UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CURSO DE HISTÓRIA FRANCIANE MONARA DA SILVA SOARES A IMAGEM TAMBÉM ENSINA: um retrato da economia colonial brasileira através das imagens de Frans Post. Natal 2014 FRANCIANE MONARA DA SILVA SOARES A IMAGEM TAMBÉM ENSINA: um retrato da economia colonial brasileira através das imagens de Frans Post. Monografia apresentada à disciplina Pesquisa Histórica II do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação da Prof. Drª. Maria da Conceição Guilherme Coelho. Natal 2014 UFRN. Biblioteca Central Zila Mamede. Catalogação da Publicação na Fonte. Soares, Franciane Monara da Silva. A imagem também ensina: um retrato da economia colonial brasileira através das imagens de Frans Post. / Franciane Monara da Silva Soares. – Natal, RN, 2014. 86 f. Orientadora: Profª. Drª. Maria da Conceição Guilherme Coelho. Monografia (Graduação) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Graduação em História. 1. Iconografia – Educação - Monografia. 2. Economia colonial – Monografia. 3. Domínio holandês – Monografia. 4. Imagem – Monografia. I. Coelho, Maria da Conceição Guilherme. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/BCZM CDU 7.04:37 FRANCIANE MONARA DA SILVA SOARES A IMAGEM TAMBÉM ENSINA: um retrato da economia colonial brasileira através das imagens de Frans Post. Monografia apresentada à disciplina Pesquisa Histórica II do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, sob orientação da Prof. Drª. Maria da Conceição Guilherme Coelho. Trabalho apresentado e aprovado pelo docente responsável em ___/ ___/ ___ BANCA EXAMINADORA Profª. Drª. Maria da Conceição Guilherme Coelho Profª. Drª. Maria Emília Monteiro Porto ____________________________________________________________ ____Profª. Esp. Francisca Aurinete Girão Barreto da Silva A Deus, a meus pais, a Kawasaki e meus alunos dedico as primícias do meu trabalho. AGRADECIMENTOS A elaboração de um trabalho como esse não é fácil, demanda bastante tempo e requer ajuda de algumas pessoas que se fazem importantes e especiais na caminhada. São essas pessoas que não poderia deixar de mencionar nesse momento. Primeiramente agradeço à Deus, meu criador e detentor de todo conhecimento. Sem Ele sequer eu existiria, não teria chegado até aqui. É ele quem me dá todo conhecimento, toda capacidade e força para superar dificuldades, barreiras e obstáculos que surgem no caminho. À Ele meu muitíssimo obrigada. Aos meus pais, que usados por Deus me deram a vida e fizeram todo o possível para que eu chegasse nesse estágio da minha vida. Sempre acreditaram em mim e me deram a melhor educação que podiam ter dado. Sempre preocupados comigo e as horas de sono perdidas em decorrência da elaboração dessa monografia. Suas frases “Monara, vai dormir!”, “Ainda não terminou com esses livros?” e “Quer um cafezinho para despertar?” eu jamais esquecerei. Ao meu amado, Kawasaki, que tanto me apoiou nessa reta final. Acordava-me para estudar quando eu tirava um cochilo à noite por não aguentar o sono. Por diversas vezes levou-me até a universidade para pegar livros ou devolver livros na biblioteca, já que eram muitos livros e ficava muito pesado para eu carregar. Pela sua compreensão em entender que eu precisava de mais tempo para ler, estudar e escrever esse trabalho. E por seu amor e confiança no meu potencial. À minha orientadora, Conceição Guilherme, por toda a paciência com a minha pessoa e por ter aceitado essa tarefa de orientar-me nessa empreitada. Por todos os conselhos e também confiança de que eu conseguiria. Aos amigos que estiveram ao meu lado e muito ajudaram na elaboração desse trabalho: Jerly, Almir, Andrielly, Batuta, Gustavo, Raully e Éllon, os quais se dispuseram a fazer empréstimos de livros para mim, já que eu não podia pegar todos os que precisava, inclusive no CERES de Caicó com Éllon; Emily, Deyse, Samille, Andressa e Emília que tanto ouviram os meus dramas e impaciências com a monografia, com a carga enorme de leitura que precisava ser feita e com os livros que não conseguia encontrar; Cosme que me deu carona até a universidade quando precisei ir aos encontros com a orientadora. Obrigada por cada detalhe. Não poderia de mencionar meus queridos alunos do Instituto Sagrada Família que foram de fundamental importância me motivando e apoiando com suas mensagens de superação e incentivo, alguns se destacando como Izadora, Milena e Pedro. Muito obrigada por todo o apoio e palavras de carinho nessa fase tão importante. Houve algumas pessoas que foram de extrema importância nessa reta final, pois “emprestaram” seus emails para “guardar” cópias de tudo que eu escrevia, para que, dessa forma, eu tivesse a garantia de que nada seria perdido. Meu amado, Kawasaki, meu pai, Marcos, meus amigos, Emily, Deyse, Gabriel, Rudá, Samille, Andressa, Samantha e, claro, minha orientadora, Conceição. Vocês foram meus anjos salvadores. Aos copistas da universidade, que tantas vezes me ajudaram e fizeram minhas cópias bem rapidamente e no mesmo dia, quando só eram possível entregar no dia seguinte, devido eu estar com muita pressa e só poder ir à universidade naquele dia. Ainda na categoria “pessoas” agradeço aos professores que aceitaram compor minha banca de defesa de monografia. E todos os amigos que separaram um pouquinho do seu tempo para assisti-la. Agora parto para outra categoria de agradecimentos: os espaços físicos. Primeiramente agradeço á Universidade Federal do Rio Grande do Norte por todo o conhecimento que, através dos docentes, me foi adquirido e por todas as amizades feitas ao longo do curso, as quais sem elas não teria conseguido a realização dessa monografia. Á Biblioteca Central Zila Mamede por cada livro emprestado e por toda a dor de cabeça após não encontrar algum livro muito importante para o trabalho. RESUMO O presente trabalho trata do estudo da História colonial brasileira a partir da arte de Frans Post, artista que chegou no Brasil quando ocorreu a invasão holandesa. Através de suas anotações e observações acerca do território brasileiro constituiu um dos maiores acervos iconográficos que retratam a temática da colonização brasileira, especificamente do período da invasão holandesa e da economia açucareira, sendo suas obras de fundamental importância para um levantamento historiográfico e recurso didático e, assim lanço os seguintes questionamentos: De que forma os alunos da Educação Básica aprendem História por meio da utilização de imagens? Quais aspectos podem ser mais aprofundados sobre a colonização e a economia colonial a partir das obras de Frans Post? E como essas imagens interferem no aprendizado dos alunos? Esse texto tem o objetivo de abordar aspectos da economia colonial brasileira, analisando o perfil das imagens de do artista flamengo com base nesses aspectos; analisar a nova visão do Brasil a partir da invasão e dominação holandesa, retratando a chegada dos artistas e a contribuição de Post na formação do imaginário brasileiro na Europa; retratar a imagem enquanto recurso didático e entender como ela pode ser um facilitador do processo ensino-aprendizagem na aula de História. Palavras-chaves: economia colonial, domínio holandês, imagem, iconografia. ABSTRACT The present work deals with the study of Brazilian colonial history from the art of Frans Post, artist who arrived in Brazil when the Dutch invasion occurred. Through his observations about the Brazilian territory constituted a major iconographic collections that depict the theme of Brazilian colonization, specifically the period of Dutch invasion and the sugar economy, and their works of fundamental importance to a historiographical survey and teaching resource and so throw the following questions: how do the Basic Education students learn history through the use of images? What aspects can be more thorough about colonization and the colonial economy from the works of Frans Post? And how these images affect on student learning? This text aims to address aspects of the Brazilian colonial economy, analyzing the profile of the images of the Flemish artist based on these aspects; analyze the new vision of Brazil from the Dutch invasion and domination, depicting the arrival of the artists and the contribution of the formation of the Brazilian Post imaginary in Europe; portray the image as a teaching resource and understand how it can be a facilitator of the teaching-learning in history class. Keywords: colonial economy, Dutch rule, image, iconography. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: Paisagem do rio São Francisco .......................................................................41 Figura 2: Rio São Francisco ..........................................................................................42 Figura 3: Vista da Sé de Olinda .....................................................................................50 Figura 4: Paisagem com pássaros ...................................................................................50 Figura 5: A vista de Itamaracá ........................................................................................51 Figura 6: A cachoeira de Paulo Afonso ..........................................................................51 Figura 7: Forte Frederik Hendrik ....................................................................................53 Figura 8: Vista da Cidade Maurícia ................................................................................54 Figura 9: Carro de bois ...................................................................................................54 Figura 10: Cidade Frederica ...........................................................................................57 Figura 11: Engenho ........................................................................................................75 Figura 12: Casa de Fazenda ............................................................................................76 Figura 13: Vila de Pernambuco ......................................................................................77 Figura 14: Vila e pessoas ................................................................................................78 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................10 1 A ECONOMIA NA AMÉRICA PORTUGUESA E O BRASIL HOLANDÊS.........................................................................................................14 1.1 O trabalho negro na economia colonial brasileira .............................................27 1.2 A face da “Guerra do açúcar” na dominação holandesa e os feitos de Nassau..................................................................................................................33 2 O IMAGINÁRIO DO NOVO MUNDO NAS TELAS DE FRANS POST ......40 3 A UTILIZAÇÃO DA ICONOGRAFIA COMO RECURSO DIDÁTICO ......58 CONCLUSÃO ...............................................................................................................80 REFERÊNCIAS ............................................................................................................82 10 INTRODUÇÃO Quando falamos hoje em economia colonial um dos primeiros produtos que vêm à nossa mente é o açúcar. Não são poucos os livros em que encontramos páginas e mais páginas falando acerca dessa economia. Contudo será que esse retrato econômico brasileiro apenas foi mostrado a Europa por meio de relatos dos viajantes colonizadores? Partindo desse questionamento é que me proponho a estudar a economia colonial do Brasil de um ângulo diversificado: o olhar europeu de Frans Post, um artista do Velho Mundo que chega às terras brasílicas juntamente com a comitiva de Maurício de Nassau. O interesse por esse tema surgiu a partir de aulas de História da Arte Brasileira quando deparei-me com as obras desse artista e de conversas com minha orientadora na tentativa de escolher um tema. Assim surgiu o pensamento de entender aspectos da economia colonial a partir das telas de Post pintadas no período da invasão e domínio holandês. Ajudou também o fato de eu querer pesquisar algo que pudesse envolver o ensino de História, a História do Brasil e arte, tendo em vista que gosto bastante dessas áreas. O objeto da minha pesquisa são as telas de Frans Post e através delas busco responder de que forma os alunos da Educação Básica aprendem História por meio da utilização de imagens? Quais aspectos podem ser mais aprofundados sobre a colonização e a economia colonial a partir das obras de Frans Post? E como essas imagens podem interferir no aprendizado dos alunos? Com isso, meu objetivo geral é entender as imagens de Frans Post como recurso facilitador do processo de ensino e aprendizagem de História na temática da economia colonial. Partindo-se desse norte surgem três capítulos abordando essa temática. No primeiro capítulo – A economia na América portuguesa e o Brasil holandês – faço uma contextualização da colônia e chegada dos holandeses, ressaltando por isso o sistema colonial como um todo, com suas formas de ocupação de terras, o cultivo da cana-de-açúcar e a forte presença desse produto como sustentáculo da economia colonial. Ainda sobre essa engrenagem reporto-me à forma que se deu a colonização do Novo Mundo e a importância que o sistema econômico teve na História do Brasil, não apenas para o período colonial fazendo-se, pois, relevante até os dias atuais, marcado pela drenagem de renda para o exterior, a mão-de-obra escrava, o latifúndio, a força do 11 mercantilismo sempre presente no Estado e a transformação lenta e gradual no tocante à tecnologia e inovações. A principal atividade econômica da Nova Lusitânia foi o cultivo da cana-deaçúcar e para isso era necessário uma mão-de-obra larga e que rendesse maiores lucros. Escolheu-se, portanto, o negro como força motriz desse sistema agrícola e sobre isso busquei também maiores informações acerca da escravidão e do trabalho africano nesse recorte espaço-temporal – o período colonial brasileiro. Outro aspecto interessante presente no primeiro capítulo ainda dentro da temática da contextualização referente à colônia portuguesa é a dominação holandesa no Brasil e os feitos de Maurício de Nassau nas terras do Novo Mundo, tendo em vista ser o eleito apto à governar aquela região. Mostro como Nassau foi considerado um herói em alguns discursos e fontes históricas e a importância que ele teve para a realização desse trabalho, visto que foi incentivado a trazer grandes nomes para a nova terra, destacando-se entre eles Frans Post, pintor que tinha o objetivo de fazer a topografia do lugar e representar na Europa o Novo Mundo. No segundo capítulo – O imaginário do Novo Mundo nas telas de Frans Post – venho mostrar a vida e a obra desse artista, trazido pela comitiva de Nassau para o Brasil com intuito de “levar” a colônia para a Europa. A partir dessa primícia pode ser feito uma análise da pintura holandesa como um todo, ressaltando algumas de suas características, e procurar ver os aspectos presentes na obra de Post e como ele se utilizava dos recursos naturais para compor seu trabalho, tendo em vista que grande parte deste foi feito já no Velho Mundo apenas com suas memórias acerca das terras brasílicas. Demonstro ainda como está dividida a carreira desse artista e alguns de seus trabalhos para exemplificar algumas de suas peculiaridades, bem como da pintura flamenga. O terceiro e último capítulo – A utilização da iconografia como recurso didático – traz alguns conceitos como imagem e iconografia, por exemplo, e o processo da imagem enquanto recurso didático, elucidando o quão relevante a imagem pode ser no processo ensino-aprendizagem na medida em que o aluno pode reconhecer-se através dela, facilitando assim a sua compreensão dos conteúdos, além de que ela funciona como facilitador do ensino, pois quando o discente depara-se com uma ilustração já trabalhada em sala de aula é mais fácil para este lembrar do conteúdo estudado por meio da associação entre aquela e este. 12 Outra informação interessante presente nesse capítulo é a da imagem estar para o ser humano como a fala, devendo, assim como esta, ser trabalhada o seu processo de análise cedo para que se ganhe o hábito de se fazer isso a fim de tornar-se algo natural, tendo em vista que a sensibilidade necessária para o trabalho de apreciação está presente em cada individuo, precisando apenas ser trabalhada para esse fim. Além disso, escolhi algumas telas de Post para uma observação aprofundada a fim de captar alguns detalhes do que ele estava querendo mostrar para o Velho Mundo acerca das novas terras. No que se refere ao meu referencial teórico me utilizei de autores como Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e Sérgio Buarque de Holanda para tratar aspectos da economia colonial brasileira, além de Vera Lucia Amaral Ferlini, Maria Yedda Leite Linhares, Manuel Correia de Andrade, Arno e Maria José Wehling, Mario Maestri, Fernando da Cruz Gouvêa, José Antônio Gonsalves Mello, Fernando A. Novais, Pedro Puntoni, Luiz Roberto Lopes, Décio Freitas e Evaldo Cabral de Mello, para o aspecto contextualizador acerca da economia do período colonial brasileiro e sobre a temática do domínio holandês. Quanto às características da pintura holandesa e sua análise trabalho com Leonardo Dantas Silva, Svetlana Alpers, George Rembrandt Gutlich, Daniel de Souza Leão Vieira, Ana Maria de Lira Pontes, Izabel Maria dos Santos e Carla Mary Oliveira. Ainda sobre o referencial teórico utilizado, no que diz respeito às imagens empreguei, inicialmente, Peter Burke, Erwin Panofsky, Ciro Flamarion Cardoso, Ana Maria Mauad, Martini Joly, Jacques Le Goff, Alberto Manguel, Jacques Aumont e Anamelia Bueno Buoro, para dar suporte no sentido de imagens. Não poderia falar sobre o uso delas como recurso didático sem trazer informações no que se refere às mudanças pelas quais passaram a História através de Ronaldo Vainfas e sua introdução sobre a escola dos Annales, esta que inovou o conceito de fonte histórica, possibilitando assim o surgimento da imagem como tal. A partir daí faço uso de outros autores como Circe Bittencourt, Eduardo França Paiva, Valesca Giordano Litz, Ricardo Barros, Charles Nascimento de Sá e Dionatan Felipe. No que se refere aos conceitos utilizados nesse trabalho são eles: economia, colônia e imagem. Para o conceito de economia fiz uso do Novo Aurélio século XXI que diz ser a ciência que trata dos fenômenos relativos à produção, distribuição e consumo de bens; sistema produtivo de um país ou região. Neste sentido, sempre que utilizo o termo economia, este faz menção à economia colonial do Brasil nesse recorte temporal da História, referindo-se, pois, aos meios de produção da colônia. 13 Kalina Vanderlei Silva e Maciel Henrique Silva em seu Dicionário de conceitos históricos oferecem um conceito de colônia, o qual fiz uso em meu trabalho por ser algo mais historicizado. Eles iniciam falando que a colonização é uma categoria histórica, tendo em vista que está relacionada a diferentes sociedades e momentos ao longo do tempo. Ela ultrapassa as barreiras do Novo Mundo, sendo, pois um fenômeno de expansão humana pelo planeta, desenvolvendo a ocupação e o povoamento de novas regiões. Destarte colonizar e cultivar, ocupar estão intimamente associados na medida em que são ações feitas em uma nova área, instalando aí uma cultura preexistente em outro espaço. Assim, a palavra colônia ganhou sentido de espaço que está sendo ocupado. O conceito de imagem trabalho com base em três autores: Jacob Burckhardt, Peter Burke e Erwin Panofsky. Aquele afirma ser a imagem uma testemunha de etapas de desenvolvimento humano e através dela ser possível entender as estruturas de pensamento e representação de dada época. O segundo considera a função da imagem como comunicante de algo, mas que ela não fala por si só, mas sim representa a preocupação de cada artista. Para o terceiro a imagem nada mais é que um registro deixado pelo homem. Escolhi trabalhar com essas três conceituações para imagem porque acredito que elas se completam, na medida em que esta é uma marca deixada pelo homem, que possibilita entender o pensamento e representações da época em que foi produzida ao mesmo tempo em que não falo por ela mesma, sendo, pois necessário uma leitura seguida de interpretação pra que se alcance esse entendimento. Assim está dividido esse trabalho que tem, como justificativa social, o fato de ser interessante que nós, brasileiros, saibamos a forma como realmente se deu a nossa colonização e também que saibamos e possamos entender e aprender a percepção desses detalhes nas obras desse artista para que visualizemos com outro olhar essa arte brasileira, além de mostrar ao aluno a arte e permitir esse contato deles com essa ciência, dando, assim, um novo olhar para ela. Além disso, a iconografia com temas brasileiros promove um maior sentimento de identidade no aluno, na medida em que ele pode se reconhecer em alguma imagem ou buscar o estabelecimento de conexões com o que ele conhece, e, como justificativa historiográfica, o fato de ser algo que pode e será trabalhado em sala de aula, mesmo porque será uma comprovação do que eu pretendo estudar. 14 1 A ECONOMIA NA AMÉRICA PORTUGUESA E O BRASIL HOLANDÊS É impossível tratar sobre o ensino da história da colonização brasileira sem dissertar sobretudo quanto às suas práticas através das imagens de Frans Post. Vale ressaltar que o emprego do vocábulo “ensino”, refere-se à utilização das imagens de Post enquanto recurso facilitador do ensino-aprendizagem referente ao período do Brasil colonial. Destarte, Gilberto Freyre (2000) ao analisar a formação da sociedade na América tropical afirma que se trata de “[...] uma sociedade agrária na estrutura, escravocrata na técnica de exploração, híbrida de índio – e mais tarde de negro – na composição” (FREYRE, 2000, p.79). Este caráter de uma sociedade hibrida é bem trabalhado por Post em suas telas, nas quais pode-se ver claramente essa realidade, tendo em vista que suas imagens nos dão uma visão aprofundada, especialmente do sistema agrícola e da sociedade que se formava. A estrutura do projeto de colonização do Novo Mundo tem suas bases fundadas na produção agrícola, tendo na cana-de-açúcar seu principal produto de exportação. A produção do açúcar necessitava, em grande medida, do emprego de uma mão-de-obra escrava, por ser esta mais rentável à Europa, pois gerava maiores lucros, contudo a mãode-obra indígena foi bastante utilizada nos primeiros anos de exploração do Brasil em busca do principal produto encontrado nas terras brasílicas – o pau brasil – e, em face da economia açucareira, não deixou de existir por completo, sendo utilizada ainda, porém em outros campos, como por exemplo, a agricultura de subsistência e alguns trabalhos domésticos. O cultivo da cana-de-açúcar propiciou o desmembramento de outros produtos, que passaram a ser cultivados para manter a mão de obra e os senhores, no sentido do consumo interno e também daquela estar sempre ocupada, pois a economia açucareira movimentava o comércio externo, sendo o principal produto feito pelo açúcar para utilização na própria colônia a aguardente, servindo como instrumento de troca para obtenção de escravos. Junto a este produto havia também o fumo que foi cultivado na Bahia e tinha a mesma finalidade que aquele. Poucas coisas teria o Brasil, nessa época, a oferecer além do açúcar. Nas engenhocas ou molinetes fabricava-se a aguardente, subproduto da cana de baixo custo e que servia não só para consumo interno das classes inferiores [...] como também para o comércio de escravos na 15 África. Os artigos de subsistência se cultivavam em minifúndios ou nos intervalos de plantio da cana. O fumo foi plantado na Bahia, tendo-se desenvolvido a partir do século XVIII e servido a uma finalidade semelhante à da aguardente: a de ser instrumento de troca para obtenção de escravos no continente negro (LOPES, 1984, p. 36). Arno e Maria José Wehling (2005) afirmam que essa estrutura de produção econômica no período colonial tem suma importância para a História do Brasil, tendo em vista que não marcou apenas o período entre os séculos XVI e XIX como também toda a posteridade econômica e mesmo social do país até hoje (século XXI). A economia colonial tem alguns condicionamentos que marcaram profundamente não só a vida brasileira entre os séculos XVI e XIX como a história posterior do país, mesmo depois da Independência. Foram traços estruturais e seculares a drenagem de renda para o exterior, o latifúndio, o trabalho escravo, a onipresença do Estado mercantilista, a lenta transformação tecnológica e à resistência às inovações. Originados na Colônia, projetaram-se em seus efeitos, até o século XX (WEHLING, 2005, p. 193). Vale ressaltar que esse modelo de produção econômica, que se consolidou durante o período da história colonial brasileira, esteve atrelado a uma engrenagem mais ampla, a saber, o projeto colonial português, fato este que contribuiu para que ele deixasse suas marcas na estrutura do sistema produtivo brasileiro, observando-se que algumas de suas características perduram até os dias atuais. Os autores supracitados mostram que o conceito de “sistema colonial” é estudado por várias correntes historiográficas e embora cada uma delas possua uma visão diferenciada acerca desse conceito um fato torna-se evidente seja em qualquer corrente: a colônia existiu para atender os interesses da metrópole, ou seja, do mercado europeu. [...] os autores marxistas discutem a natureza do sistema colonial, ou seja, se é derivado de um outro método de produção, feudal ou capitalista, se é uma terceira estrutura ou se corresponde a uma transição em que os elementos anteriores se diluíram gradativamente a favor dos capitalista. Autores de outras correntes [...] preferem ver o sistema colonial como uma consequência da ampliação do comércio europeu no século XVI (WEHLING, 2005, p.194). Essa relação dependente entre a colônia e a metrópole possibilitou uma saída de rendas para o exterior, gerando um investimento pequeno ou inexistente na América 16 Portuguesa. Sua prosperidade dependia do comércio interoceânico e dos seus produtos, como o açúcar, por exemplo. O primeiro ponto importante a ser destacado é de que o sistema colonial apresenta-se como o conjunto das relações entre a metrópole e a colônia. Dessa forma pode-se entender a posição ocupada pela colônia dentro desse arranjo, devendo esta permanecer sempre na retaguarda econômica daquela, para que, quando os lucros econômicos não estivessem tão favoráveis, a metrópole tivesse a colônia a quem recorrer. A política colonial das potências visava, por isso, enquadrar a expansão colonizadora dos trilhos da política mercantilista; fazer com que as relações entre os dois pólos do sistema (metrópole-colônia) se comportassem consoante o esquema tido como desejável. Podemos, pois, particularizando esta primeira descrição do sistema colonial, dizer que ela se apresenta como um tipo particular de relações políticas, com dois elementos: um centro de decisão (metrópole) e outro (colônia) subordinado, relações através das quais se estabelece o quadro institucional pra que a vida econômica da metrópole seja dinamizada pelas atividades coloniais (NOVAIS, 1998, p. 20). Um dos sustentáculos do sistema colonial era a eliminação da concorrência e o império português garantir à economia europeia, de um modo geral, esta concentração de lucros. Contudo, a partir do século XV o sistema passou a dar maiores vantagens para fora do reino de Portugal, provocando, assim, um enfraquecimento da dominação lusitana no Brasil. Isso gerou como consequência o crescimento da participação holandesa nas práticas do comércio internacional. Portugal foi o responsável por uma transformação na economia colonial: um deslocamento na base da colonização, passando da extração da riqueza, o que aconteceu nos primeiros anos após a chegada dos europeus no Novo Mundo, tendo como principal produto o pau brasil, à geração da riqueza, o que se deu com a percepção das boas condições naturais para a plantação da cana-de-açúcar, produto este que tinha sua procura crescente na Europa. Segundo Freyre: Semelhante deslocamento, embora, imperfeitamente realizado, importou em uma nova fase e em um novo tipo de colonização: “a colônia de plantação” caracterizada pela base agrícola e pela permanência do colono na terra, em vez do seu fortuito contato com o meio e com a gente nativa. No Brasil iniciaram os portugueses a colonização em larga escala dos trópicos por uma técnica econômica e por uma política social inteiramente novas [...] primeira: a utilização e 17 o desenvolvimento da riqueza vegetal pelo capital e pelo esforço do particular; a agricultura; a sesmaria; a grande lavoura escravocrata. A segunda: o aproveitamento da gente nativa, principalmente da mulher, não só como instrumento de trabalho mas como elemento de formação da família (FREYRE, 2006, p. 79). Desde cedo a economia colonial brasileira serviu para atender às necessidades europeias e cresceu baseada nos padrões ditados pelo Velho Mundo, do que estava ou não em alta nos mercados, produtos como pau-brasil, açúcar, ouro, diamantes, couros, algodão, arroz, anil, tabaco. Dessa forma, o Brasil estava inserido na economia mundial, na medida em que redes comerciais interoceânicas, começaram a se estabelecer. Enquanto isso o mercado interno quase não se movimentava e o autoconsumo dos nativos e da mão-de-obra era quase insuficiente, garantindo apenas a sobrevivência destes. Este foi um dos maiores problemas encontrados por João Maurício de NassauSiegen: a pouca produção de alimentos que gerava fome na população. O foco da economia era a monocultura do açúcar, contudo a população precisava de outros alimentos que atendessem às suas próprias necessidades, alimentos estes produzidos em quantidade quase insuficiente, especialmente a mandioca. A grande lavoura representa o nervo da agricultura colonial; a produção dos gêneros de consumo interno – a mandioca, o milho, o feijão que são os principais – foi um apêndice dela, de expressão puramente subsidiária. Este papel subsidiários se verifica, aliás, quase sempre na própria estrutura da produção agrícola. Aqueles gêneros de consumo são produzidos, na maior parte nos mesmo estabelecimentos rurais organizados e estabelecidos para cuidar da grande lavoura. Destinam-se a abastecer o pessoal empregado nesta última, e existem, portanto unicamente em função dela (PRADO JÚNIOR, 1992, p. 143). Outras culturas como a mandioca, o milho, o feijão e as fruteiras nativas e exóticas eram largamente cultivadas até mesmo naquelas várzeas que se destacavam pela produção de açúcar, como a do Capibaribe e a do Jaboatão, garantindo não só o abastecimento da população rural, como da urbana (ANDRADE, 1973, p. 85). Pode-se ver, nas citações acima, certa contradição no tocante á produção de outros gêneros alimentícios, como raízes e cereais. Contudo essa contradição é explicada pelo fato de que esses alimentos não eram complementos alimentares e sim a base da alimentação da sociedade colonial, na verdade em consórcio com a grande lavoura de cana de açúcar, daí ser produzido em larga escala para manter tanto a mão- 18 de-obra como os próprios senhores, e ser uma produção subsidiária tendo em vista de que o produto principal do início da economia colonial era a produção do açúcar. A cana-de-açúcar dominou a agricultura e, de forma lenta e gradual, devido a exigência na quantidade de investimentos ser muito alta para a criação de engenhos, ela se impôs como principal produto brasileiro, tendo em vista o preço do açúcar no mercado externo e também o retorno rápido do capital aplicado. A exportação do açúcar só cresceu nos séculos XVI e XVII como afirmam Arno e Maria José Wehling ao dizerem que “Em 1710 as rendas com a exportação do açúcar das três maiores capitanias produtoras – Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro – totalizavam 2.535:142$800, para um total de 528 engenhos, isto é quatro vezes a renda do ouro” (WEHLING, 2005, p. 211). Percebe-se, então, que o açúcar conseguia ser mais lucrativo do que as próprias riquezas minerais encontradas em outros locais do continente americano, mesmo porque era um produto caro na Europa e bastante procurado, fato este que promovia uma comercialização mais lucrativa. De acordo com Pedro Puntoni (1999), o açúcar ganhava destaque por ser um produto singular e considerado na Europa até o século XVI, como uma especiaria, justificando, assim a sua larga procura e aumentando o seu consumo nos séculos XVI e XVII a partir da produção colonial. A economia colonial teve como base três eixos principais: a dependência externa, como já foi mencionado, o latifúndio e a escravidão. O latifúndio caracterizouse pela monocultura e pela mentalidade aristocrática do senhor de engenho. Alguns fatores que justificam a existência daquele é a abundância de terras com pouca dificuldade de se cultivar, a agricultura e a pecuária extensiva atrasadas que exigiam áreas mais amplas e a necessidade dos engenhos terem boa produção do açúcar para exportarem para o mercado europeu. É importante destacar, de acordo com Arno e Maria José Wehling, que o latifúndio não deve ser confundido com expansão territorial, pois O latifúndio canavieiro, concentrado no litoral pernambucano, baiano e fluminense, foi responsável pela ocupação efetiva de uma estreita faixa litorânea. A grande expansão territorial verificada na Colônia se deve ao latifúndio pecuarista e a outras formas de penetração [...] o latifúndio não foi a única forma assumida pela propriedade rural na Colônia. Com ele coexistiram propriedades de extensão variável dedicadas ao cultivo do tabaco, na Bahia, a pequena propriedade produtora de artigos para abastecimentos urbano em Salvador e no Rio de Janeiro (WEHLING, 2005, p. 197). 19 Neste sentido é importante fazer uma ressalva no tocante às formas de ocupação de terras no período do Brasil colonial, tendo em vista que esta se deu através dos latifúndios e das pequenas unidades produtoras, como pode ser percebido na citação acima quando os autores mencionam o cultivo do tabaco na Bahia. Além disso, houve ainda a ocupação litorânea, pequena, diga-se de passagem, e a ocupação do interior baseada na atividade pecuarista. Caio Prado ressalta o verdadeiro sentido da colonização, a saber, fornecer para a Europa alguns gêneros tropicais e minerais como o açúcar, o algodão e ouro, por exemplo, sendo, portanto, a economia do Brasil-colônia totalmente subordinada a este fim. Contudo, para esse trabalho será mais utilizado a economia canavieira, pois esta é que está mais representada e melhor demonstrada nas obras do artista Frans Post, artista escolhido por ter um conjunto de obras referentes à temática da colonização e da economia do Brasil colonial. E também por já ter construído uma história de grande destaque no cenário da pintura holandesa, sendo, pois, um nome de destaque entre os pintores que viviam em Amsterdã. No que se refere à cultura do açúcar esta teve seu início na ilha da Madeira, conforme Novais (1998), e seus recursos concentravam-se no alargamento do périplo africano de modo que estrangeiros tiveram sua participação desde muito cedo nesse ramo da economia, proporcionando, assim, a quebra do monopólio e consequente expansão do açúcar, cabendo, pois, aos flamengos a sua comercialização. Contudo, a Coroa portuguesa com sua perspicaz atitude proibiu aos estrangeiros a sua permanência nas colônias. Percebe-se pois a política seguida astutamente pela Coroa portuguesa: liberdade de comércio na fase inicial, para estimular a vinda de recursos e capitais para a instalação da produção colonial; enquadramento no sistema exclusivista quando a economia periférica entrava em funcionamento. Na implantação da economia açucareira no Brasil repetiu-se de certo o modo o processo [...] Na transição para a colonização, isto é, na implantação do cultivo da cana e preparo do açúcar, recorreu-se aos recursos particulares, através das concessões das capitanias [...] É contudo certo que nessa primeira fase o comércio do produto foi relativamente livre [...] expendendo-se, assim, a economia açucareira [...] já em 1571, isto é, na abertura da fase de grande prosperidade, decretava D. Sebastião [...] a exclusividade dos navios portugueses no comércio da florescente colônia (NOVAIS, 1998, 46-8). 20 Com essa atitude lusitana, os holandeses passaram a ir em busca de terras com tal riqueza, a saber o açúcar, para que eles pudessem ter maior domínio e controle sobre a economia europeia. A opção pela economia açucareira se deu por vários fatores. Tudo contribuía para a escolha da cana-de-açúcar: a natureza da colônia com seu clima quente e úmido e solo de massapê no litoral, o fato de Portugal já ter comercializado o mesmo produto nas ilhas atlânticas e a grande procura da Europa pelo açúcar, já que era uma especiaria vinda do oriente e seu comércio necessitava de muitos gastos e não conseguia atender a demanda da população europeia. Dessa forma, com a exploração das terras brasílicas seria uma fonte a mais de riqueza para o Velho Mundo e para o reino de Portugal. Outro fator que se liga à questão econômica é a própria figura do colonizador. O colono europeu que vem para os trópicos com a intenção de colonizar não é o tipo trabalhador e sim o explorador, o empresário, vindo, pois, para comandar, de forma que a grande exploração rural que o coloca na figura de senhor passa a interessar-lhe em grande medida, com afirma Caio Prado (1992) ao falar sobre as características fundamentais da economia colonial: “De um lado, esta organização da produção e do trabalho, e a concentração da riqueza que dela resulta; do outro, a sua orientação, voltada para o exterior e simples fornecedora do comércio internacional” (JÚNIOR, 1992, p. 125). Neste sentido, Sérgio Buarque de Holanda (1995), fala acerca da natureza do homem, natureza esta de fundamental importância para se entender a colonização do Brasil e exploração de suas terras. Ele afirma que há dois tipos de homem na formação e evolução de uma sociedade: o aventureiro e o trabalhador. O tipo aventureiro é aquele que vem para os trópicos ignorando as fronteiras, não se preocupando com os obstáculos, transformando estes em trampolim para o seu sucesso e da nação que representa. Já o trabalhador sabe aproveitar ao máximo o insignificante e todo esforço, que ocorre de forma lenta, pouco compensadora e persistente, tem sentido bem claro para ele. Seu ideal será colher o fruto sem plantar a árvore. (referindo-se ao tipo aventureiro – grifo meu) [...] Esse tipo humano ignora as fronteiras. No mundo tudo se apresenta a ele em generosa amplitude e, onde quer que se erija um obstáculo a seus propósitos ambiciosos, sabe transformar esses obstáculos em trampolim. Vive dos espaços ilimitados, dos projetos vastos, dos horizontes distantes. [...] O 21 trabalhador, ao contrário, é aquele que enxerga primeiro a dificuldade a vencer, não o triunfo a alcançar. O esforço lento, pouco compensador e persistente, que, no entanto, mede todas as possibilidades de esperdício e sabe tirar o máximo proveito do insignificante, tem sentido bem nítido para ele (HOLANDA, 1995, p.44). Observando a questão desse ângulo, no tocante à conquista e colonização do Brasil o trabalhador desempenhou um papel secundário, tendo em vista que o colonizador tinha como principal meta o lucro rápido que a terra poderia dar para os investidores europeus, ficando o papel do trabalho a cargo da mão-de-obra escrava. [...] é que as colônias existem e são estabelecidas em benefício exclusivo da metrópole; este benefício se realiza pela produção e exportação, para ela, de gêneros de que necessita, não só para si própria, mas para comerciar com o supérfluo no estrangeiro. [...] O Brasil existia para fornecer-lhes ouro e diamantes, açúcar, tabaco e algodão. [...] Todos os atos da administração portuguesa com relação à colônia têm por objeto favorecer àquelas atividades que enriqueciam o seu comércio [...] (PRADO JÚNIOR, 1992, p. 126). Quanto ao projeto de colonização através da ocupação de terras, mais uma vez a agricultura ganha destaque, passando a organizar-se em função da produção açucareira para complementação da economia europeia. Necessário era a colonização – com sentido aqui explicitamente de ocupação e povoamento – com fins políticos, para através dela se preservar a posse da terra até então disputada pelos corsários. Contudo, os colonizadores europeus não dispunham de contingente suficiente, segundo Novais, no povoamento das novas terras descobertas e, além disso, necessitavam de uma mãode-obra que garantisse seus lucros, escolhendo, portanto, os povos da África. O colonizador português se viu na necessidade de buscar mão-de-obra, tendo em vista que não tinha quantidade suficiente em Portugal e também não podia usar o trabalho assalariado, pois seria um recurso muito dispendioso, adotando, assim, o uso do trabalho escravo. Embora o negro não participasse na África de uma agricultura mercantil e capitalista, a utilização desse tipo de mão-de-obra já fora utilizada pelos muçulmanos e obtivera sucesso e, além disso, Décio Freitas (1973) menciona a existência da escravidão doméstica no continente africano, contudo não com fins lucrativos. Dessa forma, Freitas explica a principal causa para a substituição da escravidão indígena pela negra. 22 De acordo com o autor supracitado essa troca de mão-de-obra pode ser entendida a partir de uma análise do comércio triangular no qual a economia açucareira repousava. Os comerciantes europeus trocavam açúcar e fumo por escravos e os vendiam aos senhores de engenho, fato este que gerava grande endividamento na classe dominante colonial devido ao alto preço dos escravos cobrado pelos seus responsáveis pelo tráfico. Destarte, tentando não ter tantos gastos, o comerciante que veio aqui para adquirir produtos tropicais, ofereceu o negro que tinha um baixo valor na África, mostrando, assim, que a escravidão foi a consequência do tráfico e não a sua causa. Em segundo lugar, o sistema do chamado “comércio triangular” impunha ao senhor de engenho a compra de sempre mais escravos, independentemente de suas necessidades econômicas. O senhor de engenho estava submetido a uma irremediável contradição: se não comprasse escravos ao traficante, este a seu turno não lhe compraria o açúcar (FREITAS, 1973, p. 29). O elemento de maior importância quando se trata do sistema colonial é a grande propriedade monocultora trabalhada por escravos, no qual pode-se ver os fatores característicos da agricultura colonial: a grande propriedade, a monocultura e a escravidão. Quando se fala em economia o grande setor que surge é agricultura por ser esta prática o eixo econômico de toda e qualquer civilização. Foi ela a responsável por assentar a ocupação e exploração da maior e melhor parte do território. A agricultura é o nervo econômico da civilização. Com ela se inicia – se excluirmos o insignificante ciclo extrativo do pau-brasil – e a ela deve a melhor porção de sua riqueza. Numa palavra, é propriamente na agricultura que assentou a ocupação e exploração da melhor parte do território brasileiro. A mineração não é mais que um parêntese; de curta duração aliás [...] a cultura da terra voltava a ocupar a posição dominante dos dois primeiros séculos da colonização (PRADO JÚNIOR, 1992, p.130). Com o renascimento da agricultura houve um fator de extrema importância para a colonização e povoamento da colônia: um deslocamento do eixo das capitanias do interior para o litoral, de acordo com Caio Prado em seu Formação do Brasil contemporâneo: colônia. Para o açúcar, por exemplo, o clima úmido e quente do litoral era ideal. Esse fator climatérico somado à qualidade de alguns solos era a fórmula certa para o sucesso da cultura do açúcar. Além disso, era previsível que o eixo econômico- 23 agrícola se voltasse ao litoral, pois tudo que era produzido na colônia era exportado para a Europa e o transporte da época era o marítimo, sendo, portanto, necessário que os engenhos fossem localizados próximo aos portos. Ainda sobre o ponto de vista econômico do Brasil-colônia é válido ressaltar que a economia colonial é comumente ensinada de forma errônea, como afirma Manuel Correia de Andrade, visto que alguns historiadores admitem a ideia da existência de “ciclos”, como, por exemplo, ciclo do açúcar, ciclo do ouro e ciclo do café. Porém trabalhar essa ideia é afirmar que o produto do ciclo anterior deixou de ser cultivado a partir do momento que um novo ciclo passa a existir, quando, na verdade, ele só ganha uma menor expressividade. De acordo com Andrade também é errado pensar em modos de produção quando se trata da economia brasileira, devendo a interpretação desta ser feita através de conceitos ligados à formação econômico-social. Antes mesmo da colonização o Nordeste já tinha sua importância do ponto de vista econômico. Em Pernambuco já havia feitorias onde era forte a presença da prática do escambo, sendo, assim, um negócio lucrativo se o transporte até a Europa corresse tudo bem. Após os primeiros 30 anos de exploração meramente florestal, já que apenas era retirado o pau-brasil, é que teve início a cultura do açúcar, a qual ganhou destaque em Pernambuco e na Bahia. A colonização, de fato só tem início com a figura de Duarte Coelho, quem começou tal cultura, motivado pelas vantagens que seu comércio poderia conceder na Europa e também as condições para seu plantio nas terras brasílicas. Esta demandava grande emprego de mão-de-obra e capitais para a implantação dos engenhos, daí o motivo para a implantação dos escravos africanos. Isso gerou, consequentemente, a necessidade de se produzir outros alimentos que se adaptassem ao solo brasileiro para a população que crescia, bem como a importação de alguns animais como bovinos e equinos, por exemplo. Além disso, em alguns lugares as condições geográficas não favoreceram o plantio da cana-de-açúcar, de forma que foram criados currais para a criação de gado necessário na cultura açucareira. A primeira grande lavoura no Brasil foi o açúcar, cronológica e importantemente falando, pois contribui para colonização ao passo que serviu de base material para que o europeu se estabelecesse naquele território. Além disso, mesmo tendo que competir com a mineração a economia açucareira foi responsável pela maior quota de riqueza do Brasil e constituiu-se como principal eixo econômico. 24 A economia comercial interna do açúcar tem início na verdade com Portugal, conforme afirma Celso Furtado (2007), sendo os holandeses, porém, que recolhiam o produto em Lisboa, refinavam-no e distribuíam-no por toda a Europa. Dessa forma, a contribuição dos flamengos no cenário econômico colonial foi de extrema importância, constituindo um fator fundamental de êxito da colonização do Brasil, tendo em vista que eram os únicos que dispunham de organização comercial suficiente pra abrigar um produto praticamente novo, como o açúcar. Os portugueses haviam já iniciado há algumas dezenas de anos a produção, em escala relativamente grande, nas ilhas do Atlântico, de uma das especiarias mais apreciadas no mercado europeu: o açúcar. Essa experiência resultou ser de enorme importância, pois, demais de permitir a solução dos problemas técnicos relacionados com a produção do açúcar, fomentou o desenvolvimento em Portugal da indústria de equipamentos para os engenhos açucareiros. [...] A contribuição dos flamengos [...] para a grande expansão do mercado do açúcar, na segunda metade do século XVI, constitui um fator fundamental de êxito da colonização do Brasil. Especializados no comércio intra-europeu, grande parte do qual financiavam, os holandeses eram nessa época o único povo que dispunha de suficiente organização comercial para criar um mercado de grandes dimensões para um produto praticamente novo, como era o açúcar. [...] E não somente com sua experiência comercial contribuíram os holandeses. Parte substancial dos capitais requeridos pela empresa açucareira viera dos Países Baixos. Existem indícios abundantes de que os capitalistas holandeses não se limitaram a financiar a refinação e comercialização do produto. Tudo indica que capitais flamengos participaram no financiamento das instalações produtivas no Brasil bem como no da importação da mão-de-obra escrava. (FURTADO, 2004, p. 31, 33, 34). Vera Lúcia Amaral Ferlini afirma que a cana de açúcar teve como um de seus aspectos mais marcantes o seu modelo de produção colonial, tendo como base a grande propriedade monocultora e escravista, de forma tal que deslocava os senhores de engenho, causando, assim, uma total dependência da casa-grande, pois era impossível o desenvolvimento autônomo destes. O modelo de produção colonial, baseado na grande propriedade monocultora e escravista açucareira, consagrou o poderio dos senhores de engenho, impedindo o desenvolvimento autônomo de uma camada de pequenos e médios proprietários, que tinham as condições de sua existência atrelada ao engenho, que lhes moía as canas e comprava sua produção de mantimentos, tábuas, telhas tijolos etc. [...] Os que não tinham recursos sequer para arrendar terras, gravitavam em torno do engenho, como trabalhadores especializados 25 do açúcar, moradores agregados, prestando serviço aos senhores. Foram, também, elementos essenciais para a manutenção da dominação política e social dos senhores, bem como de seu domínio militar (FERLINI, 2002, p.23). A produção açucareira teve um sucesso muito rápido, sendo o engenho, conforme Caio Prado, o elemento central desse eixo econômico, o qual abrangia grandes áreas e constituía-se numa organização complexa e dispendiosa, compreendendo “[...] numerosas construções e instalações: moenda, caldeira, casa de purgar, etc.; além da casa-grande que é a habitação do senhor [...], a senzala dos escravos e instalações acessórias e suntuárias” (JÚNIOR, 1992, p. 146 e 147). Sua disposição sobre o terreno refletia, assim, em grande medida a hierarquia de cada edifício, além do material utilizado em cada construção. O número dos engenhos crescia rapidamente, mostrando, assim, a ampliação da economia e o forte investimento do capital estrangeiro pelos lucros externos. [...] entre Itamaracá e São Vicente nos anos de 1570, existiram sessenta engenhos produzindo anualmente em torno de 2700 toneladas de açúcar [...] dez anos mais tarde, falava dos engenhos – Bahia, 36; Ilhéus, 3; Porto Seguro, 1; Pernambuco, 66; Espírito Santo, 6; Rio de Janeiro, 3 (MAESTRI, 2001, p. 76). A sociedade colonial no Brasil, principalmente em Pernambuco e no Reconcavo da Bahia, desenvolveu-se patriarcal e aristocraticamente à sombra das grandes plantações de açúcar, não em grupos à esmo e instáveis; em casas-grande de taipa ou de pedra e cal, não em palhoças de aventureiros (FREYRE, 2000, p. 91). Suas terras, além dos canaviais, são reservadas em parte para outros fins: pastagens – o engenho emprega no seu manejo grande número de cavalos e bois – culturas alimentares para pessoal numeroso; matas quando ainda sobram, para lenhas e madeira de construção (PRADO JÚNIOR, 1992, p. 147). As terras, como pode ser visto na citação, além de serem destinadas para os canaviais, são utilizadas ainda para pastagens dos animais que o engenho abriga e culturas de outros gêneros alimentícios para pessoal numeroso. Essa produção de outros gêneros alimentícios no engenho era chamada de “sistema do Brasil”, segundo Andrade, no qual os senhores de engenho permitiam que seus escravos cultivassem em áreas marginais, nos dias santos, feriados e domingos, produtos para sua auto sustentação. Um engenho, além de terras férteis e adequadas ao cultivo da cana-de-açúcar, precisava ter matas que fornecessem madeiras de construção e lenha farta para usar 26 como combustível das fornalhas, e um curso de água para abastecimento dos líquidos necessários e para mover as moendas. Muito deve o Brasil agrário aos rios menores porém mais regulares: onde eles docemente se prestaram a moer as canas, a alagar as várzeas, a enverdecer os canaviais, a transportar o açúcar, amadeira e mais tarde o café, a servir aos interesses e necessidades de populações fixas, humanas e animais, instaladas ás suas margens; aí a grande lavoura floresceu, a agricultura fundiária prosperou, a pecuária alastrou-se (FREYRE, 2000, p. 99). O engenho foi o grande polo aglutinador da sociedade do açúcar no início da colonização, sendo também responsável por ordenar a propriedade e o uso da terra em função do comércio. O trabalho realizado no engenho era completamente escravo e a quantidade dos cativos variava, devendo, contudo, cada engenho ter, no mínimo 80 escravos e “[...] quem não tem mais de 80 é reputado fraco senhor de engenho” (PRADO JÚNIOR apud VILHENA, 1992, p. 147). É importante perceber o papel que o engenho tinha nos primeiros séculos de colonização, sendo ele, além de aglutinador, articulador da rede fundiária do açúcar e elemento de concentração de poder já que era responsável ao mesmo tempo pela inclusão e exclusão de indivíduos na medida em que tudo girava em torno do engenho, conforme afirma Ferlini. O engenho foi o locus (grifo do autor) preferencial dessa sociedade, o elemento que, além de concentrar e vinculá-la ao seu sentido mercantil, tornava possível executar as funções que dão sentido a uma série de atividades. Foi, sem dúvida, o elemento de configuração da sociedade rural. Assim, através do engenho, realizava-se, ao mesmo tempo a inclusão e a exclusão dos indivíduos. Se o engenho era o elemento que dava sentido à produção, se somente através dele a produção podia se realizar, se era ele o elemento mediador entre essas produções individuais e o nível mercantil, fora dele não havia possibilidade de sobrevivência colonial. E àqueles que eram realmente excluídos de qualquer acesso à terra [...] restava gravitar em torno dos engenhos, como agregados, moradores, trabalhadores assalariados na produção do açúcar. [...] Não se trata apenas de sobrelevar o engenho como centro de vivência rural. É preciso entendê-lo em seu papel de articulador da rede fundiária do mundo do açúcar e de elemento de concentração de poder (FERLINI, 2002, p.26). Contudo, mesmo com tantos elementos favoráveis à produção de açúcar, o sistema agrícola colonial teve seu insucesso ligado a alguns fatores como, por exemplo 27 a separação da agricultura e da pecuária, tendo em vista que o gado ajudava em vários fatores com, por exemplo, o trabalho na terra, o transporte como força motriz, sendo essa sua principal função, e ainda era o grande responsável pelo adubo, através de seu estrume. A principal atividade propiciada pelo açúcar foi a pecuária, esta que desenvolveu-se no litoral abastecendo a zona canavieira, porém a extensão de terras para o cultivo da cana-de-açúcar fez com que o rei de Portugal Dom Pedro II estabelecesse através de uma Carta Régia a proibição formal do gado desenvolver-se fora do interior. O gado foi sempre um servo da cana; ocupava áreas pioneiras à sua esfera e cada vez se distanciava mais do litoral, tendo consequentemente que ir alongando cada vez mais as suas caminhadas para chegar aos centros de consumo. Foi ele que desbravou e ocupou os vales fluviais distantes de Olinda, fixando-se, ao Sul, no Vale do São Francisco e nos campos de Sergipe e, ao Norte, nos tabuleiros da Paraíba e do Rio Grande do Norte. Não fosse a pecuária e os tabuleiros se teriam tornado verdadeiros vazios demográficos e econômicos entre as áreas úmidas e férteis das várzeas (ANDRADE, 1973, p. 101). A fatal separação entre a agricultura e a pecuária, corolário daquele sistema, e que constitui um dos traços mais característicos da economia rural da colônia, também foi funesta para o trato do solo, privando-o como o privou do único elemento fertilizante que poderia dispor: o estrume dos animais (PRADO JÚNIOR, 1992, p. 136). Além disso, o desenvolvimento da indústria açucareira nas Antilhas proporcionou uma produção mais econômica do que a brasileira e havia também a política monopolista dos colonizadores, estes que apenas permitiam o comércio da colônia com a sua metrópole. E Caio Prado atribui ainda os baixos índices da agricultura colonial ao sistema geral da colonização baseado no regime de escravidão africana, tendo tal regime um trabalho ineficiente e semibárbaro. Seria difícil realizar qualquer coisa de muito melhor com trabalhadores desta natureza. Numa de suas admiráveis cartas, Vilhena descreve as atividades nos engenhos; observações colhidas na Bahia, o maior e mais importante centro açucareiro da colônia. A ignorância, a incapacidade, a falta de atenção e cuidado com que se maneja a fabricação do açúcar são de pasmar (PRADO JÚNIOR, 1992, p.139140). É certo dizer que a economia colonial teve como um de seus sustentáculos a produção açucareira, contudo a cana-de-açúcar apenas se estabeleceu como principal 28 produto brasileiro no século XVI por exigir um investimento muito alto devido à sua produção e à necessidade de um engenho. É importante, ainda chamar a atenção, como fazem Arno e Maria José Wehling, para a diferença entre produção canavieira e produção açucareira: muitos proprietários de terras não dispunham de recursos para instalar unidades produtoras, de forma que os grandes engenhos centralizavam a produção de cana-de-açúcar de alguns desses lavradores livres, os quais pagavam em açúcar a moagem da cana. Andrade informa que a exploração da cana-de-açúcar proporcionou um desbravamento imensurável na região Nordeste. Enquanto até o século XX São Paulo e alguns estados da região Sul ainda tinham terras para ser desbravadas, um levantamento feito no século XVIII, com base nos Anaes da Biblioteca Nacional, verifica um largo povoamento daquela região. Levantamento feito em 1774, constata um povoamento quase contínuo em toda a região estudada, desde Natal, Rio Grande do Norte, até Penedo, no atual Estado de Alagoas. Sergipe e o Norte da Bahia já eram também naquele ano bastante povoados. A área canavieira localizava-se quase sempre próxima ao litoral, mas em Pernambuco já penetrara bastante para o interior em freguesias como Tracunhém, Vitória de Santo Antão, e São Lourenço da Mata, que ficavam nos fins do século XVI, em plena área de exploração do pau-brasil (ANDRADE, 1973, p. 82). 1.1 O trabalho negro na economia colonial brasileira Existe, ainda, um terceiro eixo da economia colonial, o qual representava o sustentáculo da economia canavieira, eixo este que também diz respeito à sociedade formada durante esse período da História do Brasil: a mão-de-obra. O cultivo do açúcar foi um sucesso no ponto de vista econômico, contudo a organização das primeiras plantações açucareiras aumentaram as contradições entre recém-chegados e nativos. A grande quantidade de terras férteis tornou a propriedade rural como a grande unidade de produção. Para Manuel Correia de Andrade (1986), a dificuldade maior se constituía na força de trabalho, tendo em vista que os índios não satisfaziam a necessidade da mão-de-obra açucareira, pois além do plantio e colheita havia também os trabalhos domésticos, como transporte da cana, fabricação do açúcar entre outros, daí se explica a escravidão negra: por haver experimentado o regime servil na África, gerando, assim, uma produtividade maior. Conforme Mário Maestri (2001), a jornada 29 de trabalho exigida pela produção açucareira era longa, dura e ininterrupta, requerendo muita mão-de-obra, esta que precisava, além de ser ampla, ser barata para que pudesse render bons lucros para a economia europeia. No que se refere à mão-de-obra, inicialmente foi utilizada a indígena na extração do pau-brasil, não atendendo a demanda e tarefas da exploração da cana-de-açúcar, por não estarem aptos ao sistema exigido pelos colonos. Segundo Darcy Ribeiro (apud LOPES), o indígena conhecia a agricultura como ninguém, levando o autor a recusar a afirmação de que o índio não estava preparado para o trabalho na lavoura da cana. O fato, entretanto, é que aquela agricultura com regime escravo e misto de capitalismo e mercantilismo não fazia parte da rotina do índio. Foi assim que até os jesuítas acabaram se opondo à sua escravização “[...] convertendo-o à religião católica e reunindo-o nas missões, dentro de um sistema econômico teocrático-coletivista” (LOPES, 1984, p. 37), tendo em vista que estavam os clérigos interessados em facilitar o processo de conversão religiosa dos índios. Quanto ao problema do trabalho e da mão-de-obra, Sérgio Buarque afirma que verificou-se, após algumas tentativas frustradas, que o índio não daria muitos lucros no tocante à produção, sendo mais rentável a utilização da mão-de-obra negra, esta que recebia maus tratos e pouca alimentação, sendo, muitas vezes, tratados como animais. Os indígenas, habitantes da terra quando da chegada dos colonos, não eram os mais indicados, pois apenas realizariam funções por um curto espaço de tempo e sendo bem retribuídos. Além disso, houve também a proibição, por parte dos jesuítas, da mãode-obra indígena. Mas, o problema principal, o mais sério, era o da mão-de-obra, de vez que os trabalhadores eram necessários não só à cultura da cana [...] como à fabricação e ao transporte do açúcar e ainda à cultura de mantimentos e aos serviços domésticos. Os índios não satisfaziam a necessidade da mão-de-obra; inicialmente eram pouco numerosos e as guerras e a migração para o interior contribuíram seriamente para diminuí-los. Além disto, o seu desenvolvimento cultural não havia atingido, ainda, a fase da agricultura sedentária, de vez que na época do descobrimento ainda se alimentavam, sobretudo, dos produtos da coleta, da caça e da pesca. Ainda mais conhecendo bem a região, fugiam facilmente para a mata, onde se alimentavam dos produtos fornecidos pela floresta, conheciam os seus perigos e os meios de evita-los. Ainda em favor do gentio [...] havia uma série de leis regulamentando os casos em que podiam ser escravizados [...] (ANDRADE, 1973, p. 70). 30 Vale ressaltar que embora os indígenas tenham se constituído na primeira mãode-obra escravizada, ela foi substituída de forma gradual por alguns motivos, dentre eles os principais sendo a questão da resistência dos índios ao trabalho e a proteção dos jesuítas àqueles. Com a necessidade de mão-de-obra para manter a economia pensou-se no africano que chegava até a colônia através do tráfico, este que a partir do ponto de vista econômico era um dos principais empreendimentos comerciais do mundo atlântico. A primeira escravidão utilizada no Brasil foi a indígena. Os índios realizavam tarefas em troca de mercadorias, compondo um sistema chamado escambo. Os índios, no início da colonização, aceitaram trabalhar nas lavouras de subsistência, porém revoltaram-se quando perceberam que os europeus apenas queriam tirá-los as suas terras e sua liberdade. No início estabeleceram com o donatário relações completamente pacíficas e amistosas, deixando-se converter ao cristianismo, ajudando no devassamento do território e até trabalhando de bom grado nas primeiras lavouras de subsistência. Mas explodiram numa feroz rebeldia quando viram que o donatário queria apenas despojá-los das suas terras e das suas ancestrais liberdades (FREITAS, 1973, p. 15). O plantio e fabrico do açúcar, porém, exigiram uma força de trabalho mais qualificada e que rendesse maiores lucros. Dessa forma, a passagem do escambo à escravidão foi paulatina, mas não completa no sentido de que a predominância da mão-de-obra africana em substituição da indígena apenas ocorreu nas duas primeiras décadas do século XVII com a expansão da indústria açucareira. O escravo africano tem preferência devido aos moldes do sistema mercantilista e à necessidade de manter o acúmulo na metrópole, além de haver a questão da extraterritorialidade da mão-de-obra ser de fundamental importância para tal acúmulo. A economia colonial “não possuía um mecanismo interno, natural, de auto-reprodução porque a sua força de trabalho nunca pôde ser homeostaticamente estabilizada no interior do sistema” (PUNTONI apud ANDERSON, 1999, p.22), ficando claro, assim, a necessidade de conquistas exteriores para suprir a mão-de-obra do espaço produtivo. Os povos lusitanos que acompanharam os capitães-mores não aceitavam os trabalhos em piores condições do que as europeias. Maestri concorda com Sérgio Buarque ao afirmar que os colonos europeus não fazem o perfil do homem trabalhador. 31 Destarte, como já fora utilizada a mão-de-obra escrava nas ilhas atlânticas e viu-se bons resultados, o processo foi repetido no Brasil, não havendo muita preocupação com o escravo negro, pois, de acordo com Pero de Magalhães de Gândavo, estes eram “mais seguros que os índios da terra porque nunca fogem nem têm para onde (fugir)” (GÂNDAVO apud MAESTRI, 2001, p. 60). Além disso, o objetivo principal da Europa com o Novo Mundo era explorá-lo e obter lucros com ele, como afirma Maestri ao dizer que “os portugueses introduziram no Brasil as técnicas e os métodos açucareiros aclimados na ilha da Madeira. Para eles a escravidão era a solução natural para os problemas de mão-de-obra impostos pelo Novo Mundo” (MAESTRI, 2001, p. 54). Nas ilhas atlânticas e na bacia do Mediterrâneo já se praticava, havia muito, uma pequena e média produção escravista do açúcar. Os lusitanos serviram-se da mesma solução quando enfrentaram o problema da mão-de-obra no Brasil. Não se tratava de colonizar, civilizar ou catequizar o Novo Mundo; pretendia-se apenas explorá-lo. Em toda economia mercantil o objetivo da vida social é o lucro (MAESTRI, 2001, p. 31). Afirma Celso Furtado (2007) que a principal dificuldade da economia açucareira foi a questão da mão-de-obra, tendo em vista que o índio que já era utilizado para este fim não era viável para os engenhos. Assim a única condição encontrada foi o tráfico de escravos negros, tendo a escravidão, portanto, demonstrado desde o início a condição de sobrevivência do colono europeu. Contudo, faz-se importante esclarecer que a mão-deobra negra não substituiu a indígena, passando esta a deixar de existir. Apenas para a economia açucareira o negro era mais indicado que o índio. Foi esta mão-de-obra, considerada de segunda classe, que permitiu a subsistência de alguns núcleos onde a produção de açúcar falhou como é o caso, por exemplo, de São Vicente. A escravidão (grifo do autor) foi o regime de trabalho preponderante na colonização do Novo Mundo; o tráfico negreiro (grifo do autor) que a alimentou, um dos setores mais rentáveis do comércio colonial. Se a escravidão acrescermos as várias formas de trabalho compulsório, servil e semi-servil [...] resulta que estreitíssima era a faixa que restava, no conjunto do mundo colonial, ao trabalho livre (NOVAIS, 1998, p. 79). Era tamanha a importância do tráfico de escravos que por onde o domínio da cultura da cana-de-açúcar ia se estendendo o mesmo acontecia com a escravidão. Gilberto Freyre mostra que essa cultura não teria sido possível sem o trabalho do escravo negro. Há uma frase célebre e de tamanha expressividade do padre Antônio 32 Vieira: “sem negros não há Pernambuco” (MELLO apud VIEIRA, 2007, p.183). É o mesmo que dizer que sem essa mão-de-obra não há açúcar, tampouco economia, já que a base da economia pernambucana, e por que não dizer da colônia, era o açúcar. Quando os holandeses chegaram à Pernambuco já se depararam com o tráfico de escravos vindos da África e, no início, mostravam-se contrários à escravidão, na figura de Usselincx, o qual tinha relação com a Companhia Ocidental, como afirma a citação a seguir: É um engano supor que os espanhóis com os seus escravos obterão maiores lucros nos seus negócios do que nós: diz-se comumente que com cachorros ruins não se pegam coelhos; do mesmo modo o trabalho constrangido em pouco resulta. Um só homem deste país trabalha mais do que três negros, que custam muito dinheiro (MELLO apud USSELINX, 2007, p. 184). Usselincx afirmava que a escravidão era um regime antieconômico e desumano que Pela mesma razão que na Índia se executa a maior parte do trabalho por meio de escravos que custam muito, trabalham de má vontade e morrem rápido por causa dos maus tratos dos seus senhores, estamos certos de que seria muito mais proveitoso o uso de pessoas livres; além do mais, o escravo não deixa outro proveito a não ser o seu trabalho, porque sendo nu nada adquire ou necessita da indústria (CORDOVA-BELLO, Eleazar. Compañias holandesas de navegación. Sevilla, 1964, p.203, apêndice II, tradução de Pedro Puntoni). Contudo, o comércio de escravos realizado por Portugal e Espanha proporcionou uma aceitação da escravidão por parte dos Países Baixos e logo se tornaram um dos maiores participantes do tráfico de escravos. “Transportam-se da África para o trabalho agrícola no Brasil nações quase inteiras de negros” (FREYRE, 2000, p. 83) e, no que se refere ao tráfico, Maestri mostra que as condições dos navios negreiros e de como eram transportados os cativos africanos eram péssimas e Gustavus Vassa1 relata algumas destas ao lembrar do “[...] 1 Gustavus Vassa foi um dos poucos africanos escravizados a deixar suas impressões sobre a travessia. Neste trecho ele fala com compunção do terror que sentiu quando, a bordo de um negreiro, foi apalpado e examinado por estranhos homens brancos. Pensava ter ingressado em um “mundo de espíritos malignos”, no qual encontraria a morte. Ele conta ter desmaiado de medo. Entre os africanos era difundida a crença de que eram transportados, além-mar, para serem comidos pelos brancos ou por uma raça de gigantes antropófagos. No que, de certo modo, não se enganavam. As unidades escravistas coloniais devoravam vorazmente africanos feitorizados no trabalho. 33 pestilento amontoado em que os cativos se encontravam, o calor, o suor, o ar irrespirável, o fedor nauseante dos porões. As correntes, os balde-latrina, os gritos das mulheres, dos moribundos e dos castigados [...]” (MAESTRI, 2001, p. 71). Essa realidade era era explicada e justificada como preparação do negro para a escravidão, pois ao chegar em terra firme e deparar-se com um tratamento um pouco melhor que o do navio o cativo enxergava seu novo destino – ser escravo americano – de forma mais otimista. Segundo Pedro Puntoni (1999), os primeiros registros de envolvimento dos holandeses com o tráfico de escravos datam do fim do século XVI, podendo, inclusive, segundo o historiador Pietter Emmer2 esse envolvimento ser dividido em três fases, conforme mostra a citação: [...] a história da participação dos mercadores holandeses no tráfico de escravos, o século XVII, poderia ser compreendida em três diferentes etapas. Primeiro, um momento de tráfico incidental, iniciado pelo episódio da captura pelo navio midelburguês, até a conquista do porto de embarque de escravos de escravos na costa ocidental da África, São Jorge da Mina. [...] Desde então, e isto seria a segunda etapa, o tráfico de escravos realizar-se-ia sob o controle da Companhia Ocidental, atendendo aos interesses gerados por sua política colonial. Neste segundo momento, portanto, os holandeses estriam envolvidos no tráfico de uma forma regular. Este “primeiro pico” de comércio (grifo do autor) duraria até o ano de 1635 [...] quando a economia açucareira se desorganiza completamente e a região produtora e, consequentemente, o mercado de escravos estão perdidos para os holandeses. O tráfico é imediatamente desviado ao Caribe, onde os holandeses criam um entreposto e acabam por se especializar nesse comércio [...] Este terceiro momento seria coroado [...] quando os novos asientistas, fazem um acordo com a Companhia das Índias Ocidentais, contratando-a para o transporte dos escravos africanos (PUNTONI, 1999, p. 89-90). Contudo, houve muitos conflitos entre holandeses e outros europeus em virtude da disputa por mão-de-obra. A tímida participação dos Países Baixos no comércio de escravos, em seus anos iniciais, explica-se pelo fato de sua falta de conhecimento de quais procedimentos eram necessários para gerência do sistema sul-atlântico de produção do açúcar, no que se refere à mão-de-obra forçada e não compreendiam o quão necessário era e os meios de reprodução da produção escravista e ainda 2 Pedro Puntoni cita o historiador Pietter Emmer para tratar da participação dos holandeses no tráfico de escravos. 34 participavam de discussões sobre a forma certa de povoar e organizar a produção colonial sendo tais termos resolvidos com a presença de Nassau. José Antônio Gonsalves Mello (2007) fala sobre a existência de quilombos no governo de Nassau e que o governo holandês castigava exemplarmente os escravos que conseguia capturar: enforcava-os ou os queimavam vivos. Muitos quilombos existiram no período da dominação holandesa, mas há poucas informações sobre eles, sendo o de Palmares que mais ganhou repercussão, tendo em vista ter informações deste até mesmo em documentos da época3. Foi durante o período da dominação holandesa que tiveram condições para se desenvolver vários quilombos, desde 1638 há referência a quilombos que constituíam uma grave ameaça para as populações e os bens dos moradores. Havia, também, pequenos aldeamentos ou bandos de negros que roubavam e matavam pelos caminhos: os boschnegers (MELLO, 2007, p. 192). Os holandeses estavam interessados apenas em enriquecer, de forma tal que não tratavam de forma afetuosa os seus escravos, preferindo estes, em grande medida, senhores portugueses ou judeus pelos dias de folga que estes lhes ofertavam. Para os escravos era quase um castigo trabalhar para os flamengos. Trabalhavam todos os dias da semana e nem aos domingos tinham licença para folgar ou para invocar seus orixás. Apesar da proibição do trabalho aos domingos, esta não era respeitada, sobretudo no interior, pelos holandeses (MELLO, 2007, p. 197). Embora a presença da escravidão tenha sido marcante na economia colonial o trabalho livre também esteve presente em diversas atividades, interessando aqui o cultivo da cana-de-açúcar, no qual se destacava os lavradores de cana, que segundo Wehling [...] compreendiam dois tipos: os que trabalhavam nas terras do senhor com recursos próprios, pagando em açúcar ou cana uma percentagem pelo aluguel da terra e a utilização do engenho, e aqueles que recebiam, além da terra, os recurso necessários para cultivá-la, inclusive escravos cedidos ou alugados (WEHLING, 2005, p. 201). 3 Um dos documentos citados na obra de José Antônio Gonsalves Mello é o diário da viagem do capitão João Blaer aos Palmares em 1645 in BPB, traduzido por Alfredo de Carvalho, RIAP nº 56, Recife, 1902. 35 1.2 A face da “Guerra do açúcar” na dominação holandesa e os feitos de Nassau Segundo Wehling (2005), o período das invasões holandesas também ficou conhecido como “Guerra do açúcar”. Porém, as invasões não tinham como único objetivo o aspecto econômico, tendo em vista o controle de produção da maior riqueza da época. De acordo com Fernando Novais (1998), os flamengos vêm destacando-se no contexto da economia europeia de modo muito peculiar desde a Idade Média, sendo, pois uma região que destacou-se como um dos centro da economia de mercado mais ativos na Europa. Tal posição ocupada pelos Países Baixos era oriunda da sua situação de entreposto, centro de transferência de produtos e redistribuição das áreas da economia europeia. Os holandeses tiveram alguns problemas em sua primeira viagem ao Oceano Índico. De acordo com afirmações de Capistrano de Abreu foi uma “[...] viagem demorada, de pouco proveito imediato, mas fecundíssima em consequências, pois logrou a certeza da fragilidade do domínio peninsular naquelas regiões alongadas” (ABREU apud MAESTRI, 2001, p. 92). Contudo após a descoberta do caminho não pararam mais e sendo, então, detentora de privilegiada distribuição de açúcar na Europa, a Holanda passou a almejar maiores lucros, decidindo, então eliminar o controle direto de Portugal da região açucareira do Brasil. Para tanto os holandeses planejaram minuciosamente as expedições militares para invasão e conquista da colônia portuguesa, especialmente a de Pernambuco em 1630, após uma fracassada tentativa na Bahia. A Companhia das Índias Ocidentais escolheu uma opção que aumentava ainda mais as vantagens que a Holanda já tinha no que se refere ao poderio militar: o poder naval, já que os batavos acreditavam que o Brasil seria ocupado de forma mais fácil através do bloqueio naval, que, por sua vez, provocaria uma rendição, a qual, automaticamente, geraria o controle interno da colônia e dos centros de produção açucareira, os grandes focos da ocupação holandesa. Informação pouco conhecida é de que a Holanda já tinha interesse nas terras brasileiras antes mesmo da Companhia das Índias Ocidentais, como Mello afirma na citação: O que existe de concreto é que navios holandeses, apenas disfarçados em embarcações pertencentes a comerciantes portugueses, assumiram uma proporção substancial do tráfego entre o Brasil e a Europa e que esta participação continuou a crescer, a despeito da união das coroas 36 portuguesas e espanhola [...] e dos vários embargos decretados pelos soberanos peninsulares contra navios neerlandeses em portos ibéricos. Após a trégua hispano-neerlandesa [...] comerciantes holandeses chegaram a controlar entre a metade e dois terços da navegação entre Portugal e o Brasil. Concluída a trégua em 1621, as autoridades holandesas embarcaram numa política agressiva contra o Império colonial português, visando a substituir o comércio pacífico pela conquista territorial. É naquele mesmo ano que se funda na Holanda a Companhia das Índias Ocidentais, a quem o estado reconhecida direitos monopolistas no tocante à conquista, comércio e navegação da América [...] (MELLO, 1987, p. 19). O contexto político também motivou, em grande medida, a invasão holandesa às terras brasílicas, tendo em vista que Portugal e Espanha eram nações aliadas por meio da União Ibérica e a Holanda era inimiga da Espanha. É importante frisar que a ocupação holandesa no Nordeste do Brasil tem seu início em 1624, quando houve a tomada de Salvador, esta sem êxito devido à forte resistência dos nativos e dos colonizadores que aqui já estavam. Contudo, em 1630 Portugal e Espanha não puderam organizar uma defesa mais eficiente, em virtude dos conflitos internos da União Ibérica, e os holandeses tiveram sucesso com a conquista da capitania de Pernambuco. E apenas em 1637 que Maurício de Nassau chega aos Trópicos, o que mostra, de acordo com Evaldo Cabral de Mello (1987), que esse período compreende dois momentos que, na verdade dividem-se em três, sendo uma fase inicial de conquista flamenga e resistência luso-brasileira, um período pacífico durante o governo de Nassau e uma etapa de guerras que encerra essa tripartição. A ocupação holandesa no Nordeste compreende dois episódios de duração desigual: a conquista de Salvador (1624-1625) e a invasão de Pernambuco (1630-1654) [...] examinado de perto, este calendário sugere naturalmente uma periodização tripartida. Uma fase inicial (1630-1637) de conquista para os holandeses, de resistência para os luso-brasileiros; um período de paz (1638-1645), associado comumente ao governo nassoviano; e uma etapa final de guerra (1645-1654), de restauração na perspectiva luso brasileira, de repressão do levante restaurador na ótica neerlandesa (MELLO, 1987, p. 13-15). A imagem que o europeu tinha dos trópicos não era das melhores. As terras brasílicas eram representadas em crônicas e correspondências de viajantes como sendo um lugar de esplendor e riquezas, contudo o que encontravam era pobreza. Esse quadro só mudou a partir da ocupação dos holandeses na capitania de Pernambuco, os quais, a partir da figura de Nassau, construíram belas casas, abriram ruas, pontes entre outras 37 obras holandesas. Vale ressaltar que todas essas ações foram oriundas de um projeto de urbanização de Recife, projeto este que objetivava facilitar a produção do açúcar. Os holandeses ao chegarem ao Brasil aportaram suas embarcações na capitania de Pernambuco. O segundo destino optado pelos batavos foi tal capitania em virtude de ser a maior região produtora de açúcar no mundo. Além disso, cartas do governador Matias de Albuquerque possibilitaram aos flamengos ricas informações sobre a capitania em questão, como, por exemplo, a situação das fortificações de Olinda e Recife e alguns dados completos sobre a produção açucareira. Além da grande quantidade de cana-de-açúcar presente nessa capitania, os flamengos tinham conhecimento também da cultura e exploração da cana no Nordeste. Recife era, de acordo com os documentos antigos citados por José Antônio Gonsalves de Mello (2007), apenas um burgo sem vida própria e totalmente dependente de Olinda nos primeiros anos do século XVII. Contudo, mesmo com essa dependência, o lugar era uma tentação para os piratas mais destemidos devido às riquezas oferecidas pela terra. E foi isso que levou os holandeses a invadirem tal capitania. Após a tentativa frustrada de invasão do centro político – Bahia – os holandeses tentaram apossar-se do centro econômico do século seiscentista. A conquista de Pernambuco por parte dos holandeses representou um empreendimento bem diferente da colonização portuguesa. Embora ambos fossem comerciantes, quando os portugueses chegaram às terras brasílicas depararam-se com uma terra desconhecida, enquanto que aqueles já chegaram conhecendo a terra e suas possibilidades de lucro. Enquanto os portugueses tiveram que organizar a base econômica da colônia quando chegaram devido à cultura primitiva que encontraram, os holandeses quando chegaram à Pernambuco encontraram um Brasil organizado já com seu sistema de produção e de trabalho formados e o Nordeste, especificamente, com sua economia baseada no açúcar e no negro. Tal fato gerou certa facilidade maior para os flamengos. A conquista holandesa da capitania de Pernambuco foi difícil, porém, devido à destruição oriunda dos constantes conflitos entre holandeses e portugueses. Após mais de cinco anos de lutas e destruição nas capitanias nordestinas os holandeses precisavam reorganizar a economia que estava abalada. Para tal tarefa a melhor pessoa era Maurício de Nassau, “[...] chegado ao Recife em 1637, era a figura mais indicada para concluir e consolidar a conquista, pois às suas qualidades de administrador juntava grande espírito de tolerância [...]” (ANDRADE, 1973, p. 76). 38 Fernando da Cruz Gouvêa cita C.R. Boxer entre outros historiadores para afirmar a ideia de que não havia melhor escolha para assumir o cargo de governador da Nova Holanda do que o conde Maurício de Nassau, contratado em 1636 pela Companhia das índias Ocidentais (WIC4) para governar e administrar a capitania de Pernambuco, tendo em vista a sua linhagem pertencer a uma das famílias mais famosas da Europa e ter iniciado cedo uma carreira militar virtuosa. Conforme afirma Gaspar Barlaeus “pelas qualidades reveladas na milícia europeia, todos o desejavam nesse posto [...]” (GOUVÊA apud BARLAEUS, 1998, p. 37). Vale ressaltar que grande parte das informações acerca dos feitos de Nassau são baseadas nas fontes e relatos de Barlaeus, o qual representava a imagem de Nassau como um herói sendo a realidade diferente desta. A capitania de Pernambuco podia ser descrita por Duarte Coelho da mesma forma que a ilha da Madeira, alertando-se apenas para a substituição da referencia aos algodoais pela vinha e o trigo. Entre todos os moradores e povoadores, uns fazem engenhos de açúcar porque são poderosos para isso, outros canaviais, outros algodoais, outros, mantimentos que é a principal e mais necessária coisa para a terra, outros usam de pescar, que também é muito necessário para a terra, outros usam de navios que andam buscando mantimentos e tratando por terra conforme ao regimento que tenho posto, outros são mestres de engenhos, outros mestres de açúcares, carpinteiros, ferreiros, oleiros e oficiais de formas e sinos para os açúcares e outros oficiais (VIEIRA apud MELLO, 2000, p.77). A expansão da capitania citada anteriormente, porém, só teve seu início através dos filhos de Duarte Coelho e de Jerônimo de Albuquerque, sendo o ponto principal dessa expansão o engenho, este que possuía uma organização espacial chamada de “triângulo rural” por Evaldo Cabral de Mello (2000), composto pela casa-grande, engenho e capela. É valido destacar que os artistas nassovianos representam esse sistema de forma muito bem, sendo as casas de Frans Post, por exemplo, uma representação “[...] quase literal do tipo mais comum das casas rurais da mãe-pátria” (SMITH apud MELLO, 2000, p. 79), além da representação da disposição do terreno como um todo, no que se refere ao engenho, à casa grande e à capela. 4 Doravante, segundo a historiografia consultada, a Companhia das Índias Ocidentais também pode ser chamada de WIC, sigla inglesa para West Indian Company. 39 [...] a iconografia holandesa já indica as linhas de força do seu assentamento em termos da ocupação dos níveis do terreno: a instalação da fábrica na proximidade do curso d’água de que depende para a força motriz e para outros usos; a construção da casa-grande na parte mais elevada do terreno, via de regra, na meia encosta, em decorrência da necessidade prática de controle das atividades e do imperativo simbólico de expressão de domínio; e a ereção da capela ao mesmo nível da casa-grande ou mais acima, conotando a predominância do Sagrado (MELLO, 2000, p. 80). Foi através do modelo escolhido por Nassau que o domínio holandês, de fato, consagrou-se no Brasil. A primeira medida tomada por Nassau ao chegar aos trópicos foi invalidar o controle português da capitania, tendo que, logo após dar prioridade à recuperação da produção açucareira, a qual foi arruinada em função das lutas armadas entre batavos e lusitanos no primeiro momento da ocupação. Para tanto foi necessário, entre outras medidas, a plantação de outros gêneros alimentícios, como a mandioca, por exemplo, para suprir a fome da população, especialmente dos trabalhadores. O empreendimento nassoviano obteve sucesso graças ao modelo de ocupação militar dos novos espaços produtivos, fator este que ocasionou uma propulsão nos negócios batavos, fazendo com que, consequentemente, sua máquina administrativa operasse sem maiores restrições internas. Na citação abaixo Mello elucida bem essa realidade. A liberalização do comércio entre os países Baixos e o Brasil holandês explica em boa parte a euforia característica dos primeiros anos de governo nassoviano. Com a consolidação do domínio territorial, as tarefas econômicas passaram ao primeiro plano administrativo e, em particular, a necessidade de pôr a operar no mais breve prazo o sistema de produção açucareira. Os anos de guerra haviam gravemente comprometido seu funcionamento. Quase a metade dos engenhos havia sido abandonada pelos seus proprietários luso-brasileiros ao emigrarem para a Bahia na esteira do exército de resistência. E o que era mais grave, muitos engenhos haviam tido suas instalações desmontadas, roubadas ou simplesmente danificadas (MELLO, 1987, p. 21). É válido apontar e chamar atenção também quanto à questão de que a presença holandesa no Nordeste brasileiro imprimiu uma marca indelével na construção da nossa matriz cultural. Ressaltando-se que durante a dominação holandesa junto com Nassau não apenas vieram militares, mas também um estilo de vida, um conceito de mundo e de sociedade, a arquitetura o urbanismo, a arte, ponto este que interessa esse trabalho. 40 Outras características marcaram o governo de Nassau. Além do sucesso econômico com o açúcar, fez grandes empreendimentos arquitetônicos, como a construção da Cidade Maurícia, e o objetivo que ele tinha em transplantar o Renascimento para a América, estimulando, assim, as artes e o conhecimento da colônia através de artistas, dentre os quais alguns vieram em sua comitiva, como é o caso, por exemplo, de Frans Post. [...] quanto às ciências e artes, a ação do período nassoviano é verdadeiramente fecundo em comparação com a colônia dos portugueses sempre estéreis nas artes. Portugal nunca cogitou em enviar para o Brasil homens de conhecimento, ao contrário, procurou sempre evitar o contato com os estrangeiros ilustres (GOUVÊA apud RODRIGUES, 1998, p. 209). Entre os artistas que acompanharam a comitiva nassoviana estava Frans Post, o qual, segundo a divisão feita por Maurício de Nassau no tocante às imagens, ficou responsável pelos registros das áreas sob o controle flamengo, as batalhas e as principais edificações construídas e/ ou conquistadas por estes. Holandeses e outros europeus (alemães, franceses) ficavam encantados com as terras pernambucanas, as quais eram retratadas pelo artista Frans Post, que configurou muito bem as paisagens pernambucanas, transmitindo um ideal pacífico da capitania. Não foi, porém, apenas paisagens da natureza que Post retratou em suas telas. Para existência de uma sociedade é necessário que haja uma cidade e tendo consciência disso é que Nassau construiu a Cidade Maurícia, esta que foi milimétrica e meticulosamente projetada em cada um de seus detalhes, sendo alguns deles, inclusive calculados pelo próprio Maurício de Nassau. Essa cidade foi muito bem representada por Post em sua tela Mauritiopolis, na qual o artista mostra o aspecto mais popular da cidade: um bairro projetado por Nassau para os habitantes mais pobres. Antes da invasão holandesa e da comitiva de Nassau, a qual trazia uma missão artístico-científica composta por artista e cientistas europeus mandados pela Companhia das Índias Ocidentais com o objetivo de representar uma visão diferenciada do Novo Mundo, os relatos que se conheciam deste eram baseados em textos, não sendo a imagem algo comum e sim apenas um complemento cujo objetivo era prender ainda mais a atenção do leitor. Foi a partir de Nassau que o imaginário da América portuguesa mudou, em virtude do trabalho de artistas como Frans Post, por exemplo. 41 2 O IMAGINÁRIO DO NOVO MUNDO NAS TELAS DE FRANS POST De acordo com Evaldo Cabral de Mello (1987), no processo de formação de uma nação existem acontecimentos que ganham relevância histórica e cultural. E existem, ainda, alguns fatos que “passam a ser aceitos pelo senso comum como acontecimentos sínteses, simbolizando os ideais e valores permanentemente necessários à formação da nação” (MELLO, 1987, p. 9). Estes são chamados de referências culturais, estando, pois, a experiência holandesa no Nordeste brasileiro incluída nessa categoria. No tocante à arte, é importante ressaltar que nos séculos XVI e XVII não é correto falar o termo “arte brasileira” e sim “arte no Brasil”, tendo em vista que ela foi oriunda das transplantações de conceitos europeus. Quando os flamengos chegaram ao território brasileiro estavam acompanhados não apenas de exércitos. Eles traziam consigo, em sua “missão holandesa”, um estilo de vida, uma concepção de mundo e de sociedade, a arte militar, mas também as artes plásticas, a arquitetura e o urbanismo como pode ser visto em várias imagens de Frans Post, este que estava, juntamente com Albert Eckhout, entre os artistas holandeses que se destacaram, sendo muito mais um cartógrafo que pintor. Naquela “Missão”, especialmente importantes foram os pintores. Eram documentaristas da nova terra e do seu exotismo. Pintaram paisagens, pessoas, animais e naturezas mortas do nordeste em que moraram temporariamente. As obras deles [...] foi o que melhor se fez no Brasil em termos qualitativos no século XVII (LOPES, 1984, p. 60). Maurício de Nassau foi convidado pelo Conselho dos XIX da Companhia das Índias Ocidentais a assumir o posto de governador do Brasil holandês após a realização de seus feitos na Europa, como a conquista de Bois-le-Duc e a tomada de Maastricht, bem como a sua entrada muito cedo e participação no Exército da União. Para tal posto, Nassau necessitava registrar as realizações de seu governo, a paisagem e a topografia do lugar conquistado, bem como os aspectos militares e civis para que a Europa pudesse tomar conhecimento do trabalho que estava sendo realizado nos Trópicos. Foi pensando nisso que o Conde holandês trouxe em sua comitiva e missão científica alguns pintores, sendo, pois, de maior importância e relevância para esse trabalho Frans Post. 42 As imagens produzidas por esse artista, no contexto da vinda da comitiva de Nassau para os Trópicos, tiveram importância fundamental para autopromoção do conde enquanto chefe de estado, na medida em que retratavam seu governo e sua figura. Nassau sabia o quão importante era a propaganda para seu governo e que só através das imagens conseguiria comprovar sua proeza no Brasil e seriam símbolos de sua boa administração local. Tendo em vista que o artista em questão foi contratado por Maurício de Nassau com a função de pintar os fortes e as vilas do Brasil colonial e levando-se em consideração ainda a maestria e riqueza de detalhes de sua obra “[...] a imagem em Frans Post, tida como uma cópia visual da realidade empírica, foi tomada até como uma antecipação óptica da imagem fotográfica” (VIEIRA, 2013, p.2). Enquanto cartógrafo Post descreveu, por meio de esboços, de forma criteriosa a paisagem do Nordeste. Ele tinha uma comitiva composta por militares, guardas e alguns nativos que o acompanhavam por questões de segurança e conhecimento dos caminhos e fronteiras, tendo percorrido, assim, diversas capitanias da América portuguesa. Figura 1: Paisagem do Rio São Francisco, Frans Post. Disponível em: <http://brasiliana.usp.br>. Acesso em 5 nov. 2014. 43 Figura 2: Rio São Francisco, Frans Post. Disponível em:<http://albertorenault.blogspot.com>. Acesso em 6 nov. 2014. Muitos dos seus desenhos e esboços transformaram-se em telas após a volta do artista a Europa. Em virtude disso as imagens e paisagens do Nordeste ganharam uma luminosidade brumosa natural do Norte da Europa. O mais expressivo nas suas paisagens são os horizontes largos e perspectivas que se diluem num azul lírico. Embora Post não tenha sabido captar a luminosidade da terra a qual estava representando soube expressar minimamente a extensão do espaço. O Brasil, assim como as demais terras americanas, ocupava um lugar no imaginário europeu permeado por mitos, sendo uma terra distante e selvagem. Tal pensamento é resultado de uma série de documentos, como crônicas e relatos, por exemplo, com pouca ou nenhuma parcialidade e equivocados durante muito tempo essa área a única fonte de informação sobre o Novo Mundo, realidade esta que começou a mudar no século XVII, quando as imagens deixaram de ser utilizadas com cunho meramente ilustrativo, passando agora a constituírem também fontes do conhecimento acerca dos Trópicos. Tendo em vista a curiosidade europeia a respeito das terras tropicais, Nassau traz em sua comitiva artistas com esse objetivo, os quais eternizaram em suas telas aspectos 44 da colônia no que concerne ao relevo, á flora, aos tipos humanos, às construções para mostrar a Europa as vantagens daquela terra e de suas riquezas. De acordo com Izabel Maria dos Santos (2008), suas imagens foram responsáveis pela transformação do pensamento europeu acerca do Novo Mundo. A extensa produção artística e científica desenvolvida pelos membros da corte de Nassau logo se transformou na principal fonte de informações e imagens sobre a América. Foi através dos livros, mapas, gravuras e telas, produzidas pela comitiva do vaidoso conde que a Europa foi absorvendo referências e formando um conceito sobre como seria o Novo Mundo, bem como foi se transformando o imaginário, até então existente, de forma a abandonar a imagem do índio europeizado e das paisagens estilizadas. Surgia ali, no apogeu da sociedade Moderna e sob grande influência do legado artístico e científico deixado pelos membros da comitiva de Maurício de Nassau, uma nova forma de se pensar a América e seus habitantes (SANTOS, 2008, p. 2). Segundo Leonardo Dantas Silva (2000), Post foi o primeiro paisagista europeu que veio a trabalho para as terras brasílicas e deixou uma obra rica, porém pouco do seu trabalho chegou até nós, apenas pouco mais de 160 telas. Além de ser o primeiro pintor da paisagem brasileira é também o pioneiro no paisagismo das Américas, ocupando, assim, uma importância primordial por ter sido o precursor dentre os artistas estrangeiros a retratar essas paisagens, sendo sua primeira obra com tema das Américas A vista de Itamaracá. Formado na escola de Haarlem e acostumado com a luz da Holanda, o pintor teve seu conhecimento aprendido com seu irmão mais velho Pieter Post, discípulo do maior arquiteto do seu tempo e responsável pela construção da Casa de Maurício – Mauritshuis–e, através dele, foi apresentado ao Conde de Nassau quando este foi convidado para governar o Brasil. Aqui o pintor tornou-se a memória visual do governador, registrando tudo ou quase tudo, já que o foco do seu trabalho eram paisagens, construções e aspectos militares, ficando o aspecto etnográfico sob a responsabilidade de Albert Eckhout. Para isso, Post passou a acompanhar Nassau em todas as suas viagens. O objetivo principal de Frans Post seria a documentação de cidades, vilas, povoações, costumes, construções civis e militares, cenas de batalhas navais e terrestres, que viriam a ilustrar um grande relatório das atividades do governo do Conde de Nassau em terras da América. 45 Enquanto Albert Eckhout tinha por tarefa a documentação de tipos humanos, da fauna e da flora [...] (SILVA, 2000, p. 12) Foram pelo menos 18 quadros pintados por Frans Post que retratavam a paisagem brasileira durante o período de sete anos que ele ficou no Nordeste acompanhando Nassau, sendo quadros que mediam cerca de 60cm x 90cm e foram conservados por Nassau até 1679. Após sua morte as telas foram doadas ao rei Luís XIV da França. Porem dessa quantidade apenas sete quadros conseguiram ser identificados enquanto os outros desapareceram com o passar do tempo. José Roberto Teixeira Leite faz a seguinte observação acerca de Post e de sua pintura: Pode-se aquilatar o impacto emocional por que terá passado Post, acostumado à disciplina dos campos holandeses, banhados em suave luminosidade, ao se defrontar de inopino com a áspera vegetação tropical, povoada de seres insólitos, tudo sob uma luz escandalosamente intensa. A força e o ineditismo de tal impacto têm como consequência estancar, no artista setentrional, toda a capacidade criadora, e por isso, nos Trópicos, os amadores sentem-se mais à vontade que os verdadeiros pintores. É que os Trópicos são mais pitorescos que pictóricos, demasiados ricos, demasiados exuberantes [...] Nos quadros executados no Brasil conseguiu Frans Post traduzir todo o pitoresco, sem deixar de ser pictórico; daí o seu valor. E embora se subordinasse fielmente à realidade soube evitar o excesso de detalhes meramente esdrúxulo, aquele acúmulo de elementos curiosos que sobrecarregariam o quadro, comprometendo-o irremediavelmente (LEITE apud SILVA, 2000, p. 14). Ele afirma ainda que o artista deve ter registrado meticulosamente a fisionomia do Brasil, embora tivesse que selecionar, de acordo com a inspeção de Maurício de Nassau, apenas algumas obras para ilustrar o livro de Barleus, sendo o critério para escolha as que estivessem mais aptas ao esclarecimento do texto. Frans Post tem grande importância no cenário da iconografia brasileira enquanto documentarista, chamando atenção de todos que se dedicavam a estudar o imaginário brasileiro do período nassoviano, por ser uma fonte relevante para os aspectos naturais, etnográficos, arquitetônicos e topográficos. Apesar de suas obras serem de grandes dimensões, Post era tido como um miniaturista e suas telas possuem uma riqueza de detalhes minuciosos e muito pequenos, fazendo-se por vezes necessário o uso de uma lupa para conseguir visualizar as particularidades que ele julgava necessárias para 46 compor aquela imagem e, muitas vezes, ele conseguia captar e representar aspectos etnográficos que talvez Eckhout não conseguisse em seus quadros. As obras de Post são uma fonte inestimável para a história natural e etnografia bem como para a arquitetura e topografia. Para certos temas não existem equivalentes no material até agora estudado. Embora suas pinturas muitas vezes sejam de tamanho moderado ou mesmo grande, Post era virtualmente um miniaturista em escala e seu olhar para os detalhes era bem meticuloso. Pode-se julgar a importância que os detalhes tinham para ele pelo seu trabalho mesmo nas figuras com um centímetro mais ou menos. Com frequência precisamos de uma lupa para apreciar a quantidade de detalhes minuciosos que ele julgava necessário. Portanto, concluímos que os animais, plantas e pessoas em seus quadros têm um valor documentário, não apenas para mostrar o que ele observa, mas, no caso da etnologia, para registrar coisas que talvez não sejam encontradas nas obras de Eckhout ou em outras fontes (WHITEHEAD apud SILVA, 2000, p. 16). Os desenhos de Post foram a única fonte iconográfica da paisagem brasileira que se teve conhecimento por mais de um século e foram essas paisagens que compuseram a mais importante fonte para o estudo do domínio holandês e do governo de Nassau no Brasil: o livro de Gaspar Barleus. Ao todo são 31 imagens, das quais 23 são de Post e, destas, 14 estão datadas de 1645. Além de imagens de Frans Post, Barleus traz 24 mapas de sítios e fortificações, sendo esse conjunto de autoria de George Marcgrave e um apenas parece ser do cartógrafo CornelisBastianszoonGolijath. Além do livro de Barleus, as imagens de Post ilustraram outras composições da época, como o poema Mauritiados do reverendo Francisco Plante, por exemplo. Após as imagens para o livro de Barleus e já na Holanda, Frans não abandonou os pincéis e as telas. O artista foi dominado pela paisagem dos Trópicos. Na sua volta para a Holanda continuou a representar quadros com imagens brasileiras, graças aos seus esboços elaborados durante a sua estadia de sete anos no Novo Mundo, cheios de cores e elementos tropicais. Agora que sua obra não tem mais o objetivo de documentar ela ganha uma importância ainda maior na medida em que registra a arquitetura civil, religiosa e militar, a fauna, a flora, tipos humanos entre outros elementos de fundamental relevância para tornar conhecida a paisagem do século XVII do Nordeste brasileiro. O contato direto com a natureza primitiva deu a Frans Post um estilo próprio deixando ele à margem dos grandes artistas holandeses contemporâneos a ele, como Segher, Ruidael e Van Goyen, por exemplo. 47 [...] resumindo a evolução artística de Frans Post, podemos afirmar que, superada a fase documental dos quadros realizados no Brasil, vencida a preocupação pelo exótico e pelo pitoresco dos produzidos imediatamente após o retorno à Holanda, conseguiu o pintor afinal harmonia entre forma e cor e a equivalência entre o conteúdo e o seu equivalente clássico, para evocar a paisagem brasileira, da qual seria o intérprete primeiro, num clima de intenso lirismo (LEITE apud SILVA, 2000, p. 23). A pintura de Frans Post é nitidamente holandesa no que concerne às tradições pictóricas e descritivas que eram usadas nas pinturas dos Países Baixos. Sua pintura é descrita por Hermann Bauer da seguinte forma: Nos seus quadros, nota-se que dá, é certo, diversas informações pormenorizadas no que diz respeito ao país longínquo, mas que em suas pinturas são compostas segundo os esquemas habituais da pintura de paisagem holandesa. Partindo-se do primeiro plano flanqueado de decorações laterais, é-se levado para a profundidade do quadro; o longínquo com as alterações cromáticas, o lugar importante ocupado pelo céu são características típicas da pintura holandesa. Nestas paisagens brasileiras, a figura da pintura de gênero torna-se num tema secundário do quadro cuja estrutura ele ordena (BAUER apud OLIVEIRA, 2005, p. 14). Pode-se dizer que a obra de Post está dividida em quatro etapas, as quais sofreram diversas mudanças ao longe de seus 40 anos. A primeira fase do artista, intitulada Os anos brasileiros, durou de 1637 à 1644 e foi o momento mais espontâneo e original do pintor que reproduziu 18 paisagens brasileiras que representavam as províncias do Brasil controladas por Nassau. A segunda fase, conhecida por Os anos realistas, com duração de 1645 à 1659, corresponde aos 15 anos após sua chegada na Holanda, um período em que havia grande preocupação por parte do artista em pintar exatamente o que ele observara in loco, tarefa esta que apenas se tornava possível devido aos cadernos de esboços de Frans, onde ele fazia seus desenhos, sendo estes que mais tarde se transformaram em telas. O apogeu, sua terceira fase, durou de 1660 à 1669. Essa fase é conhecida pela maturidade artística de Post, tendo em vista o domínio que o artista conseguiu em sua técnica e tratamento de temas brasileiros. Contudo, foi no momento em que a obra desse artista passou a lhe garantir certo conforto e maior prosperidade que ele começou a perder muito de sua espontaneidade e abandonar sua preocupação de reproduzir tal qual 48 seus esboços lhes mostravam. É nessa fase também que a sua obra sofreu uma mudança, pois seus clientes agora desejavam composições com riqueza de detalhes tropicais, árvores, moinhos de açúcar, vilarejos, índios e escravos negros. Dessa forma, o artista começou a realizar arranjos decorativos dos diversos elementos brasileiros que lhe eram solicitados em quadros que, apesar de não terem esboços, foram todos esses elementos muito bem observados por Post na sua estadia no Brasil. Nessa fase foram produzidas mais de 80 obras. Fica claro que as imagens de Frans Post feitas no Brasil eram criadas a partir de uma motivação econômica e política, pois sua intenção era registrar a riqueza e organização das terras sob o domínio holandês na América portuguesa. Contudo, como percebe-se na terceira fase do pintor, sua obra mudou e ele deixou de pintar apenas o que estava representado em seus cadernos de esboço. Isso pode ser explicado por um espaço chamado de ‘campo’, onde as práticas sociais ocorrem de acordo com as posições de poder e trocas simbólicas, sendo, nesse caso, o campo de Post demarcado pelo mundo holandês. E como burguês ele sabia o que produzir para conseguir receptividade no mercado artístico da Holanda. Sua última fase – O declínio (1670 à 1680) – constituiu seu período mais fraco e, sobretudo, de decadência artística e pessoal. As obras desta fase mostraram falhas de execução e hesitações técnicas bem pouco compatíveis com o que se conhece do pintor. Tal fato pode ser explicado pelo declínio físico e mental pelo qual passou o artista devido à sua idade avançada, à morte de sua esposa e ao alcoolismo. O vício muito corroborou para a queda de sua capacidade criadora, contribuindo, assim, para a decadência e mediocridade dos seus trabalhos. Isso o impossibilitou de ver a entrega dos seus quadros ao rei da França em 1679, Luís XIV, quem os recebeu com presente de Maurício de Nassau. Nas últimas fases do trabalho de Post sua obra torna-se mais frágil e ganha menos definição tanto com relação ao traço quanto ao conteúdo, mudança esta que, de acordo com Gordon se alguém que continuasse na Holanda e nunca tivesse saído representaria o exótico do Novo Mundo da mesma forma. Neste sentido alguns autores, como Joaquim de Souza Leão, defendem a fidelidade de Post para com seu trabalho, pois embora ele distancie-se da descrição do Novo Mundo de forma mais real, ganhando sua obra figuras incomuns e estranhas ao Brasil, ainda assim conseguia atender a necessidade e curiosidade pelos Trópicos com relação aos seus compradores. 49 A evolução que se nota no seu estilo é apenas natural dentro do espaço de aproximadamente trinta anos. O que é notável é que seu trabalho se manteve igual em qualidade e fácil de identificar, e que Post se permitiu ser um pouco influenciado por seus grandes contemporâneos. É quase um caso sem paralelo (LEÃO apud PONTES, 2008, p. 6-7). Post morreu em Haarlem em 18 de fevereiro de 1680 e mereceu a honra de ser retratado por FransHals, importante retratista contemporâneo àquele pintor. Vale ressaltar que e a obra de Post teve dois aspectos principais: um político, visto em grande medida na sua primeira fase, na qual representava o Novo Mundo tal qual ele é, devido aos seus esboços e também ao controle de Nassau; um comercial, onde a obra de Post passa a ser muito mais decorativa, ao passo que ele recebia encomendas do mercado curioso pelo Novo Mundo. Ainda no que se refere à fidelidade do pintor holandês com relação à fidelidade do pintor holandês com relação à sua imagem pode-se perceber o quão espaçosa foi sua obra, tendo em vista que toda sua carreira como pintor foi com o tema do Novo Mundo, mesmo com o declínio sofrido especificamente na quarta fase de sua obra. Deve-se levar em consideração também o fato de que os desenhos feitos por Post foram utilizados em sua primeira fase, sendo os demais estágios do seu trabalho feitos com uma única ferramenta principal: a sua memória. E esta, ao longo dos anos, tende a misturar fatos, detalhes e experiências com relação a diversos eventos. De acordo com Giulio Carlo Argan (1998) a arte é uma ideologia que dá ao ser humano a possibilidade de representar-se. Dessa forma, as telas de Post podem ser consideradas como vários estágios diferentes de fases em que o Brasil é descoberto por um público que o desconhecia completamente. Além da visão antropológica de Post é possível perceber a presença de um molde em sua tradição holandesa. O pintor estava fortemente ligado às amarras da pintura de paisagem flamenga do século XVII – o século do ouro da pintura batava – fato este que pode ser percebido por meio do uso de recursos estéticos constantemente como o repoussoir5 e o horizonte baixo. SeymorSlives (1998) aponta várias semelhanças de Post com seus contemporâneos pintores, mesmo tendo iniciado muito cedo sua carreira de pintor e tendo sido no Brasil, fato este que revela um modelo holandês para pinturas de paisagem. 5 Segundo o glossário do sítio Educathyssen, é uma palavra francesa para uma técnica na qual a obra é pintada com cores fortes no primeiro plano de uma imagem e serve para aumentar a sensação de distância do outro detalhe. 50 Outra característica da pintura holandesa além do realismo6é o maneirismo7, não sendo, contudo, este fruto apenas da formação artística e sim da possibilidade de concluir suas telas em ateliês a partir de esboços do natural, técnica esta que permite atenção maior aos detalhes, às estruturas e ao conteúdo. Quando se discute o realismo em relação aos pintores de paisagem holandeses do século XVII, é importante ter em mente que esses artistas quase nunca pintavam seus quadros em exteriores. A prática de fazer pinturas ao ar livre só se tornou comum no século XIX. Em épocas anteriores as pinturas de paisagem eram quase sempre compostas nos ateliês (SLIVE, 1998, p.181). Pode-se exemplificar as semelhanças entre Post e seus contemporâneos da pintura holandesa de paisagens ao coloca-lo lado a lado com outro artista do seu tempo, por exemplo, RoelandtSavery. É possível observar nas imagens de ambos os artistas mencionados a presença de um repoussoir do lado direito composto de um elemento vertical principal e uma representação da fauna e flora. Além disso, a semelhança completa-se pela presença de uma edificação singular destacada no quadro e o horizonte, que embora esteja distante ainda assim está detalhado, como era, de fato, o esforço da pintura de paisagem holandesa. 6 Segundo o Novo Aurélio Século XXI, é uma doutrina segundo a qual a arte deve expressar somente os caracteres essenciais da realidade. 7 Segundo o Novo Aurélio Século XXI, é uma tendência estética surgida no século XVI que se caracteriza pela interpretação requintada da maneira de certos artistas do Renascimento, com ênfase na movimentação estilizada das formas (e consequente abandono da proporção e simetria), na elegância, na dramaticidade, o que iria configurar uma arte própria de uma minoria intelectual cortesã, marcada pelo individualismo. 51 Figura 3: Vista da Sé de Olinda, Frans Post. Disponível em: <http://www.coletiva.org>. Acesso em 4 nov. 2014. Figura 4: Paisagem com pássaros, RoelandtSavery. Disponível em: <http://pt.wahooart.com>. Acesso em 4 nov. 2014. 52 De acordo com George Gordon (2006),Frans Post utiliza em cada uma de suas fases técnicas variantes, sendo a primeira e segunda fases mais importantes, tendo em vista que foi o marco de sua volta a Holanda e quando seu trabalho foi dividido em quadros a serviço da administração e quadros comercializados. As técnicas utilizadas nessas fases são marcantes e repetem-se nas demais, sendo o primeiro estágio marcado pelo naturalismo, em grande medida, ausência de um elemento central e de um primeiro plano. Já no segundo estágio são usados mais pigmentos, a madeira, enquanto suporte,ganha destaque, a linha do horizonte torna-se um pouco mais alta e uma barreira vegetal passa a ocupar o primeiro plano. Além dessas características, é marcante na maioria dos quadros do pintor a presença de um repoussoir e de um horizonte baixo, independente do estágio de sua obra. Figura 5: A Vista de Itamaracá, Frans Post. Disponível em: <http://franspost-tda.blogspot.com>. Acesso em 4 nov. 2014. 53 Figura 6: A cachoeira de Paulo Afonso, Frans Post. Disponível em: <http://brasilartesenciclopedias.com.br>. Acesso em 4 nov. 2014. Segundo Svetlana Alpers (1999) a pintura de paisagem holandesa era uma abstração materializada na qual “[...] era como uma descrição da Holanda e da vida holandesa que os autores de antes do século XX viam e julgavam a arte holandesa do século XVII” (ALPERS, 1999, p. 23), de modo que o que mais chamava atenção dos observadores dessa arte era o seu aspecto descritivo, aspecto este que se torna a sua maior distinção da arte italiana. Nomes como Joshua Reynolds e EugéneFromentin têm a mesma opinião: de que os holandeses nada mais faziam do que um retrato de sim mesmos, embora ambos os analisadores possuíam uma visão diferente da pintura holandesa. O primeiro era um antagonista que considerava o interesse pela ‘naturalidade de representação’ dos holandeses junto com a monotonia de suas imagens uma combinação que deixava a descrição verbal enfadonha e desarticulada. Assim ele escreve sobre a pintura holandesa: A descrição que até aqui se deu nos quadros holandeses é, confesso-o, mais chata do que eu esperava. Seria desejável poder dar ao leitor uma ideia dessa excelência, cuja contemplação propiciou tanto prazer: mas, como o mérito deles não raro consiste unicamente na verdade da representação, por mais elogio que mereçam, por mais prazer que dêem quando sob o nosso olhar, não fazem senão uma triste figura na descrição (REYNOLDS apud ALPERS, 1999, p. 24). 54 Já o Fromentin afirma que um pintor holandês não tinha motivo algum para pintar um quadro, de modo que “a pintura holandesa não era nem podia ser senão o retrato da Holanda, sua imagem exterior, fiel, exata, completa, natural, sem nenhum ornamento” (FROMENTIN apud ALPERS, 1999, p. 25). A arte holandesa, no que se refere ao consumo é semelhante com a arte do século XX: havia um investimento alto, os quadros eram comprados diretamente na loja do artista ou em mercados abertos para encher espaços e/ou decorar paredes. Do ponto de vista de seu consumo, a arte como a vemos em nossos dias tem início, sob vários aspectos, com a arte holandesa. Seu papel social não está longe daquele que tem a arte atual: investimento líquido com a prata, tapeçarias ou outros objetos de valor, os quadros eram comprados nas lojas dos artistas ou no mercado aberto como posses e pendurados, presume-se, para encher espaço e decorar as paredes domésticas (ALPERS, 1999, p. 32). Essa forma artística do norte europeu tinha seu maior problema localizado na falta de acesso verbal fácil, não proporcionando, pois, um discurso crítico próprio, diferindo tanto do Renascimento italiano, devido à presença de manuais e tratados, como também do realismo do século XIX. Os retratos, as naturezas-mortas, as paisagens e a apresentação da vida diária representam prazeres hauridos num mundo cheio de prazeres: os prazeres dos laços familiares, os prazeres das posses, prazer nas pequenas cidades, na terra. Nessas imagens o século XVII assemelha-se a um longo domingo (ALPERS, 1999, p.34). O prazer e harmonia característicos da pintura holandesa do século XVII colocado por Alpers pode ser visto nas obras de Post, como por exemplo, o Forte Frederik Hendrik, tela na qual o artista coloca as três raças existentes na colônia – o índio, o negro e o branco – de forma harmoniosa e sem conflitos, fazendo apenas uma descrição do seu cotidiano. Vale, embora, atentar para o fato de que as outras raças utilizam, na pintura, objetos holandeses, o que pode indicar a tentativa de unificação das etnias por meios da figura do branco holandês colonizador. Tal fato pode, ainda, ter objetivo de mostrar na Europa como o flamengo seria um melhor administrador para o Novo Mundo do que o português a partir do momento que teria conseguido manter um convívio pacífico e harmonioso entre as três raças. 55 Figura 7: Forte Frederik Hendrik, Frans Post. Disponível em: <http://www.areliquia.com.br>. Acesso em 4 nov. 2014. A natureza marca presença forte nas obras de Post, mantendo-se intacta e predominante mesmo após a volta do artista a Holanda, mesmo com a presença de engenhos, do homem, entre outros aspectos presentes naquelas obras. Apenas em algumas pinturas, como Vista da Cidade Maurícia e do Recife, a natureza não está tão priorizada quanto em outras telas. Figura 8: Vista da Cidade Maurícia e do Recife, Frans Post. Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br>. Acesso em 4 nov. 2014. Em outras imagens pode-se percebera diferença de como o aspecto natural é mostrado, como em Arredores de Serinhaém e Carro de Bois. O primeiro mostra a natureza em sua forma deslumbrante, já no segundo essa mesma presença marcante da natureza, papel central naquela, cedo o espaço para o carro de bois com o capataz e seus escravos. 56 Figura 9:Carro de Bois, Frans Post. Disponível em <http://people.ufpr.br>. Acesso em 04 nov. 2014. A imagem de Post, segundo Daniel de Souza Leão Vieira, é marcada pela relação entre topografia e história, especialmente em suas primeiras imagens, tendo em vista que eram feitas sob a ordenança de Nassau, possuindo, pois, um valor político da formação de uma imagem oficial da colônia. Sua obra já comportava, no aspecto visual, um realismo, o qual era característica da pintura holandesa, associado ao imaginário da topografia na representação neerlandesa de paisagem, tal fato sendo marcante em sua primeira tela Vista de Itamaracá, e, embora sua segunda telaO Carro de Bois fizesse menção muito mais à abundância e riqueza do açúcar do que à topografia foi um meio que não foi novamente utilizado nas telas que chegaram até nosso conhecimento, sendo, inclusive, todas as telas, até 1640, compostas cumprindo a representação da topografia das localidades oficiais da Nova Holanda. Foi nesse ambiente cultural, em que eram relacionados entre si a topografia e a história, que Frans Post nasceu e aprendeu a compor paisagens. E esses códigos de representação estão marcantemente presentes em suas primeiras paisagens, sobretudo porque, sendo feitas para João Maurício, Conde de Nassau-Siegen, elas adquiririam a visão política da montagem de uma visão oficial da colônia. [...] Quando Frans Post viajara para o Brasil, no início de 1637, a linguagem visual do ‘realismo’ já estava associada ao cenário de topografia pátria na paisagística neerlandesa. A sua primeira tela, Vista de Itamaracá, já apresenta essa característica. E se a segunda tela, O carro de bois, representa a paisagem pernambucana em alegoria de abundância açucareira sem fazer menção à topografia, tratou-se de uma estratégia que não voltou a se repetir nas telas que ele pintou depois e que chegaram até nosso conhecimento hoje. Toas as cinco, datada até 1640, foram compostas 57 respeitando o motivo da topografia das localidades oficiais da colônia (VIEIRA, 2013, p. 4). Vê-se que a paisagem está sempre presente nas telas de Frans Post e considero, assim, necessário fazer uma abordagem no tocante ao surgimento desta como gênero de pintura. Da mesma forma que a natureza “a paisagem não reivindica para si o papel de protagonista [...] e se conforma com o plano de mero cenário” (GUTLICH, 2005, p. 35). Ela tem um significado muito maior na pintura setentrional, surgindo, no máximo, como pano de fundo na pintura italiana. O surgimento da paisagem enquanto gênero da pintura foi identificado por E. H. Gombrich, na obra A teoria renascentista da arte e a ascensão da paisagem (1950), através de inventários venezianos do Renascimento, assim também como Kenneth Clarck, na obra A paisagem na arte (1961), viu que nas pinturas venezianas o fundo passou a ser substituído pelas paisagens. É interessante mostrar que há dois termos para a mesma palavra: paesagio (italiano) e landschaap (holandês). Enquanto o primeiro refere-se ao aspecto visual, o segundo diz respeito a uma área conquistada pelo homem a qual era necessário largo esforço para mantêla. Outro aspecto da pintura de paisagem é a presença do mar, este que demorou a compor o fundo das pinturas por não consistir em um lugar digno de admiração, sendo visto apenas como um obstáculo para os viajantes. A marinha surge na pintura holandesa no século XVI obvimanete como um adágio acerca da fragilidade do homem frente à fúria da natureza, dos riscos da pátria frente ao risco iminente da destruição e, logo depois, como celebração dos feitos navais, das glórias marítimas, da engenhosidade na construção naval, mas nunca lhe negando a força e o temor que dele advinha. Pode-se arriscar que em muitos casos o mar apresenta-se como protagonista de um possível embatimento trágico (GUTLICH apud GOMBRICH, 2005, p. 39). Um aspecto que chama muito a atenção é mostrado por Gombrich (apud GUTLICH). Trata-se de um processo no qual havia uma identificação dos pintores vivos com os da Antiguidade, sendo Frans Post comparado a Estudio, este que pintava cenas campestres com pessoas locomovendo-se. Não se deve privar da glória Estúdio, pintor da época de Augusto, o primeiro a pintar, em paredes, temas amenos, casa de campo e portos, bosques sagrados, florestas, tanques de peixes, canais, riachos, praias e o que viesse a 58 desejar, colocando aí vários tipos de pessoas, andando a pé ou de barco, dirigindo-se, por terra, a suas propriedades rurais a cavalo ou em carroças, ou pescando ou caçando e colhendo uvas8 (GUTLICH, 2005, p.53). A esfera celeste também característica da obra de Post denuncia o legado de artistas a quem nosso pintor estava ligado – os de Haarlem, tais como Seghers e Ruysdael. É importante ressaltar que as nuvens na pintura de Post passam por certa mudança, sendo as obras feitas no Brasil com certa timidez, enquanto suas telas feitas já na Holanda surgem com uma liberdade narrativa e apuro técnicos maiores. Pode-se perceber essa diferença através do quadro Cidade Frederica. Figura 10: Cidade Frederica, Frans Post. Disponível em: <http://commons.wikimedia.org>. Acesso em 4 nov. 2014. O primeiro quadro é sua principal obra no aspecto de manifestações celestes. Enquanto na maioria das obras de Post as nuvens surgem em contraposição ou reforço à linha compositiva diagonal predominante, nesse quadro há certa comunicação entre céu e terra, deixando claro, possivelmente a formação de uma tempestade, percebido também pelo recolhimento dos pássaros no canto inferior direito, e ainda, no céu, a formação de uma figura humana. Neste sentido, nota-se, então, o quanto essas telas foram importantes para diversos historiadores na construção da historiografia brasileira. É partindo desse pressuposto que venho mostrar o quanto essas mesmas imagens podem se transformar em um importante recurso didático no processo de ensino-aprendizagem da temática do Brasil-colônia. 8 PLÍNIO, o velho, 23-79 d.C., itens 113 e 116 do livro 35 da Historia Naturalis. 59 3 A UTILIZAÇÃO DA ICONOGRAFIA COMO RECURSO DIDÁTICO A historiografia passou por algumas mudanças e deixou de importar para historiadores apenas eventos políticos, econômicos e sociais. Foi nesse sentido que surgiu o campo da História das Mentalidades, junto com outros campos, e com ele outros tipos de fontes passou a chamar atenção dos estudiosos da história, como, por exemplo, as imagens, estas que passam a ser utilizadas com uma abrangência maior ao lado de textos e relatos orais. Chama a atenção o uso desse tipo de fonte, pois muitos historiadores ainda estão presos ao tradicionalismo histórico e desenvolvem estudos na área econômica, políticae social, muitas vezes, apenas através de documentos escritos e/ ou relatos orais, quando, na verdade, o recurso imagético é algo que, se bem analisado, pode trazer à luz um vasto leque de informações ou mesmo confirmar os discursos já elaborados pelas fontes escritas. Prova disso são as pinturas rupestres utilizadas para o estudo da Pré- história, as pinturas feitas nos túmulos das pirâmides e sua contribuição para a história do Egito antigo e, claro, as telas de Frans Post no estudo da dominação holandesa no período do Brasil colônia. Jacob Burckhardt (apud BURKE, 2004) define imagens como “testemunhas de etapas passadas do desenvolvimento do espírito humano” e através delas “é possível ler as estruturas de pensamento e representação de uma determinada época” (BURCKHARDT apud BURKE, 2004, p. 13). Imagens não podem e não devem ser utilizadas como evidências no sentido literal da palavra, tendo em vista que foram produzidas por alguém com algum objetivo. Elas possibilitam ao observador que visualizem o passado de uma forma um pouco mais real, o colocando “face a face com a história”, como sugeriu Stephen Bann (apud BURKE). Segundo Peter Burke, o testemunho das imagens levanta muito mais problemas, pois são testemunhos mudos, sendo, pois, difícil traduzir em palavras o que elas dizem. É desnecessário dizer que o uso de testemunhos de imagens levanta muitos problemas incômodos. Imagens são testemunhas mudas, e é difícil traduzir em palavras o seu testemunho. Elas podem ter sido criadas para comunicar uma mensagem própria, mas historiadores não raramente ignoram essa mensagem afim de ler as pinturas nas “entrelinhas” e aprender algo que os artistas desconheciam estar ensinando. Há perigos evidentes nesse procedimento. Para utilizar a evidência de imagens de forma segura, e de modo eficaz, é necessário, como no caso de outros tipos de fontes, estar consciente de suas fragilidades (BURKE, 2004, p.18). 60 Daí o motivo de algumas imagens oferecerem mais evidências do que outras, como é o caso dos esboços, que representam bem mais fiel a realidade do que as pinturas trabalhadas no estúdio do artista. Um exemplo dessa ocorrência acontece exatamente com Franz Post, já que ele compôs a maioria de suas telas já na Holanda com base em seus desenhos. É importante também levar em consideração a variedade de imagens e que as mudanças que estas sofreram em lugares e épocas específicos, principalmente duas revoluções no que se refere à imagens: o surgimento da imagem impressa e o surgimento da imagem fotográfica. Estas foram de grande importância, pois possibilitaram um grande aumento na quantidade de imagens disponíveis à população comum. De acordo com Burke, a imagem existe para comunicar algo, mas elas não falam por si só e muito menos surgiram pensando nos historiadores que delas se utilizariam enquanto fontes, mas sim para representar as preocupações próprias de cada artista. Dessa forma, uma imagem só pode ser compreendida e analisada com base em um conhecimento prévio do que aquela retrata. Quando falamos em imagem devemos ter em mente que esta é, na verdade um registro deixado pelo homem – único animal que deixa registros atrás de si – tendo em vista que nesse caso a mente produz uma ideia que distingue-se da existência material dos produtos e objetos, conforme afirma Erwin Panofsky (1976). Enquanto outros animais produzem signos sem perceberem a relação do significado o homem percebe, sendo tal percepção a responsável por “[...] separar a ideia do conceito a ser expresso dos meios de expressão. E perceber a relação de construção é separar a ideia da função a ser cumprida dos meios de cumpri-la” (PANOFSKY, 1976,p. 24). O ser humano lida com imagens desde muito pequenos, estando estas relacionadas com a própria fala, havendo, assim como ocorre com a fala, um limite relacionado à idade que se é iniciado o processo de leitura delas, conforme elucida a Martini Joly na citação abaixo. Desde muito pequenos, aprendemos a ler imagensao mesmo tempo em que aprendemos a falar. Muitas vezes, as próprias imagens servem de suporte para o aprendizado da linguagem. E, como no caso desse aprendizado, há um limite de idade além do qual, se não se foi iniciado a ler e compreender as imagens, isso se torna impossível (JOLY, 1996, p. 43). A imagem em sala de aula tem grande importância e tem sido cada vez mais utilizada e antes de se trabalhar com esse recurso didático é relevante que seja feita uma análise do que vai ser exposto. A sua interpretação tornou-se algo realmente importante e necessário no 61 mundo em que vivemos, especialmente por estarmos na era das imagens, estas que a cada dia intensificam-se e renovam-se. Contudo o seu uso no ensino de História não deve ser feito como mero recurso didático, mas sim ter qualidade e intencionalidade. Embora estas tenham uma visualização imediata para seu expectador, o mesmo não acontece com sua compreensão, ainda mais se seu contexto de produção for afastado do nosso, como é o caso do objeto de estudo dessa pesquisa, daí a importância de interpretar as imagens. Jacques Aumont (1993) mostra que existe dois tipos de interpretação da imagem: 1) a semiologia, que distingue vários códigos da imagem, sendo alguns universais e outros ditados pelo contexto social; 2) a iconologia, na qual a interpretação tem sua importância ligada ao objetivo da imagem, ou seja, quanto mais importante for o objetivo, mais crucial será sua interpretação. Em minha pesquisa a iconologia ganha um maior prestígio, tendo em vista a importância que as telas de Frans Post têm até hoje na História do Brasil, bem como o motivo das paisagens brasileiras terem invadido as telas holandesas. Dentro da iconologia o teórico que ganha destaque éErwin Panofsky, que dividiu em partes a leitura das imagens a partir da iconologia: 1º) o tema primário ou natural, que subdivide-seem fatual e expressional, no qual é percebido pela identificação das formas puras, constituindo-se em uma descrição pré-iconográfica, por ele nomeado de nível da denotação; 2º) a compreensão acontece quando se relacionam elementos da representação com outros temas, criando, assim, um possível entendimento; 3º) a análise iconológica, que acontece quando define-se princípios que revelam outros aspectos, como a atitude de um período, de uma classe entre outros. Dessa forma, a interpretação iconológica nada mais é que “[...] considerar [...] que todos os elementos da obra de arte são simbólicos, no sentido amplo [...]” (AUMONT, 1993, p. 252), constituindo, pois, sintomas culturais e revelando detalhes ainda pouco ou nada conhecidos. Interpretar uma obra de arte é, antes de tudo, buscar uma leitura histórica da imagem escolhida, relacionando-a o mais próximo possível com seu contexto filosófico, ideológico, material e político. Trazendo essa divisão fatual e expressional para as obras de Post percebe-se o significado fatual nos elementos que compõem a imagem e associar e/ou reconhecer com o que já se conhece do período colonial. Já o significado expressional seria marcado pela sensação que os elementos das imagens de Post causam no observador. Para uma análise iconográfica de imagens, sejam elas quais forem, faz-se necessário um breve conhecimento 62 do que está sendo mostrado, no caso das obras citadas é essencial conhecer o período colonial brasileiro. A análise iconográfica, tratando das imagens, estórias e alegorias em vez de motivos pressupõe, é claro, muito mais que a familiaridade com objetos e fatos que adquirimos pela experiência prática. Pressupõe a familiaridade com temas específicos ou conceitos, tal como são transmitidos através de fontes literárias, quer obtidos por leitura deliberada ou tradição oral (PANOFSKY, 1976, p. 58). Já na interpretação iconológica, é necessário, além de familiaridade com os conceitos e temas vistos e analisados, ter um conhecimento intrínseco de outros temas que o observador julgue pertinente fazer parte da obra de arte em questão. [...] terá de aferir o que julga ser o significado intrínseco da obra ou grupo de obras a que devota sua atenção, com base no que pensa ser o significado intrínseco de tantos outros documentos da civilização historicamente relacionados a esta obra ou grupo de obras [...] (PANOFSKY, 1976, p. 63). Joly Martini (1996) mostra, porém, alguns aspectos que transformam essa tarefa em algo provocador. O primeiro deles é perguntar-se o que dizer de uma mensagem que parece “naturalmente” legível. O segundo ponto mostrado pela autora citada é buscar o que o artista objetivou com tal imagem pelo fato de não haver como ter a certeza de quais foram as intenções que motivaram-no a criar determinada representação. Por fim, mas não menos importante, está o fato de a imagem ser considerada “artística”, por fazer parte do lado emotivo e afetivo do pintor. Outro confronto de suma importância está aafirmação de que a imagem possui uma linguagem universal, sendo tal realidade contraditória, pois é sabido que toda imagem é subjetiva, carregada de sentidos e de objetivos ao ser criada, capaz de ganhar diversas interpretações e representações de acordo com as vivências e conhecimentos de quem estiver fazendo sua leitura. Decerto existem, para a humanidade inteira, esquemas mentais e representativos universais, arquétipos ligados à experiência comum a todos os homens. No entanto, deduzir que a leitura da imagem é universal revela confusão e desconhecimento. [...] A confusão é frequentemente feita entre percepção e interpretação (JOLY, 1996, p. 42). 63 É interessante também perceber a função que a imagem tem, sendo sempre uma mensagem para outra pessoa, devendo cada observador buscar o público para o qual foi dirigida a mensagem visual, não sendo, contudo, o bastante para a compreensão das imagens. Seja ela expressiva ou comunicativa, é possível admitir que uma imagem sempre constitui uma mensagem para o outro, mesmo quando esse outro somos nós mesmos. Por isso uma das precauções necessárias para compreender da melhor forma possível uma mensagem visual é buscar para quem ela foi produzida. [...] No entanto, identificar o destinatário da mensagem visual não basta para compreender para que ela serve. A função da mensagem visual é também, efetivamente, determinante para a compreensão de seu conteúdo (JOLY, 1996, p. 55). Na definição, dada por Joly, acerca da iconografia e da interpretação é possível perceber a importância de se fazer uma análise das imagens tanto no que se refere ao ensino quanto à vivência particular do indivíduo. Interpretar uma mensagem, analisá-la, não consiste certamente em tentar encontrar ao máximo uma mensagem preexistente, mas em compreender o que essa mensagem, nessas circunstâncias, provoca de significações aqui e agora, ao mesmo tempo que se tenta separar o que é pessoal do que é coletivo (JOLY, 1996, p. 44). Dessa forma, saber a função da imagem é determinante para compreender o seu conteúdo.Para entender o significado da imagem é necessário perceber que ela representa um acontecimento situado em um tempo e um espaço, de forma que a imagem representativa também é uma imagem narrativa, mesmo que o que esteja sendo representado não tenha larga amplitude. Como observamos várias vezes, a representação do espaço a do tempo na imagem são consideravelmente determinadas pelo fato de que na maioria das vezes esta representa um acontecimento também situado no espaço e no tempo. A imagem representativa, portanto costuma ser uma imagem narrativa, mesmo que o acontecimento marcado seja de pouca amplitude. Já que se deseja saber o que a imagem representa, lógico que se comece por indagar qual é sua relação com a narratividade em geral (AUMONT, 1993, p. 244). Quando se fala em narrativa da imagem o primeiro ponto a ser mostrado é o conceito de narrativa que nada mais é que um conjunto de signos, cujos significados formam uma história. Esse conjunto, por sua vez, tem uma duração particular, tendo em vista que a narrativa desenrola-se no tempo. Desta feita cabe demonstrar que uma imagem pode conter 64 uma narrativa a partir do momento em que a definição daquela foi atrelada à representação da mimese9, havendo, pois, três tipos de narrativas: 1) a narrativa que exclui a mimese, sendo, então, composta apenas pela linguagem verbal; 2) a narrativa que apenas comporta a mimese, constituída por um análogo das ações e palavras dos personagens; 3) a narrativa mista, esta que possui uma parte verbal e outra parte mimética, que domina a literatura. Assim, quando se trata da análise de imagens, é fator primordial, além da sensibilidade e do preparo visual, a bagagem cultural, o conhecimento prévio que o observador tenha do conteúdo que está sendo retratado, de forma que não existe, dessa maneira, observador ingênuo, pois este também faz sua análise, sua interpretação do que ele está vendo, independentemente de seu preparo, pois, nesse caso, supõe-se que o mesmo tenha sensibilidade, partindo-se das primícias de que todos nós temos empatia, e, sem perceber, utiliza a sua bagagem cultural nessa tarefa. A experiência recreativa de uma obra de arte depende, portanto, não apenas da sensibilidade natural e do preparo visual do espectador, mas também de sua bagagem cultural. Não há espectador totalmente “ingênuo”. O observador “ingênuo” da Idade Média tinha muito o que aprender e algo a esquecer, até que pudesse apreciar a estatuária e arquitetura clássicas, e o observador “ingênuo” do período pós-renascentista tinha muito a esquecer e algo a aprender até que pudesse apreciar a arte medieval [...] Assim o observador “ingênuo” não goza apenas, mas também, inconscientemente, avalia e interpreta a obra de arte; e ninguém pode culpa-lo se o faz sem se importar em saber se sua apreciação ou interpretação estão certas ou erradas, e sem compreender que sua própria bagagem cultural contribui, na verdade, para o objeto de sua experiência (PANOFSKY, 1976, p. 36). Com base nos vários significados criados é que se pensa no conceito de representações. Também ligado à escola dos Annales o conceito de representações foi construído por Roger Chartier quando afirma que as representações ocorrem quando “em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade é construída, pensada, dada a ler por diferentes grupos sociais” (CHARTIER apud BARROS, 2007, p. 3). Dessa forma, a teoria das representações permite a interdisciplinaridade e facilita ao pesquisador compreender o objeto, neste caso a imagem, sob vários ângulos. Para Serge Moscovici (apud BARROS) as representações são impostas, de forma que o comportamento de cada indivíduo é condicionado pelas convenções estabelecidas. Assim, as imagens surgem baseadas em sistemas anteriores que refletem algo produzido em alguma época passada. 9 Segundo o Novo Aurélio Século XXI, é a imitação ou representação do real, ou seja, a recriação da realidade. 65 É importante formar o aluno enquanto leitor de imagens para que ele possa entende-las melhor e sentir-se mais atraído por essa área de estudos que concerne à arte. Tratando-se das obras de Frans Post, a partir do momento que o discente aprender a fazer uma leitura de uma tela, ele mesmo poderá compreender as interrogações do artista, por exemplo, ao retratar um “carro de bois”. Quanto ao docente, antes dele almejar a formação de seus alunos enquanto leitores de imagens aquele deve buscar a sua própria formação como tal para que ele possa alfabetizar o “discente” nesse aspecto. [...] é de fundamental importância investir na formação e sensibilização do professor para a leitura da imagem, a fim de que de posse plena dessa competência, ele se torne capaz de trabalhar na contracorrente de qualquer olhar redutor, condicionado e esvaziado, impostos pelo ritmo do cotidiano, em meio à superabundância de imagens que se alternam diante do olhar (BUORO, 2003, p. 43). A utilização de imagens em sala de aula deve criar uma atmosfera de discussões sobre o contexto em que foi produzida determinada imagem, sendo possível, assim, perceber seu significado tanto para a época em que foi feita como para o tempo presente. Para Peter Burke (2004) uma imagem jamais deve ser considerada como um simples reflexo de sua época, mas como uma extensão do contexto social foi produzido, devendo, portanto, ser feito uma análise, especialmente dos seus conteúdos subjetivos. Neste sentido, nota-se o papel do professor como conhecedor do que está sendo trabalhado na imagem, não só o contexto histórico, como a vida do artista entre outros aspectos, mesmo porque a leitura da imagem, a sua análise é feita com base no conhecimento que se tem. Vemos uma pintura como algo definido por seu contexto: podemos saber algo sobre pintor e sobre o seu mundo; podemos ter alguma ideia das influências que moldaram sua visão; se tivermos consciência do anacronismo, podemos ter o cuidado de não traduzir essa visão pela nossa – mas, no fim o que vemos não é nem a pintura em seu estado fixo, nem uma obra de arte aprisionada nas coordenadas estabelecidas pelo museu para nos guiar. [...] O que vemos é a pintura traduzida nos termos da nossa própria experiência [...] infelizmente (ou felizmente) só podemos ver aquilo que, em algum feitio ou forma, nós já vimos antes. Só podemos ver as coisas para as quais já possuímos imagens identificáveis, assim como só podemos ler em uma língua cuja sintaxe, gramática e vocabulário já conhecemos (MANGUEL, 2001, p. 27). Alguns aspectos devem ser apontados no momento de análise de uma imagem, como sua procedência, sua finalidade, seu tema, sua estrutura formal, e seu simbolismo. Tais 66 aspectos facilitamo trabalho de análise, pois todo material iconográfico possui ideias, foi produzido por alguém com um objetivo específico e nem sempre isso está claro, daí a importância da contextualização, sendo ela que dará dicas das respostas às perguntas feitas no momento da análise. Imagens podem dar forma a um imaginário cultural e também fornecer dados e características de povos e épocas diversos. É preciso, porém, ter cuidado ao lidar com imagens enquanto evidências históricas,pois A imagem não é o retrato de uma verdade, nem a representação fiel de eventos ou de objetos históricos, assim como teriam acontecido ou assim como teriam sido. Isso é irreal e muito pretencioso. A História e os diversos registros históricos são sempre resultados de escolhas, seleções e olhares de seus produtores e dos demais agentes que influenciaram essa produção (PAIVA, 2006, p. 19-20). Com isso é fácil perceber porque a obra de Frans Post foi responsável pela transformação do imaginário europeu acerca das terras brasílicas, como novas impressões e pensamentos, tornando-se tais imagens documentos que fornecem muitas informações do período colonial e da colônia enquanto objeto de observação e exploração. Tratando-se especificamente da pintura, seu uso em sala de aula é um meio muito rico para a compreensão de outras épocas e da História em si, tendo em vista que ela sempre traz informações sobre diversos aspectos do passado. Contudo ela deve ser observada de forma certa, conforme orienta Robert Cumming (apud LITZ). [...] ver não é o mesmo que olhar, assim como ouvir não é igual a escutar. Ver apenas envolve o esforço de abrir os olhos; olhar significa abrir a mente e usar o intelecto. Olhar uma pintura é como partir para uma viagem – uma viagem com muitas possibilidades, incluindo o entusiasmo de compartilhar a visão de uma outra época. Como em qualquer viagem, quanto melhor a preparação, mais gratificante será a expedição. A melhor maneira de viajar é com um guia que o ajude enquanto você se familiariza com o novo ambiente, e que lhe mostre coisas que do contrario passariam despercebidas. (CUMMING apud LITZ, [s.d]). Anamelia Bueno Buoro (2003) trabalha a ideia de que a arte deve ser acessível para toda e qualquer pessoa, bem como o seu conhecimento. Contudo, nesse aspecto cabe ao docente revestir-se de autoridade e amplo saber do assunto para, só então, estarem aptos à leitura de imagens. É importante ressaltar que o conceito de leitura de imagens entenderá a 67 arte como linguagem, como construção humana que comunica ideias, sendo a arte entendida, pois, neste sentido, como texto visual. É inegável que o investimento no conhecimento do futebol vem acontecendo há muito em nosso país, e a mídia tem se incumbido de instrumentalizar teoricamente as análises dos interessados no assunto. Contudo, se o mesmo não acontece com o conhecimento da arte, será preciso que, em algum momento e por obra de algum outro sujeito, esse saber, ainda tão elitizado, passe a frequentar o cotidiano do cidadão comum, invadindo a mídia e os espaços urbanos idealizados ou não a fim de promover as artes por meio de exposições e eventos. [...] Só com investimentos de toda sorte a construção de conhecimentos em arte deixará de se manter restrita a um universo de privilegiados para encarnar-se de fato na realidade concreta, passando assim a participar da vida dos brasileiros. A melhor capacitação dos agentes envolvidos em projetos que integrem a arte e a educação é, pois, o passo decisivo para despertar outros indivíduos para o contato e as experiências que a arte proporciona. Arte e conhecimento para muito mais gente, arte e conhecimento para todos [...] (BUORO, 2003, p. 27-28). Alberto Manguel (2001) afirma que as imagens, assim como um texto escrito, estão carregadas de informações, sendo aquelas de suma importância para a existência de uma narrativa, porque esta existe no tempo enquanto aquelas ocupam um lugar no espaço. É a partir do Renascimento que a imagem como narrativa sofre uma mudança, já que durante a Idade Média bastava um painel pintado para que uma sequência narrativa pudesse ser representada. Com o desenvolvimento da perspectiva, os vários quadros de um painel congelam-se em instantes únicos, sendo este o momento da visão percebida pelo espectador, de forma que a narrativa passa a ser transmitida através do que o espectador sabia estar acontecendo por meio de outras fontes. Formalmente as narrativas existem no tempo, e as imagens, no espaço. Durante a Idade Média um único painel pintado poderia representar uma sequência narrativa, incorporando o uso do tempo nos limites de um quadro espacial, como ocorre nas modernas histórias em quadrinhos, com o mesmo personagem aparecendo várias vezes em uma paisagem unificadora, à medida que ele avança pelo enredo da pintura. Com o desenvolvimento da perspectiva, na Renascença, os quadros se congelam em um instante único: o momento da visão tal como percebida do ponto de vista do espectador. A narrativa, então, passou a ser transmitida por outros meios: mediante “simbolismo”, poses dramáticas, alusões à literatura, títulos – ou seja, por meio daquilo que o espectador, por outras fontes, sabia estar ocorrendo (MANGUEL, 2001, p. 24-25). Qualquer imagem em uma primeira observação terá percepções e análises mais simples, ao passo que com o decorrer do tempo pode-se ver e descobrir mais detalhes, 68 perceber outros aspectos, associar e combinar outras imagens a fim de se fazer uma melhor leitura do que está sendo observado. Com o correr do tempo, podemos ver mais ou menos coisas em uma imagem, sondar mais fundos e descobrir mais detalhes, associar e combinar outras imagens, emprestar-lhe palavras para contar o que vemos mas, em si mesma, uma imagem existe no espaço que ocupa, independente do tempo que reservamos para contemplá-la [...] (MANGUEL, 2001, p. 25). É importante ressaltar que a narrativa da imagem é produzida com base em outras narrativas, ou seja, no conhecimento que o espectador, nesse caso o aluno, tem em suas vivências. O uso de imagens deve ser feito em parceria com o conteúdo que está sendo estudado, pois assim há uma “quebra” do cotidiano da sala de aula, além de que a percepção dos alunos é afetada com o que eles já sabem, o que se chama de conhecimento prévio, ajudando assim a elaborar associações entre a imagem e o conteúdo que já possuem. A intenção de utilizar a imagem como recurso é que através dela ocorra uma melhoria no processo de ensino e aprendizagem, devendo, para tanto, aquela ser bem utilizada e explorada para que possa assumir o lugar de uma fonte de informação, pesquisa e conhecimento para o aluno, capacitando este a perceber semelhanças e diferenças, rupturas e permanências no processo histórico. O uso de imagens no ensino de história é algo presente desde o século XIX, quando os livros didáticos já apresentavam litogravuras e mapas intercalados aos textos escritos. Já no início do século XX o professor Jonathas Serrano, do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, já apontava as imagens como recurso didático importante, pois tira o aluno do método mecânico o qual já está habituado. Dessa forma as imagens ganham um papel de proporcionar aos alunos uma aprendizagem diversificada, como afirma o professor Serrano: “Os alunos poderiam aprender História pelos olhos e não mais enfadonhamente só pelos ouvidos, em massudas, monótonas e indigestas preleções” (SERRANO apud BITTENCOURT, 2005, p.69). De acordo com Eduardo França Paiva (2006), a iconografia vem sendo utilizada com muita destreza pelas mais novas gerações de historiadores e professores de história. Ela deixou de ser vista como “figura”, “desenho” que serve apenas para deixar o texto mais colorido e passou a ser vista como registro histórico, estes com o qual aqueles devem estabelecer um diálogo contínuo. 69 Embora a iconografia seja uma das fontes históricas mais ricas de informações, não se pode tomar o que está nela representado como verdadeiro. Assim como toda fonte histórica, ou a maioria, ela foi criada com alguma intencionalidade e o docente, o historiador, não pode deixar-se levar pelas armadilhas metodológicas presentes nas imagens, sendo elas quanto mais ricas em cores, maior riqueza de detalhes, com traçados mais elaborados, mais próximas da realidade, maior é o perigo que elas apresentam, enganando os olhos de quem vê, como uma sereia com seu canto. É preciso saber filtrar todas essas imagens, todos esses registros iconográficos. Para tanto, nunca é demais voltar aos velhos ensinamentos em torno da crítica interna e externa das fontes, que todo historiador deve empreender, talvez sem a rigidez modelar, esquemática e classificadora que se pretendeu e se praticou no passado. Mas é certamente fundamental que nunca nos esqueçamos de fazer aos registros históricos, iconográficos ou não, as perguntas que caracterizam o início de todos os nossos trabalhos e de nossas reflexões. Quando? Onde? Quem? Para quem? Para que? Por que? Como? A essas perguntas deve-se, contudo, acrescentar outros procedimentos. Primeiramente deve-se preocupar com as apropriações sofridas por esses registros com o passar dos anos e, evidentemente, diante das necessidades e dos projetos de seus usuários. Além disso, temos que nos perguntar sobre os silêncios, as ausências e os vazios que sempre compõem o conjunto e que nem sempre são facilmente detectáveis (PAIVA, 2006, p. 18). A imagem não é a realidade histórica em si, mas traz em si porções dela, tornando-se, assim, um subsídio para o historiador-docente acerca da versão do passado e do presente. Ela não se esgota e há sempre mais aspectos a serem observados e apreendidos do que está explicitado, tornando-a como uma ponte entre o que está sendo retratado e outras realidades, fato este que permite ao professor traçar um paralelo com outros temas. A análise da imagem é um fator importante do aprendizado de História e de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, o aluno deve, no tocante à História, ter o domínio de procedimentos referentes à pesquisa e produção de textos, aprendendo a observar e colher informações de paisagens diversas e registros sejam escritos, iconográficos e sonoros. Percebe-se que o contato com as imagens é imprescindível para a boa formação histórica do aluno. Contudo, poucos professores são adeptos desse recurso didático e preferem ainda, em grande medida, o uso de textos escritos. É interessante reparar como o uso da imagem no ensino de História é tido ainda como um obstáculo, pois para alguns docentes ela não é vista como um documento ou uma fonte, mas sim como ilustração do texto escrito. Embora o número de professores que tem feito uso 70 de imagens como recurso didático para melhorar o processo de ensino e aprendizagem, ainda é muito pequena a quantidade de iniciativas em que a imagem é utilizada e estudada como documento e fonte histórica. O professor, antes de trabalhar com imagens e suas leituras deve definir o que ele entende por leitura e imagem, mesmo porque cada observador fará uma leitura de um determinado lugar social de acordo com suas vivências de forma tal que são criados diversos significados por parte de alunos e professores. Ela não é vista como um documento, uma fonte, mas como mera ilustração do texto escrito. Se quisermos, entretanto, fornecer subsídios para que nosso aluno leia as imagens devemos também definir o que entendemos por leitura e por imagem. Até que ponto a imagem é compreendida a partir do mundo do leitor? Afinal, aquele que lê, o faz de um determinado lugar social, com seu repertório e com suas vivências. Isso permite a alunos e professores a criação de significados diversos e particulares e nos leva ao conceito de representação (BARROS, 2007, p. 2). De acordo com Circe Bittencourt a utilização das imagens teve seu crescimento, enquanto ilustrações de livros didáticos, a partir da segunda metade do século XX e hoje elas se fazem presentes não apenas nesse suporte, mas também nas imagens tecnológicas, como filmes e fotografias, por exemplo, caracterizando-se assim como recursos didáticos além do livro. Contudo, ela ressalta, a imagem deve ser bem utilizada pelo professor para não ser usada apenas como meio de chamar a atenção do aluno, este que já está acostumado com aulas enfadonhas e com imagens que circulam nos meios midiáticos e não constroem nenhum tipo de postura crítica ou analítica naquele aluno. Dessa forma é que o professor deve estar apto para trabalhar a sensibilidade e a percepção no seu alunado, especialmente quando a imagem se trata de telas e quadros, os quais, muitas vezes, têm seu significado e sentido de maneira implícita. Serrano afirma que, mesmo com a utilização de imagens no ensino já ter mais de um século e de sua multiplicação trazer uma grande importância desse recurso na cultura escolar, as imagens são utilizadas para ilustrar a História, possibilitando aos alunos presenciar experiências não vividas por eles. Esse recurso tem o papel de relembrar, rememorar, e até aproximar-se de um passado desconhecido, tal qual ocorre com fotos de família o mesmo acontece com imagens históricas. De acordo com Elias Thomé Saliba (2005) o aluno procura significado nas imagens, pois o leitor tende a buscar e estabelecer conexões do que ele está vendo com suas lembranças. Vale ressaltar que uma imagem, como qualquer fonte histórica, foi produzida por alguém e está carregada de intencionalidade, devendo haver o cuidado da parte do professor 71 buscar entender e mostrar o porquê e o para que determinada imagem foi produzida. Nesse mesmo sentido Saliba tem um conceito de imagem no qual ele admite que ela nem ilustra nem reproduz a realidade e sim é algo construído a partir de uma linguagem própria, a qual é produzida em um dado contexto histórico. Da mesma forma que ocorre com o filme (imagem tecnológica) a imagem também irradia um processo de pluralização de sentidos e/ou verdades, fato este que reforça a atitude do professor em mostrar a intenção do artista na criação das imagens. A intenção de utilizar a imagem como recurso é que através dela ocorra uma melhoria no processo de ensino e aprendizagem, devendo, para tanto, aquela ser bem utilizada e explorada para que possa assumir o lugar de uma fonte de informação, pesquisa e conhecimento para o aluno, capacitando este de perceber semelhanças e diferenças, rupturas e permanências no processo histórico. Quanto à questões pedagógicas e historiográficas, a utilização dos signos visuais possibilita uma excelente interpretação histórica devido á riqueza de informações e detalhes. O uso de imagens no ensino de História é melhor pensado através de uma reflexão de como o aluno constrói seu conhecimento histórico, sendo tal conhecimento ligado à forma como aquele o recebe e o articula. Conhecer é ter a capacidade de estruturar, relacionar, organizar, sistematizar as informações que se tem e perceber como essas relações estruturam a realidade. As atividades de aprendizagem, assim como os objetivos das aulas, não podem se resumir a reproduzir conhecimentos pra apenas memorizar e depois repetir. Todo conhecimento deve ser pensado no sentido de sua redescoberta ou redefinição. Para isso faz-se necessário trabalhar dialeticamente construindo o conhecimento numa relação entre professor aluno objeto e realidade. Nessa relação, o professor deve ser o mediador entre o educando, o objeto do conhecimento e a realidade, buscando um caminho que leve o aluno a analisar e sintetizar esse objeto, de forma que chegue a um conhecimento mais elaborado, e não fragmentado e baseado apenas no senso comum (LITZ, [s. d.], p. 5, 6). Entre os objetivos da disciplina História um dos principais é tornar o aluno capaz de verbalizar e escrever sobre o conteúdo estudado, relacionando o presente com o passado, adquirindo uma posição na realidade a qual está inserido e a questionando quando for preciso. Dessa forma vários recursos didáticos surgiram para tornar real esse objetivo. Em grande medida, através da Nova História, com a mudança no conceito de fonte histórica, a imagem surge como aliada no processo de construção do conhecimento histórico. Atualmente, a sua utilização é um dos métodos mais eficazes usados como recurso pedagógico na aula de 72 História, sendo muitas as formas que ela surge: cinema, pintura, mapas entre outros, interessando em meu trabalho, porém, as pinturas apenas, tendo em vista que meu objeto de pesquisa são as telas de Frans Post. Para o ensino de História não existem muitas referências sobre o uso de imagens, apesar da ampla produção, a partir dos anos 50 e 60, de psicólogos, sociólogos e especialistas em semiologia ou teorias de comunicação, os quais tinham como principal o rádio, o cinema e a televisão na configuração de uma cultura de massa. Na trilha desses pesquisadores, historiadores vêmse dedicando ao estudo da iconografia, incluindo análises das denominadas “imagens tecnológicas” (BITTENCOURT, 2011, 361). A iconografia com temas brasileiros promove um maior sentimento de identidade no aluno, na medida em que ele pode se reconhecer em alguma imagem ou buscar o estabelecimento de conexões com o que ele conhece. O uso de imagens no ensino de História do Brasil ajuda a reforçar um sentimento de pertencimento, tendo em vista que algumas pinturas constituem uma memória histórica à várias gerações. Além de que essa forma de representação causa uma indagação ao espectador: será possível identificar-se nelas com alguém? Ernest Lavisse considera a iconografia como recurso que auxilia na aprendizagem, pois os alunos memorizam os conteúdos das explicações através delas. Contudo é necessário que o autor do livro didático e mesmo o docente tenham a precaução de alocar bem as imagens de forma que fiquem bem distribuídas ao longo do capítulo e sejam acompanhadas de legendas ou pequenos textos explicativos para que os alunos ao se depararem com as ilustrações saibam o que eles deveriam observar com mais atenção, reforçando, assim, a ideia contida no texto e na explicação do docente. Tal pensamento de Lavisse fica bem percebido na citação seguinte: As crianças têm necessidade de ver as cenas históricas para compreender a história. É por esta razão que os livros de história que vos apresento estão repletos de imagens. Desejamos forçar os alunos a forçar as imagens. Sem diminuir o número de gravuras que existiam no texto, compusemos novas séries delas correspondendo a uma série para cada livro. Cada série é acompanhada de questões que os alunos responderão por escrito, após terem olhado o desenho e feito uma pequena reflexão sobre ele. É o que denominamos de revisão pelas imagens e acreditamos que este trabalho possa desenvolver a inteligência das crianças ao mesmo tempo que sua memória (LAVISSE apud BITTENCOURT, 2005, p.75). 73 Podemos perceber nessa afirmação a importância da imagem, se bem trabalhada, no aprendizado do aluno, funcionando como uma ferramenta de revisão e de reforço do conteúdo explicado em sala de aula. Compartilha dessa ideia de Lavisse a autora Miriam Leite ao afirmar que a imagem “é percebida pelo olho mas transmitida pela palavra” (LEITE apud BITTENCOURT, 2005, p.88), ajudando na aprendizagem do aluno e na sua escrita e oralidade, em virtude de que ele vê e começa a fazer conexões com outras experiências, iniciando, pois, uma descrição do que se é visto. Fator importante para ser ressaltado quando se refere ao uso de imagens no ensino de História é também a questão da análise destas, podendo ser visto na citação abaixo que para se analisar uma imagem e entende-la é necessário ter um conhecimento prévio sobre o assunto e conteúdo o qual a imagem retratar. Os contextos em que estão inseridas as imagens que se deseja ler reservam ou exprimem sentidos que podem transformados em novas mensagens, que por sua vez por sua vez podem atingir os diferentes sentidos. Assim com é preciso passar por trás dos cenários para compreender as imagens visuais, é necessário um conhecimento prévio e direto da realidade que a imagem representa, simboliza ou indica para não se ficar desorientado com seus elementos constitutivos (LEITE, 2001, p.158). Para analisar uma imagem é preciso conhecer basicamente do que ela trata, pois na leitura da comunicação não-verbal e constitui esse processo de interpretação não apenas os elementos que estão explícitos na gravura, mas também a formação cultural e intelectual do leitor, sendo importante aqui o papel do docente ao trabalhar o conteúdo em sala de aula, pois a iconografia deve ser trabalhada em classe após a explicação do conteúdo ou de forma concomitante. No que diz respeito a obra de Frans Post é importante tomar cuidado ao analisar suas imagens, devido ao fato de que ele produzia para a burguesia neerlandesa, o que gerava certa desconfiança do que estava sendo representado, tendo em vista que o mercado da arte no século XVII era marcado pela influência do comprador no resultado final da tela. Com relação á paisagem, bastante presente nas obras de Post, graças a iconografia ela também ganha um novo significado: toda paisagem física nada mais é que uma imagem que pode ser lida, de forma tal que ao ser representada temos uma imagem da imagem. Deve-se ter o cuidado, contudo, de analisá-la como fazendo parte de um sistema cultural. 74 [...] o que numa determinada cultura parece ser “senso comum” precisa ser analisado pelos historiadores e antropólogos como parte de um sistema cultural. No caso da paisagem, árvores e campos, rochas e rios, todos esses elementos comportam associações conscientes ou inconscientes para os espectadores (SCHAMA apud BURKE, 2004, p. 53). Para o processo de significação da imagem, além do sentido denotativo e conotativo, é de fundamental importância uma terceira categoria defendida por Norman Bryson (apud Vieira): o “estereótipo”. Este, acordando com Peter Mason (apud Vieira), trata a questão do exótico,o qual nada mais é que um discurso etnocêntrico sobre o Outro, o qual, por sua vez, de acordo com o grau do estereótipo, é representado como “selvagem” ou “domesticado”. Neste sentido de acordo com Daniel de Souza Leão Vieira (2013), é possível explorar um tema pouco estudado através das obras de Post: as figuras humanas, estas que aparecem como landmarks10 para a simbolização de dois tipos de paisagens: a parte política representada pela Nova Holanda; a economia colonial que podia ser explorada. E em ambas as representações há o emprego de alegorias de prosperidade, embora com discursos políticos distintos – o republicanismo civil. Entretanto, ressaltamos que esses dois imaginários não foram simplesmente reflexos das duas ideologias: mas, antes, as polaridades de um campo de forças discursivas que permitiu a emergência de um lugar simbólico de embate entre ambas as ideologias. Nesse sentido, a criação imagética de Frans Post foi o lugar, por excelência, para reforçar a própria construção do Eu no interior da cultura visual neerlandesa do século XVII, através dessa especulação invertida que foi a exotização da paisagem dos Trópicos no Brasil por estereotipias do Outro (VIEIRA, 2013, p. 2). Frans Post representava o Brasil com um cunho muito mais político que qualquer outro aspecto. Contudo, em 1645 ocorre uma mudança, na qual suas imagens deixam de representar localidades específicas, pois passou a importar muito mais ao Conde de Nassau o aspecto econômico, mostrando a Europa um Brasil rico em açúcar. Neste sentido os landmarks saíram um pouco de cena, dando espaço à arquitetura dos engenhos, sendo tais composições as responsáveis por formar o pensamento neerlandês no que se refere à produção açucareira. 10 A palavra inglesa “landmark”, se traduzida ao pé da letra, significa “marco de terra”. Marcos são objetos proeminentes e resistentes, feitos e instalados para durarem e não serem deslocados, ou seja, imutáveis. Neste sentido, as figuras humanas são consideradas assim devido representarem algo indelével na obra de Post. 75 Quanto a estereotipia na obra de Post, vale ressaltar que a Europa teve um processo crescente estando este mais presente no trabalho daquele artista no período que remete ao fim do século XVII. A obra de Post retrata essencialmente aspectos da sociedade, da economia, o que pode ser visto, por exemplo, na tela Engenho. Nela pode-se analisar elementos da conjuntura econômica e religiosa, a partir do momento que ele põe o engenho e a igreja ao fundo. No quadro chama atenção o grupo de pessoas no canto inferior direito, com cestos, alguns totalmente cobertos e outros com o tronco nú, demonstrando, com isso, como a cultura e catequese europeias estavam sendo incorporadas pelos grupos indígenas da América Portuguesa. A mesma imagem evidencia como a presença europeia modificou a paisagem e natureza local, inserindo aí casas, engenhos, capelas. E a hibridização cultural, tão destacada por Gilberto Freyre em Casa Grande e Senzala, está presente no momento em que o pintor mostra índios com indumentárias europeias, sem, contudo, abandonar seus costumes por completo, o que confirma a presença dos cestos. Figura 111: Engenho, Frans Post. Disponível em: <http://www.sabercultural.com>. Acesso em 4 nov. 2014. 76 Algo também que fica claro quando analisamos as imagens de Frans Post é a presença do binômio muito utilizado como objeto de estudo sobre o passado colonial do Brasil: a casagrande e a senzala, como por exemplo, na tela Casa de fazenda. O artista demarca bemas estruturas de poder através da presença dessas construções em suas telas. O docente deve, porém, chamar a atenção do aluno para o fato de que a casa-grande, embora seja detentora do poder do colono europeu, acompanha as mudanças do tempo, não sendo, pois, um castelo medieval. Figura 112: Casa de Fazenda, Frans Post. Disponível em: <http://people.ufpr.br>. Acesso em: 4 nov. 2014. Também podemos perceber mais elementos da estadia de Post em Pernambuco e analisar melhor aspectos de modificações em estruturas naturais e criadas pelo europeu. Na tela Vila de Pernambuco é possível perceber, logo em primeiro plano, o abacaxi, fruta que teve grande aceitação pelos colonos e foi usada como mercadoria. Vendo isso o europeu associaria também a uma fonte de riqueza alternativa para o comércio na Europa. Além dessa fruta, Post representou também um coqueiro, planta trazida da Índia pelos portugueses como demarcação do território, sendo válido chamar atenção para o tamanho dos coqueiros. Por ser uma planta que demora a crescer e pelo tamanho representado no quadro, percebe-se que a 77 presença de povos do Velho Mundo na América tropical já tinha muito tempo. No canto esquerdo vê-se também a representação da cobra e do tatu, animais estes que podem identificar ao europeu um Brasil ainda em construção, deixando seu aspecto selvagem para a modernidade “civilizada” oferecida pelo europeu. No que se refere às construções, pode-se ver um avanço no tipo de material utilizado, optando por tijolos e telhas à taipa, e aspectos relacionados à demografia da colônia também podem ser analisados, tendo em vista que as representações de moradia estão com dois pisos, dando uma ideia defamília e filhos. No aspecto religioso, é possível ver uma estrutura bem mais trabalhada arquitetonicamente do que as outras construções, mostrando seu poder e importância para a comunidade. As variações pessoais também estão presentes no quadro de Post, estas que são mostradas de forma pacífica pelos personagens representados. O pintor chama atenção para o rio ao fundo da tela, completando o cenário natural, tendo em vista a importância demarcada pelo curso d’água no estabelecimento de vilas pela necessidade da água para consumo, serviços domésticos entre outros. Figura 113: Vila de Pernambuco, Frans Post. Disponível em: <http://movimentodomundo.blogspot.com>. Acesso em 4 nov. 2014. De acordo com Charles Nascimento de Sá (2011), dessa forma o docente tem um amplo leque de assuntos que podem ser trabalhados em sala de aula, ajudando o discente a 78 formar uma consciência crítica a partir do momento que é desenvolvido neste uma consciência analítica dos diversos elementos presentes num quadro e qual conceitos estes têm. Com tais possibilidades de análise, o professor tem assuntos variados para trabalhar com o quesito imagens em sala de aula, podendo tornar o momento em sala de aula rico na busca de significados para os elementos representados nas obras a serem analisadas. Trabalhar esses sentidos em sala de aula, desperta no educando o interesse pela disciplina e leva-o a desenvolver uma consciência analítica, sabendo conceituar o valor de cada elemento e o que este elemento representa para cada período (SÁ, 2011, p. 11). Quando se trata do aspecto demográfico e de relações pessoais nas telas de Frans Post o leque é vasto. Outra de suas imagens nas quais pode ser percebida a demografia da colônia brasileira é Vila e pessoas onde vê-se pessoas, construções, aspectos estes que apontam para um crescimento populacional que ocorria no Velho Mundo com ajuda do conde de Nassau. O moderno desenho de pesquisas demográficas, que têm por intuito condensarem todo um universo populacional a partir do menor número possível de casos, desenvolveu-se a sobre a dinâmica entre o conhecimento estatístico acumulado e a prática de campo das pesquisas. Após curto tempo vivido em Pernambuco, Frans Post pôde demonstrar, neste e em outros quadros, que um aguçado espírito de observação também terá sido suficiente para construir amostras fieis ao universo humano que havia presenciado (MOURA FILHO apud SÁ, 2011, p.11). Figura 114: Vila e pessoas, Frans Post. Disponível em: <http://www.aquipernambuco.com.br>. Acesso em 4 nov. 2014. 79 Outro aspecto muito mostrado pelo pintor holandês é a importância dos rios. Estes marcam presença em muitas de suas telas, almejando o artista, com isso, mostrar na Europa a relevância daqueles para o transporte, fornecimento de água para animais e moinhos, demonstrando, pois, sua necessidade para o desenvolvimento colonial e para a economia açucareira. Além disso, embora o aspecto natural esteja sempre presente nas obras de Post, vê-se que grandes vegetações não se fazem presentes, revelando, assim o avanço da cultura canavieira sobre as terras colonizadas. Por tudo isso ressaltado pode-se perceber a importância que Frans Post tem no cenário historiográfico para o estudo do período colonial do Brasil, e também enquanto recurso didático, na medida em que suas telas podem ser usadas como imagens nas aulas de História. 80 CONCLUSAO A historiografia brasileira é marcada por Gilberto Freyre, Caio Prado Júnior e Sérgio Buarque de Holanda, mas quando se trata dos autores que versam sobre o período colonial tem-se um leque bem mais amplo, como, alguns dos utilizados aqui nesse trabalho, Arno e Maria José Wehling, Mario Maestri, Luiz Roberto Lopes e Evaldo Cabral de Mello, por exemplo. Esses autores fazem-se importantes por apresentar aspectos da sociedade e da economia, os quais são relevantes para essa pesquisa. Quando nos atemos a dissertar sobre a ocupação holandesa no Brasil-colônia é fundamental ressaltar a economia e com isso a Companhia das Índias Ocidentais e a figura do conde João Maurício de Nassau, daí serem estes elementos presentes no meu trabalho. Além disso a presença desses elementos, especialmente de Maurício de Nassau, é marcada por ser através deles que surge o artista que veio a dar origem a essa pesquisa: Frans Post. Frans Post surgiu como artista holandês para registrar as realizações do governo de Nassau, a paisagem e a topografia do Novo Mundo. Dessa forma, as suas imagens forma fundamentais para promover o conde como chefe de Estado, já que ao mesmo tempo que mostrava a paisagem da nova terra conquistada com isso trazia à cena a economia e o governo de Nassau. Embora a função de Post ao vir para o Brasil tenha sido mostrar a topografia do Novo Mundo, suas imagens assumiram uma característica muito mais importante, pois elas demonstravam aspectos da economia no que diz respeito ao cultivo da cana-de-açúcar e à produção de açúcar, e da sociedade visto que mostra o convívio dos habitantes, as formas de moradia e o trabalho realizado na nova terra. Diante do exposto pode-se perceber o quão importantes são as imagens de Frans Post no estudo do período colonial. Através delas podemos ter uma visão da versão europeia para esse período da história do Brasil. Tanto no aspecto geográfico como econômico e social. Vale ressaltar a importância do trabalho com imagens, tendo em vista que estas passaram a se constituir em fontes históricas a partir das mudanças no conceito de fontes promovida pela Escola dos Annales no século XX, a qual diversificou e ampliou esse conceito, sendo assim que as telas do artista holandês passaram a ser consideradas como fontes. As imagens, ao assumirem o papel de fonte, ganham um espaço ainda maior: a sala de aula. Nesse espaço sua importância está ligada ao processo de ensino-aprendizagem e ela passa a ser utilizada como recurso, como um facilitador para o aluno. 81 Além disso, é importante trabalhar com imagens porque elas provocam no leitor uma sensação de pertencimento, em alguns casos, na medida em que o observador se identifica com algum aspecto da imagem, trabalhando, portanto, a noção de identidade. A imagem se faz importante, ainda, por possibilitar um contato maior com a arte, realidade esta que, muitas vezes, pode nem fazer parte do cotidiano do discente. Esse trabalho não marca um fim, mas um início, uma pesquisa que pretendo desenvolver mais profundamente no futuro, além de ser uma interessante linha para outros trabalhos referentes ao ensino de História, mais especificamente sobre a temática do período colonial da história do Brasil. 82 REFERÊNCIAS A CACHOEIRA de Paulo Afonso. Frans Post. <http://brasilartesenciclopedias.com.br>. Acesso em: 4 nov. 2014. Disponível em: A VISTA de Itamaracá. Frans Post. Disponível em: <http://franspost-tda.blogspot.com>. Acesso em: 4 nov. 2014. ALPERS, Svetlana. A arte de descrever: a arte holandesa no século XVII. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 1999. ANDRADE, Manuel Correia de. A pecuária e a produção de alimentos no período colonial. In: SZMRECSÁNYI, Tamás (Org.). História econômica do período colonial. São Paulo: Hucitec, 2002. p. 99-108. ANDRADE, Manuel Correia de. A terra e o homem no Nordeste: contribuição ao estudo da questão agrária no Nordeste. São Paulo: Atlas, 1986. 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