; Duarte, 1946, p. 187-191). Passando ao largo da troca de informações – que são sobretudo as enviadas das mutuais para setores de estatística pública, e que tendem a contemplar poucas das entidades existentes – , falemos agora dos requerimentos típicos de representação de interesses e do uso de recursos das mutuais pelo Estado. Os requerimentos de representação de interesses – nos quais poderíamos incluir mesmo aqueles antes tratados – poderiam ser didaticamente (não analiticamente) divididos segundo dois critérios: os que versam sobre interesses de um ou de vários, e os que versam sobre interesses de sócios ou não-sócios. Deixemos de lado os que versam exclusivamente sobre interesses de sócios (um ou vários), porque não raro se relacionam com os próprios socorros prestados pela entidade, como por exemplo o de defender associados na justiça, ou com pedidos de subvenções em diferentes formas. Na maior parte dos casos em que mutuais representam interesses de não-sócios, isso se relaciona ao fato de elas se auto-investirem como representantes “desinteressadas” de certo grupo social. Quando, em 1891, a Deutscher Hilfsverein pede que seja desburocratizada a concessão de vales a uma viúva alemã recém-chegada aos Rio Grande do Sul, em nenhum momento do requerimento aparecem interesses da entidade no processo (Requerimentos 270, 1891). Da mesma forma, não aparecem benefícios específicos às entidades nos requerimentos da Associação Beneficente e Protetora dos Empregados Brasileiros da The Western Telegraph Company Limited pedindo o apoio político da bancada federal ao projeto de Caixa de Aposentadoria e Pensões, ou ainda naquele 12 enviado pela Associação Beneficente dos Sargentos do Exército que pedia apoio a projeto de lei federal versando sobre carreira e disciplina militares (Requerimentos 364, 1927). A Sociedade Príncipe de Nápoles foi capaz de desautorizar o agente consular italiano, que protestou contra a mobilização da entidade em pedir indenizações pela requisição de animais durante a guerra civil de 1923 (Gardelin, 1988, p. 124-126). Com exceção do primeiro caso, sobre o qual a menos informações, há motivos para supor que eventuais omissões das entidades nesses momentos poderiam romper com expectativas de sócios de serem protegidos, independente dessa proteção se estender também a não-sócios. Se as atitudes da diretoria anteciparam ou resultaram da pressão de associados, as entidades se autoinvestiram como representantes de um grupo maior que seus associados. O caso dos Clubes Caixeirais que se batem pelo fechamento de portas aos domingos desde a década de 1880 já mereceu algum estudo e nos indica a possibilidade de mutuais acumularem funções de resistência (Duarte, 2000). O uso de recursos de mutuais pelo Estado não parece ter sido muito disseminado e, com efeito, encontramos apenas três casos relacionados a regimes de exceção. No primeiro, o edifício e hospital da Sociedade Beneficente Brasileira União, em Porto Alegre, foi requisitado pelo Ministro do Exército para aquartelar um batalhão da Guarda Nacional em 1893, tendo sido desocupado em 1895, para então ser ocupado pelo governo do estado para aquartelar um batalhão da Brigada Militar. Em 1898, a entidade lamentava o estado em que ficara o prédio e pedia uma subvenção para consertá-lo, o que foi negado pelo governo do estado, porque este havia pagado “razoável aluguel” (Requerimentos 288, 1898). A insolência da entidade em deixar implícito o direito a uma compensação foi punida, porque entre 1895 a 1908 não receberia nenhuma subvenção pública. Já a Sociedade Española, de Porto Alegre, não se sabe se por simpatia ou pressões, cedeu sua sede para cuidar dos feridos pelos combates da Revolução de 1930 e doou 413$000 réis “para consolidar la República nueva que resurge disminuyendo las deudas contraídas en el extrangero por gobiernos mal orientados” (Vargas, 1979, p. 299-301). O terceiro caso foi localizado em um processo civil que se arrastou por anos. Em 1942, com as hostilidades entre o Brasil e o Eixo, entidades de italianos e alemães foram proibidas de funcionar no Rio Grande do Sul, e um setor da Polícia estadual passou a ocupar a sede da Gemeinützinger Verein. Com o fim da guerra, e pelo fato do local estar em boa localização no centro da cidade, o governo estava cedendo prédio e terreno para a construção de um ginásio coberto pela Sociedade Ginástica (antiga Turnerbund), quando os antigos sócios da Gemeinützinger Verein entram com processo para reaver os bens. A Sociedade Ginástica foi apoiada por diferentes parcelas do Estado e sociedade civil (inclusive cronistas esportivos), mas em 1960 foi finalmente firmado um acordo: a Gemeinützinger seria incorporada pela Sociedade Ginástica, desde que esta criasse um departamento de Pecúlios com o nome da antiga entidade e concedesse aos sócios honorários e beneméritos os mesmos privilégios na nova entidade (Amparo Mútuo, 1960). O fato de havermos localizado apenas três casos não nos indica que o uso de recursos das mutuais pelo Estado se limitasse ao relatado, tão somente nos indica a ausência de estudos monográficos capazes de precisar a forma com que a sede da Sociedade Italiana de Santa Maria ficou em mãos do estado até 1998 (Zanini, 1999, p. 21) – ou ainda hoje se encontra a sede da Liga Operária de Pelotas em mãos de um grupo escoteiro e uma sociedade de benemerência –, ao passo que já em 1949 a sede da Sociedade Italiana de Santa Vitória do Palmar foi devolvida (Azambuja, 1978, p. 123). +++++++ Um balanço da descrição que fizemos até agora nos permitiria avançar – mesmo que sejam avanços pautados por novas interrogações – em alguns tópicos. O primeiro deles são os limites de denominarmos como “política” um conjunto de normas o suficiente 13 amplo para deixar ao arbítrio do governante o que fazer com as mutuais. A menos que nos abriguemos em clichês como “tudo é político”, é patente que a forma como foi legislado o mutualismo no Brasil deixou amplos espaços para uma ação administrativa de várias instâncias do Estado que, como foi visto para o Rio Grande do Sul, careceu de projetos, regularidades e regras claras de gestão. Com isso, poderíamos até falar em “política”, mas conscientes de que não se tratam de formas racionais-legais de dominação, talvez se aproximando de práticas clientelistas, o que só um estudo mais aprofundado poderia revelar. Se a relação de clientela poderia pautar também os requerimentos dirigidos das mutuais ao Estado, há fortes indícios, poucos aqui revelados, de que internamente a disputa política nas mutuais envolvia valores aproximados a um modelo democrático de gestão. O segundo tópico decorre do primeiro, dispondo sobre a necessidade de aprofundarmos o estudo do mutualismo nos limites do Estado nacional, de forma a verificar eventuais regularidades invisíveis sem perspectivas comparadas. Isso significa investir, por um lado, em histórias comparadas locais para verificar a ação municipal e a possibilidade de mutuais se comportarem como agentes destacados na formulação de políticas. O que parece ser apenas uma auto-justificativa para esta pesquisa ganha relevo se constatamos que, em 1940, cerca de 3% da população do Brasil maior de 18 anos era filiada a sociedades de socorro mútuo e em alguns estados, inclusive o Rio Grande do Sul, esse índice era superior à média nacional. Se excluímos a população rural no cálculo desse índice, obteremos níveis ainda maiores de afiliação, chegando a 10% da população masculina em Bagé e a 23% em São Sepé. É exatamente esse tipo de fenômeno que causa estranheza, porque, em nível local, o mutualismo pode assumir grande importância sem que os historiadores tenham se detido com mais vagar em seu estudo, seja abordando como grupo de interesse, de previdência ou mesmo grupo político. Isso significaria pensar a história da previdência no Brasil a partir da relação Estado-sociedade, e não exclusivamente como ação do Estado, pressionado ou não por grupos de interesse. O terceiro tópico decorre do segundo, ao invocarmos a sociedade civil como agente na conformação de políticas públicas. Se a normatização do mutualismo é nacional, a possibilidade de uma análise comparada de temas concernentes à previdência e assistência social nas regiões contempladas por estas Jornadas depende de definirmos a relevância de uma região para efeitos de análise. Espero ter demonstrado que a região do Rio Grande do Sul é imprópria para pensarmos algo mais do que as relações administrativas estabelecidas entre mutuais e Estado, e algo muito diferente só poderia ocorrer no Uruguay, região que coincide com os limites de um Estado nacional. Com isso, a comparação de políticas públicas não poderia abstrair da análise – se existente – de “comunidades cívicas” (Putnam,1996) nas regiões, o que, por outro lado, coloca um problema de maior alcance: a relação, mesmo que misteriosa, entre comunidade cívica e democracia seria necessariamente de caráter tenso, pelo menos no Rio Grande do Sul, que na maior parte do período seria dificilmente caracterizado como “democrático”, a despeito do sem-número de associações voluntárias da sociedade civil. Isso nos permitiria construir uma agenda de pesquisa sobre políticas públicas cujo principal interrogante seria em quê medida essas resultariam da ação conjunta de Estado e Sociedade e em quê medida as ações do Estado e da Sociedade se condicionam mutuamente. Isso significaria não derivar as políticas públicas exclusivamente nem dos “interesses” sociais e tampouco da demiurgia do Estado. Referências Bibliográficas A Federação. Porto Alegre, 7 set. 1922. AZAMBUJA, Péricles. História das terras e mares do Chuí. Caxias do Sul : UCS/ Porto Alegre : EST, 1978. o BELTRÃO, Romeu. Cronologia histórica de Santa Maria e do extinto município de São Martinho. 1 vol. 14 1787-1930. Santa Maria : Pallotti, 1958. BMTIC = Boletim do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Rio de Janeiro, n. 1-32, set. 1934-abr. 1937. BRASIL. Coleção das Leis e Decretos. 1860-1935 CINQUANTENARIO della colonizzazione italiana nello Stato del Rio Grande del Sud.: 1875-1925. 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Anuário Estatístico do Estado do Rio Grande do Sul. Organizado pela Repartição de Estatística. Ano de 1922. Porto Alegre : Oficinas Gráficas d’A Federação, s/d. RIO GRANDE DO SUL. Secretaria de Estado dos Negócios do Interior e Exterior. Anuário Estatístico do Estado do Rio Grande do Sul. Organizado pela Repartição de Estatística. Ano de 1923. Porto Alegre : Oficinas Gráficas d’A Federação, 1924. SILBERSTEIN, Carina F. de. Mutualismo y educación en Rosario: las escuelas de la Unione e Benevolenza y de la Sociedad Garibaldi (1874-1911). Estudios Migratorios Latinoamericanos. Buenos Aires, n. 1, dic. 1985, p. 77-97. SILVA Jr., Adhemar Lourenço da. Etnia e classe no mutualismo do Rio Grande do Sul (1854-1889). Estudos Ibero-Americanos. PUCRS, v. XXV, n. 2, p. 147-174, dez. 1999. Sociedade Amparo Mútuo, Administrativo/Dossiê. 1960. (Sociedade Ginástica Porto Alegre). STF = Supremo Tribunal Federal. Acórdãos (1950/1999). Processo RE-108120, 08 mar. 1988. 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Nome Cidade Ano Sócios Sócios % Donativos %contribuição contribuintes remidos (públicos e privados) Sociedade Espanhola Socorros Mútuos Livramento 1923 81 0,30 33,91 Sociedade Portuguesa de Beneficência Porto Alegre 1923 1000 2100 1,11 12,84 Sociedade Portuguesa de Beneficência Porto Alegre 1921 550 510 1,92 15,87 Sociedade Portuguesa de Beneficência Porto Alegre 1920 471 454 3,75 26,68 Sociedade Portuguesa de Beneficência Porto Alegre 1922 900 2.000 5,21 13,38 Socorros Mútuos União Operária São Luiz 1921 87 9,76 19,76 Associação União Operária Beneficente Caçapava 1923 311 2 13,63 47,67 Sociedade Espanhola de Socorros Mútuos Porto Alegre 1923 154 14,77 50,94 Sociedade Portuguesa de Beneficência Rio Grande 1921 438 846 15,39 30,82 Sociedade Italiana de Mútuo Socorro Santa Maria 1922 53 15,74 0,00 Sociedade Syrio Libanesa Bagé 1921 41 16,89 83,11 Associação Beneficente São José Guaporé 1923 160 20,02 79,11 Sociedade Portuguesa de Beneficência Rio Grande 1922 42 13 21,86 42,09 Sociedade Mutualidade dos Funcionários Rio Grande 1923 87 21,89 25,10 Municipais Associação Beneficente Águia Branca Porto Alegre 1923 80 23,21 17,86 Sociedade Mutualidade dos Funcionários Rio Grande 1922 79 26,37 24,45 Municipais Sociedade Portuguesa de Beneficência Rio Grande 1920 393 1042 27,67 36,49 Sociedade Portuguesa de Beneficência Rio Grande 1923 420 986 37,19 44,50 Centro Espanhol de Socorros Mútuos Rio Grande 1922 57 47,15 0,00 Centro Espanhol de Socorros Mútuos Rio Grande 1923 50 7 47,15 0,00 Associação Beneficente Vitorio Emanuel II Montenegro 1923 21 80,72 19,28 Sociedade Syrio Libanesa Bagé 1923 52 93,02 6,98 Fontes: Rio Grande do Sul, 1922, s/d., 1924. % Outras receitas 65,78 86,05 82,21 69,57 81,41 70,48 2,66 34,30 53,78 84,26 0,00 0,87 36,05 53,01 58,94 49,18 35,85 18,30 52,85 52,85 0,00 0,00