Castro Alves em um olhar Cigano
Escrito por Cezarina
Dom, 24 de Abril de 2011 11:42
Sempre me encantei com a poesia de Castro Alves, o último poeta do Romantismo brasileiro,
nascido em 14/03/1847 (Muritiba) e morto em 06/07/1871 (Salvador/Bahia)
Tudo o que sei sobre o dom inato para as artes dos ciganos tornou-se claro e evidente diante
de meus olhos deslumbrados! Na longa história do Povo Rom repetem-se os casos de grandes
poetas, músicos, artistas, dançarinos que marcaram época no cenário artístico e literário
mundial.
Entretanto, como sempre aconteceu, o preconceito falou mais alto, escondendo por décadas,
quiçá séculos, a origem romani desses grandes artistas. Isto me revolta sobremaneira! Faz-me
ver o quanto de injustiça e discriminação sempre marcou a trajetória de nosso povo!
Fui procurar em fontes confiáveis a procedência desse fato. Na sua página da Internet o
insigne ciganólogo, escritor, antropólogo e lingüista Athos Vilas Boas da Motta assim se refere
ao fato histórico: “A comovente informação oral que eu ouvi, foi aquela em que a sua dileta
irmã Adelaide ao enxugar-lhe a fronte ouvira, apesar de ofegante: Querida irmã, guarde este
lenço, pois com ele você está enxugando o suor da minha agonia!...". Com esta recomendação
final, o nosso poeta fechou os olhos para o mundo, abrindo-os na eternidade, mas os reabriu,
indiretamente, na memória popular que não os esquece. Por falar em olhos de Castro Alves,
cabe aqui uma interessante observação: Examinando as fotografias deste poeta, sempre nelas
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notei ser demasiado branca a alva de seus olhos, cuja explicação, baseada em vetores
antropológicos, só muito mais tarde pude encontrar explicação: Castro Alves era descendente
de ciganos, pois sua mãe - Dona Clélia Viegas, posteriormente Clélia Brasília Castro Alves - o
era. Um dos traços característicos da maioria dos boêmios*: tez morena azeitona, gengivas
arroxeadas, alva dos olhos bastante branca, agilidade gestual, etc. Pedro Calmon (1902-1985)
em sua obra "Vida de Castro Alves", (última edição), auxiliado por sua dedicada irmã Dona
Romana, conseguiu localizar, num livro de registro de nascimento, a constatação de que a sua
progenitora era cigana, pois o atento vigário, com sua letra bastante legível, qualificou a
batizante e seus padrinhos com o termo: ciganos. O biógrafo ainda esclarece que a condição
de zíngaro do nosso poeta sempre foi um segredo mantido a sete chaves pela própria família.
O preconceito, ontem e hoje, teve e ainda tem muita força!”(Extraído de
http://melodia93.com.br/Sessao.aspx?cod=768
).
Em outros artigos pude recolher informações sobre a genealogia de sua família. No livro de
Alberto da Costa e Silva “CASTRO ALVES” (Editora COMPANHIA DAS LETRAS): “O ponto de
partida do perfil é a escravidão, que dava base à vida brasileira. O ponto de chegada é também
a escravidão, mas dessa vez abolida. Entre os dois pontos está a curta trajetória de Castro
Alves, que morreu com apenas 24 anos e, no entanto, teve papel importantíssimo na libertação
dos escravos e na crítica ao sistema de uma forma geral.”
Prosseguindo o autor nos revela dados familiares do poeta baiano como o fato de seus avós
paternos terem sido solteiros. “O avô materno, o coronel Antônio José da Silva Castro era um
sertanejo de antepassados paulistas, grande senhor de terras, de seu inventário constam
dezesseis fazendas - e famoso por sua valentia e participação em quase todas as insurreições
militares, antes e depois da Independência, como revoltoso ou como repressor”. No
assentamento de batismo de Clélia (mãe de Castro Alves) não constava o nome da mãe, mas
que era filha natural do fazendeiro e major, Antônio José da Silva Castro. A mãe de Clélia teria
sido uma cigana de origem espanhola, Ana Viégas, falecida quando ela ainda era pequenina.
Em outro artigo pude constatar que Ana Viégas era uma artista espanhola de origem cigana,
daí o fato de se guardar muito bem o segredo de família. Sempre o preconceito tentando
mudar a história, escondendo a verdade!
Pelos traços marcantes de sua personalidade podemos constatar a expressão mais fiel da
alma cigana: era um apaixonado pela vida, um belo rapaz, de porte esbelto, tez pálida, grandes
olhos vivos e profundos, negra e farta cabeleira, voz grave, dons e maneiras que
impressionavam a multidão, impondo-se à admiração dos homens e arrebatando paixões às
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mulheres. Seus primeiros romances nos fizeram sentir em seus versos, os mais belos poemas
líricos do Brasil. Era de uma intensidade dramática em suas emoções, expressando em seus
poemas toda a sua ardente paixão e entusiasmo pelos ideais abolicionistas e republicanos. Era
bem um artista cigano! Dedicando-se à pintura e ao desenho, Castro Alves produziria várias
telas a óleo e esboços à lápis ao longo de sua curta, porém intensa existência. Também foi
teatrólogo de valor, tocava bem o violão, sendo repentista e improvisador de primeira (herança
de seu sangue Calon). Mas a beleza e o brilho de sua poesia colocou em segundo plano todos
os outros talentos. O poeta baiano era um amante da Natureza, um noctívago, boêmio
apaixonado pela noite, festeiro como todos os ciganos, bom dançarino e fumante inveterado.
Simpático, elegante, um “Don Juan” incansável, cortejando e seduzindo as mulheres de sua
época com suas maneiras gentis.
Considerado o poeta do povo, o poeta que sonhou com a liberdade dos escravos e com a
República, um dos maiores poetas brasileiros, era cigano! Que orgulho!
Para finalizar, deixo aqui um trecho de um de seus poemas - “SUB TEGME FAGI”:
(...) Vem comigo cismar risonho e grave...
A poesia — é uma luz... e a alma — uma ave...
Querem — trevas e ar.
A andorinha, que é a alma — pede o campo.
A poesia quer sombra — é o pirilampo...
Pra voar... Pra brilhar.
Meu Deus! Quanta beleza nessas trilhas...
Que perfume nas doces maravilhas,
Onde o vento gemeu! ...
Que flores de ouro pelas veigas belas!
... Foi um anjo com a mão cheia de estrelas
Que na terra as perdeu.
Aqui o éter puro se adelgaça...
Não sobe esta blasfêmia de fumaça
Das cidades para o céu.
E a Terra é como o inseto friorento
Dentro da flor azul do firmamento,
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Cujo cálice pendeu! ...
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