Avaliação preliminar das causas de ruptura de uma
encosta em Nova Friburgo, RJ
de Campos, T. M. P.
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]
Amaral, C. P.
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]
Moncada, M. P. H.
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]
Veloso, R. Q
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, RJ, Brasil, [email protected]
Resumo: O presente trabalho apresenta uma síntese de estudos efetuados pela PUC-Rio para
avaliar o mecanismo de ruptura de uma encosta em Nova Friburgo, Rio de Janeiro, Brasil. O
escorregamento, que provocou a morte de duas pessoas e importantes danos materiais, ocorreu
em um perfil de solo residual de gnaisse não saturado. Este deslizamento potencialmente decorreu
da redução da sucção como conseqüência da infiltração de águas no talude não saturado. A época
do acidente coincide com um período de baixa precipitação e com a ruptura de uma tubulação de
água, alguns dias prévios ao movimento. Com o intuito de identificar os fatores condicionantes da
instabilidade da encosta, foram executadas investigações de campo, de laboratório e, a partir dos
dados destas, análises de fluxo e de estabilidade. Para a modelagem de fluxo utilizou-se um programa
que simula o fluxo bidimensional em um meio de saturação variável. Para as análises de estabilidade
utilizou-se o programa comercial Slope-W, com os valores de sucção resultantes das analises de
fluxo sendo utilizados nas análises de estabilidade. Também foram executadas análises de
estabilidade, com o método de talude infinito, para avaliar uma eventual influência de efeitos
tridimensionais no escorregamento.
Abstract: The paper presents a synthesis of studies performed at PUC-Rio to evaluate the
mechanism of failure of a natural slope in Nova Friburgo, Rio de Janeiro, Brazil. The slide provoked
the death of two people and important material damages. It happened in a profile of unsaturated
gneissic residual soil, with the movement being potentially caused by the reduction of suction due
to water infiltration in the slope. The natural slope failure occurred in a period of low precipitation,
a few days after the rupture of a water pipe buried in its top portion. In an attempt to understand the
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721
mechanisms that caused failure, field and laboratory investigations were carried out and stability
and flow analyses were performed. Flow analyses were carried out using a 2D finite element
saturated-unsaturated flow programme. Pore pressures resulting from the flow analysis were used
to perform 2D stability analyses considering different scenarios. Such analyses were carried out
using the commercial program Slope-W. Further analyses were also performed using the infinite
slope method in order to have an assessment of 3D effects on the slope failure.
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho apresentada os resultados de investigações efetuadas visando avaliar os mecanismos que podem ter ocasionado a ruptura
de uma encosta localizada no bairro de Jardim
Califórnia em Nova Friburgo, RJ. Tais investigações compreenderam:
a) Visitas de campo
b) Execução de investigações de campo
c) Execução de investigações de laboratório
d) Execução de análises de fluxo
e) Execução de análises de estabilidade
A seguir serão descritos os pontos mais
importantes destas investigações e sua relevância e utilização nas análises das causas da ruptura.
1.1 Caracterização do problema
No inicio da manhã do dia 12/04/2004, ocorreu
um deslizamento de solo em uma encosta localizada entre as ruas Araripina e Pesqueira, no
Loteamento Canto do Riacho, bairro Jardim
Califórnia, Município de Nova Friburgo. Este
deslizamento provocou a morte de duas pessoas, a destruição total da casa nº 28, e a destruição parcial da do lote 27.
1.2 Aspectos gerais da área e do local do acidente
A partir de visitas de campo efetuadas em junho/julho de 2004, foram coletadas informações
722
junto a moradores da área e do local do acidente que permitiram caracterizar a área afetada pelo
escorregamento.
1.2.1 Área do Loteamento Canto do Riacho
Trata-se de uma área de relevo ondulado, caracterizado pela presença de encostas planoconvexas, com inclinação natural variando de
35º a 50º, expondo vegetação rasteira e espécies arbóreas. As encostas são constituídas por
perfis de intemperismo medianamente desenvolvidos, com solos residuais aparentemente
maduros de 2 a 3m de espessura, e raros
afloramentos de rocha alterada e/ou sã. As ruas
na área foram implantadas acompanhado as linhas de nível, gerando cortes de até 4 m de
altura, com drenagem superficial ineficiente. As
casas foram construídas, em geral, junto às testadas das vias, por vezes exigindo também a
escavação de taludes pretensiosos, de 3m a 4m
de altura e inclinação de 90º, aos fundos.
1.2.2 Área do Deslizamento Pós-Ruptura
A área do deslizamento, mostrada na Figura 1, é
um trecho de encosta entre as ruas Araripina
(cota aproximada de 880m) e Pesqueira (cota
aproximada de 860m), com comprimento de 25m
e largura máxima de 15m, na crista da qual, junto
à rua Araripina, encontram-se uma boca de lobo
para drenagem pluvial e a ligação da rede pública d’água com um tubo de PVC de 22mm de
diâmetro. Na frente do terreno, separadas da
rua Pesqueira por um muro de blocos de con-
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creto parcialmente destruído de cerca de 2,5m
de altura, encontram-se as ruínas da casa do
lote 28, totalmente destruída, e da casa do lote
27, parcialmente destruída. Atrás das ruínas das
casas, lateralmente à cicatriz do deslizamento,
encontra-se um talude de solo residual de cerca
de 3m de altura.
maduro, menos espesso, de cor vermelha e textura areno-argilosa, não apresenta sinais de erosão. Já nos taludes de corte mais antigos, escavados para a implantação das vias, em que aparece sozinho, tal como à esquerda da casa do
lote 28, há feições de escorregamentos superficiais afetando o solo saprolítico. Quanto ao solo
maduro, nos taludes de corte em que aparece
sozinho mesmo com alturas de cerca de 3m, não
há feições de escorregamentos, apenas trincas
junto á crista.
Figura 1 – Vista da área do acidente (julho, 2004).
Posteriormente ao escorregamento, o talude
remanescente junto à rua Araripina exibia uma
altura de cerca de 4m na vertical, enquanto o
corte atrás das casas, envolvido em parte no
movimento, exibia uma altura variável de 2 a 3m.
Parte das feições ao longo da cicatriz do
deslizamento já havia sido modificada, mas foi
possível reconhecer nos taludes expostos a ocorrência de um perfil de solo residual de rocha
metamórfica (biotita-gnaisse), com horizontes
saprolítico e maduro (parcialmente orgânico).
Capeando este último, em transição abrupta, aparece uma camada de aterro/entulho. Não foram
notadas feições anisotrópicas marcantes no solo
residual, apenas uma foliação incipiente.
As Figuras 2 e 3 revelam o tipo de comportamento do solo residual na área do deslizamento.
Nos taludes de corte verticais mais recentes, com
cerca de 5m de altura, à direita da casa do lote 28
(olhando de frente), o horizonte de solo
saprolítico, de cor branca, com textura arenosa, é
muito susceptível a erosão, apresentando grandes sulcos por ação de erosão pluvial. O solo
Figura 2 - Detalhe do material na superfície de
deslizamento
A partir de dados coletados junto aos moradores, foi possível ter-se uma idéia da topografia
original da encosta, ou seja, antes da ruptura.
Todas as informações indicaram que o talude
escavado atrás das casas, parcialmente rompido, tinha a mesma altura dos trechos remanescentes adjacentes à cicatriz do deslizamento. As
informações indicaram também que à montante
deste talude, até a rua Araripina, a encosta prosseguia plana, com algumas irregularidades no
terreno, mas sem nenhuma evidência de sulco
ou depressão que indicasse concentração de fluxo superficial. Outro aspecto importante quanto
às condições pré-ruptura é a característica do
muro, também destruído parcialmente com o
deslizamento. Trata-se de um muro divisório sem
drenagem, apoiado diretamente sobre o solo residual. Sua altura em relação à rua Pesqueira é
de cerca de 2,5m.
IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
723
Figura 3 - Foliação preservada no solo saprolítico
1.2.3 Deslizamento e Fatores Relevantes
De acordo com informações coletadas junto aos
moradores do local, o deslizamento envolveu
dois movimentos, ocorridos em instantes distintos. O primeiro, catastrófico, compreendeu o
talude escavado (com cerca de 3m de altura)
existente à montante das casas dos lotes 28 e
27, tendo mobilizado um volume de cerca de
80m3 de solo situado aproximadamente entre as
cotas 875m e 865m. O mesmo foi responsável
pela destruição da casa 28 e grande parte da
casa 27 e provocou o tombamento do muro divisório entre a Rua Pesqueira e as residências.
Observações do local após o deslizamento sugerem que este movimento foi do tipo raso (envolvendo profundidades da ordem de 1 a 2m),
com a superfície de ruptura ocorrendo na transição do solo maduro/aterro para o solo
saprolítico, numa forma essencialmente planar.
Um segundo movimento aconteceu cerca de
uma hora após o primeiro. Ele afetou o talude à
jusante da rua Pesqueira, tendo mobilizado um
volume de cerca de 25m3 e grande parte do material escorregado anteriormente. Estendeu-se
por cerca de 40m, gerando danos para as casas
da rua Caruaru, à jusante do deslizamento inicial. Este segundo movimento aparentemente não
724
envolveu superfície de ruptura definida, podendo ser caracterizado como uma decorrência de
processos de subsidência/corrida associados
ao material previamente movimentado.
Nenhuma evidência de existência de fontes
naturais de água, intermitentes ou não, foi observada no local, sendo que o curso de água
mais próximo ocorre à cerca de 60 m abaixo da
base do movimento. Tais aspectos indicam que
o nível d’água no local, se existente, deve ser
muito baixo, com movimento de massa tendo,
essencialmente, envolvido um perfil de solo residual não saturado. Por outro lado, relatos de
moradores, recortes de jornais e informações
da Defesa Civil indicaram a existência de uma
tubulação de água na crista do talude, que permaneceu rompida por no mínimo três dias antes
do acidente, esguichando água até cerca de 6m
de altura. Além disto, informações dos moradores indicam que, na parte média à alta do talude
rompido, encontrava-se posicionada pelo menos uma caixa de água, com capacidades de
cerca de 500L. Nas visitas efetuadas verificouse a existência de um pequeno platô, localizado
à direita da cicatriz do movimento, onde tal caixa poderia ter estado. Não há evidências, entretanto, de que a mesma tenha tido algum papel
relevante no primeiro escorregamento.
Com base nas informações acima fica aparente que o movimento de massa a ser entendido foi o que aconteceu primeiro. O mesmo ocorreu em um perfil de solo residual não saturado,
com o movimento tendo sido potencialmente
causado por aumento de poro-pressões em virtude de infiltração de águas na encosta.
2 INVESTIGACOES DE CAMPO E
LABORATÓRIO
2.1 Investigações de Campo
As investigações de campo compreenderam um
levantamento plano-altimétrico detalhado da
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área do escorregamento e de seu entorno, a
execução de sondagens à percussão, a execução de ensaios de permeabilidade visando a
determinação da condutividade hidráulica
saturada-não saturada dos diferentes materiais existentes no local, e a retirada de amostras
indeformadas e amolgadas de materiais representativos do perfil de solo envolvido no movimento.
O levantamento plani-altimétrico compreendeu a determinação de curvas de níveis de
metro em metro e a definição de duas secções
topográficas,
uma
passando
pelo
escorregamento (seção 1) e, outra, por área não
movimentada (seção 2). As Figuras 4 e 5 mostram a seção 2 e a planta topográfica. A Figura
4 sugere que a inclinação do talude natural
pré-existente no local é elevada, da ordem de
35º. Nota-se, na Figura 5, o contorno da cicatriz do primeiro movimento, no topo do qual
encontra-se locada a tubulação de água rompida.
Foram executados quatro furos de sondagem à percussão com medida de SPT. Na Figura 4 encontra-se indicada a posição dos furos
de sondagem (SP1 a SP4). Conforme mostrado
na Figura, três dos furos foram efetuados ao
longo da cicatriz do primeiro escorregamento,
enquanto que, o quarto, o foi em área não afetada pelo movimento. Não foi detectado nível
de água nos furos de sondagem executados.
Tomando-se como base as observações de
campo e os resultados do levantamento plano-altimétrico e das sondagens à percussão,
foram definidos os perfis geológicos mostrados nas Figuras 6 e 7. Na Figura 6 tem-se uma
representação do perfil geológico atual, ou
seja, correspondente à condição pós-ruptura
da encosta. A Figura 7 mostra uma recomposição do perfil de solo original, ou seja, antes da
ocorrência do acidente. Ambos os perfis foram traçados considerando a seção CC’
indicada na Figura 5.
Figura 4 – Topografia do local do escorregamento
Figura 5 – Perfil topográfico passando por área não
afetada pelo movimento.
Figura 6 – Perfil geológico atual (pós-ruptura)
IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
725
Amostras indeformadas, do tipo bloco cúbico com cerca de 250mm de lado, foram
coletadas de cada um dos materiais identificados.
2.2 Investigações de Laboratório
Figura 7 – Perfil geológico recomposto (pré-ruptura)
Os ensaios de permeabilidade foram realizados utilizando um permeâmetro tipo Guelph
(Campos et al, 1992; Moreira et al, 1997) Foram
executados ensaios visando à determinação da
condutividade hidráulica dos três materiais identificados no perfil. Os resultados obtidos nestas investigações encontram-se resumidos na
Tabela 1.
As investigações de laboratório compreenderam a determinação de teores de umidade de
amostras do SP4, ensaios de caracterização, de
permeabilidade saturada, de retenção de umidade e de cisalhamento direto nos diferentes
materiais identificados no perfil.
2.2.1 Caracterização dos Materiais
As Tabelas 2, 3 e 4 apresentam dados básicos
de classificação geotécnica e índices físicos
associados aos materiais do perfil.
Tabela 2 – Caracterização dos materiais.
Tabela 1 – Resultados dos ensaios de condutividade hidráulica executados no campo.
Tabela 3 – Granulometria dos materiais
ksat = permeabilidade saturada.
Chama a atenção, na Tabela 1, a ocorrência
de um valor de permeabilidade saturada no solo
maduro, em torno da profundidade de 0,40m,
cerca de duas ordens de magnitude menor que
a observada no solo saprolítico subjacente. Das
observações de campo, é aparente que tal
descontinuidade hidráulica ocorre próximo ao
contato solo maduro-solo saprolítico.
726
Tabela 4 – Índices físicos.
γt = peso específico total; γd = peso específico seco; w
= teor de umidade; e = índice de vazios; S = grau de
saturação.
IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
Com base no Sistema Unificado de Classificação dos Solos (SUCS), o aterro e o solo maduro apresentam características similares, sendo classificados como solos arenosos com finos plásticos (SC). A principal diferença entre
os mesmos encontra-se nos teores de finos (fração silte mais argila) e de argila, ligeiramente
maiores no caso do solo maduro que, consistentemente, também apresenta uma plasticidade
maior que a do aterro. Considerando o índice
de atividade de Skempton, ambos os materiais
apresentam baixa atividade. Isto sugere que o
mineral argílico presente na fração fina dos mesmos deve ser a caulinita.
O solo saprolítico, de origem gnáissica, compreende um material essencialmente arenoso,
bem graduado, com poucos finos, não plásticos. De acordo com o SUCS, é um solo tipo SW.
das de acordo com de Campos et al. (1992), ou
seja, umedecendo ou secando os corpos de prova a partir da umidade natural dos mesmos. As
curvas encontram-se plotadas em termos do teor
de umidade volumétrico, θ, assumindo que os
corpos de provas utilizados nos ensaios não apresentam variações de volume nos processos de
umedecimento e secagem impostos.
Figura 8 – Curvas de retenção de umidade
2.2.2 Permeabilidade Saturada
2.2.4 Resistência ao Cisalhamento
A permeabilidade saturada dos materiais foi
determinada a partir da execução de ensaios,
em amostras indeformadas, utilizando
permeâmetros de parede flexível. Os resultados
obtidos são apresentados na Tabela 5.
Tabela 5 – Permeabilidade saturada em laboratório.
2.2.3 Relação Umidade-Sucção
As características de resistência dos materiais
foram obtidas a partir da execução de ensaios
de cisalhamento direto em amostras moldadas
verticalmente, submersas imediatamente antes
da aplicação da tensão normal de adensamento,
e cisalhadas sob condições drenadas.
A Figura 9 mostra as envoltórias obtidas.
Nota-se, nesta Figura, que os materiais de aterro e solo maduro apresentam envoltórias praticamente coincidentes dentro da gama de tensões normais investigada. Os parâmetros de
resistência definidos a partir dessas envoltórias,
válidos para uma condição próxima da saturação, estão resumidos na Tabela 6.
Tabela 6 – Parâmetros de resistência
As curvas de retenção de umidade dos três materiais, representadas na Figura 8, foram obtidas utilizando a técnica do papel filtro (Marinho, 1994;
Vilar & de Campos, 2001). Tais curvas foram obtiIV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
727
Figura 9 – Envoltórias de resistência ao cisalhamento
dos materiais do perfil.
Figura 10 – Malha de elementos finitos.
3 ANÁLISES DE FLUXO
características de sucção) e as respectivas funções de permeabilidade (relação condutividade
hidráulica – sucção mátrica para cada material).
No programa SWMS_2D, utilizado na análise
de fluxo, as propriedades hidráulicas são descritas pelas equações de van Genuchten
(Simunek, Vogel e van Genuchten, 1994), que
requerem o conhecimento dos seguintes
parâmetros: θr = teor de umidade volumétrico
residual; θs = teor de umidade volumétrico correspondente ao valor da sucção mátrica a partir
do qual ocorre entrada de ar no solo saturado;
ks = permeabilidade do solo saturado e n e α =
parâmetros de ajuste.
Na Tabela 7 encontram-se resumidos os
parâmetros hidráulicos adotados nas análises
de fluxo. Os valores de permeabilidade saturada
foram definidos a partir dos resultados das investigações de campo de laboratório efetuadas.
Os parâmetros θr e θs, bem como a função de
permeabilidade, foram definidos a partir do ajuste do modelo de van Genuchten aos pontos
das curvas características de sucção obtidos
em laboratório.
As análises de fluxo saturado-não saturado foram efetuadas utilizando o programa
SWMS_2D, desenvolvido pelo U. S. Salinity
Laboratory (Simunek, Vogel e van Genuchten,
1994). O programa SWMS_2D é um programa
de domínio público que simula o fluxo
bidimensional num meio de saturação variável.
O programa resolve numericamente, pelo método dos elementos finitos, a equação de Richards
para o fluxo saturado-não saturado.
3.1 Geometria e malha
A geometria adotada na análise de fluxo foi obtida a partir da reconstituição da geometria do
perfil local anterior ao acidente, reproduzida na
Figura 5. A Figura 10 mostra a malha de elementos finitos utilizada, formada por 14.911 elementos e 7.722 nós. Esta malha foi obtida a partir de
geração automática, utilizando préprocessadores desenvolvidos na PUC-Rio,
adaptados ao código SWMS_2D.
Tabela 7 – Parâmetros hidráulicos
3.2 Propriedades hidráulicas
As propriedades hidráulicas necessárias para a
execução de uma análise de fluxo não-saturado/
saturado compreendem as curvas de retenção
de umidade dos materiais envolvidos (curvas
728
IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
3.3 Condições de contorno
3.4 Condições iniciais
As condições de contorno impostas na modelagem de fluxo estão representadas na Figura
11. Estas condições são condição atmosférica
(precipitação e evapotranspiração) no talude e
impermeável nos outros contornos relativos às
ruas, à base do domínio e aos limites laterais.
As condições iniciais, em termos de carga hidráulica de pressão, no domínio de modelagem
são apresentadas na Tabela 8. Estes valores
foram obtidos através dos valores de teor de
umidade das amostras na condição natural. A
partir destes valores de umidade de laboratório
foram definidos os valores de carga de pressão
através das curvas características de sucção.
Tabela 8 – Condições iniciais
Figura 11 – Condições de contorno
A Figura 12 mostra os dados pluviométricos
diários em um período próximo ao dia do
deslizamento. Estes dados foram coletados de
duas estações pluviométricas existentes em
Nova Friburgo. A evaporação potencial foi estimada em 45,7mm/mês, que corresponde a
evapotranspiração potencial média para o mês
de abril, no período de 1961 a 1990.
Figura 12 – Dados pluviométricos
3.5 Resultados obtidos
Para as análises de fluxo foram consideradas
quatro situações diferentes:
Caso 1a: sem rompimento da tubulação,
Caso 2a: com rompimento da tubulação,
Caso 1b: idem Caso 1a, considerando a existência de uma camada mais impermeável no contato solo maduro – solo saprolítico,
Caso 2b: idem Caso 1b, considerando a existência de uma camada mais impermeável no contato solo maduro – solo saprolítico.
Para simular a condição de rompimento da
tubulação, impôs-se uma carga de pressão nula
e constante na posição da tubulação rompida. A
camada mais impermeável no contato solo maduro – solo saprolítico tenta representar o contraste de permeabilidades medido no campo.
Na Figura 13 está plotada a evolução da carga hidráulica de pressão com o tempo, em três
pontos locados na superfície de ruptura, para
os quatro casos estudados.
Pode-se observar que a consideração do
rompimento da tubulação na análise tem uma
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729
grande influência nas poro-pressões do ponto
1 (região superior do talude). A consideração
da existência de um contato mais impermeável
mostra mais influência no ponto 2 (região inferior do talude).
Figura 14 – Superfície de ruptura pré-definida –
FS:0,803.
Figura 13 – Evolução da carga hidráulica com o tempo
4 ANÁLISES DE ESTABILIDADE
As análises de estabilidade foram efetuadas
utilizando o programa SLOPE/W. O programa
permite avaliar a estabilidade de encostas em
condições saturadas e não saturadas, com procura automática da superfície de ruptura. Adicionalmente a estas análises foram feitas também
análises tipo talude infinito.
4.1 Condição saturada
A primeira situação analisada foi uma superfície de ruptura pré-definida, coincidente com a
superfície determinada após a ruptura, de acordo com os dados topográficos. Esta situação
foi analisada considerando o solo saturado e
com os parâmetros de resistência efetivos.
Simularam-se varias condições, considerando a ruptura como um todo (Figura 14), e a ruptura da parte superior (Figura 15) que é a condição que se apresenta mais consistente com as
observações de campo. Os fatores de segurança obtidos, em todos os casos, são menores
que a unidade.
730
Figura 15 – Superfície de ruptura pré-definida – FS:
0,888.
Utilizou-se também a opção de procura automática da superfície critica do programa, a
imposição de trincas no topo e limites nas regiões de entrada e saída possíveis da superfície
de ruptura. Nestes casos os resultados não foram satisfatórios, i.e. as superfícies fornecidas
pelo programa não resultaram coincidentes com
a superfície de ruptura real.
4.2 Análises considerando os resultados das
análises de fluxo
Da Figura 13 nota-se que as situações mais criticas para a estabilidade da encosta são os casos 2a e 2b, onde ocorre uma queda importante
no valor das poro-pressões pela infiltração de
água. Para estes dois casos foram analisadas
diversas situações, considerando superfície de
ruptura pré-definida, procura automática da
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superfície e procura automática com limites de
entrada e saída da superfície de ruptura. Em todos as análises utilizou-se os valores de sucção resultantes da análise de fluxo nos casos
2a e 2b e considerando que φb=φ’. Nas Figuras
16 e 17 estão apresentados alguns dos resultados obtidos. Destas figuras pode se observar
que o coeficiente de segurança é maior que a
unidade e que não apresenta variação com os
valores de sucção impostos nos casos 2a e 2b.
De maneira similar ao acontecido com as análises na condição saturada sem geração de poropressões, quando se utilizou a opção de procura automática, as superfícies fornecidas pelo
programa não resultaram coincidentes com a
superfície de ruptura real.
Na condição de umidade natural, para a superfície pré-definida se obteve um coeficiente
de segurança de 3,665. A procura automática da
superfície apresenta as mesmas limitações que
nos casos já descritos.
Figura 16 – Caso 2a – Superfície pré-definida. FS: 5,543.
Tabela 9 – Parâmetros adotados
Figura 17 – Caso 2b – Superfície pré-definida. FS: 5,542.
4.3 Análises Tipo Talude Infinito
Para as análises tipo talude infinito foi considerado que a superfície de ruptura coincide com o
contato solo maduro-solo saprolítico. Esta situação foi simulada considerando a condição
saturada sem geração de poro-pressões, a condição saturada com formação de nível freático e a
condição não saturada. Para todas estas condições foi feita uma análise bi e outra tridimensional.
As formulações adotadas para calcular os coeficientes de segurança no caso tridimensional
correspondem às propostas por Wolle (1988).
Também, de acordo com este autor, a sobrecarga
de vegetação varia na faixa de 0 a 3kPa. Nas análises realizadas foram adotadas sobrecargas de 1
e 3 kPa, não se observando nenhuma variação
significativa do fator de segurança em função do
valor de sobrecarga utilizado.
Os parâmetros adotados nas análises estão
resumidos na Tabela 9. Na Tabela 10 estão apresentados os resultados obtidos nestas análises.
z= profundidade da sup. de ruptura, L= comprimento
da sup. de ruptura, α= inclinação da sup. de ruptura,
∆p= sobrecarga da vegetação.
IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
731
Tabela 10 – Fatores de segurança
(*) em relação à superfície de ruptura
5 CONCLUSÕES
Os resultados das análises apresentadas, embora envolvendo algumas hipóteses simplificadoras
com relação aos parâmetros dos materiais (φb) e
às condições iniciais do terreno (topografia original, evapotranspiração), permitem um entendimento do mecanismo de instabilização da encosta, que se dá essencialmente pela infiltração
de água em meio não saturado. Os resultados do
método de talude infinito indicam que a
instabilização da encosta pode ter acontecido
sob condições tridimensionais, como resultado
da geração de poro-pressões positivas pequenas no contato solo maduro-solo saprolítico. A
ocorrência de uma diminuição nos valores de
sucção resulta evidente das análises de fluxo e
também destas análises é possível observar que
o principal responsável pela queda de sucção é
o vazamento da tubulação.
Uma das principais limitações para modelar o
fluxo na encosta é a definição das condições inicias de umidade e sucção. Nas análises apresentadas optou-se pela determinação a partir das
condições de umidade de laboratório. Presentemente estão sendo modeladas outras situações
considerando condições iniciais de umidade e
sucção a partir das condições de campo, e com
uma pressão equivalente a uma coluna de água
de 4m na tubulação rompida.
732
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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T.M.P. (1992). Avaliação de campo da
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de Campos, T.M.P., Delgado, C.C., Tibana, S.,
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RJ. V. 3, 853-871.
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Moreira, B.D.M.; Vargas Jr., E.A.; de Campos,
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3 0 Simpósio Brasileiro de Solos Não
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IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA
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