Interciencia
ISSN: 0378-1844
[email protected]
Asociación Interciencia
Venezuela
da Silva Pimentel Rocha, Michelle; da Silva Mourão, José; de Medeiros Silva Souto, Wedson; Duarte
Barboza, Raynner Rilke; da Nóbrega Alves, Rômulo Romeu
O uso dos recursos pesqueiros no estuário do Rio Mamanguape, Estado Da Paraíba, Brasil
Interciencia, vol. 33, núm. 12, diciembre, 2008, pp. 903-909
Asociación Interciencia
Caracas, Venezuela
Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=33913807
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Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto
O Uso dos Recursos Pesqueiros no Estuário do Rio
Mamanguape, Estado da Paraíba, Brasil
Michelle da Silva Pimentel Rocha, José da Silva Mourão, Wedson de Medeiros Silva Souto,
Raynner Rilke Duarte Barboza e Rômulo Romeu da Nóbrega Alves
RESUMO
O complexo estuário-manguezal possui um elevado capital
natural, fornecendo diversos serviços ecológicos e recursos naturais para as comunidades costeiras, de uso na subsistência
ou na economia local. O presente trabalho teve como objetivo
inventariar os usos dos recursos pesqueiros provenientes do estuário do Rio Mamanguape localizado no Estado da Paraíba,
Brasil. Para isto, foi utilizada uma proposta metodológica que
envolveu a combinação de métodos qualitativos (entrevistas e
observação direta) e quantitativos (valor de uso e concordância de uso principal corrigido). Foram entrevistadas 30 pessoas,
sendo registrado o uso de 68 espécies, entre peixes, crustáceos
e moluscos. As espécies mais importantes foram Opisthonema
oglinum, Anomalocardia brasiliana, Mugil curema, Crassostrea
rhizophorae, Ucides cordatus, Centropomus sp. e Panulirus argus. As espécies são utilizadas principalmente para comercialização e consumo local, entretanto, algumas delas são utilizadas
para fins medicinais (usos zooterapêuticos) e como iscas para
captura de outras espécies. A biodiversidade de recursos explorados registrada neste trabalho evidencia a importância dos
manguezais para as comunidades que aí se desenvolvem e os
dados obtidos podem servir de base para a elaboração de projetos de manejo que visem à conservação dos recursos e da diversidade cultural.
Introdução
tantes para a manutenção da
biodiversidade e para a sobrevivência das comunidades
humanas costeiras (Rönnbäck,
1999; Prost e Loubry, 2000).
Manguezais formam a base de
uma complexa rede alimentar
que mantém estuários, zonas
O complexo estuário-manguezal representa uma zona
de transição entre os habitats de águas doce e marinho
apresentando, assim, uma alta
variação de parâmetros am-
bientais, como turbidez, concentração de alimento e salinidade (Odum e Barret, 2007).
Esses fatores são responsáveis
por uma elevada produtividade
biológica fornecedora de uma
ampla variedade de recursos
ecológicos e naturais impor-
costeiras e algumas áreas de
pesca (Patu, 2002).
Muitas comunidades litorâneas obtêm sua subsistência
dos manguezais por meio da
pesca, da exploração de madeira e /ou turismo (Glaser
e Grasso, 1998; Rönnbäck,
PALAVRAS CHAVE / Biodiversidade / Complexo Estuário-Manguezal / Conservação / Recursos Pesqueiros /
Recebido: 11/02/2008. Modificado: 29/09/2008. Aceito: 02/10/2008.
Michelle da Silva Pimentel Rocha. Mestranda em Desenvolvimento e Meio Ambiente,
Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Brasil. Endereço:
Avenida das Baraúnas, Campina Grande, Paraíba 58109-753,
Brasil. email: [email protected]
José da Silva Mourão. Doutor em
Ecologia e Recursos Naturais,
Universidade Federal de São Carlos, Brasil. Mestre em Ciências
Biológicas, Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Brasil.
Professor, UEPB, Brasil. e-mail:
[email protected]
DEC 2008, VOL. 33 Nº 12
Wedson de Medeiros Silva
Souto. Mestrando em Desenvolvimento e Meio Ambiente, UEPB, Brasil. Bolsista do
DAAD (Deutscher Akademischer Austausch Dienst). e-mail:
[email protected]
Raynner Rilke Duarte Barbosa. Mestrando em Ciência e
0378-1844/08/12/903-07 $ 3.00/0
Tecnologia Ambiental, UEPB,
Brasil. email: raynner.rilke@
uol.com.br
Rômulo Romeu da Nóbrega
Alves. Mestre e Doutor em
Ciências Biológicas, UFPB,
Brasil. Professor, UEPB, Brasil. e-mail: romulo_nobrega@
yahoo.com.br
903
USE OF FISHING RESOURCES IN THE MAMANGUAPE RIVER ESTUARY, PARAIBA STATE, BRAZIL
Michelle da Silva Pimentel Rocha, José da Silva Mourão, Wedson de Medeiros Silva Souto, Raynner Rilke Duarte Barboza and
Rômulo Romeu da Nóbrega Alves
SUMMARY
Estuary-mangrove complexes possess a rich natural capital
and furnish diverse ecological services and natural resources
to local coastal communities for both subsistence and economic ends. The present work presents an inventory of the uses of
fishing resources at the Mamanguape River estuary, located in
Paraíba State, Brazil. The inventory was prepared using a methodological approach that involved a combination of qualitative
(interviews and direct observations) and quantitative (use-value
and corrected principal-use concordance) approaches. A total of
30 people were interviewed and 68 species of fish, crustaceans
and mollusks were identified as being used. The most important
species were Opisthonema oglinum, Anomalocardia brasiliana,
Mugil curema, Crassostrea rhizophorae, Ucides cordatus, Centropomus sp. and Panulirus argus. The species harvested are
principally commercialized or consumed locally, although some
are used for medicinal (zootherapeutic) purposes and as bait to
capture other species. The biodiversity of the resources reported
here is indicative of the importance of mangrove swamps for the
local communities, and the data can be used for the design of
management projects directed towards the conservation of both
regional natural resources and cultural diversity.
UTILIZACIÓN DE LOS RECUSOS PESQUEROS EN EL ESTUARIO DEL RÍO MAMANGUAPE, ESTADO DE
PARAIBA, BRASIL
Michelle da Silva Pimentel Rocha, José da Silva Mourão, Wedson de Medeiros Silva Souto, Raynner Rilke Duarte Barboza y
Rômulo Romeu da Nóbrega Alves
RESUMEN
El complejo estuario-manglar tiene un elevado capital natural, proporcionando varios servicios ecológicos y recursos naturales a las comunidades costeras, para el uso en la subsistencia
o en la economía local. El presente trabajo tuvo como objetivo
inventariar los usos de los recursos pesqueros provenientes del
estuario del Río Mamanguape (ERM), localizado en el Estado
de Paraíba, Brasil. Para ello fue utilizada una propuesta metodológica que incluyó la combinación de métodos cualitativos
(entrevistas y observación directa) y cuantitativos (valor de
uso y concordancia de uso principal corregido). Fueron entrevistadas 30 personas, registrándose el uso de 68 especies entre peces, crustáceos y moluscos. Las especies más importantes
1999; Prost e Loubry, 2000;
Alves e Nishida 2002, 2003;
Mourão e Nordi, 2002, 2006;
Dias, 2006; Hanazaki e Begossi, 2006). Contudo, os
manguezais são extremamente
frágeis e vêm sofrendo severos
impactos ambientais que, conseqüentemente, acarretam em
ameaças a qualquer atividade
dependente desses ecossistemas.
A implementação de medidas conservacionistas visando
à preservação dos manguezais e ecossistemas costeiros
necessitam integrar o conhecimento das comunidades tradicionais que vivem próximas
ou inseridas nessas áreas. No
Brasil, a lei 9.985 de 18 de
junho de 2000 (Artigo 5º),
que criou o Sistema Nacional
de Áreas Protegidas, assegura
que comunidades tradicionais
904
e populações indígenas que
vivem em áreas protegidas
devem tomar parte no processo de estabelecimento ou
de administração e monitoramento de tais áreas (Patu,
2002). O conhecimento local
é um recurso valioso que deve
ser considerado em planos de
desenvolvimento e em estudos
de manejo do meio ambiente
(Alves e Rosa, 2005; Drew,
2005; Pedroso Junior e Sato,
2005), sendo impossível desenvolver modelos sustentáveis
de apropriação dos recursos
naturais sem antes estudar a
experiência adquirida pelas
culturas locais durante os ciclos de interação com o ecossistema (Toledo e Castillo,
1999).
Desta forma, o presente
estudo teve como proposta
inventariar os recursos faunís-
identificadas fueron Opisthonema oglinum, Anomalocardia brasiliana, Mugil curema, Crassostrea rhizophorae, Ucides cordatus,
Centropomus sp. y Panulirus argus. Las especies son utilizadas
principalmente para la comercialización y consumo local; sin
embargo, algunas de ellas son utilizadas para fines medicinales
(usos zooterapéuticos) y como cebo para la captura de otras especies. La biodiversidad de recursos registrada en este trabajo
demuestra la importancia de los manglares para las comunidades que allí se desenvuelven y los datos obtenidos pueden servir
de base para la elaboración del proyectos de manejo que persigan la conservación de los recursos e en la diversidad cultural.
ticos associados ao manguezal
que são usados pelas comunidades de Barra de Mamanguape e Lagoa de Praia, estuário
do Rio Mamanguape (Estado
da Paraíba, Brasil), estabelecendo os usos e a importância
desses recursos para a reprodução do modo de vida dessas
comunidades e contribuindo
para o desenvolvimento posterior de planos de manejo e
uso sustentável das espécies
faunísticas usadas por indivíduos que aí residem.
Área de Estudo
O estuário do Rio Mamanguape (ERM; Figura 1) está
localizado no litoral norte
do Estado da Paraíba, entre
6°43’02’’ e 6º51’54’’S e entre
35°67’46’’ e 34°54’04’’O. Possui uma extensão aproximada
de 25km no sentido leste-oeste e uma largura de 5km no
sentido norte-sul, constituindo
uma área de 16400ha que faz
parte da Área de Proteção
Ambiental (APA) de Barra
de Mamanguape, criada pelo
Decreto Federal Nº 924, de
10 de setembro de 1993, cujo
objetivo é proteger os ecossistemas costeiros e o peixe-boi
marinho (Trichechus manatus
Linnaeus, 1758; Mourão e
Nordi, 2002, 2003).
A porção estuarina da APA
abrange uma vasta extensão
de manguezal, com aproximadamente 6000ha de mangue,
representando a maior área de
mangue do Estado da Paraíba.
Este manguezal apresenta-se
como um dos mais preservados do Estado, apesar da
inf luência antrópica com a
retirada de madeira pelos ri-
DEC 2008, VOL. 33 Nº 12
beirinhos, do cultivo
dade e consistência
da cana-de-açúcar e
das informações,
da recente implantarecorreu-se à repeção da carcinicultutição das entrevistas
ra (Alves e Nishida,
em situações sincrô2003). A contaminicas, onde a mesnação gerada pelos
ma pergunta é feita
produtos proveniena pessoas diferentes,
tes da agroindústria
em tempo bastante
canavieira, associada
próximo (Maranhão,
ao desmatamento do
1975). Os nomes
manguezal, tem ocavernaculares das essionado transformapécies foram regisções que se refletem
trados como citados
na redução da propelos entrevistados,
dução pesqueira e no
sendo a identificação
assoreamento do leito
feita através de fotodo rio (Alves et al.,
grafias, especialistas,
2005).
trabalhos etnoecológiA pesquisa foi recos e etnotaxonômializada junto às cocos já realizados na
munidades de Barra
área (Mourão, 2000;
de Mamanguape e
Mourão e Nordi,
Lagoa de Praia, lo2002, 2003; Nishida
calizadas na APA de
et al., 2004, 2006)
Barra de Mamanguae bibliografia espepe, às margens do
cializada (Figueiredo
ERM. Essas comue Menezes, 1980a,
nidades são consti1980b, 1985).
Figura 1. Localização do Estuário do Rio Mamanguape e Área de Proteção Ambiental
tuídas basicamente
Para a abordagem
de Barra de Mamanguape.
por uma mistura de
quantitativa, cuja fielementos indígenas,
nalidade foi quantiquantitativos para possibilitar
negros e brancos e que desenestruturadas, visando à obtenficar os recursos explorados e
uma abordagem responsavelvolvem suas atividades pesção de dados sobre a exploraapontar quais os de maior immente equilibrada, devendo-se
queiras na área de entorno e
ção, utilização e conservação
portância para as comunidades
reconhecer a legitimidade de
no próprio Rio Mamanguape
dos recursos provenientes do
estudadas, foi organizada uma
ambos os métodos e buscar,
(Paludo e Klonowski, 1999;
complexo estuário-manguezal
listagem contendo todas as
se e quando necessário, a sua
Mourão e Nordi, 2006). A
do Rio Mamanguape. As enespécies da fauna citadas por
integração, pois uma fornece
oferta de emprego nesta área
trevistas realizadas para esta
cada entrevistado, bem como
respostas às perguntas que
é praticamente inexistente, a
abordagem foram aplicadas
sua utilidade. Baseando-se
a outra, pelas suas próprias
não ser como mão-de-obra
individualmente a 30 pessoas
em Silvano et al. (2002), os
limitações, não consegue dar
para as fazendas de cana-de(20 homens e 10 mulheres),
usos dos recursos faunísticos
(Marques, 2002).
açúcar e na atividade turística,
sendo 18 entrevistados da coforam agrupados em quatro
Para a abordagem qualitatique está em desenvolvimento
munidade de Barra de Macategorias: comercialização
va, por meio da qual procurou
no local. Apesar de a região
manguape e 12 entrevistados
(onde os recursos capturados
obter os dados a respeito do
ser rica em recursos naturais,
pertencentes à comunidade de
são destinados à venda por
contexto pesqueiro a ser esa população é pobre, apreLagoa de Praia. As entrevistas
apresentarem valor comercial),
tudado, foram utilizados os
sentando homogeneidade no
foram registradas graficamenconsumo local (onde os recurmétodos de entrevista aberquadro socioeconômico entre
te e, quando permitido pelo
sos capturados são utilizados
ta e semi-estruturada, e de
as famílias (Mourão, 2000).
entrevistado, eletromagnetiapenas para alimentação por
observação direta (Bernard,
camente, com a utilização de
não possuírem valor comer1994; Marques, 1995; Viertler,
Métodos
um mini-gravador portátil e
cial), medicinal (corresponde
2002). A amostragem foi nãofitas micro-cassetes, sendo as
aos recursos utilizados para o
Procedimentos
aleatória intencional (Almeida
informações posteriormente
tratamento de doenças) e artee Albuquerque, 2002), na qual
transcritas.
fato de pesca (onde os recurOs trabalhos de campo
foram pré-definidos os entreOs dados obtidos foram anasos capturados são utilizados
ocorreram junto às comunivistados, aqui representados
lisados por meio da interpretacomo isca). O número de citadades de Barra de Mamanpor pescadores(as). Inicialção do discurso dos entrevistações para cada espécie e o núguape e Lagoa de Praia no
mente, realizaram-se entrevisdos (Mourão e Nordi, 2003),
mero de espécies citadas para
período de julho a outubro
tas abertas com a finalidade
com base no modelo de união
cada categoria de uso foram
2006, onde foram realizadas
de se conhecer aspectos da
das diversas competências inusados para a construção de
visitas periódicas a cada 15
interação entre as comunidadividuais (Hays, 1976), que
duas matrizes de dados, para
dias. Neste estudo foi utilizades-alvo e o complexo estuconsiste em considerar todas
posterior análise por meio de
da uma proposta metodológica
ário-manguezal. A partir das
as informações fornecidas por
técnicas quantitativas.
que envolveu uma combinainformações obtidas, foram
todos os entrevistados, sem exPara cada espécie citada foi
ção de métodos qualitativos e
realizadas entrevistas semiclusão. Para confirmar a valicalculado seu respectivo valor
DEC 2008, VOL. 33 Nº 12
905
de uso (VU), adaptado de Albuquerque et al. (2006), que
possibilitou demonstrar a importância relativa da espécie
conhecida localmente, independente da opinião do pesquisador (Alves e Rosa, 2007).
O valor de uso é calculado,
entrevistando-se cada indivíduo
uma única vez (Ferraz et al.,
2006), através da fórmula VU=
ΣU/n, onde VU: valor de uso da
espécie, U: número de citações
por espécie, e n: número de
informantes.
Para cada espécie também
foi calculado a concordância de
uso principal corrigido (CUPc),
que fornece a importância relativa de uma determinada espécie relacionando-a com os
usos comuns para essa espécie
em uma dada comunidade. O
cálculo foi baseado no trabalho
de Friedman et al. (1986), modificado por Amorozo e Gély
(1988); todavia, diferentemente
destes, mesmo espécies com
uma única citação foram consideradas, uma vez que o fator de
correção (FC) permite corrigir
eventuais distorções nos resultados. Sendo assim, temos:
CUP= (UP × 100)/E
FC= E/Em
CUPc= CUP × FC
onde CUP: concordância de
uso principal, UP: número de
informantes que citaram o(s)
uso(s) principal(is) da espécie,
E: número de informantes que
citaram a espécie (número de
citações por espécie), FC: fator de correção, Em: número
de informantes que citaram a
espécie mais citada, e CUPc:
concordância de uso principal
corrigido.
Resultados e Discussão
Recursos biológicos
explorados no ERM
Já pesquei caranguejo, siri,
aratu, ostra, marisco, lagosta,
peixe [...] Tudo que tem aqui
eu já pesquei (E., pescador de
Barra de Mamanguape).
Foi registrado o uso de 68
espécies de animais distribuídas
em três categorias taxonômicas: peixes (n= 48 espécies),
crustáceos (n= 15) e moluscos
906
(n= 6). Esses resultados corroboram com diferentes trabalhos
que apontam para a riqueza de
recursos explorados em áreas
de manguezais no Brasil e no
mundo (Hanazaki et al., 1996;
Pisey, 1997; Siddiqi, 1997; Vannucci, 1997; Paludo e Klonowski, 1999; Rönnbäck, 1999;
Silva, 2004; Dias, 2006).
Porém, é importante ressaltar
que o presente estudo leva em
consideração apenas a riqueza
de espécies que apresentam alguma importância de uso, seja
no sentido utilitário ou simbólico. Como afirma Silva (2004),
“falar de diversidade de espécies conhecidas por pescadores
é uma análise que vai além do
que o pescador menciona”, uma
vez que estes detêm, também,
um amplo conhecimento sobre
as espécies que não são utilizadas por eles. Este fato pode ser
verificado no seguinte relato:
Todo tipo de peixe que existe aqui no estuário e no mar,
acho que eu conheço quase
tudo (E., pescador de Barra de
Mamanguape).
Peixes
Nas comunidades estudadas,
foram registradas 48 espécies
de peixes pertencentes a 26
famílias e 38 gêneros (Tabela
I). As famílias de peixes mais
representativas em número de
espécies foram Carangidae e
Scombridae (4 espécies). Quanto ao número de citações por
espécies, que indica quais são
de fato as mais importantes
para os moradores locais, as
famílias mais representativas
entre os entrevistados (n= 204
citações) foram Clupeidae e
Mugilidae.
O número de espécies que
compõe a ictiofauna explorada
pelos pescadores artesanais das
áreas estudadas é expressivo
e demonstra a estreita relação
entre as espécies, as comunidades e o manguezal. A importância da ictiofauna para
as populações ribeirinhas vem
sendo alvo de muitos estudos
em áreas costeiras no Brasil.
Alguns exemplos são os trabalhos de Dias (2006) que,
em estudo sobre exploração
de recursos por pescadores
artesanais, registrou um total
de 50 espécies, pertencentes
a 38 gêneros e 30 famílias,
sendo Gerreidae e Lutjanidae
as famílias com maior número de espécies; já Ramires e
Barrella (2003) registraram 54
espécies, distribuídas em 28
famílias na Estação Ecológica
de Juréia-Itatins, em São Paulo.
Dentre as espécies citadas no
presente trabalho, a sardinhaazul (Opistonema oglinum Clupeidae) foi a que teve maior
número de citações (n= 28).
Segundo levantamento pesqueiro realizado em 1995 (dados
não publicados) na comunidade
de Barra de Mamanguape, pelos pesquisadores José da Silva
Mourão e Nivaldo Nordi (Universidade Estadual da Paraíba
e Universidade Federal de São
Carlos, respectivamente), foram
pescados cerca de 19,5ton de
sardinha-azul no período de um
ano. Este dado demonstra que
a comunidade, há muito tempo,
tem explorado intensamente
este recurso. Outras espécies
de peixes mais citadas foram a
tainha (Mugil curema - Mugilidae) e camurim (Centropomus
sp. - Centropomidae), com 19
e 15 citações, respectivamente.
O valor de uso (VU) para as
espécies de peixes utilizadas
variou de 0,03 a 0,93, sendo a
espécie O. oglinum com maior
VU (0,93) (Tabela I).
Estudos sobre a pesca artesanal, realizados tanto com
comunidades costeiras quanto
ribeirinhas, mostram que a diversidade de espécies de peixes
exploradas é ampla, sendo algumas espécies mais capturadas
e comercializadas que outras
(Silva e Begossi, 2004; Dias,
2006). Hanazaki et al. (1996),
em estudo sobre o uso dos recursos por pescadores da Ponta
do Almada, no Estado de São
Paulo, observaram que entre as
espécies mais exploradas está
a tainha (M. curema), sendo
registrada também a captura
de espécies pertencentes às famílias Clupeidae, Centropomidae e Scombridae. Silva (2004)
aponta que as espécies dos gêneros Mugil, Centropomus e
Cynoscion estão entre as de
maior importância na pesca artesanal de Canguaretama (RN).
Já Costa Neto (2000) registrou
que Mugilidae, Centropomidae
e Engraulidae estão entre as
famílias de destaque na pesca
artesanal do Município do Conde, Estado da Bahia, Brasil. As
famílias Clupeidae, Mugilidade e Centropomidae, portanto,
constituem-se dentre os recursos
mais valiosos e explorados nas
áreas estudadas do ERM, bem
como em estudos realizados em
outras áreas. Assim, a presença
de espécies que representam
recursos-alvo deve ser levada
em consideração no que diz
respeito à elaboração de práticas de manejo e conservação.
Crustáceos
Diversas espécies de crustáceos são capturadas pelas comunidades do ERM, a exemplo
de caranguejos, siris, lagostas e
camarões. No presente estudo
foram registradas 15 espécies
de crustáceos, pertencentes a
sete famílias e sete gêneros
(Tabela I). As famílias mais
representativas em número de
espécies citadas foram Portunidae, Grapsidae e Palinuridae. Já quanto ao número de
citações entre os entrevistados,
as famílias com maior representatividade foram Portunidae,
Palinuridae e Ocypodidae. Os
crustáceos representam um importante recurso explorado pelas
comunidades ribeirinhas que vivem próximas aos manguezais
e, segundo Alves e Nishida
(2003), representam um dos
grupos de maior relevância para
a economia doméstica de várias
famílias que se desenvolvem no
entorno dos manguezais. Para
Rönnbäck (1999), os crustáceos são recursos de grande
valor econômico e ecológico,
sendo os camarões da família
Panaeidae e os caranguejos os
exemplos mais importantes.
Dentre as espécies de crustáceos mais citadas nas comunidades estudadas, destacam-se:
lagosta-vermelha (Panulirus
argus - Palinuridae), caranguejo-uçá (Ucides cordatus - Ocypodidae) e goiamum (Cardisoma guanhumi - Gercacinidae).
O valor de uso registrado para
as espécies utilizadas variou
de 0,03 a 0,56, sendo P. argus
a que apresenta maior valor
de uso (0,56). Estudos sobre a
pesca de crustáceos, realizados
DEC 2008, VOL. 33 Nº 12
Tabela I
Valor de Uso e Concordância de Uso Principal corrigido das espécies animais utilizadas
por moradores do Estuário do Rio Mamanguape
Taxon
Mollusca
Família
Loliginidae
Mytilidae
Ostreidae
Ostreidae
Veneridae
Alpheoidea
Gercacinidae
Espécie
Nome local
Citações
por
espécie
Usos citados
UP
Informantes CUP
que citaram (%)
o UP
FC
CUPc VU
Lula
4
UM
UM
4
100
0,14 14,29 0,13
Sururu
4
CL
CL
4
100
0,14 14,29 0,13
Ostra
16
CL, COM, UM
CL
16
100
0,57 57,14 0,53
Ostra-de-mergulho
2
CL
CL
2
100
0,07 7,14 0,06
Marisco / Marisco-pedra 26
CL, COM
CL, COM
26
100
0,93 92,86 0,86
Crustacea
Tamaru
2
AP
AP
2
100
0,07 7,14 0,06
Caranguejo-goiamum /
12
CL, COM
CL
10
83,33 0,43 35,71 0,4
goiamum
Grapsidae
Aratu-vermelho /
6
CL
CL
6
100
0,21 21,43 0,2
Goniopsis cruentata
Aratu-do-Mangue
Grapsidae
Aratú das pedras
4
AP
AP
4
100
0,14 14,29 0,13
Aratus pisoni
Ocypodidae
Caranguejo uçá
16
COM
COM
16
100
0,57 57,14 0,53
Ucides cordatus
Palinuridae
Lagosta-cabo-verde
2
COM
COM
2
100
0,07 7,14 0,06
Panuliris laevicauda
Palinuridae
Lagosta-vermelha
17
CL, COM
CL
14
82,35 0,61 50
0,56
Panulirus argus
Panaeidae
Camarão
7
CL, COM
CL
7
100
0,25 25
0,23
Panaeus sp.
Portunidae
Siri-azul
11
COM
COM
11
100
0,39 39,29 0,36
Callinectes danae
Portunidae
Siri-cagão
2
CL
CL
2
100
0,07 7,14 0,06
Callinectes bocourti
Portunidae
Siri-de-mangue
3
CL
CL
3
100
0,11 10,71 0,1
Callinectes exasperatus
Portunidae
Siri-guiné
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Callinectes sp.
Portunidae
Siri-pontinha
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Callinectes larvatus
Portunidae
Siri-princesa
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Callinectes sp.
Portunidae
Siri-vermelho
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Callinectes sp.
Chondrichthyes Carcharhinidae Rhizoprionodon lalandii
Cação
4
CL, COM
CL
3
75
0,14 10,71 0,13
Dasyatidae
Arraia de crôa
6
CL, COM, UM
CL
6
100
0,21 21,43 0,2
Dasyatis guttata
Gymnuridae
Arraia-de-mantêga
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Gymnura micrura
Myliobatidae Myliobates narinari
Arraia-pintada
2
CL
CL
2
100
0,07 7,14 0,06
Myliobatidae Rhynoptera bonasus
Arraia-três-venta
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Osteichthyes
Gobe
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Não identificado
Pirambu
2
COM
COM
2
100
0,07 7,14 0,06
Não identificado
Ariidae
Bagre / bagre cambueiro 11
CL
CL
11
100
0,39 39,29 0,36
Genidens genidens
Carangidae
Peixe-galo
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Selene vomer
Carangidae
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Carangoides bartholomaei Garajuba
Carangidae
Pampo-cabeça-mole
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Trachinotus carolinus
Carangidae
Pampo-garabebel
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Trachinotus goodei
0,14 14,29 0,13
Carangidae
Xareu
4
COM
COM
4
100
Caranx latus
Carangidae
Xixarro
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Não identificado
Centropomidae Centropomus sp.
Camurim
15
COM
COM
15
100
0,54 53,57 0,5
Clupeidae
Sardinha-branca
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Anchoa tricolor
Clupeidae
Sardinha-fofi
6
COM
COM
6
100
0,21 21,43 0,2
Sardinella brasiliensis
Clupeidae
Sardinha-azul
28
COM
COM
28
100
1
100
0,93
Opisthonema oglinum
Engraulidae
Sardinha-rabo-de-fogo
6
COM
COM
6
100
0,21 21,43 0,2
Cetengraulis edentulus
Ephippidae
Parú
2
CL
CL
2
100
0,07 7,14 0,06
Chaetodipterus faber
Gerreidae
Carapeba
4
COM
COM
4
100
0,14 14,29 0,13
Diapterus olisthostomus
Gerreidae
Carapicu
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Eucinostomus argentius
Gobiidae
Amoré
5
CL
CL
5
100
0,18 17,86 0,16
Bathygobius soporator
Gobiidae
Taicica
1
AP
AP
1
100
0,04 3,57 0,03
Gobionellus sp.
Haemulidae
2
CL, COM
CL
2
100
0,07 7,14 0,06
Pomodasys corvinaeformis Coró-branco
Hemiraphidae Hyporhamphus brasiliensis Agulha
5
CL, COM
CL
5
100
0,18 17,86 0,16
Lutjanidae
Ariacó
2
COM
COM
2
100
0,07 7,14 0,06
Lutjanus analis
Lutjanidae
Cioba
2
COM
COM
2
100
0,07 7,14 0,06
Lutjanus sp.
Lutjanidae
Dentão
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Lutjanus apodus
Megalopidae Megalops atlanticus
Camurupim
2
CL, UM
UM
2
100
0,07 7,14 0,06
Mugilidae
Tainha / sauna
19
COM
COM
19
100
0,68 67,86 0,63
Mugil curema
Mugilidae
Tamatarana
12
COM
COM
12
100
0,43 42,86 0,4
Mugil sp.
Muranidae
Amoréia
3
CL, UM
CL
3
100
0,11 10,71 0,1
Gymnothorax sp.
Muranidae
Mututuca
1
AP
AP
1
100
0,04 3,57 0,03
Gymnothorax ocellatus
Polynemidae Polydactylus virginicus
Barbudo
3
CL
CL
3
100
0,11 10,71 0,1
Sciaenidae
Cabeçudo
2
CL
CL
2
100
0,07 7,14 0,2
Stellifer sp.
Sciaenidae
Pescada
12
COM
COM
12
100
0,43 42,86 0,4
Cynoscion sp.
Scombridae
Albacora
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Thunnus sp.
Scombridae
Bonito
6
COM
COM
6
100
0,21 21,43 0,2
Euthynnus alleterattus
Scombridae
Cavala
1
COM
COM
1
100
0,04 3,57 0,03
Scomberomorus cavalla
Scombridae
8
COM
COM
8
100
0,29 28,57 0,26
Scomberomorus brasiliensis Serra
Serranidae
Mero (bodete)
2
COM
COM
2
100
0,07 7,14 0,06
Ephinephelus itajara
Symbranchidae Não identificado
Muçum
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Syngnathidae Hippocampus reidi
Cavalo-marinho
6
UM
UM
6
100
0,21 21,43 0,2
Tetraodontidae Lagocephalus laevigatus
Baiacu-xaréu
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Tetraodontidae Spheroides testudineus
Baiacu-pintado
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Tetraodontidae Colomesus psittacus
Baiacu-camisa-de-meia
1
CL
CL
1
100
0,04 3,57 0,03
Trichiuridae
Espada
4
COM
COM
4
100
0,14 14,29 0,13
Trichiurus lepturus
UP: uso principal, CUP: concordância de uso principal, CUPc: concordância de uso principal corrigido, UM: uso medicinal, COM: comercialização, CL:
consumo local, AP: Artefato de pesca
Loligo spp.
Mytella guyanensis
Crassostrea rhizophorae
Crassostrea sp.
Anomalocardia brasiliana
Alpheus sp.
Cardisoma guanhumi
DEC 2008, VOL. 33 Nº 12
907
junto a catadores tradicionais,
mostram uma ampla diversidade explorada potencialmente, sendo alguns crustáceos
de maior importância para
as áreas envolvidas. Alves e
Nishida (2003) observaram
que, entre as espécies capturadas e comercializadas pelos
catadores no ERM, merecem
destaque o goiamum, o aratú,
os siris e o caranguejo-uçá,
sendo este último o principal
recurso explorado. Silva (2004)
constatou que 55% do pescado de Canguaretama (RN) é
representado pela captura do
caranguejo-uçá, sendo capturados também o goiamum, o
aratú e o camarão.
Moluscos
Os resultados obtidos registraram a exploração de
cinco espécies de moluscos,
pertencentes a quatro famílias e cinco gêneros (Tabela
I), destacando-se Veneride e
Ostreidae como as mais exploradas. Apesar de estudos sobre
a exploração de moluscos serem escassos, alguns autores
apontam a importância desse
grupo para comunidades que
dependem dos recursos oferecidos pelos manguezais. Conforme afirma Rönnbäck (1999),
os moluscos constituem um
importante recurso pesqueiro
séssil que são extensivamente explorados por famílias de
pescadores locais. De acordo
Nishida et al. (2006) e Paludo
e Klonowski (1999), as espécies de ostras (Crassostrea
spp. - Ostreidae), o marisco
(Anomalocardia brasiliana Veneridae) e o sururu (Mytela
guyanensis - Mytilidae) são as
mais relevantes em termos de
uso na área do ERM.
O valor de uso (VU) para
os moluscos utilizados pelas comunidades estudadas
amostra apresentou-se bastante
diversificado entre as espécies, com variação de 0,03 a
0,86. O bivalve A. brasiliana
representa a espécie com o
maior VU (0,86), representando um dos recursos mais
explorados pelas comunidades
de Barra de Mamanguape e
Lagoa de Praia. Nishida et al.
(2004) registraram, entre os
908
moradores das comunidades
de Tramataia e Camurupim,
localizadas também no ERM,
que a atividade de catação de
moluscos é restrita à exploração de marisco, demonstrando
a importância deste recurso
para os pescadores que vivem
às margens desse estuário.
Silva (2004) observou que o
sururu, o marisco e a ostra
foram as espécies de moluscos
mais citadas na comunidade
do Canto do Mangue (RN).
Já Clauzet et al. (2005) observaram que a lula (Logilo
spp.) é um recurso fortemente
explorado pelos pescadores do
Litoral de São Paulo.
Embora os estoques naturais de moluscos sejam considerados suficientes para suprir a demanda do mercado
(Rönnbäck, 1999), os catadores apontam que os mesmos
estão diminuindo. Segundo
Nishida et al. (2004), o aumento da demanda e as pressões a que se tem submetido o
complexo estuário-manguezal
têm contribuído para este fato.
Entre alguns fatores, Rönnbäck
(1999) aponta que, além do
aumento da demanda, a perda do hábitat (desmatamento
das florestas de mangue) e a
poluição estão entre as principais causas para a redução
dos estoques de moluscos.
Usos principais das espécies
pelos moradores do ERM
Isso é a sobrevivência da
família daqui [...] o que sobra,
vende (E., pescador de Barra
de Mamanguape, evidenciando
o caráter de subsistência do
uso dos recursos pesqueiros
pelas comunidades do ERM).
Os recursos pesqueiros explorados no ERM podem ser
agrupados em quatro categorias de uso: artefato de pesca,
comercialização, consumo local
e medicinal.
Os recursos utilizados pelos
moradores do ERM destinamse, sobretudo para o consumo local e comercialização.
Todavia, eles também fazem
uso de peixes (52,2% das citações) e crustáceos (47,8%)
para a produção de artefatos
de pescas, bem como de peixes e moluscos (ambos 50%
das citações) para tratamento
tradicional de doenças.
Adicionalmente, a Tabela I
também traz a porcentagem de
concordância de uso principal
corrigido (CUPc) das espécies
animais utilizadas pelos moradores das comunidades estudadas. Como pode ser visto, as
espécies com maior CUPc são
a sardinha-azul (O. Oglinum;
CUPc= 100%), o marisco-pedra (A. Brasiliana; 92,86%), a
tainha (M. curema; 67,86%), a
ostra (Crassostrea rhizophorae;
57,14%), o caranguejo-uçá (U.
cordatus; 57,14%), o camurim
(Centropomus sp.; 53,57%),
a lagosta-vermelha (P. argus;
50%), a pescada (Cynoscion
sp.; 42,86%), além do siri-azul
(Callinectes danae) e do bagre
(Genidens genidens), ambos
com CUP= 39,29%. Estas espécies também coincidem com
as que apresentam maior valor
de uso (VU) e correspondem
as mais importantes para os
moradores das comunidades
de Barra de Mamanguape e
Lagoa de praia, sobretudo do
ponto de vista comercial ou
para consumo local.
A importância da pesca artesanal como fonte de alimento
e renda para as comunidades
ribeirinhas e costeiras verificada neste estudo corrobora com
os trabalhos de Costa Neto
(2000), Dias (2006) e Silva
(2004). Dias (2006) também
constatou a utilização de alguns recursos pesqueiros como
artefatos de pesca (isca) para a
captura de animais importantes para o consumo e venda,
e para a pesca esportiva no
litoral do Nordeste do Brasil.
Dentre os trabalhos nos quais
os autores ressaltam a importância dos recursos faunísticos
para a medicina tradicional estão os de Alves e Rosa (2007),
que registraram o uso de 138
animais medicinais em comunidades pesqueiras do Norte e
Nordeste do Brasil; e Marques
(1995), que identificou 56 animais utilizados na medicina
popular na Várzea de Marituba, no Estado de Alagoas.
Conclusão
A variedade de recursos registrada neste estudo reforça
o papel dos manguezais como
um ecossistema responsável
pela subsistência das comunidades costeiras e de ribeirinhos, já que as atividades de
pesca realizadas pelas comunidades estudadas são de extrema importância econômica
e social. Na área de estudo,
os recursos pesqueiros explorados são a principal fonte
de alimento e renda. Convém
ressaltar a importância de estuários e manguezais como
um habitat necessário para a
manutenção de diversas espécies, que encontram nestes
locais o ambiente favorável
para reprodução, nidificação e
desenvolvimento; sendo assim,
é extremamente necessário que
o uso das espécies associadas
a estes ecossistemas seja realizado dentro dos princípios da
sustentabilidade.
Estudos adicionais acerca da
exploração dos recursos são
imprescindíveis para que práticas de manejo e ações conservacionistas (e.g., avaliação
das áreas e monitoramento,
além da criação de áreas de
proteção ambiental) adequadas
sejam aplicadas de forma coerente, visando manter a diversidade biológica e o desenvolvimento cultural local desta área.
Contudo, no desenvolvimento
e aplicação dessas ações, o
conhecimento tradicional sobre o uso de recursos naturais
deve ser considerado, pois, este
conhecimento desenvolvido por
povos tradicionais, como o de
pescadores artesanais, serve
como fonte de informação a
respeito do status atual dos recursos, da dinâmica dos ecossistemas e das características
ambientais locais, produzindo
informações teórico-práticas
sobre como manejar, conservar
e utilizar os recursos naturais
de maneira mais sustentável.
Agradecimentos
Os autores agradecem a os
moradores das comunidades
onde este estudo foi desenvolvido, à APA do Rio Mamanguape e à Fundação Peixe-boi
marinho, vinculado ao Centro
de Mamíferos Aquáticos do
IBAMA, pelo apoio logístico,
e à Carmen Alonso Samiguel,
DEC 2008, VOL. 33 Nº 12
pela tradução do resumo para
língua espanhola.
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