Revista da Fapese, v.3, n. 2, p. 87-100, jul./dez. 2007
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Tecnologia e Meio Ambiente: o Processo de
Modernização da Agricultura Familiar
R e s u m o
Patrícia Santos Silva*
C
ompreende-se que a modernização da agricultura brasileira
trouxe um modelo de agricultura que modificou o sistema de
produção camponês, fazendo emergir uma nova organização
produtiva e mecanismos tecnológicos que envolvem o contexto rural. Essas mudanças criaram novas determinações que a estrutura
do sistema capitalista impõe sobre o comportamento econômico
desse tipo de agricultor, intensificando a sua produção, através das
consideradas ‘técnicas modernas’ que utilizam em maior escala investimentos de capital e, em menor, recursos tradicionais trazendo
efeitos nefastos ao meio ambiente. Baseando-se nessa perspectiva,
a idéia desse artigo foi a de orientar a investigação no sentido de
acompanhar a evolução do espaço rural, que se manifesta de ma-
neira particular, na análise do avanço das tecnologias de ponta que
passam a ocupar cada vez mais espaço junto à agricultura e, ainda
que numa dimensão menor, também, na agricultura familiar e seus
efeitos ao meio ambiente, tentando mostrar a diversidade desta
evolução.
PALAVRAS-CHAVE: tecnologia; meio ambiente; modernização; agricultura familiar.
*
Doutoranda em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP) E-mail: [email protected]
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Patrícia Santos Silva
1. Introdução
As transformações nas economias capitalistas a
partir dos anos 60 difundiram, no Brasil, idéias ligadas ao fato de que o desenvolvimento produtivo do
país dependeria da modernização tecnológica e que as
condições tradicionais seriam características de uma
sociedade atrasada, destinada a desaparecer para deixar lugar aos médios/grandes empreendimentos capitalistas, julgados economicamente mais eficientes.
Essa situação é constatada não só no meio urbano
quanto também em todo o meio rural. A agricultura
brasileira, nas últimas décadas, vem passando por
transformações que colocam novamente em pauta a
discussão sobre a inserção tecnológica no campo um
aparato para a denominada “modernização da agricultura”.
O conceito de “modernização da agricultura” evoca a melhoria da produção através da adoção de técnicas modernas visando uma maior produtividade da
terra e do trabalho. Nesse caso, são consideradas técnicas modernas aquelas que utilizam em maior escala
investimentos de capital e, em menor, recursos tradicionais. No decorrer desse processo, o grau de modernização pode ser medido através da difusão de técnicas modernas entre agricultores, que resulta em uma
tendência a homogeneização desses espaços tanto no
que diz respeito às práticas produtivas quanto ao meio
natural, induzida pela “Revolução Verde1”:
[...] através da utilização intensiva da
motomecanização,
fertilizantes
inorgânicos, agrotóxico, equipamentos pe-
1
2
sados de irrigação e da erosão e degradação dos solos agrícolas, no comprometimento da qualidade e da quantidade de recursos hídricos para a agricultura na devastação sistemática de florestas e campos nativos, no empobrecimento da diversidade genética dos cultivares, plantas e animais, e
na contaminação dos alimentos consumidos pela população (Meio ambiente e o desenvolvimento da agricultura, 1993, p. 82).
Diante desse contexto, esse texto busca analisar o
processo pelo qual se deu esse “desenvolvimento2” e
a suas conseqüências ao meio ambiente alicerçado pela
modernização da agricultura dentro de um determinado contexto vigente no país, levando em conta que
esse processo está enraizado à condição de desenvolvimento do capitalismo e de seus desdobramentos na
agricultura, como também mostra as alternativas/estratégias executadas pelo governo federal como resposta para essa carência, acima citada, desembocando
em projetos de desenvolvimento no setor rural.
Dessa forma, cabe afirmar a importância de um resumo sobre a contextualização histórica da modernização da agricultura, colocada aqui como pano de fundo para compreender o cerne principal desse texto: a
tecnologia e o meio ambiente.
2. O Processo de modernização da agricultura
familiar
No final do pós-guerra e início da década de 1950,
o Brasil começa a debater a “realidade” do país, as
Segundo Hayami e Ruttan (1988, p. 86), estas mudanças baseadas na modernização, também chamada de “Revolução
Verde” fundamentavam-se na melhoria do desempenho dos índices de produtividade agrícola, por meio da substituição
dos moldes de produção locais ou tradicionais, por um conjunto bem mais homogêneo de práticas tecnológicas, isto é,
de variedades vegetais geneticamente melhoradas, muito exigentes em fertilizantes químicos de alta solubilidade,
agrotóxicos com maior poder biocida, irrigação e motomecanização.
É importante salientar que ‘desenvolvimento do país’ não é sinônimo de um país desenvolvido, pois atualmente, o debate
travado sobre desenvolvimento no Brasil, demonstra as percepções diferenciadas das potencialidades do sistema produtivo
do país, dentro de um cenário paradoxal, no qual o aumento frenético da produção e da competitividade transformam-se
como parte do processo de globalização, envolto por visíveis desigualdades sociais. Para ser mais pontual, exemplifico:
mesmo sendo o Brasil considerado o segundo maior exportador do mundo em produtos agrícolas, existe a necessidade de
implementar uma política social voltada para a segurança alimentar, no caso, o Programa Fome Zero.
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condições do seu atraso e a sua superação diante da
situação inerte no desenvolvimento do setor agrícola,
devido aos problemas relacionados à tecnologia, aos
baixos níveis de produção agrícola para o mercado
interno e externo, a escassez de matérias-primas para
as demandas do setor industrial e a distribuição
fundiária altamente concentrada nas mãos de um pequeno grupo. Diante dessa situação, este setor estava
sendo visto como um obstáculo para o crescimento do
país, o que estimulou uma reação por parte do Estado, que propôs uma reavaliação na sua política econômica a fim de criar estratégias para reverter esse quadro de estagnação no setor agrícola.
O Estado começa, então, com uma sucessão de
operações com vistas a planejar uma política econômica necessária para estimular o desenvolvimento do
capitalismo no país. Esta ação tinha como pontos de
partida, dois problemas direcionados ao setor agrícola: a) o abastecimento precário dos centros urbanos,
ou melhor, a escassez de alimentos. Este problema
ocorria devido ao fato dos grandes latifundiários serem incapazes de produzir alimentos a baixo custo
para suprir o mercado interno, direcionando sua produção à exportação. Esse fato faz com que o Estado
perceba que a forma em que se pautava a agricultura
tornava-se um obstáculo para o desenvolvimento do
país; b) um outro problema é o atraso das relações de
produção no campo brasileiro. Em virtude de uma
agricultura tradicional (onde a racionalidade capitalista não impera) o Brasil se via limitado a expandir o
mercado consumidor para os produtos industriais.
Neste momento, o desenvolvimento da agricultura era
almejado no intuito de favorecer o incremento de matérias-primas para o setor industrial no Brasil, assim:
A transformação do campo era vista como
condição sine qua non do desenvolvimento
capitalista, na perspectiva dos ideólogos do
desenvolvimento industrial no modelo clássico (subdesenvolvimento como processo), e
cujos ‘entraves’ estariam localizados no setor da circulação, ou seja, na pequenez do
mercado interno. Conseqüentemente, a
abertura desse mercado teria como ponto de
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partida a transformação da agricultura (modernização das forças produtivas e das relações de produção) e possibilitaria a expansão do capitalismo no Brasil (Linhares, 1981,
p. 39-40).
Vários teóricos que analisaram o atraso do setor
agrícola foram destacados e de certa maneira influenciaram as tomadas de decisão frente a um novo modelo de agricultura que visava a um incremento do capitalismo através do setor agrário, entre eles está Theodore
W. Schultz (1965), um dos pensadores da modernização da agricultura, em seu livro “Transformação da
agricultura tradicional”, que tem como problema principal para estudo tentar compreender como é possível
transformar a agricultura tradicional, considerada pouco produtiva, em um setor da economia altamente produtivo.
Em sua obra, Schultz afirma que o aspecto crucial
da agricultura tradicional é a baixa taxa de retorno do
investimento nos fatores agrícolas do tipo que os agricultores vêm empregando ancestralmente (rotinas há
muito estabelecidas), considerando, esse tipo, um fator que emperra o desenvolvimento econômico do país:
A agricultura baseada inteiramente nas espécies de fatores de produção usados durante
gerações pelos agricultores pode ser chamada de agricultura tradicional é inevitavelmente pobre e, por ser pobre, gasta a maior
parte de sua renda em alimentos (Schultz,
1965, p.15-16).
Resumindo, o autor considera a agricultura uma
fonte de crescimento econômico de um país, “Naturalmente, uma agricultura que use apenas os fatores
tradicionais não pode fazê-lo, mas uma agricultura
modernizada é capaz de dar uma grande contribuição” (Schultz, 1965, p.17), entendendo, assim, que o
seu desenvolvimento depende da passagem de uma
agricultura do tipo tradicional para uma agricultura
moderna levantando a necessidade de investir na
mudança comportamental do agricultor tradicional,
fazendo-o entender e aceitar as modificações técnicas
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que permitam a intensificação da sua produção, abrindo mão de sua condição de agricultor tradicional para
adotar uma “racionalidade econômica” fundada sobre
a predominância do mercado.
Baseando-se nessa concepção surge, a partir dos
meados da década de 1960, especificamente, em 1964,
uma política econômica específica implementada pelo
Estado brasileiro - articulada pelo Regime Militar recém-chegado ao poder - que direcionou as suas ações
para o desenvolvimento da agricultura através do processo de modernização do seu sistema produtivo, alterando, dessa forma, a organização social no meio
rural e o perfil dos produtos cultivados, a fim de permitir uma reorganização do capital através da ampliação da oferta de alimentos, que seria possível não por
meio da reforma agrária, mas sim pelo desenvolvimento
intensivo da agricultura.
Daí, o país começou a abrir-se para o mercado internacional, iniciando o processo de expansão do capitalismo no campo, marcando o período que vai do
final da década de 1960 até a década de 1970, caracterizado pela euforia da modernização produtiva, no
intuito de retirar os agricultores familiares tradicionais de seu “primitivo tecnológico” e inseri-los em
circuitos propriamente capitalistas, através da criação
dos complexos agroindustriais3 internos.
A modernização da agricultura se deu pela via
tecnológica atingida pela industrialização, tendo o seu
apogeu por meio dos princípios da “Revolução Verde”,
que visava à substituição dos produtos antes adquiridos da natureza, passando agora a ser selecionados industrialmente, estimulando a utilização massiva dos
insumos modernos (adubos, agrotóxico), máquinas e
equipamentos agrícolas, com vistas a garantir novos
incrementos para produção agrícola, afastando, de forma assustadora, o agricultor do equilíbrio da natureza.
3
4
Este tipo de agricultura terá propaganda e incentivo político e procurará sobrepor-se às formas remanescentes do meio rural. Para tal, ela será chamada de
agricultura moderna, caracterizada pela passagem de
uma atividade de apropriação das condições naturais
existentes para uma atividade de fabricação industrializada dessas mesmas condições. Segundo esta caracterização, o capital teria se apropriado de elementos
do processo de produção rural através do crédito rural de baixo custo, liberado para os grandes proprietários, e de pesquisas agrícolas, reincorporado-os à agricultura como insumos ou meios de produção.
Dessa forma, a industrialização foi apresentada como
uma fórmula milagrosa capaz de, por si só, gerar o desenvolvimento do setor agrícola, apontando-o como o
responsável pelo atraso desses países, deveria ceder,
portanto a posição dominante da economia (Silva, 1982).
Nota-se que, seja em termos políticos, seja em termos econômicos, esse processo de modernização da
agricultura exigiu uma reorganização da agricultura a
partir da intervenção do Estado e com o apoio da oligarquia rural, fazendo surgir uma nova dinamização
da produção agrícola e a renovação das estruturas de
dominação, caracterizada por uma maior concentração, centralização, desigualdade e exclusão no campo,
marcando o período chamado de “Modernização Conservadora”, ou seja, uma modernização sem mudanças. Este modelo desenvolvimentista manteve as características do modelo evolutivo da estrutura agrária
do Brasil deste a sua colonização: a intensificação da
produção para atendimento às demandas do consumo externo, a opção pela monocultura, o apoio político e econômico aos grandes proprietários de terras
(incentivo à estrutura latifundiária) e a subordinação
dos agricultores de pequena produção às grandes propriedades, destacando-se como um modelo capitalista
monopolista, baseado na denominada “via prussiana”4.
Entendemos por complexo agroindustrial o conjunto formado pelos setores produtores de insumos e maquinarias
agrícolas, de transformação industrial dos produtos agropecuários, de distribuição, de comercialização e financiamento
nas diversas fases do circuito agroindustrial.
Essa denominação faz referência à Prússia, região alemã de agricultura comercial, voltada para a exportação e dominada
pelos grandes proprietários. Segundo Veiga (1996), o modelo “prussiano”, semelhante ao caso europeu, caracterizava-se por
impedir que suas populações rurais tivessem acesso à propriedade da terra, apoiando a agricultura patronal e não familiar.
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O desenvolvimento do capitalismo no campo, através da modernização da agricultura, não foi outra coisa senão a aceleração do processo de diferenciação do
sistema de produção de organização familiar tradicional inserido no modo de produção capitalista. Dessa
forma, segundo Wanderley:
[...] a modernização adotada foi, antes de
tudo, dolorosa porque, paradoxalmente, reproduz o atraso. Ora, o atrasado que permanece dentro de um moderno e que o
redefine pode ser identificado pelo fato de
que a modernização foi feita sob o comando da terra, isto é, pelo e para os proprietários fundiários gerando uma tensão entre a
propriedade e a produção que afeta a profundidade da própria modernização
(Wanderley, 1996, p. 27).
Essa transformação causa um rol de efeitos e de
impactos econômicos, sociais e culturais no comportamento do agricultor familiar, fundamentalmente, pela
quebra repentina da estabilidade de base produtiva
do mesmo, subordinado-a ao capital que se interpõe
como comprador de suas mercadorias e como fornecedor dos meios de produção de que necessita, controlando os mecanismos de financiamento e comercialização, fazendo com que suas condições e suas necessidades econômicas e sociais, sejam reguladas e controladas pelo capital.
Na década de 80, período da redemocratização do
país entra em crise o modelo de desenvolvimento, até
então adotado, começando a surgir conseqüências
como a forte exclusão social no campo e o enfraquecimento da política econômica do país revelando a incapacidade financeira do Estado de manter os mecanismos criados no período anterior, especificamente, no
que diz respeito ao sistema de financiamento de produção nas condições anteriormente estabelecidas, ou
seja, crédito rural deliberado, abundante e de baixo
custo para os grandes proprietários.
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Iniciam-se, assim, as críticas ao modelo de modernização da agricultura no Brasil, através de um discurso sobre formas alternativas de produção que propõe: a redução dos custos da produção; o controle do
uso indiscriminado de agrotóxico; melhorias no uso
do solo e da água baseados em princípios ecológicos
de preservação do meio ambiente e por fim tecnologias
adequadas e mais acessíveis à pequena produção familiar. Enfim, o que se pretendia era tornar a agricultura menos dependente de insumos e equipamentos
fornecidos pela indústria que, como vimos nesse texto, se tornou excessivamente motivada pela penetração
do capitalismo no campo, aumentando, porém, a sua
eficácia. Apesar desse “sucesso”, o modelo da “modernização”5, que inspirou as políticas agrícolas desde o
final dos anos sessenta, tem sido cada vez mais criticado. Tais críticas traduzem preocupações diversas, mas
podem ser agrupadas em três conjuntos principais:
1. As críticas econômicas, com relação à queda dos
preços, o aumento dos custos dos fatores de produção e a redução do ritmo de incorporações de
inovações, a crise na geração de empregos;
2. As críticas ecológicas, uma vez que a implementação do modelo foi acompanhada de custos
ambientais particularmente elevados. A tendência
à homogeneização das práticas produtivas, à simplificação e a artificialização extrema do meio natural, se fez acompanhar da degradação dos solos
agrícolas, do comprometimento da qualidade e
quantidade dos recursos hídricos, da devastação
das florestas, do empobrecimento da diversidade
genética dos cultivares, plantas e animais, e da contaminação dos alimentos consumidos pela população (Bastos, 2002);
3. As críticas sociais, que embora sempre tenham
existido, atualmente assumem um patamar que preocupa, cada vez mais, a toda sociedade brasileira.
O processo de modernização da agricultura foi também sinônimo de exclusão social. Neste proces-
Cf. Graziano da Silva (1982). O processo de modernização da agricultura é considerado «conservador» por este autor, na
medida em que ele manteve inalterada a estrutura de distribuição da terra no Brasil.
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so, ficou evidente a impossibilidade das cidades
e das metrópoles absorverem as populações rurais excluídas, revelando elevados índices de
êxodo rural.
Paralelamente, sobretudo depois dos anos 90 a
dependência do agricultor familiar tornou-se maior nos
mais diversos níveis do processo produtivo, visto que,
com o mercado cada vez mais dinâmico e inovador, os
mesmos tiveram que reestruturar as atividades desenvolvidas em suas propriedades, de forma a adaptarem-se as “necessidades” do mercado, passando a
adotar os pacotes tecnológicos direcionados para o setor
agrícola que na maioria das vezes não são condizentes
com as condições edafoclimáticas do Brasil e que, por
isso resultam na degradação e no desequilíbrio
ambiental.
É certo que, mesmo reconhecendo os benefícios
técnicos com a modernização da agricultura não podemos deixar de admitir que a sua utilização, mal
gerenciada, e os seus precedentes históricos, caracterizados pelo poder da oligarquia fundiária, resultam
em vários impactos que são capazes de produzir determinados efeitos negativos, tanto em relação ao meio
ambiente (desmatamento da vegetação nativa, alto índice de uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos,
salinização, perda da fertilidade do solo), como também a descaracterização do agricultor familiar, quando
sugere a transformação de suas unidades agrícolas em
empresas, transformando terra de trabalho em terra de
negócio, o que supõe um processo de subordinação
ao capital, criando uma forte dependência6, tanto técnica quanto financeira e comercial, da maior parte desses produtores.
6
3. Modernização e o meio ambiente
A atual conjuntura sócio-econômica do Brasil caracterizada pelo processo crescente de desregulação
das atividades de produção; a abertura do mercado; a
reorganização produtiva e a modernização das empresas têm sido a conjugação desencadeadora de efeitos
nefastos sobre todas as regiões brasileiras, representadas pelo desemprego, a precarização do trabalho e a
deterioração das condições e modos de vida. Isso constitui a face perversa do estilo de desenvolvimento onde
a retórica da supremacia do mercado impõe uma busca pela eficiência econômica que se sobrepõe às outras
dimensões da vida social (cultural e ambiental). Esses
efeitos, em prol de tal “desenvolvimento”, têm suas
bases alicerçadas pelo fator da modernização.
Com a modernização o capital vem adquirindo não
só a possibilidade de aumentar, mas de controlar o
ritmo e a velocidade do trabalho e da produção criando novas bases materiais, tecnológicas, novas formas
de organização, de reestrutura do processo de trabalho e criar, ao mesmo tempo, novas formas de relações
de produção. Este fato ocorre porque a dominação do
capital sobre o trabalho não se dá apenas pela propriedade dos meios de produção, mas também, e necessariamente, pelo controle do processo de produção.
Entretanto, como destacava Marx (1984), o próprio
capitalismo gera as forças necessárias para a
rearticulação da sociedade, por meio de princípios
gerais e dinâmicos, voltados para uma direção global,
marcada por um ritmo desesperado e frenético, capaz
de imprimir determinadas condições à vida moderna,
que segundo Giddens (1991), é o momento em que a
A dependência faz parte de um rol de modificações que a modernização da agricultura causou no campo operando no
sentido de tornar as unidades familiares tradicionais cada vez mais dependentes dos mecanismos estruturais do
mercado, em vários níveis: na obtenção dos seus meios de vida; na compra de insumos da produção, dos instrumentos
de trabalho e da própria terra; na venda de suas mercadorias, em grau crescente; no mercado de trabalho, tanto
fornecendo temporariamente sua força de trabalho para as grandes propriedades, como contratando eventualmente
empregados para complementar a força de trabalho familiar. Porém, falar de “dependência” nos remete a falar de
“perda de autonomia” o que é questionado, pois, se percebe que o agricultor familiar é atrelado a um sistema maior
ressaltado por suas relações necessárias com o mercado de venda de sua produção no sentido de adquirirem suprimentos,
materiais que não produzem o que leva a uma “independência relativa”, ou seja, em uma sociedade capitalista, o que
é produzido não tem valor ou significado em si mesmo, mas só quando estabelece uma relação com o mercado.
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sociedade se reorganiza em função das tendências sociais ligadas as novas visões de tempo e espaço o que
proporciona rebatimentos em todas as tessituras sociais, causadas por diversas transformações na organização da sociedade.
A década de 70 marcou o início das preocupações
com a relação entre a atividade produtiva no campo e
a preservação do meio ambiente no Brasil. Essa mesma década se destaca pelo avanço das tecnologias de
ponta que passam a ocupar cada vez mais espaço junto à agricultura e, ainda que numa dimensão menor,
também, na agricultura familiar.
Esse processo de modernização recebeu muitas críticas entre elas destaca-se a de Graziano Neto, para
quem, “a chamada modernização da agricultura não é
outra coisa, para ser mais correto, que o processo de
transformação capitalista da agricultura, que ocorre
vinculado às transformações gerais da economia brasileira recente” (1997, p. 27).
Assim, o indivíduo é fruto de sua trajetória histórica e da modernidade, através dos processos de desencaixe7 que o mercado e o Estado moderno provocaram (e provocam), “desenraizando as pessoas e fazendo-as independente de seus contextos particulares,
com que os indivíduos assumem a feição de seres abstratos e intercambiáveis” (Domingues, 2001, p. 27).
No meio rural esses efeitos da modernização não
são diferentes. A desconcentração espacial, com a crescente tecnologia aplicada a produção, a terceirização
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de atividades industriais e de serviços produtivos, é
hoje onipresente nesses espaços como conseqüência
do processo da globalização que atinge todo o mercado seja no nível da produção como no de consumo.
Esses efeitos da modernização não atingem somente o
modo e as relações de produção, provocam, também,
alterações no modo de vida de populações fundamentadas em tradições8 e no meio ambiente a qual elas se
encontram refletindo, conseqüentemente, para toda a
sociedade.
Tais transformações encontram-se inseridas no contexto geral do processo mais amplo chamado de
globalização. Um dos autores que trata a questão da
globalização e as conseqüentes modernizações implementadas em vários segmentos da sociedade é Anthony
Giddens9, especialmente em sua obra “As Conseqüências da Modernidade”, destacando que a modernização aconteceu fundamentalmente em quatro setores:
no poder administrativo, no poder militar, no capitalismo e na industrialização, estendendo seus braços
por várias dimensões, nas palavras do autor:
A experiência global da modernidade está
interligada – e influencia, sendo por ela influenciada – à penetração das instituições
modernas nos acontecimentos da vida cotidiana. Não apenas a comunidade local, mas
as características íntimas da vida pessoal e
do eu tornam-se interligadas a relações de
indefinida extensão no tempo e no espaço.
Estamos todos presos às experiências do
cotidiano, cujos resultados, em um sentido
Giddens (1991) aponta para a separação ocorrida entre tempo e espaço, dando origem à construção de uma nova
organização das relações sociais, que passam a acontecer de maneira distanciada, deslocada, do âmbito local para o
global, ao que o autor chama de desencaixe.
Em “As conseqüências da modernidade“ (1991, p. 64), Giddens comenta a diferença entre as sociedades tradicionais e
as modernas: [...] nas sociedades tradicionais, o passado é venerado e os símbolos são valorizados porque contêm e
perpetuam a experiência de gerações. A tradição é um meio de lidar com o tempo e o espaço, inserindo qualquer
atividade ou experiência particular na continuidade do passado, presente e futuro, os quais, por sua vez, são estruturados
por práticas sociais recorrentes. Para Bornheim (1987), a tradição já não é, encarada pelas ciências sociais como um
arcaísmo que se imporia aos indivíduos. Aparece, antes, como uma aprendizagem e, portanto, como uma reapropriação.
A tradição, nesse sentido, significa a capacidade de interagir e incorporar valores de um “habitus” num contexto
moderno, de maneira flexiva.
Giddens define globalização como: [...] a intensificação das relações sociais em escala mundial, que ligam localidades
distantes de tal maneira que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo a muitas milhas de distância
e vice-versa (Giddens, 1991, p. 69).
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genérico, são tão abertos quanto aqueles que
afetam a humanidade como um todo. As
experiências do cotidiano refletem o papel
da tradição – em constante mutação – e,
como também ocorre no plano global, devem ser consideradas no contexto do deslocamento e da reapropriação de especialidades, sob o impacto da invasão dos sistemas
abstratos. A tecnologia, no significado geral
da “técnica”, desempenha aqui o papel principal, tanto na forma de tecnologia material da especializada expertise social
(Giddens, 1991, p. 77).
Para o autor, dá-se um “deslocamento das relações
sociais de contextos locais de interação e sua reestruturação através de extensões indefinidas de tempoespaço” (1991, p.29), o que ele chama de desencaixe
dos sistemas sociais. Giddens mostra como a tradição
se constitui num forte meio de manutenção da coesão
social, mas não deixa de apontar as mudanças nas
tradições, que se reconfiguram para permitir o desenvolvimento de novas tecnologias.
Ainda segundo Giddens (1997), o modo mais adequado para denominar essa época seria “modernidade
reflexiva”, termo que toma emprestado de Ulrich Beck
e que caracteriza uma época “marcada pelos processos
concomitantes de globalização e da busca de contextos de ação mais tradicionais, alterando o equilíbrio
entre tradição e modernidade” (Giddens, 1997, p. 117).
O autor ressalta que a globalização tende a ser vista
como um ‘fenômeno externo’, como algo afastado dos
problemas do dia-a-dia, chegando, mesmo, a ser considerada como um outro campo de estudos. Discordando desse ponto de vista, Giddens argumenta:
A globalização é uma questão do ‘aqui’, que
afeta até os aspectos mais íntimos de nossas
vidas – ou, preferivelmente, está relacionada com elas de forma dialética. Na verdade,
o que hoje em dia chamamos de intimidade
– e sua importância nas relações pessoais –
foi criado em grande parte por influências
globalizadoras (Giddens, 1997, p.118).
A globalização é um fenômeno que traz um ar de
semelhança aos diferentes contextos sociais e apresenta, segundo Giddens (1991), dois tipos de mecanismos que provocam essa conexão entre as diferentes sociedades: as fichas simbólicas – “meios de intercâmbio que podem ser ‘circulados’ sem ter em vista
as características específicas dos indivíduos ou grupos que lidam com eles em qualquer conjuntura particular” (1991, p.30) – e os sistemas peritos – “sistemas de excelência técnica ou competência profissional que organizam grandes áreas dos ambientes material e social em que vivemos hoje” (Giddens, 1991,
p.35). Ambos os mecanismos terminam por estabelecer formas de controle e legitimação, o desencaixe de
vários segmentos da sociedade – especialmente o econômico – a expansão do sistema capitalista, a realização de toda uma série de transações que alteram a
relação tempo-espaço e o estabelecimento de novas
regras e bases para se estabelecer relações de confiança ou não.
Quando se trata da questão da modernização da
agricultura, os dois mecanismos também se fazem presentes: fichas simbólicas passam a circular sem que
estejam, necessariamente, vinculadas aos indivíduos de uma determinada comunidade; ao mesmo tempo, os sistemas peritos terminam por substituir práticas aprendidas de geração em geração, levando os
agricultores a terem de confiar em sistemas que desconhecem. Nesse aspecto Bourdieu (1979, p. 11) ressalta que:
[...] as condições econômicas determinam a
adoção de um comportamento econômico
“racional” e pretende que o homem das sociedades pré-capitalistas acabe se convertendo em homem “desenvolvido” para poder
desfrutar das vantagens econômicas de uma
economia ‘desenvolvida’”.
De toda forma, cabe ressaltar mais uma vez, Giddens
não trata do fim das tradições, mas, antes, da convivência de processos que são mais ou menos tradicionais e que reconfiguram e reordenam a ordem social,
ou seja, para o autor a tradição não se extingue totalRevista da Fapese, v.3, n.2, p. 87-100 jul./dez. 2007
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mente, porém não permanecem totalmente a ponto de
consistir o conceito de habitus10.
Essa nova ordem imposta por uma realidade
multifacetada, termina por produzir o que se tem chamado de “sociedade do risco”. O termo surgiu na obra
de Ulrich Beck, “Risk society”, para definir a mudança
paulatina de uma “sociedade da penúria”, baseada na
divisão de riquezas, para uma “sociedade do risco”,
baseada na divisão dos riscos. O risco, para Beck, está
diretamente ligado à questão da industrialização e a
necessidade de se desenvolver a confiança em “sistemas peritos”, na maior parte das vezes incompreensíveis, fazendo com que a confiança fique baseada muito
mais numa espécie de “fé” do que no conhecimento.
De acordo com Silva (2006, p. 5),
Para Beck, a modernidade acentua velhas
formas de desigualdade social à medida que
instaura novas formas de exposição ao risco. Os países pobres são exemplos
emblemáticos dessas novas desigualdades
sociais. Para essa população o processo de
industrialização, potencialmente poluidor e,
portanto, ameaçador, significa antes a possibilidade de superação de uma situação de
miséria material e o sonho de uma vida com
dignidade. Ora, entre a ameaça visível da
fome e ameaça invisível da contaminação,
tem-se pouca ou nenhuma possibilidade de
escolha. A necessidade de manutenção da
vida imediata se coloca antes de qualquer
processo conscientizador das ameaças invisíveis proliferadas pela indústria.
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Com isso Beck quer mostrar o quanto nos encontramos encurralados, quase sem opção, diante da necessidade de mergulhar nos riscos e nos medos
advindos desses riscos. Se por um lado, a confiança
se torna cada vez mais importante, por outro, a desconfiança passa a nos afligir cada vez mais, posto que
a lógica predominante é a da mudança, trazendo em
seu bojo, as inseguranças peculiares, pois na sociedade moderna há mais possibilidades de escolhas do
que na sociedade tradicional o que proporciona mais
riscos gerando o aumento das incertezas.
No trabalho de Giddens e Beck (1991), a sociedade
inserida no contexto da “modernidade reflexiva”11, está
constantemente incorporando e desincorporando tradições: “tradição é uma orientação para o passado, de
tal forma que o passado tem uma pesada influência
ou, mais precisamente, é constituído para ter uma
pesada influência para o presente” (Giddens, 1997, p.
80). A constante transformação das tradições traz consigo o risco. Beck (1999, p. 2-7), inclui entre os riscos
os “ecológicos, químicos, nucleares e genéticos, produzidos industrialmente, externalizados economicamente, individualizados juridicamente, legitimados
cientificamente e minimizados politicamente” este conjunto de riscos geraria “uma nova forma de capitalismo, uma nova forma de economia, uma nova forma de
ordem global, uma nova forma de sociedade e uma
nova forma de vida pessoal” (Idem). Giddens (1991),
por sua vez, destaca os seguintes riscos: o impacto do
desenvolvimento social moderno sobre os ecossistemas
mundiais; o desenvolvimento da pobreza em larga escala (holocausto da pobreza); as armas de destruição
maciça com suas possibilidades de violência coletiva
e a repressão dos direitos democráticos.
10 Para Bourdieu o conceito de habitus é explicado como sendo o desenvolvimento de um senso prático funcionando como uma
força conservadora no interior do indivíduo, que se expressa diante de seus “sistemas simbólicos” representativos que agem
como instrumento de conhecimento e de comunicação: “Um sistema de disposições duráveis e transferíveis que, integrando
todas as experiências passadas, funciona a cada momento como matriz de percepções, apreciações e ações, e torna possível
a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas que permitem resolver
os problemas da mesma forma e graças às correções incessantes dos resultados obtidos, dialeticamente produzidas por estes
resultados. Com efeito o habitus constitui um princípio gerador que impõe um esquema durável e, não obstante,
suficientemente flexível a ponto de possibilitar improvisações reguladas (Bourdieu, 2001, p. XLI).
11 Beck (1997, p. 19-24) distingue a modernização simples da modernização reflexiva, trazida por ele como um modelo
alternativo à sociedade de risco. A modernização reflexiva representa o ideal de uma sociedade que coloca seu modelo
organizacional e seus valores relativos à idéia de progresso em questão, fazendo emergir novos paradigmas de desenvolvimento.
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No que diz respeito aos impactos ambientais na
sociedade como uma das conseqüências do processo
de modernização, tanto Beck quanto Giddens acreditam que o homem sempre conviveu com o risco, relacionando-o a causas essencialmente naturais, no entanto, esses riscos tornam-se maiores quando se somam aos riscos provenientes da intervenção do homem sobre o meio. Assim a noção de risco está relacionada com a ação do homem sobre o meio ambiente.
Dessa forma, observa-se que o homem convive com
os riscos produzidos por ele mesmo não rompendo
com o modelo cartesiano de dominação da natureza
favorecendo a produção de riscos ecológicos que escapam cada vez mais ao seu controle.
A impossibilidade de frear o processo de modernização no que diz respeito a proteção do meio ambiente, apresentam um risco sem precedentes: o consumo
sem medida dos recursos disponíveis e a conseqüente pauperização do planeta12, criando cismas entre os
defensores da preservação e os que apostam na
tecnologia como a solução dos próprios males que origina. Giddens vai mais além e afirma:
Sempre que algo usualmente determinado
pela ‘natureza’ – seja ela o ambiente ou a
tradição – torna-se uma questão de tomada
de decisão, novos espaços éticos são abertos
e novas perplexidades políticas são criadas.
Nesses espaços, as tensões entre o diálogo e
a afirmação da certeza moral freqüentemente tornam-se intensas (1997, p. 225-226).
Os estudos de Giddens e Beck, embora não se detenha especificamente na questão do meio ambiente,
apresenta-se como fundadora de uma reflexão, ainda
que tangencial, sobre tal tema. Os autores incluem o
meio ambiente e ação desmesurada e inconseqüente
sobre ele, como um dos grandes problemas da
modernidade tardia – nos termos de Giddens – e da
sociedade do risco – conforme Beck.
4. Conclusão
Em linhas gerais, compreende-se que as populações que se desenvolvem num considerado espaço
rural possuem dinâmicas diversificadas, multidimensionais, complexas, multifacetadas em termos de produção, composição social e cultural. No entanto, assemelham-se quando se trata de constantes transformações no modo de vida como conseqüência da modernização tecnológica, que tem orientado o processo de
desenvolvimento do país e sua inserção no processo
contemporâneo de globalização econômica.
Este modelo desenvolvimentista deu-se no desenrolar da história agrária e agrícola do país, mantendo
as características do modelo evolutivo da estrutura
agrária do Brasil desde a sua colonização: a intensificação da produção para atendimento às demandas do
consumo externo, a opção pela monocultura, o apoio
político e econômico aos grandes proprietários de terras (incentivo à estrutura latifundiária) e a forma irracional da terra. Esse contexto é muito bem identificado na obra de Pádua (2002), no qual busca reconstituir
de forma crítica e abrangente a existência de uma reflexão profunda sobre o problema da destruição ambiental
no Brasil13.
De certa forma as novas tecnologias derivadas da
modernização da agricultura foram e ainda são um dos
focos principais que compõem a crise do meio ambiente devido a forma inadequada e extensiva de utilização dos recursos naturais voltada para o aumento da
12 Beck chama a esses conflitos de ‘bads’: a destruição ecológica decorrente do desenvolvimento industrial, como o buraco
na camada de ozônio, o efeito estufa e os riscos que traz a engenharia genética para plantas e seres humanos (1997, p.16).
13 Pádua registra que houve um grande número de escritores e uma quantidade considerável de material foi produzida,
com grande alcance temporal e geográfico no Brasil (cerca de 150 texto, 50 autores – discutindo de forma direta e
indireta por mais de 102 anos) as conseqüências sociais da destruição das florestas, da erosão, do esgotamento das
minas e dos desequilíbrios climáticos.
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Tecnologia e Meio Ambiente
produção e da produtividade. Essa orientação
produtivista tem sua origem na chamada Revolução
Verde sendo um modelo que conduziu a intensificação da produção alicerçada no desenvolvimento
tecnológico como estratégia para a modernização da
agricultura.
Dessa forma, as práticas da agricultura moderna,
que representam uma extrema simplificação de sistemas ecológicos complexos, em um primeiro momento
despertaram o otimismo de cientistas que acreditavam,
por exemplo, que os meios químicos e mecânicos poderiam substituir completamente os métodos da agricultura tradicional. Entretanto, essas técnicas, além
de não alcançarem completamente o seu objetivo, também provocaram efeitos secundários de degradação do
meio ambiente como conseqüência do uso indiscriminado de agrotóxico e insumos orgânicos.
Essas tecnologias inseridas na vida do agricultor
familiar deixam explícito o surgimento de “fatores de
perturbação”14 que fazem surgir novas dinâmicas sócio-econômicas que abalam consideravelmente o modo
de vida e o ambiente em que se encontram. O entendimento dessas novas dinâmicas que afetam as formas
tradicionais de vida e de produção é um recurso importante para entendermos a sociedade capitalista como
um todo.
Para Giddens (1991) o processo de modernização
vem gerando inseguranças através das transformações
sociais e sua ruptura com a estrutura tradicional o que
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nos remete a concepção do surgimento da sociedade
de riscos que segundo Beck (1999) tem início a partir
dos efeitos colaterais produzidos pela sociedade industrial. Assim, o autor distingue os riscos individuais que sempre existiram como condição natural e os
riscos globais que são aqueles que a modernidade traz
consigo provenientes da intervenção do homem sobre
o meio, ou seja, os riscos globais não mais se limitam
a lugares e grupos, mas se globalizam. Salienta-se,
portanto que, a sociedade convive com os riscos produzidos por ela mesma. Dessa forma o conceito de
sociedade de risco se justifica, nesse texto, pela transformação das ameaças da natureza em ameaças sociais, econômicas e políticas do sistema. Porém, alguns
riscos/ameaças podem permanecer invisíveis à população em virtude de mecanismos utilizados pelo poder público e suas instituições. Diante desse fato Beck
(1998) desenvolve o conceito de irresponsabilidade
organizada para identificar os meios utilizados pelos
sistemas políticos e econômicos para ocultar a origem
dos riscos, seus possíveis efeitos e evitar uma possível responsabilização pelos danos ocasionados.
Todo esse contexto nos remete a lógica irracional
do modelo de desenvolvimento que se inicia pela opção pela quantidade, cujo objetivo é crescer, faz lembrar uma história contada por Rubem Alves, em seu
livro “A gestação do futuro” (1987), quando o mesmo
chama a atenção para os perigos do crescimento como
finalidade. O autor compara o mundo a uma bolha de
sabão, que vai sendo soprado e a cada novo sopro
(crescimento) aumenta a sua fragilidade.
14 Para Antônio Cândido (2003, p. 107) o termo é empregado para definir aqueles fatores que contribuem para modificar
ou transformar antigas condições de vida material e sócio-culturalmente estabelecidas por populações de pequenos
produtores ou agricultores. Antônio Candido concebeu este termo para se referir aos fatores que causaram transformações
no modo de vida dos chamados “caipiras”, em São Paulo, surgidos pela expansão do capitalismo no campo.
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