1^
GRUMIN
CPV
Grupo Mulher-Educação Indígena
T
Rio de Janeiro, julho de 1992
|J^ ^
"A palavra da mulher é sagrada como a terra." Cacique Aniceto Xavante
GRUMIN-EntidadedeDireitoPúblicp, sem finslucrativos, registrada sobon" 96.343-Livro A29,
no Registro Civil de Pessoas Jurídicas do Rio de janeiro, em 4/12/1987.
* Os problemas vividos
pelo povo Potiguara
devem ser tratados com a
urgência necessária. Veja
Há oito anos, um pequei.o grupo de mulheres Potiguaras vinham
o editorial "Nordeste discutindo em encontros questões que vão desde o respeito à pessoa
Brasileiro: Uma Amazônia humana à doenças da própria mulher, que muitas vezes exigem o
Destruída ". pag 2. acompanhamento da medicina que não é dos índios, e que não têm.
FORTALECENDO O ESPÍRITO
E AS BASES POTIGUARAS
Discutiam também a necessidade de um ensino mais adequado para
seus filhos, que resgate, inclusive, suas raízes culturais através do estudo
da
história e língua.
* Pela primeira vez no
Outra preocupação das mulheres é o trabalho sacrificado na busca do
Brasil uma mulher caranguejo, ostras e mariscos. Esse trabalho leva as mulheres a permanecer
indígena será candidata à um dia inteiro com lama até os Joelhos, arriscando sua saúde e muitas vezes
prefeitura. Trata-se de voltando para casa com o balaio vazio.
O trabalho no roçado também é sacrificante e os especuladores
Nancy, da nação
transformam as mulheres em mão-de-obra quase escrava, fazendo-as
Potiguara. Veja sua caminhar quilômetros a pé em busca de alimento para as crianças.
plataforma na página 2.
Muitas vezes esses duros trabalhos prejudicam o útero, desregularizando
o ciclo menstrual, transformando-o muitas vezes em quadro hemorrágico
que elas escondem no dia-a-dia.
E o fato de nos mobilizarmos em torno desta luta não significa uma
*A criação do "Centro divisão no movimento indígena, como um todo. Ao contrário, o que
de Profissionalização da buscamos é o fortalecimento da luta, ao lado dos homens, também nas
Mulher Indígena e questões centrais como a demarcação das terras, as invasões, violências e
Formação de Lideranças" mortes, enfim o cumprimento da Constituição, a paz.
Daí ter nascido o GRUMIN - Grupo Mulher-Educação Indígena,
visa trabalhar em cinco voltado para um programa de trabalho centrado na educação-escola, na
pontos básicos. Veja quais defesa da mulher e da criança, incentivando a profissionalização dos
são eles na página 3. índios para trabalharem dentro das aldeias como professores, técnicos em
agricultura, em saúde e outras áreas, permitindo assim melhor qualidade
de vida para todos. E hoje, depois de longo trabalho, enfrentando maucaratismos, mentiras, calúnias e difamações de terceiros, o GRUMIN
* Em 1993 será o Ano projeta o ls Centro de Profissionalização da Mulher Indígena e Formação
Internacional dos Povos de Lideranças com cinco programas básicos, apoiado por um Conselho de
Indígenas. Desde já os 500 mulheres Potiguara.
Até o final do ano a base da casa estará construída e os programas de
diversos grupos estão saúde, educação, trabalho artesanal e a campanha contra o alcoolismo
trabalhando no âmbito da serão iniciados no mês de setembro.
Em dezembro, o GRUMIN realizará na aldeia o I Encontro: Mulher e
ONU para garantir
Produtividade
Indígena.
conquistas concretas. Veja
Não fique de fora, participe. Mas com amor no coração, pois a palavra
matéria na página 4. da mulher é sagrada como a terra.
pag2
Grumin
nordeste brasileiro: uma amazônia destruída
A área indígena Potiguara está
situada num dos mais lindos pontos
do litoral brasileiro - fica na Baia da
Traição, estado da Paraíba. A área
está limitada pelos rios Camaratuba,
Mamanaguape, pelos municípios
de Mataraca e Rio Tinto.
É um território marcado pela
presença da Mata Atlântica, de
tabuleiro costeiro, com soloargiloso
e arenoso, de coloração escura e
relevo suavemente ondulado. Os
Potiguara ocupam uma área de
21.238 hectares distribuídos em 20
aldeias: Brejinho, Careira, Camurupim, Coqueirinhos, Cumaru,
Estiva Velha, Forte, Galego, Jacaré
de César, Lagoa do Mato, Laranjeiras, São Miguel, Tramataia,
Santa Rita, São Francisco, Silva do
Belém, Tracoeiras, Silva, Bento e
Grupiuna, contando com uma
população de cinco mil indígenas
(fonte: "Potiguara, Cultura Material"
de Anna e José Eduardo Costa).
Na época do Império, a área
totalizava 52.600 hectares e hoje a
demarcação (homologação de 82/
83) reduziu para 21 mil hectares,
deixando de fora referências culturais muito importantes para os
Potiguara como o cemitério
indígena Maripitanga, aldeias
Taepe e Prabuçu que possuem
ainda muitas famílias índias.
Por ser a região muito rica em
recursos naturais, infelizmente, muitos especuladores investiram seus
capitais, como a AGICAM por
exemplo, transformando a área
indígena
em
um
grande
desmatamento para o plantio da
monocultura da cana-de-açúcar. No
entanto, a partir da luta do Movinharam violências terríveis às
mento Indígena Potiguara, que enfamílias indígenas. E muitas dessas
controu apoio jurídico na Profamílias, amedrontadas pela ação
curadoria Geral da República da
dos colonos, fugiam inteiras para
Paraíba, através do ilustre Dr. LuRecife e Natal de lá tomando outro
ciano Mariz Maia, hoje existe uma
rumo, muitas vezes para não serem
ação de reintegração de posse amortas. Muitos índios foram assastravés do decreto nc 91.275-9.
sinados, ensacados e jogados ao
Segunde pesquisas, o Rio Camar. Fora tudo isso, o processo de
maratuba f um dos rios mais podesintegração cultural e espiritual
luídos do Nordeste. Nele, são desmotivados pelo racismo dos colopejados o vinhoto da cana-denos, fez com que muitos Potiguara
açúcar e diversos agrotóxicos. A
que saíram das aldeias tivessem
Fazenda Brasfrutas e a destilaria
vergonha de ser índio (a), inclusive
Xuá não ficam atrás nesse processo
escondendo suas origens, negando
de poluição.
por toda a vida e levando para o
Pode-se afirmar que 70% das
túmulo o medo e a vergonha.
frutas naturais foram prejudicadas
E o processo com as mulheres
na sua produtividade natural como,
fói pior porque, além de tudo, mepor exemplo, a mangava, caju, pininas de 12/13 anos eram abusadas
nha, maracanduba, pitomba, masexualmente. Centenas de abusos
racujá, dendê, ati, ubaia, aracá,
fizeram com que mulheres calaskatolé, ariticum e outras.
sem diante da sociedade, causanO desmatamento preocupa-nos
do-lhes desequilíbrio psicológico e
pois o resultado dessa prática leva
emocional para o resto de suas
a desertificação do solo. Fora isso,
vidas. Essas são as guerreiras ao assoreamento dos rios já é uma
nônimas que trazem o silêncio no
realidade. Esse fenômeno consiste
peito.
no estreitamento do Rio, devido à
Em 1993, a ONU criará o Ano
quantidade de terra que se espalha
Internacional dos Povos Indígenas.
e que cobre o leito fluvial. Os rios
São 300 milhões de índios em todo
Sinimbu - rio sagrado para os Potio mundo. Ao mesmo tempo, a 10a
guara - e o rio Estiva hoje estão
Sessão do Grupo de Trabalho sobre
prejudicados na produção do
Populações Indígenas será realizacamarão, marisco, ostra e cada de 21 a 31 de julho de 1992 e a
ranguejo. A lagoa Akajutibiró (lagoa
delegação Potiguara estará lá desagrada onde moram os ancestrais)
fendendo a especificidade brasitambém tem sofrido com o assoleira e nordestina, afinal são 40 mil
reamento.
índios no nordeste! A Declaração
Os especuladores, por outro
Universal dos Direitos Indígenas
lado, escravizavam os índios e
ficará pronta e temos esperança de
conta-nos um velho sábio potiguara
resgatar a nossa dignidade violenque seus pais e avós testemutada em 500 anos de descriminação
eleições 92
'
Pela primeira vez na História do Brasil uma mulher indígena sairá candidata á Prefeitura Municipal.
Trata-se de Nancy, uma mulher Potiguara de 45 anos, parteira e que muito vem contribuindo para o
desenvolvimento sócio-político e econômico da mulher indígena. Desde os tempos da invasão holandesa
até hoje, o Potiguara tem sido esmagado em suas terras. É chegada a hora do povo Potiguara resgatar
sua dignidade através da índia Nancy. Parabéns, Nancy. Mais uma vez as mulheres Potiguaras estão
demonstrando sua ancestralidade guerreira.
Plataforma política: limpeza das praias, assistência à saúde e à educação; resgate da cultura indígena,
turismo, ação social democratizada; apoio à agricultura e pesca através de cooperativas; criação de
creches nas aldeias e cidade.
^
Grutnin
pag3
povo potiguara por um fio: socorro!
OGRUMIN (GrupoMulher-Educação Indígena vem em nível nacional e internacional informar a
trágica situação do povo Potiguara.
São cinco mil pessoas habitando
20 aldeias no estado da Paraíba.
As mulheres e crianças são as que
mais sofrem com o estado de abandono. Diariamente morre uma
criança. O estado de pobreza em
que se encontram algumas aldeias
é motivado pela poluição dos rios
que outrora fornecia os alimentos.
As brigas internas, mortes, alcoolismo, a mendicância, o desânimo
para o trabalho e diversas enfermidades ocasionadas pela desnutrição são motivados pela falta
de perspectiva de sobrevivência e
falta de trabalho. O Chefe de posto,
o índio Marcos Antônio Santana
dos Santos, filho do falecido cacique
tradicional Potiguara, juntamente
com as fortes lideranças Potiguaras
(homens e mulheres) encontramse desesperados, num estado psicológico de muito sofrimento e angústia, pois se sentem impotentes
diante da calamitosa situação. Não
há transporte para levar os doentes
(casos graves) para o Hospital em
João Pessoa que fica há duas horas
de distância. A desesperança reina
nas terras dos nossos antigos
guerreiros ancestrais que até hoje
esperam justiça e sofrem ao ver
nossas vidas violentadas. Os Potiguaras estão rezando Tupã e não
querem continuar neste estado de
indignidade onde, apesar de tudo,
resistem.
No ano em que a Europa come-
A criação do "Centro de Profissionaiiraçs.> da Mulher Indígena e Formação de
Lideranças" visa capacitar as mulheres potiguaras na luta contra a miséria
mora os 500 Anos de Colonização
não podemos silenciar: SOCORRO.
Portodas essas razões se reuniu
no dia 12/02/92, na aldeia do Forte,
e no dia 20/04/92, na aldeia Tramataia (áreas Potiguaras), a Comissão
indígena para a criação do "Centro
de Profissionalização da Mulher
Indígena e Formação de Lideranças"quepossuicincoprogramas
básicos:
a) Cursos trimestrais de cerâmica, cestaria, tapeçaria, corte-costura, pinturas, confecções de rede
de dormir e pescar. Produção e
venda. Intercâmbio com outras nações indígenas.
b) Reciclagem dos professores
e criação de material didático.
c) Projeto de Cabra-leiteira para
famílias carentes.
d) Campanha da valorização da
identidade indígena contra o alcoolismo, estado de desesperança e
desânimo.
e) Apoio à saúde da mulher.
Apoio às mães viúvas, separadas,
solteiras e a seus filhos menores.
Diante dos obstáculos que estamos passando e a demora para a
solução dos problemas, vimos a
público solicitarapoioparaas instalações do Centro da Mulher que
está projetado para a aldeia do
Fone, Parque Indígena Potiguara,
estado da Paraíba, que formará 60
mulheres em nível local e 15 mulheres no âmbito nacional (porano),
alémde assistirá comunidade local.
19 de abril
O dia do índio na área Potiguara transcorreu com muita alegria. Houve festa em Jacaré de S.
Domingos, em Cumaru, S. Francisco e outras áreas. Infelizmente, por dificuldades financeiras, não se
pôde realizar uma festa coletiva. Lembramos que no ano passado via-se passar ônibus e mais ônibus
trazendo a turma de outras áreas. Fica aqui uma mensagem. Vamos construir de agora a unidade e o
trabalho para a preservação da cultura indígena, das tradições trazidas no Toré, que é a dança sagrada
que evoca os "cabocos" indígenas, os santos, mostra os aspectos da natureza e ressalta o valor dos trajes
ind ígenas Potiguaras (confeccionados por Fátima Potiguara), o som da flauta do seu 2é Bia e os tambores
de Tonhô.
pag4
Grumin
ano internacional dos povos indígenas
Resumo de algumas idéias e
sugestões formuladas durante a
reunião técnica realizada no Centro
de Direitos Humanos das Nações
Unidas (Genebra), de 9 a 11 de
março de 1992.
Objetivo: Ano Internacional dos
Povos Indígenas.
a) a sub-comissão deve
trabalhar para que se aprove a
Declaração Universal dos Direitos
Indígenas para 1993;
b) apoiar as artjculações de
interesses dos povos indígenas,
como o Pacto Internacional de Di-
reitos Humanos, a convenção sobre
a eliminação do racismo, a convenção sobre a eliminação de todas
as formas de descriminação contra
a mulher e a convenção sobre os
direitos das crianças, estabelecer
programas específicos para apoiar
mulheres e crianças;
c) prom -ver o desenvolvimento
econômic/ dos povos indígenas
(formação profissional em saúde,
educação, agricultura);
d) reconhecer e proteger o patrimônio cultural indígena (língua, cultura, religião, espiritualidade, educa-
ção, saúde e terra);
e) investigação sobre o suicídio,
alcoolismo, distúrbios psicológicos
entre as populações indígenas;
f) promover a criação de organização indígena;
g) garantira participação indígena no Ano Internacional dos Povos
Indígenas;
h) investigar os sistemas
jurídicos indígenas e sua relação
com outros sistemas jurídicos;
i) respeitar os direitos à terra e à
administração dos recursos
naturais.
notas notas notas notas notas notas notas notas
O líder político Potiguara,
Mancos Antônio dos Santos, filho
do tradicional cacique Potiguara,
e Elíane Potiguara participam,
em julho, da 10" sessão do Grupo
de Trabalho nas Nações Unidas
(Genebra), reunião decisiva para
a Declaração Universal dos
Direitos Indígenas para o ano
internacional dos povos
indígenas{1993).
A próxima reunião da mesa
diretora do IITC (Conselho Internacional dos Tratados índios)
está marcada para outubro,
culminando com as contestações
dos 500 Anos de Resistência
Indígena e Popular, onde mais
de cinco mil pessoas estarão
reunidas neste evento na cidade
de San Francisco (EUA).
Leonard Peltier, o líderindígena das nações Lakota e Amishinabe
está injustamente preso desde 1975, acusado de ter matado dois
agentes do FBI. Peltier, que é um forte líder espiritual, cumpre sua
pena, porém solicita solidariedade à sua luta contra a discriminação
racial que sofre há tantos anos.
I
\
Está marcado para agosto o
lançamento da Pedra Fundamental do I Centro de Profissionalização da Mulher Indígena e
Formação de Líderes (futura
sede do GRUMIN), na aldeia do
Forte, área indígena Potiguara,
com almoço de confraternização,
festa e toré. Solicitamos apoio e
solidariedade.
Nancy é candidata a prefeita
da Baía da Traição
Marina Souza, índia Guarani
e conselheira do GRUMIN,
participa durante todo o mês de
julho do Encontro de Mulheres
Trabalhadoras no México, a
convite do Movimento do Graal.
Wilma Maria dos Santos, vice-presidente do GRUMIN e índia Potiguara, viaja a Bolívia
para participar do encontro da
Liga Internacional de Mulheres,
Paze Solidariedade. Parabéns,
Wilma!
O Conselho internacional
dos Tratados índios (IITC), com
status consultivo, categoria II
desde 1977, no Conselho Econômico e Social das Nações
Unidas lançou a campanha
internacional para promover Rigoberta Menchu (índia guatemalteca) a prêmio Nobel da
paz para 1992. Rigoberta é
membro da mesa diretora do
Conselho Internacional de Tratados índios e representante do
Comitê de Unidade Camponesa
(CUC)eencontra-se atualmente
exilada no México devido à sua
luta. O GRUMIN, que tambémé
membro da mesa diretora do
IITC, vem se solidarizar e pedir
adesões à campanha de
Rigoberta, reconhecendo seu
alto compromisso com as lutas
pela libertação dos povos indígenas do mundo inteiro.
Escreva-nos!
GRUMIN - Grupo Mulher-Educação Indígena
Coordenação: Eliane Potiguara (presidente) e Wilma M. dos Santos (vice).
Rua da Quitanda 185 - sala 503
CEP 20.091 - Rio de Janeiro.
Conselho do GRUMIN
Paraíba: Potiguara - Aldeia de São Francisco: Rejane Vidal, Tia Leverina, Maria Vidal, Maria de Fátima, Sônia V. Alves, Maria Nilda
faustino, Valda, Severina Faustino, Maria da Glória, Esteia Maximiniano da Conceição; Aldeia do Forte; Judith Clementino Soares,
Lindacy Soaresda Silva, Livramento Silva, Aparecida Pereira dos Santos, Inês Trindade de Souza, Maria Soares da Silva, Alma, Wilma
Santana dos Santos e Nancy; Aldeia do Forte: Joana Ferreira da Silva, Edivaldo Bento; Baía da Traição: Lauzimar Maria dos Santos
Lima, Elza Silva; >4/de/a Tramafa/a/Antonia Maria Maria da Guia dos Santos, Maria G. Carneiro dos Santos. Pernambuco: Pankaram
-AnitériaPankaram,Jacinlene F.Barbosa. Alagoas: Xucum-Kariri-AnitériaXururu-Kariri.RioGrande do Sul: Kaigang-Andila Inácio.
Paraná: Kaigang - Beriamina Luiz, Marina Andrade. Pará: Kaiapó - Tuíra Kaiapó. Kaiowá - Anaí Kaiowá.
Jornal do GRUMIN
Diretora Responsável:
Eliane Potiguara Lima dos Santos
Editor: Paulo Thiago de Mello
Apoio para esta edição: Sindicato dos Urbanitários - RJ
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