ANAIS DO II EGEPE, p. 492-504, Londrina/PR, Novembro/2001 (ISSN 1518-4382) ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE AGLOMERADO INDUSTRIAL E EMPRESA VIRTUAL NO CONTEXTO DE UM CONSÓRCIO EXPORTADOR Gustavo Beltran de Souza (UFSCAR) Flávio Cesar F. Fernandes (UFSCAR) Resumo: As iniciativas das empresas em obterem melhores condições para atuarem e sobreviverem em seus mercados fizeram com que alguns conceitos se destacassem no contexto empresarial por apresentarem benefícios e soluções que de certa forma estão muito próximos da realidade dessas empresas, principalmente as de micro, pequeno e médio porte. Destacamos dois entre esses conceitos: Aglomerado Industrial (Industrial Cluster) e Empresa Virtual. Diante desta relevância, vamos por meio deste artigo analisar os efeitos causados pela influência dessas concentrações de empresas sobre os principais fatores tecnológicos e gerenciais que envolvem tal contexto, além de conceituar a relação da Empresa Virtual como uma estrutura cooperativa capaz de implantar e sustentar a dinâmica das alianças estratégicas estabelecidas entre as empresas de um cluster. Em especial, vamos utilizar como referência para este trabalho um Consórcio Exportador do ramo de calçados infantis localizado na cidade de Birigüi, e procurar de forma objetiva destacar os seus desafios mais importantes. 1. INTRODUÇÃO O conceito de Aglomerado Industrial, também conhecido na literatura como Industrial Cluster, se fortaleceu e cada vez mais vem merecendo destaque dentro do novo contexto de alianças estratégicas entre empresas. Para HOFFMAN & KAPLINSKY (1988), este novo padrão de relações inter-firmas é um dos três pilares que sustentam a atual era da produção industrial, definida como a Era da Sistemofatura, sendo que os outros dois foram definidos pelos autores por meio do novo processo de trabalho e as novas tecnologias de automação baseadas na eletrônica. Segundo COUTINHO & FERRAZ (1994), nos setores industriais onde o pequeno porte empresarial dificulta a exploração de novas fontes de competitividade, é cada vez mais freqüente o surgimento de formas de cooperação horizontal, seja por meio do fortalecimento de pólos regionais de produção, geradores de economias de aglomeração, seja por meio de alianças estratégicas entre empresas. Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 2 Diante da importância das relações inter-firmas como mecanismo indispensável para a sustentação deste contexto organizacional cooperativo e em especial para casos onde o Aglomerado Industrial é formado por Pequenas e Médias Empresas (PMEs) que buscam competitividade em seu ramo de negócio, este artigo tem como objetivo analisar os efeitos causados pela influência dessa concentração de empresas sobre os principais fatores tecnológicos e gerenciais que envolvem tal contexto, além de conceituar a relação da Empresa Virtual como uma estrutura cooperativa capaz de implantar e sustentar a dinâmica das alianças estratégicas estabelecidas entre as empresas de um cluster, utilizando como referência para este trabalho um Consórcio Exportador do ramo de calçados infantis localizado na cidade de Birigüi – Noroestes do Estado de São Paulo, o qual denomina-se APEMEBI, e procurar de forma objetiva destacar os seus desafios mais importantes. É importante que, num primeiro momento, sejam apresentados separadamente os conceitos e características sobre Aglomerado Industrial e Empresa Virtual encontrados na literatura, para em seguida enfatizar a relação entre estes dois termos. Com base nesta contextualização, propomos a análise do caso APEMEBI (Associação dos Exportadores de Birigüi) como sendo o grupo de empresas que forma o consórcio exportador em questão. 2. AGLOMERADO INDUSTRIAL Podemos definir um aglomerado industrial (industrial cluster) como aglomerações de empresas de um mesmo ramo que são encontradas geograficamente próximas umas das outras, mantendo suas relações através do desenvolvimento e uso de tecnologias para sistemas de produção comuns, compartilhando tecnologia, conhecimento (experiências), informação, mão-de-obra especializada, fornecedores, clientes, etc., isto é, sua principal finalidade é unir esforços para alcançar objetivos também considerados comuns. Este aglomerado de empresas possui um grande poder de inovação, tanto em aspectos tecnológicos quanto organizacionais, fato que as tornam importantes em relação a sua atuação num mercado competitivo, aumentando a produtividade e estimulando a formação de novos negócios para seus membros, podendo ter grande escala de produção sem sacrificar a flexibilidade. Dentro de um aglomerado, RABELLOTTI (1995) descreve que o processo de produção é caracterizado pela alta flexibilidade e elevada especialização. A flexibilidade é obtida através de relações “especiais” no mercado de trabalho; uso intensivo de trabalhadores e disponibilidade para se trabalhar em horas extras, permitindo rápida e fácil adaptação da mão-de-obra em ser capaz de reagir às mudanças da demanda. A especialização é devido à divisão por fases do processo de produção, permitindo uma exploração mais eficiente de diferentes economias de escala e maior capacidade de inovação do que em firmas integradas verticalmente. O relacionamento entre as empresas de um aglomerado pode ocorrer de duas formas. A primeira é o relacionamento informal, ou seja, a inexistência de uma instituição capaz de coordenar interesses comuns e que muitas vezes, pode fragmentar a influência competitiva do grupo. A segunda forma pode ser constatada em grupos de empresas que mantêm tal relacionamento dentro de mecanismos formais, organizadas em forma de associações industriais. Um aglomerado formal exige de seus membros um comportamento mais responsável e elevado nível de confiança para com o grupo, deste modo, tal formalismo proporciona maior facilidade na implantação e utilização de tecnologias de informação Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 3 capazes de interligar as empresas, ou seja, permitindo que a coordenação e a troca de informações entre os membros do aglomerado seja rápida, segura e confiável. Segundo SANTOS et al. (1994) há basicamente dois tipos de cooperação inter-firmas. A Cooperação Vertical, normalmente encontrada nos casos onde as relações ocorrem entre uma empresa e os componentes dos diferentes elos ao longo de uma cadeia produtiva e a Cooperação Horizontal, onde as relações de cooperação se dão entre empresas que produzem e oferecem produtos similares, pertencentes a um mesmo ramo de atuação, isto é, uma empresa e seus próprios concorrentes. A Cooperação Horizontal é implantada na maioria das vezes quando as empresas isoladamente apresentam dificuldades em adquirir e partilhar recursos escassos de produção, atender interna ou externamente o mercado em que atuam e, lançar e manter nova linha de produtos. Segundo AMATO NETO (1999), várias são as explicações sobre a formação e desenvolvimento dos clusters, no entanto, elas muitas vezes não explicam o porquê clusters específicos surgem em determinados locais. De acordo com PORTER (1985), o sucesso das firmas de uma determinada nação, atuando em um particular ramo da economia é determinado por uma série de fatores condicionantes. Estes fatores seriam, as condições da demanda, as indústrias de apoio relacionadas, a estratégia da firma, sua estrutura e o nível de rivalidade presente no ambiente local. Conforme COUTINHO & FERRAZ (1994), na maioria dos ramos industriais, o fator tecnológico é fundamental para explicar movimentos de reorganização da produção em duas direções relevantes. Em empresas líderes dos países de industrialização avançada, passou a predominar a prática de subcontratar outras firmas (muitas vezes de países em desenvolvimento) para a produção de determinados lotes de produtos ou apenas para a realização da fase mais intensiva em trabalho (baixo custo da mão-de-obra). Por outro lado, as empresas não-líderes internacionais utilizam mecanismos visando ampliar as capacitações tecnológicas e gerenciais para conjuntos de empresas, envolvendo iniciativas atenuadoras de suas desvantagens de escala. A aglomeração de PMEs nos pólos em torno de projetos comuns, além de proporcionar condições adequadas à elevação da eficiência produtiva e gerencial, pode também facilitar as relações tanto com fornecedores como melhorar o acesso a mercados inexplorados pelas deficiências de escala. AMATO NETO (1999) destaca que a cooperação inter-firmas pode viabilizar o atendimento de uma série de necessidades das empresas, de tal modo que seriam de difícil satisfação nos casos onde estivessem atuando isoladamente. Essas necessidades são verificadas da seguinte forma: Combinar competências e utilizar Know-how de outras empresas; Dividir o ônus de realizar pesquisas tecnológicas, compartilhando o desenvolvimento e conhecimentos adquiridos; Partilhar riscos e custos de explorar novas oportunidades, realizando experiências em conjunto; Oferecer uma linha de produtos de qualidade superior e mais diversificada; Exercer uma pressão maior no mercado, aumentando a força competitiva em benefício do cliente; Compartilhar recursos, com especial destaque aos que estão sendo sub-utilizados; Fortalecer o poder de compra; e Obter mais força para atuar nos mercados internacionais. Para que estas necessidades sejam atendidas é importante que as empresas saibam em qual tipo de aliança estratégica elas melhor se encaixam. Dentre os vários e possíveis tipos de alianças, KANTER (1990) apresenta o conceito de Alianças Multi-Organizacionais de Serviços ou Consórcios. Sua definição compreende um grupo de empresas que possuem Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 4 necessidades similares (freqüentemente empresas de um mesmo setor industrial) que se juntam para criar uma nova entidade cuja finalidade é preencher as carências do grupo. Conforme AMATO NETO (1999), no caso de um aglomerado, encontra-se um amplo escopo para a divisão de tarefas entre empresas (ação em conjunto), bem como para a especialização e para a inovação - elementos essenciais para a competição além de mercados locais. A ação em conjunto entre as empresas viabiliza a solução de problemas específicos, tais como a provisão de serviços, infra-estrutura e treinamento, não excluindo a competitividade entre seus membros. O aglomerado freqüentemente se torna repositório de habilidades específicas da indústria e com o passar do tempo, os conhecimentos se acumulam, fazendo com que as habilidades sejam repassadas de pessoa a pessoa até que estes conhecimentos se tornem comuns ao aglomerado como um todo. O termo industrial district é definido por RABELLOTTI (1993) como uma rede dinâmica de pessoas interagindo em um ramo de atividade econômica específico sob regras institucionais e comportamentais particulares, embora algumas vezes implícitas. As interações são entendidas como fluxos de mercadorias, conhecimento, informações e pessoas entre as empresas membros deste aglomerado, não representando somente uma simples troca de inputs e outputs através do mercado. Ainda para a italiana RABELLOTTI (1993), industrial district se refere a um conjunto de pequenas e médias empresas concentradas geograficamente e pertencentes a um mesmo ramo, por exemplo o de calçados. Assim consideramos que o que ela denomina industrial district, é na realidade o aglomerado industrial (industrial cluster). Outro nome usado no Brasil é Consórcio de Exportação, para o caso em que o objetivo principal do aglomerado industrial é fomentar as exportações. Alguns anos depois, RABELLOTTI (1995) diz que o mercado está organizado em uma mistura de cooperação e competição, onde preços e quantidades são definidos e trocados, bem como informações, códigos, rotinas, estratégicas, idéias e conhecimento. Desta forma, ela apresenta um modelo da literatura sobre aglomerado industrial, baseado na experiência italiana e caracterizado em quatro fatores chaves: • Aglomerações de pequenas e médias empresas espacialmente concentradas e setorialmente especializadas por ramo; • Um conjunto de ligações entre fornecedores e clientes, baseado tanto na troca de mercadorias, informações e pessoas; • Uma base cultural e social comum, ligando agentes econômicos e criando um código comportamental, algumas vezes explícito, mas freqüentemente implícito; e • Uma rede local de instituições públicas e privadas apoiando os agentes econômicos a agirem dentro do aglomerado. SCHMITZ (1995) também destaca em seu trabalho que o modelo italiano da (Terceira Itália) se tornou o principal ponto de referência para vários aglomerados industriais. Os principais componentes desse modelo são: • Concentrações geográficas e por ramo de empresas; • Predominância de pequenas e médias empresas; • Desintegração vertical (em nível empresarial); • Competição cooperativa; • Uma identidade sócio-cultural que facilita a confiança; e a • Presença de Instituições de auto-ajuda. Os modelos acima caracterizados por RABELLOTTI (1995) e SCHMITZ (1995) representam tanto aglomerados formais quanto informais, de modo que, a junção destes elementos traz vantagens competitivas para as empresas pertencentes a estes aglomerados em comparação com empresas isoladas. Tal junção ilustra o conceito de eficiência coletiva introduzido por SCHMITZ (1990), o qual foi definido como vantagens competitivas derivadas das características locais e ações em conjunto. É importante destacarmos que a 5 Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 busca por vantagens competitivas baseando-se no conceito de eficiência coletiva tem como fator decisivo a confiança entre as relações de cooperação das empresas. Muitas vezes tal confiança só é obtida quando existe um certo equilíbrio entre a cooperação e competição das empresas que se relacionam. Todos estes conceitos, definições e características apresentados até o momento, nos fazem perceber a importância das alianças estratégicas para as empresas, sejam elas megacorporações ou até mesmo, e principalmente, as pequenas e médias empresas, no sentido de se beneficiarem com o potencial de um aglomerado industrial. Certamente, cooperações formais ou informais trarão ganhos de competitividade, entretanto, cooperação no sentido de comprometimento (formalismo), conduz as empresas de um aglomerado a refletirem sobre o ato de coordenar esta aliança. É justamente com essa preocupação que o conceito de Empresa Virtual vem servir como ferramenta na busca pela coordenação destas empresas, além da utilização de recursos como as redes de computadores e as tecnologias de comunicação (Sistemas de Informação / Sistemas de Apoio à Decisão), possibilitando assim, que grupos de empresas coordenem suas atividades comuns, aumentando sua capacidade de processar informações para tratar um grande número de clientes como indivíduos, permitindo que as empresas ofereçam produtos individualizados mantendo grande volume de produção. 3. EMPRESA VIRTUAL A vantagem competitiva das empresas passa cada vez mais pelo desenvolvimento de novas estruturas organizacionais que respondam mais adequadamente às tendências e solicitações dos mercados, satisfazendo um conjunto cada vez mais exigente de requisitos. Para AZEVEDO (2000), o aparecimento de novos fatores, de âmbito externo e interno, tais como, a globalização dos mercados, o lançamento de novos produtos em escalas temporais cada vez menores e a proliferação tecnológica em áreas de grande heterogeneidade têm provocado alterações profundas nas organizações para que elas continuem competitivas. Uma conseqüência destas alterações profundas é a exploração de novas formas de organização, denominadas a partir da criação de redes de empresas e da formação de organizações virtuais e consequentemente de Empresas Virtuais. A Figura 1 apresenta a emergência de novas formas organizacionais. Novos fatores: Alterações Novas formas de Externos e Internos Profundas Organização Globalização dos mer- dos Novos produtos Redução do tempo de vida Proliferação Inovação Aumento de produtividade Potenciação das capacidades humanas Rede de empresas Organização virtual Empresa virtual ... Figura 1- A emergência de novas formas organizacionais. Fonte – AZEVEDO (2000) Conforme BREMER (1999), o avanço das tecnologias de informação e comunicação possibilitou uma redução significativa nos custos de transação, criando assim um ambiente Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 6 propício para ocorrência de cooperação entre empresas. Essas cooperações ocorrem dentro de um ambiente chamado organizações virtuais e são denominadas Empresas Virtuais. As Empresas Virtuais podem ser definidas como uma rede temporária de empresas independentes – fornecedores e clientes, até mesmo rivais - unidas pela tecnologia de informação para explorarem em conjunto um mercado e dividirem riscos e custos, além de somarem competências (BYRNE, 1993). Uma verdadeira reunião oportunista de empresas que visam um determinado objetivo comum. De acordo com AMATO NETO (1999), o conceito de Empresa Virtual pode ser entendido como uma forma de cooperação entre empresas, que através da utilização de novas tecnologias como a Internet, formam verdadeiras redes dinâmicas de cooperação. Seus principais objetivos são: impulsionar a competitividade dos parceiros desta rede e possibilitar a exploração de novas oportunidades de mercado em nível global. Segundo STRADER et al. (1998) as organizações (empresas) virtuais compreendem uma aliança de empresas independentes que podem rapidamente juntar suas competências essenciais por meio de uma infra-estrutura de informação que sofre melhorias contínuas em sua tecnologia para aproveitarem as vantagens de uma oportunidade de mercado. Em seu trabalho também são apontadas algumas desvantagens ou porque não chamarmos de dificuldades enfrentadas pelas Empresas Virtuais. As principais dificuldades giram em torno do nível de segurança, nível de negociação e coordenação do recurso humano e a necessidade de integração dos processos e dos sistemas de informação entre as parceiras. Além das definições de Empresas Virtuais, é possível identificarmos algumas características deste tipo de organização. A Figura 2 traz as características principais das Empresas Virtuais (BREMER, 1999). Competências Competências Competências Temporariedade E i i Essenciais Essenciais Cooperação baseada em competências essenciais Uma empresa com as Tecnologia de ComuCompetências nicação e Informação Essenciais Tecnologias para romper as barreiras físicas e organizacionais Principais características de Empresas Virtuais Cooperações para aten-der oportunidades espe-cíficas de negócios ti õ d Competências Confiança Essenciais Cooperações baseadas na confiança, objetivan- do agilidade e redução dos custos de Figura 2 – Características principais das empresas virtuais Fonte – BREMER (1999) 7 Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 AZEVEDO (2000) também descreve algumas características principais das Empresas Virtuais: Autonomia, Dispersão Física da empresas, Configuração Dinâmica (aliança temporária), Adaptabilidade às mudanças do mercado e Redes de Informação propiciadas pelos avanços da Tecnologia de Informação e Comunicação. Para STRADER et al. (1998) as empresas virtuais seguem quatro fases distintas durante seu ciclo de vida, as quais estão bastante inteligíveis na Figura 3. Os principais processos na fase de formação incluem a identificação, avaliação e seleção dos parceiros e a própria formação da parceria. Identificação Identif. da Oportunidade Formação Identificação dos Parceiros Seleção dos Parceiros Seleção da Oportunidade Operação Término Projeto Término da Operação Marketing Adim. Financeira Produção Formação da Parceria Distribuição Dispersão da Organização Infra-estrutura de Informação Figura 3 – Modelo do ciclo de vida da Organização Virtual Fonte – STRADER et al. (1998) O processo de formação da parceria envolve a formação das empresas selecionadas em organização virtual. A fase de operação geralmente envolve cinco processos principais de decisão incluindo projeto, marketing, finanças, produção e distribuição. Cada um dos processos de decisão conta com a entrada e a saída de outros processos de decisão. Segundo STRADER et al. (1998) isto faz com que esta fase seja a mais difícil de gerenciar. A fase de operação termina uma vez que a oportunidade de mercado tenha passado. Por fim, a fase de término inclui o processo de término da operação e o processo de dispersão da organização virtual. Tendo completado esta fase as empresas estão livres para buscarem outras oportunidades e formarem outras parcerias. É importante observarmos que todas as fases são suportadas por uma infra-estrutura de informação capaz de realizar todos os processos do ciclo de vida das organizações virtuais. 4. RELAÇÃO ENTRE AGLOMERADO INDUSTRIAL E EMPRESA VIRTUAL As pequenas e médias empresas (PMEs) se confrontam com a necessidade de formarem cooperações para suprirem as suas deficiências em termos de recursos e conhecimento. As PMEs que formam o industrial cluster definido na introdução deste artigo Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 8 buscam esta cooperação, no entanto, a idéia de criar uma Empresa Virtual capaz de coordenar o Planejamento e Controle em um ambiente de produção distribuído e realizar a troca de informações entre os membros do cluster está de certo modo, “incoerente” com algumas características da Empresa Virtual colocadas pelos autores citados. Um exemplo disso é a característica temporária e a proximidade das entidades que formam a Empresa Virtual. Em um ambiente de produção distribuído o planejamento da produção tem um papel chave. A coordenação dos pedidos e a atribuição ótima dos recursos neste ambiente são tarefas muito difíceis. Uma das principais necessidades para a coordenação da rede é a disponibilidade da informação e os métodos para a distribuição da carga de trabalho entre as empresas. Segundo MEZGÁR et al. (2000), um certo número de propriedades que são comuns serem atribuídas às Empresas Virtuais não são mais válidas quando transferidas para o modelo de organização responsável pelo planejamento de redes de PMEs; devem ser preservadas a independência dos nós (PMEs) e a estabilidade da rede para que sejam mantidos direitos iguais sobre a definição de políticas e exploração de oportunidades de negócio em conjunto. Algumas diferenças mais significativas entre as Empresas Virtuais e a abordagem do planejamento de redes de PMEs são resumidas por MEZGÁR et al. (2000) na Tabela 1. Tabela 1 – Diferenças significantes entre as Empresas Virtuais e as redes de PMEs Fonte – MEZGÁR (2000) Características principais Empresa Virtual Rede cooperativa de PMEs Base para reação rápida Especialização funcional Flexibilidade herdada Organização do sistema Duplicação do sistema Preservação da identidade Temporária Estável Local Global Agregação Coordenação Por outro lado, é possível considerar a abordagem do planejamento de redes de PMEs como sendo um caso especial de Empresa Virtual pelo fato de tal abordagem preservar duas características fundamentais da empresa virtual que é a cooperação baseada na confiança entre os membros de uma rede e a utilização de tecnologia de informação e comunicação. Desta forma, também estamos tratando de um caso especial de Empresa Virtual para o Consórcio de Exportação APEMEBI, onde, a cooperação entre as empresas de calçados que formam esta rede, além da confiança e da tecnologia empregadas, também é estável, ou seja, permanece no longo prazo para garantir seu objetivo comum que é fomentar as exportações. Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 9 5. ANÁLISE DO CASO APEMEBI Segundo informações do Sindicato das Indústrias do Calçado e Vestuário de Birigüi, hoje são produzidos mais de 129 mil pares diários no ano de 1999 por cerca de 150 empresas, sendo que deste total de pares, 90% são calçados infanto-juvenis. Por ter a maior produção de calçado infantil do País, superando grandes centros como Novo Hamburgo (Rio Grande do Sul), Nova Serrana (Minas Gerais), Franca e Jaú (São Paulo), a cidade de Birigüi é conhecida como a Capital Sul Americana do Calçado Infantil. Quanto aos benefícios proporcionados à área social, devemos destacar a importância do papel realizado pelas indústrias de Birigüi na região. Segundo dados do Sindicato das Indústrias de Calçado e Vestuário de Birigüi, atualmente as indústrias de calçados são responsáveis por cerca de 11 mil empregos diretos, sendo que a maioria das vagas são ocupadas por mulheres e adolescentes. São gerados mais de mil empregos indiretos, que são distribuídos entre as fábricas de sola, cartonagens, fábricas de facas industriais, comércio de componentes, representações, enfim, toda a cadeia calçadista. Podemos considerar, de modo geral, que as indústrias de calçados da região de Birigüi formam um grande aglomerado industrial, levando em conta a proximidade entre as fábricas e em virtude da especialização na produção de calçados infantis. No entanto, podemos tratar algumas partes deste aglomerado mais amplo, isto é, podemos tratar e analisar aglomerados com dimensões menores e com características específicas como a organização e o relacionamento entre as empresas e a busca por objetivos comuns a todas elas. Neste contexto, vamos focar a APEMEBI (Associação dos Exportadores de Birigüi) como um Consórcio Exportador (aglomerado industrial) formado por pequenas e médias empresas de calçados infantis, cujo principal objetivo comum é fomentar as exportações de seus membros. Atualmente sete empresas formam esta associação que por meio dos incentivos de um programa desenvolvido pelo Governo Federal, conhecido como Programa Brasil Empreendedor, cujo objetivo é dar condições para que estas empresas invistam na reestruturação (organizacional e técnica) e na formação de consórcios de exportação, podendo assim, aproveitar as oportunidades oferecidas pelo mercado externo. Como conseqüência desses incentivos é possível que haja geração de novos postos de emprego e o desenvolvimento da região em que se encontram. Com base nos artigos 4o e 5o do Estatuto da agência ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio denominada APEX (Agência de Promoção de Exportações) podem ser esclarecidos vários pontos importantes que caracterizam um consórcio de exportação, a saber: a Associação que coordenará o consórcio de exportação (industrial cluster) não poderá ter fins lucrativos e deverá contribuir para a capacitação de exportação da economia da região, por meio de estímulo às atividades de capacitação profissional, aperfeiçoamento tecnológico, design e outras atividades de cunho econômico, social, educacional e de interesse geral da comunidade; realizar atividades de apoio à capacitação dos associados (melhoramento técnico, industrial, comercial, administrativo) para a exportação de seus produtos; criar ou contratar empresa comercial exportadora para realizar as exportações em nome das associadas; coordenar a implantação de adequação dos produtos às necessidades dos mercados de exportação; organizar missões empresariais, com o objetivo de buscar parcerias comerciais e técnico-industriais, assim como rodadas de negócios; utilizar meios modernos de comercialização, como o comércio eletrônico; e procurar manter o equilíbrio técnico e organizacional entre os participantes da Associação. 10 Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 A Associação em questão segue os princípios acima apresentados pela APEX e como coordenadora desse aglomerado cumpre um papel fundamental perante as associadas que é a realização das exportações. Para que isto ocorra, muito esforço deve ser desprendido no sentido de se desenvolver e implantar na própria Associação um sistema de informação (Sistema de Planejamento e Controle da Produção - SPCP) capaz de integrar e coordenar suas associadas, proporcionando rapidez e segurança na troca de dados e garantindo maior flexibilidade no gerenciamento de operações como a alocação de grandes pedidos às empresas participantes, além de possibilitar a manutenção e até mesmo o incremento do nível de confiança entre o grupo. Este sistema de PCP é na realidade a essência para a formação de uma Empresa Virtual. A Figura 4 consiste no modelo de integração desse aglomerado industrial, envolvendo o Sistema de PCP da coordenadora e os sistemas de PCP das associadas. Mercado externo (pedidos) Coordenadora Associação Sistema de PCP PCP EMPRESA PCP EMPRESA PCP EMPRESA PCP EMPRESA Pedidos Pedidos Pedidos Pedidos Figura 4 – Modelo inicial de Integração dos Sistemas de PCP do cluster APEMEBI O papel principal da integração entre os sistemas de PCP (coordenadora e associadas) é justamente possibilitar a coordenação, a divisão e a alocação dos pedidos de produção do mercado externo às associadas, garantindo assim, a variedade dos produtos disponibilizados por elas e ao mesmo tempo a obtenção do volume de produção esperado pelo cliente. Tendo uma idéia inicial da definição e das características desse aglomerado industrial fica fácil entendermos quais são os fatores gerenciais e tecnológicos que estão ligados à integração dos Sistemas de PCP e que são fundamentais para a prosperidade deste consórcio exportador. Sendo assim, a caracterização dos fatores gerenciais diz respeito à coordenação e ao controle dos recursos produtivos (capacidade produtiva) que cada empresa do aglomerado disponibiliza para a produção, de modo que, estes recursos produtivos possam ser efetivamente (ou seja eficazmente e eficientemente) utilizados no atendimento dos pedidos do mercado externo. A coordenação (divisão e alocação dos pedidos externos de produção) deve assegurar e atualizar constantemente as informações em uma base de dados própria, considerando o processo de produção distribuído, a capacidade e desempenho de cada Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 11 associada, as políticas de distribuição da carga de trabalho e levar em conta as necessidades e restrições colocadas por cada associada (critérios de alocação). Estes critérios são fundamentais para a tomada de decisão que envolve a alocação das operações produtivas referentes aos pedidos externos. Assim, conforme Billings & Sturm (1996) apud AZEVEDO (2000) , Frederix (1996) apud AZEVEDO (2000) e Azevedo & Toscano (1999) apud AZEVEDO (2000) foram identificados os seguintes requisitos fundamentais para os sistemas de informação voltados às atividades relacionadas com a produção e implantados sobe o conceito de Empresa Virtual: Suporte à cooperação e à coordenação em uma escala mundial (distribuição), Mecanismos eficientes de atualização, compartilhamento e distribuição de informação, Suporte à escalabilidade (o sistema de informação deve estar apto a integrar novos componentes ou novos “objetos de negócio”), Suporte à dinâmica de reconfiguração e reorganização da Empresa Virtual, Utilização de tecnologia standard e evolutiva, Arquitetura distribuída e baseada na tecnologia de objetos, Adequação a processos de negócio temporários, Adequação a diferentes modelos de informação, Suporte à tecnologia de componentes distribuídos, Adequação a um ambiente heterogêneo (com diferentes sistemas de informação e diferentes infra-estruturas tecnológicas) e Elevado nível de segurança no acesso à informação. Segundo STRADER et al. (1998), algumas tecnologias disponíveis que podem suportar a comunicação necessária para coordenar as atividades das organizações virtuais envolvem EDI, groupware, a Internet baseada em WWW e Intranets. Sendo assim, em relação à caracterização dos fatores tecnológicos, existe uma grande preocupação em adquirir uma arquitetura de hardware mais acessível às condições financeiras das empresas parceiras e na implantação de um software que atenda em especial aos requisitos específicos para a coordenação das funções do PCP no ambiente de produção distribuída da APEMEBI. 6. CONCLUSÕES Muito esforço está sendo despendido por parte das empresas que compõem essa associação no sentido de cooperarem entre si os seus recursos produtivos, para que possam atender aos pedidos de produção do mercado externos, muitas vezes maiores do que a capacidade individual de produção de suas entidades (empresas). Desta forma, a grande preocupação está na coordenação e distribuição de grandes pedidos de produção entre as empresas da associação (a Empresa Virtual), ou seja, de maneira que a associação possa coordenar efetivamente o Planejamento e Controle da Produção das empresas do industrial cluster, garantindo assim, eficiência (segurança, consistência, confiabilidade e rapidez) na troca de informações para obtenção de uma melhor postura competitiva, ou seja mais eficaz, junto ao mercado externo. Atingir constantemente o equilíbrio entre a competição e a cooperação das empresas desse aglomerado industrial é na realidade o principal desafio dessas organizações. Este equilíbrio somente será mantido com a preservação, e melhor ainda, com o incremento do nível de confiança entre os membros da associação. As considerações finais deste trabalho enfocam sobre a definição de uma arquitetura tecnológica coerente à realidade das PMEs pertencentes ao aglomerado industrial em questão. Para que isto seja possível, não podemos abrir mão dos requisitos fundamentais Anais do II EGEPE – Londrina – Paraná - 2001 12 referentes aos sistemas de informação apresentados neste trabalho, e, além disso, garantirmos que os Sistemas de PCP das empresas membros do aglomerado mantenham seus dados seguros e consistentes para que o processo de tomada de decisão da coordenadora seja confiável. Dentre os requisitos fundamentais para os sistemas de informação em ambientes de produção distribuídos e as soluções tecnológicas apresentados acima, devemos considerar para o caso do industrial cluster APEMEBI as opções que melhor atendem às necessidades e às limitações desta associação. Desta forma, em relação às soluções tecnológicas, uma simples comparação custo/benefício nos mostrará que o EDI e o groupware não são viáveis como infra-estrutura tecnológica devido ao elevado custo que ambas apresentam, já a Internet/ Intranet são vistas como um conjunto de tecnologias capazes de fornecerem mecanismos para compartilhar informação com baixo custo e desempenho satisfatório (segurança e rapidez) entre diferentes membros de uma rede. Sendo assim, para que a integração da informação seja garantida, a coordenadora e suas associadas devem manter um esquema de rede interna (Intranet), a qual possam ser disponibilizados serviços de comunicação entre elas, serviços esses comuns aos da Internet e, principalmente, que sejam garantidos a segurança na obtenção e no compartilhamento dos dados necessários para a coordenação da rede. Esta Intranet poderá estabelecer suas conexões, utilizando a tecnologia disponível das empresas de telefonia locais, por meio de linhas telefônicas dedicadas ou simplesmente o acesso discado por meio de linhas telefônicas comuns. Existem várias soluções que poderiam ser adotadas para assegurar a efetividade da integração da informação entre as empresas pertencentes à APEMEBI, no entanto, a maioria dessas soluções exige grandes investimentos financeiros que acabam impossibilitando a aquisição dessas tecnologias por parte das empresas de pequeno e médio porte. Desta forma, a solução tecnológica adotada deve estar enquadrada ao perfil das PMEs e ao mesmo tempo proporcionar resultados amplamente satisfatórios tanto no processo de tomada de decisão (coordenação da produção distribuída) quanto no estabelecimento da confiança. ________________________________ REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMATO NETO, J.; Redes de cooperação produtiva: antecedentes, panorama atual e contribuições para um política industrial, Tese de Livre Docência apresentada ao Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 1999. AZEVEDO, A. L.. A emergência da empresa virtual e os requisitos para os sistemas de informação. GESTÃO & PRODUÇÃO, Vol.7, No.3, pp. 208-225, Dezembro 2000. BREMER, C.F. Um sistema para apoio a formação de empresas virtuais baseada em recursos de chão-de-fábrica. GESTÃO & PRODUÇÃO, Vol.6, No.2, pp.79-86, Agosto 1999. BYRNE, J.A. Virtual Corporation. Business Week, February 8, 1993. 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