DIÁLOGO E INTERAÇÃO volume 8 (2014) - ISSN 2175-3687 http://www.faccrei.edu.br/dialogoeinteracao DESENVOLVIMENTO DO EMPREENDEDORISMO PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA SUPERAR ALGUMAS BARREIRAS *ARMINDO, Jacqueline Hartmann. (PPGEN – UTFPR-LD) [email protected] **SILVA, Flávia Maria da.(PPGEN – UTFPR-LD) [email protected] ***YOSHIMOTO, Graziele M. F. (PPGEN – UTFPR-LD) [email protected] ****OLIVEIRA, Jair de. (PPGEN – UTFPR-LD) [email protected] Resumo: Este trabalho tem como objetivo principal identificara percepção de um empreendedor sobre as práticas atuais do governo para desenvolvimento do empreendedorismo para pessoas com deficiência. Esta investigação é importante tendo em vista que o empreendedorismo representa uma alternativa que favorece a autonomia e aumento de renda das pessoas com deficiência e um auxiliador no desenvolvimento econômico e social para o Brasil. Para tanto, esta pesquisa utilizou um estudo de caso de um empreendedor deficiente auditivo, cuja empresa está estabelecida na cidade de Andirá no estado do Paraná, para identificar as percepções do empresário sobre as políticas governamentais referentes ao empreendedorismo para pessoas com deficiência. As teorias que nortearam esta pesquisa são os pressupostos de diversos autores dentre eles Dornelas, Dolabela e Lopes. Espera-se contribuir de forma significativa com informações relevantes sobre como as atuais políticas são percebidas pelos próprios deficientes. Como resultado de pesquisa, destaca-se que as políticas públicas nem sempre são percebidas pelos deficientes, e que o espírito empreendedor, faz com que o sujeito rejeite benefícios garantidos por lei, em busca de autonomia e realização. Palavras-Chave: Empreendedorismo. Deficiência. Políticas Públicas. Barreiras. 1 INTRODUÇÃO A inclusão profissional de pessoas com deficiência no Brasil, ainda que tenha adquirido avanços importantes nos últimos anos, ainda institui um grande desafio, que exige aprendizagem pela prática, ação e reflexão relacionadas, sistematização de conhecimentos e * Jaqueline Hartmann Armindo, Mestranda no Mestrado Profissional em Ensino de Ciências Humanas, Sociais e da Natureza (UTFPR/LD). [email protected] **Flávia Maria da Silva, Licenciada em Letras e Inglês (UENP), Bacharel em Administração de Empresas e Administração Rural, Especialista em Recursos Humanos, Gestão de Pessoas e Competências, (UNIFIL), Mestranda em Ensino de Ciências Sociais ou da Natureza ou Humanas (PPGEN – Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus de Londrina - UTFPR-LD), Londrina/PR, [email protected] *** Graziele Maria Freire Yoshimoto, Mestranda no Mestrado Profissional em Ensino de Ciências Humanas, Sociais e da Natureza (UTFPR/LD). Professora no Centro Universitário Filadélfia (UNIFIL). [email protected] ****Jair de Oliveira - Doutor em Engenharia (Engenharia de Produção) pela Universidade de São Paulo (2010). Docente do Programa de Mestrado Profissional em Ciências Sociais, Humanas e da Natureza da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – Campus Londrina. [email protected] 2 entendimento de diversos fatores sociais. Cabe ao Estado, entre outras imputações, fazer cumprir a legislação, promover políticas direcionadas à geração de emprego e renda, gerar condições de infra estrutura para a acessibilidade em diversos domínios, originando satisfatórias condições de trabalho, bem como, requerer oportunidade de trabalho. Refletir sobre as potencialidades e as vias compensatórias para o desempenho profissional da pessoa com deficiência, de maneira qualitativa e quantitativa, assemelhar-se ainda, a ser algo bem remoto dos escopos do processo produtivo capitalista. No âmbito profissional, o empreendedorismo pode acolher, oportunizar e representar uma possibilidade de inclusão da pessoa com deficiência no mundo do trabalho (DOLABELA & TORQUATO, 2014). Desse modo, esta pesquisa discute as políticas públicas e o desenvolvimento do empreendedorismo para pessoas deficiências. Para tanto, utilizou-se uma pesquisa exploratória, com um estudo de caso de um sujeito em particular, para entender de que formas as políticas públicas são percebidas pelas pessoas com deficiências. Justifica-se a escolha do tema pela importância da inclusão social das pessoas com deficiências no contexto atual, e pela necessidade de entender quais os fatores que levam os indivíduos com alguma forma de deficiência a abrir seu próprio negócio. Espera-se com esta pesquisa, fornecer um material significativo sobre o papel do empreendedorismo no desenvolvimento da independência do indivíduo como um ser atuante na sociedade, e como sujeito ativo do desenvolvimento econômico do país. Diante desse contexto, surgiu o interesse em saber como as políticas públicas são percebidas pelas pessoas com deficiências para contribuem na superação das barreiras enfrentadas por estas. Para isso, os objetivos para essa proposta são: identificar qual a percepção de um deficiente empreendedor sobre as práticas atuais do governo para desenvolvimento do empreendedorismo para pessoas com deficiência. Para que os objetivos dessa pesquisa fossem alcançados, foram utilizados como procedimentos metodológicos a pesquisa descritiva bibliográfica, de estudo de caso e analítica. Visto que, o estudo consiste no levantamento bibliográfico sobre empreendedorismo e políticas públicas para pessoas com deficiências, além da aplicação e análise de uma entrevista feita com um empreendedor deficiente auditivo da cidade de Andirá, situada ao norte do Paraná. A seguir, serão apresentados os autores que norteiam o trabalho como Dornelas, Dolabela, e Lago Campos e Santos por exemplo, e os procedimentos metodológicos percorridos. Posteriormente, serão apresentadas a análise e a discussão dos dados obtidos, para por fim serem tecidas as considerações finais. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Esta seção apresenta os fundamentos teóricos adotados da pesquisa a fim de elucidar e responder o problema elencado. A seguir, serão apresentados tópicos com os seguintes temas: Empreendedorismo e sua evolução, Educação Empreendedora, Ensino de Empreendedorismo no Brasil, e Comportamento Empreendedor. 2.1 EMPREENDEDORISMO: EVOLUÇÃO O termo empreendedorismo, deriva do inglês entrepreneurship, esignifica “fazer coisas novas, ou desenvolver maneiras novas e diferentes de fazer as coisas.” ( DOLABELA, 1999, p. 16). Segundo o dicionário Aurélio online, significa “qualidade ou caráter do que é empreendedor. Atitude de quem, por iniciativa própria, realiza ações ou idealiza novos 3 métodos com o objetivo de desenvolver e dinamizar serviços, produtos ou quaisquer atividades de organização e administração.” Alguns registros apontam que as tarefas empreendedoras existem desde a origem do comércio entre as civilizações antigas, porém aumentaram durante os séculos XVI e XVII, como método de um conhecimento experimental, tendo como base as habilidades de cada indivíduo para corrigir falhas e soluções novas para bens e serviços. De acordo com Murphy, Liao e Welsch (2006) no século XVIII, com investimentos em especialização e desenvolvimento dos conhecimentos, as oportunidades de mercado ficaram mais visíveis, intensificando dessa forma o empreendedorismo. O conceito de empreendedorismo é muito antigo, e acredita-se que sua origem tenha acontecido junto ao surgimento da civilização. Porém, registros bibliográficos apontam que somente após o século XX seu estudo começou a ser realizado de modo sistemático e organizado, e desde esta data atrai a atenção de diversos estudiosos sobre o tema, devido aos impactos que sua ação pode acarretar. O empreendedorismo foi utilizado usando conceitos de diversas disciplinas, não apenas focando em negócios, tais como economia, psicologia, sociologia, administração e engenharia. Segundo Gimenez, Ferreira e Ramos (2008), a ação empreendedora pode gerar benefícios tanto econômicos quanto sociais para as sociedades que a promovem. Atualmente, não se deve limitar o entendimento de empreendedorismo apenas à geração de negócios e implantação de empresas, deve-se considerar as outras abordagens a que ele se sujeita como social e comportamental. Sobre a dificuldade de obter uma definição única sobre o empreendedorismo, Dolabela (1999) relata que esta variedade de definições é resultado da abordagem que cada ciência atribuiu ao empreendedorismo. Porém há duas correntes de pensamento que se destacam, sendo elas as abordagens econômicas que divulgam a inovação como elemento que desenvolve a ação empreendedora, e a abordagem comportamental que relacionam ao indivíduo qualidades como criatividade e iniciativa. Esta pesquisa considerará ainda, outra abordagem do empreendedorismo, que é a abordagem social, ou seja, o impacto que a ação empreendedora gera na sociedade. Prando (2006) observa que Schumpeter foi um dos primeiros a tratar sobre o empreendedorismo em 1934, sob a perspectiva que empreender era realizar novas coisas, ou de realizar as coisas de um jeito novo, propondo a inovação como ferramenta para o sucesso das organizações, criando o que pode ser chamada de perspectiva econômica do empreendedorismo. De acordo com a literatura, McClelland por volta dos anos 60apresentou uma abordagem voltada para o comportamento do empreendedor, elencando quais as características principais que ele deveria apresentar, tais como assumir risco, visualizar oportunidades, poder de decisão, competência e determinação, o que denomina-se a perspectiva comportamental do empreendedorismo. No entanto, Drucker propõe que o empreendedorismo não é um traço de personalidade, mas sim algo que pode ser disciplinado, ensinado e praticado de forma sistemática e as competências empreendedoras podem ser desenvolvidas, e se colocadas em ação podem oferecer mudança econômica e social. Schumpeter foi um dos primeiros a tratar do tema, definindo o empreendedorismo como a percepção e a exploração de novas oportunidades, no âmbito dos negócios, utilizando os recursos disponíveis de maneira inovadora. Entretanto, essa definição econômica do empreendedorismo veio sofrendo muitas modificações com o passar do tempo. Muitos autores da literatura que versa sobre o empreendedorismo identificam o termo com uma vertente que apresenta a pessoa empreendedora comumente ligada a resultados econômicos e financeiros, conforme consta em Souza (2010) apud Carland et al. (1984). Contudo, nota-se que o termo também aplicava-se a inúmeras outras possibilidades, que denotam responsabilidade social, desenvolvimento sustentável, inovação, criatividade, dentre outros. Dornelas (2001,) esclarece que o termo empreendedor transformou-se em uma visão mais voltada para perspectivas econômicas, conceituando que o empreendedor é aquele que organiza uma empresa e a desenvolve para obter lucro pra si mesmo. Aquele que tem 4 iniciativa, que apresenta competências para o negócio, que corre riscos de falhas podendo gerar prejuízos, ou que obtém lucro, que está preparado para as variáveis que podem ocorrer durante o percurso. O autor acrescenta ainda que a definição atualizada no século XXI conceitua o empreendedorismo como a junção de: Tomar iniciativa, organizar e reorganizar mecanismos sociais e econômicos a fim de transformar recursos e situações para proveito prático, aceitar o risco ou o fracasso. Ressaltando que empreendedor é aquela pessoa que faz uma série de junções para agregar um valor maior a determinado produto/serviço, usando de inovações ou criações. É aquela pessoa que tem diferenciais em seu comportamento de sempre querer algo novo, de experimentar coisas novas, necessidade de realizar. O empreendedorismo do século atual se define como um processo dinâmico e que agrega riqueza seja a um produto ou serviço, podendo inovar ou reformular produtos existentes inovando-os em alguns aspectos. Portanto, Dornelas (2001) descreve empreendedorismo como sendo um indivíduo que enxerga uma oportunidade no mercado e a aproveita da melhor forma, que mesmo sabendo que corre diversos riscos, não desiste. Ou seja, utiliza-se de uma oportunidade de mercado para capitalizar, criando coisas diferentes e novas para atrair o comércio e aguçar a concorrência. É necessário ter como característica empreendedora a persistência, pois muitas coisas podem dar errado, porém o empreendedor de verdade não desiste nunca, é persistente em seus objetivos sempre, independente dos riscos corridos, sendo importante a realização de planejamento detalhado para analisar os possíveis riscos, e assim não ser pego de surpresa. Ainda, buscando definições mais atuais, Morris (1998) destaca que o empreendedorismo se divide em sete criações: criação de riqueza, agregando valor a um produto/serviço novo ou já existente; criação de empresa, abrindo um negócio com ideias diferentes, pensamentos sistêmicos; criação de inovação, colocando em prática novas ideias; criação de mudança, ou seja, quebrando os paradigmas existentes e revolucionando em coisas diferentes; criação de empregos, pois um novo negócio no mercado automaticamente abre portas para contratação de colaboradores; criação de valor, modificando um produto para melhorá-lo faz com que o seu valor agregado melhore perante os consumidores e o mercado; e por fim criação de crescimento, pois empresas novas, negócios novos proporciona um maior crescimento para o país. Dolabela (1999, p. 31) conceitua empreendedorismo como: [...] fruto dos hábitos, práticas e valores das pessoas. Existem famílias mais empreendedoras do que outras, assim como cidades, regiões, países. Na verdade aprende-se a ser empreendedor pela convivência com outros empreendedores [...] o empreendedor aprende em um clima de emoção e é capaz de assimilar e experiência de terceiros. Sendo assim, o autor acima comenta que é possível aprender a ser um empreendedor, basta querer, e observar e vivenciar ao lado de um. Lago, Campos e Santos (2011) definem o empreendedorismo como o motor e o combustível da inovação. A criação e geração de riquezas de um país estão diretamente ligados a capacidade empreendedora de sua população, por isso qualquer cidadão seja, ele aluno, professor, pesquisador, desempregado, pessoa com deficiência pode em qualquer momento fazer parte deste processo de criação empreendedora e desenvolvimento do país. 2.2 EDUCAÇÃO EMPREENDEDORA Segundo Dolabela (2004), a educação empreendedora é mais conhecida como pedagogia empreendedora, esta pedagogia não foca no indivíduo e sim na comunidade como 5 um todo. No entanto, ela envolve o indivíduo, pois é ele quem desenvolve utilidades para as outras pessoas, produzindo como resultado valores muito positivos para comunidade e sociedade através das pessoas. Dolabela (2004, p. 2) analisa que a pedagogia empreendedora é um desenvolvimento para o aluno traçar seus próprios caminhos ao dizer que ela “[...] dispara um processo de criação, de criatividade, pondo em uso todo o patrimônio existencial do aluno, que é diverso, que é único. Lopes (2010) defende que o empreendedorismo não é uma aprendizagem comum, é um desenvolvimento de uma educação dinâmica para conscientização dos alunos, proporcionando uma reflexão ao redor, é utilizar de experiências vivenciadas, somar com os conhecimentos e a partir daí obter resultados satisfatórios. A pedagogia empreendedora dá um enfoque na importância da educação, da experiência e dos conhecimentos. Segundo Schirlo (2009), para obter êxito em educar pela pedagogia empreendedora é necessário refazer o planejamento de ensino voltado para esta educação, revendo também os conceitos de aprendizagem para utilizar o que melhor se adeque a este tipo de ensino. O método de ensino da pedagogia empreendedora é desenvolvido através de acontecimentos do dia a dia para se trabalhar com os alunos, que aos poucos vão se descobrindo, se auto conhecendo e identificando seus sonhos como empreendedor. Os alunos utilizarão de seus conhecimentos já vivenciados e adquiridos durante a vida, e acrescentando a criatividade, a participação para cada um desenvolver suas ferramentas para o empreendedorismo. Lopes (2012, p. 25) discorre que: Pode se perceber que a educação empreendedora pode enfocar a formação do indivíduo ou focar naquele que se interessa por uma oportunidade e que estaria numa fase anterior à criação de um negócio; pode, ainda, voltar-se para os que já estariam na fase de criação de um empreendimento e, até mesmo, para aqueles que estão em fases posteriores à criação e que estão preocupados com as estratégias para permanecer ativo ou expandir o negócio. Desse modo, a educação empreendedora tem como objetivo formar indivíduos voltados para empreendedorismo. Sendo estes pessoas que demonstrem interesse em aproveitar as oportunidades quando elas aparecem. 2.3 ENSINO DO EMPREENDEDORISMO NO BRASIL A sociedade brasileira, desde seu descobrimento até os dias atuais, tem o Estado como um papel central no progresso econômico, e na visão de Prando (2006), de certa forma isto influenciou no desenvolvimento do empreendedorismo no país, já que os sistemas governamentais existentes até então, não proporcionavam a liberdade necessária para a prática empreendedora. O que se viu, foram práticas empreendedoras por necessidade, em virtude das crises que atingiram a economia, a distribuição de renda deficitária, e poucas ações de empreendedorismo por oportunidade. De acordo com o Sebrae (2010), o empreendedorismo teve seu surgimento no Brasil no ano de 1990, devido a abertura da economia no país. Nesta época houve um número maior de produtos importados, de alta qualidade e debaixo custo, o que afetou a competitividade no país. Estes novos acontecimentos obrigaram as organizações a se adequarem a esta nova realidade,provocando uma mudança geral desde as pequenas até grandes empresas a se modernizarem para voltarem a ser competitivas no mercado. Devido a algumas iniciativas do governo, pode-se controlar a inflação, e no ano de 2000 surgiram novos lugares no mercado de trabalho, dessa forma, a cada ano que passa as pequenas e micro empresas conquistam mais espaço na economia do Brasil. E quanto mais empreendimentos vão surgindo, mais 6 empregos são gerados ao país, dando um importante salto no mercado e na economia frente aos outros países. Porém, esses empregos gerados pelas organizações formais não dão conta de atender a demanda exigida, o que faz com que surja uma nova forma de empreendedores, aqueles que autonomamente procuram abrir seu próprio negócio. Gem (2010) expõe que o Brasil vem se destacando a cada ano no ranking mundial em relação ao crescimento do empreendedorismo. E há motivos diferentes para se empreender; um por oportunidade que vem de brechas no mercado aproveitadas pelo empreendedor para abrir seu próprio negócio; e os provindos de necessidades, como a falta de renda, que acabam pondo em prática ideias que podem ou não dar certo, pois o desemprego causa desespero e resultam em buscas por outros caminhos, fazendo com que negócios sejam abertos sem muito planejamento. Mas ao mesmo tempo, o relatório do Gem mostra que o Brasil poderia investir muito mais em inovações e em tecnologias inovadoras, apontando assim uma falta de comprometimento com a cultura empreendedora. 2.4 COMPORTAMENTO EMPREENDEDOR De acordo com Shane e Venkataraman (2000), as definições de empreendedor como o indivíduo que abre um novo negócio é muito vago, há comportamentos por trás do empreendedor. Os indivíduos têm oportunidades em diferentes graus de qualidade, porém é aí que se destacam comportamentos e características dos empreendedores dos não empreendedores. Ser um proprietário de estabelecimentos, seja de pequeno ou médio porte, não necessariamente significa ser um empreendedor. É necessário ter uma noção básica sobre empreendedorismo, sabendo que não é simples ter um negócio, que para isto é indispensável fazer estudos de plano de negócios, saber que se correm riscos, e que há possibilidades de dar certo ou não. Desse modo, Birkinshaw (1997), Brown (2001),Wiklund (2001), Galunic e Rodan (1998) e Jacobson (1992) acrescentam que o comportamento empreendedor pode ser interpretado como o indivíduo que possui iniciativa para fazer e realizar as coisas; que apresenta inovação para criar, e utiliza toda criatividade para montar produtos novos; aproveitando oportunidades, identificando-as no mercado e aproveitando-as da melhor forma, ou seja, o verdadeiro empreendedor consegue observar oportunidades quando os outros não as veem. Para Dolabela (1999) o meio em que vive o indivíduo pode influenciar suas atitudes, assim, o lugar, as relações, podem influenciar diretamente as motivações de um empreendedor. Ser empreendedor não é somente ter acúmulo de conhecimento, mas como este conhecimento é utilizado nas relações com o mundo, é o que o autor chamou de sistema de relações. Segundo Vico (2001), para que no sistema produtivo sejam produzidos produtos e serviços com qualidade é necessário que haja indivíduos qualificados e capacitados, ressaltando que apenas o conhecimento não basta para o sucesso de um empreendimento, pois e preciso também o espírito empreendedor, que faz com que o conhecimento seja colocado em prática. Por outro lado, Filion (1991) defende que a pessoa criativa, que possui em sua personalidade a persistência para estabelecer e atingir objetivos, sempre analisando seu ambiente de atuação e detectando oportunidades de negócios, pode ser chamada de empreendedor. O comportamento empreendedor depende da motivação, e esta de acordo com Huitt (2003) vem do interior de cada pessoa, e é uma característica particular, que alavanca o indivíduo na realização de seus desejos, sanando suas necessidades, ultrapassando limites e enfrentando desafios e riscos. A motivação é de extrema importância para que as pessoas executem suas tarefas eficazmente, ser motivado é correr atrás do que realmente se gosta de fazer, podendo assim se descobrir um empreendedor. 7 Sobre a discussão acerca do fato de nascer empreendedor, ou se tornar empreendedor ao longo da vida, há posições controversas na literatura, visto que para Moraes ( 2000) muitos já nascem com tais características, e outros conseguem adquiri-las ao passar dos anos, com as experiências vividas, e com as necessidades enfrentadas. Para tanto, Dornelas (2001) apresenta diversas características dos empreendedores, tais como: buscam sempre melhorar a vida das pessoas; são líderes e motivam as pessoas ao seu redor; conseguem criar planos para gerenciar seus negócios; ainda que este planejamento seja apenas mental, estão sempre em busca de conhecimento; são determinados;gostam das tarefas que executam; correm os riscos de um negócio; aproveitam as oportunidades; e vêem o que a maiorias das pessoas não conseguem enxergar, as oportunidades. O autor dividiu as habilidades dos empreendedores em três categorias: técnicas, gerencias e características pessoas. Contudo, verifica-se a variedade de elementos que qualificam o perfil do empreendedor, e esta pesquisa adotará como ponto de partida as teorias de Timmons (2004), que definem que todo empreendedor segue alguns princípios comportamentais, sendo eles:a sensibilidade;a iniciativa;a visão de mercado;a capacidade de adaptar-se a novas técnicas;a flexibilidade e adaptação a novas situações; e a vontade de aprender. Não obstante, o sucesso nos empreendimentos não é apenas uma questão de personalidade, mas sim das atitudes realizadas para atingir os resultados esperados. Para ser considerado um empreendedor não é suficiente ser inteligente, é preciso estar motivado e comprometido com o propósito a empreender. 3 PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS A CONVENÇÃO DA ONU SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA - 2008 Artigo 1 Propósito - O propósito da presente Convenção é promover, proteger e assegurar o exercício pleno e eqüitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente. Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas. MUDANÇAS NO BPC – LEI N• 12.470/31 DE AGOSTO DE 2011 - A lei define que pessoa com deficiência é aquela que tem impedimentos de longo prazo (pelo menos 2 anos) de natureza física, mental, intelectual, ou sensorial. Os impedimentos podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade,em igualdade de condições com as demais pessoas. Razões para desenvolver um sistema educacional mais inclusivo. Educacional. Educar todas as crianças juntas significa que as escolas terão que desenvolver formas de ensino que respondam as diferenças individuais, beneficiando todas as crianças. Social. As escolas inclusivas podem mudar atitudes para com aqueles que de alguma forma são “diferentes”. Isso colaborará na criação de uma sociedade justa sem discriminação. Econômica. Estabelecer e manter escolas que educam todas as crianças juntas será mais barato do que criar um sistema complexo de diferentes tipos de escolas especializadas em diferentes grupos de crianças. Existe uma preocupação com a denominação correta para as pessoas com deficiências. Sabe-se que em épocas anteriores a terminologia já foi “portador de deficiência”, no entanto, ocorre que em cada momento histórico-social diferente a nomenclatura é alterada de acordo com a perspectiva da sociedade. 8 A terminologia “pessoa com deficiência” é a escolhida nos últimos anos para definir todo indivíduo que possuí um tipo de deficiência. As mudanças em relação à denominação são carregadas de valores simbólicos, que muitas vezes, são formados por preconceitos. Dessa maneira, a definição atual possibilita uma reflexão a respeito do processo de conscientização dessas pessoas sobre o poder de escolha e de assumir a situação vivida. A nova nomenclatura busca contribuir com o desenvolvimento de ações de inclusão de todas as pessoas na sociedade sejam elas com deficiência ou não. No Brasil, o termo pessoa com deficiência foi definido a partir da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência promovida pela Organização das Nações Unidas - ONU em 2007. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (2008),os motivos que levaram a escolha dessa nomenclatura procuraram apresentar esse grupo para a sociedade de maneira digna, sendo valorizadas as diferenças que existem entre os indivíduos. Um dos princípios que direcionou essa denominação foi a necessidade de identificar as diferenças para garantir os direitos sociais, políticos e econômicos propostos pelos Direitos Humanos, o que exige o desenvolvimento de oportunidades nas diferentes esferas da vida em sociedade. Sendo assim, Brasil (2008, p. 134) esclarece que: Art. 1º. O propósito da presente Convenção é o de promover, proteger e assegurar o desfrute pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por parte de todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua inerente dignidade. Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas. O primeiro artigo do documento delineado na convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com deficiências define as pessoas com deficiência, o que possibilita um debate em relação à preocupação de garantia e consolidação dos direitos humanos. De acordo com Nogueira (2008), a liberdade se apresenta como um conceito fundamental de compreender e instituir novos direitos para o grupo social em questão são ideias que procuram ultrapassar as barreiras sociais que impem a participação desses sujeitos na sociedade de maneira efetiva. Desse modo, ao pensar sobre a questão da participação social das pessoas com deficiência, principalmente, no mundo do trabalho, foram retomados conceitos que ajudam a compreender o processo de desigualdade de oportunidades que não incluem esses sujeitos nas relações econômicas de forma mais igualitária. A seguir serão tratados esses conceitos e analisados seus reflexos na vida da pessoa com deficiência. 3.1 O MUNDO DO TRABALHO PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS Para contextualizar o mundo do trabalho para pessoas com deficiência se faz necessário uma retomada sobre o assunto. Heller (2004) define que a vida do homem é a vida cotidiana, na qual são expressas suas individualidades, sentidos, capacidades intelectuais, sentimentos, ideologias. Primeiramente, destaca-se a necessidade de compreensão da importância do papel do trabalho para o indivíduo. Dejour (2004) enfatiza a essencialidade desta atividade para o ser humano, uma vez que ela contribui para a satisfação de diferentes necessidades, tais como econômicas, psicológicas e sociais. Ou seja, o trabalho é um fator essencial à vida de todo e qualquer indivíduo. Desta maneira, o trabalho é encarado como um fator de equilíbrio na vida das pessoas em geral. Para o trabalhador com deficiência a questão do trabalho não é diferente. No entanto, Aranha (2001) diz que as pessoas com deficiências por muito tempo eram tidas como fracas, sem capacidade e automaticamente eram desvalorizadas e excluídas do mercado de trabalho. Principalmente, porque o mundo capitalista pedia e pede trabalhadores cada vez 9 mais qualificados, o que piora ainda mais as desigualdades e pode ser entendido como préconceito, uma vez que as pessoas com deficiências podem desempenhar papéis tão importantes quanto uma pessoa sem deficiência ao ocupar um cargo no mercado de trabalho. Visando diminuir essas diferenças algumas garantias legais foram criadas. Após a Constituição de 1998, nos Artigos 205, 206 e 208 incisos III e IV, avanços significativos no campo dos direitos sociais foram disponibilizados para inclusão em período escolar. Além disso, outros documentos nacionais e internacionais passaram a tratar com ênfase o assunto sobre a inclusão social de pessoas com deficiências. Leis como a 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que reserva uma parte das vagas em concursos públicos para pessoas com deficiência, e a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 que determina um percentual de vagas de emprego para pessoas com deficiências nas empresas privadas com mais de 100 funcionários, constituem documentos que foram de grande importância para ampliação da contratação deste profissional. Para Barnes e Mercer (2005) as políticas que facilitam a entrada de Pessoa com Deficiência (PcD) no mercado de trabalho centram-se em programas de educação e treinamento, além de vários incentivos para os empregadores contratarem essas pessoas. Além do ganho de incentivos, McLaughli, Bell e Stringer (2004) ressaltam que a atitude de contratação das PcD pode gerar impacto nas organizações quanto ao nível de aceitação dessas pessoas, visto que diminui a distância social entre elas e os funcionários que não têm deficiência, possibilitando a quebra de julgamentos discriminatórios tradicionalmente atribuídos a esses indivíduos e fornecendo ferramentas necessárias para possibilitar o trabalho eficiente dessas pessoas, transformando deficiências em habilidades. Carvalho-Freitas (2009) ressalta benefícios apontados por gerentes com a contratação de PcD: melhoria da imagem da empresa entre clientes e funcionários, o que tem a ver com a responsabilidade socioambiental dela. Para os autores, a falha no processo de formação e qualificação profissional é o fator que dificulta a inserção de PcD no mercado de trabalho, aliada à falta de condições estruturais e funcionais das empresas para recebê-las. A força da lei que obriga as empresas a contratar pessoas com deficiências propiciou um cenário marcado pela coexistência de realidades diferentes, pois o acesso ao trabalho formal, antes reservado apenas para o trabalhador física e mentalmente "normal", também é direito das PcD. Se para as PcD ainda se apresentam todas essas dificuldades como forma de obstáculos para a sua inclusão no mercado de trabalho, o sentido atribuído ao trabalho para aqueles que conseguiram ter um emprego formal, ou não, seria diferente? Como elas próprias avaliam o sentido do trabalho em suas vidas? Quando o sentido do trabalho é atribuído, uma dimensão afetivo-emocional, que atua influenciando e transformando sua interpretação, também vem à tona. Investigar os discursos produzidos por esse público é fundamental para aproximar-se da sua subjetividade, de forma que tal compreensão seja fonte de estímulo para que políticas públicas e práticas organizacionais atendam melhor aos seus anseios e tragam novos referenciais para ampliar as possibilidades de interação no e sobre o trabalho. Para contextualizar o tema mundo do trabalho para pessoas com deficiência se faz necessário uma retomada sobre a compreensão do conceito trabalho, destacando assim, alguns estudos reflexivos que buscam analisar o contexto social atual. São reflexões que consideram a vida cotidiana relacionada ao trabalho como um conjunto de relações sociais expressadas, muitas vezes, pelas habilidades de cada indivíduo na sociedade. Karl Marx em seu livro A Ideologia Alemã, realiza uma reflexão sobre o conceito de trabalho, destacando a diferença entre os homens dos outros animais. Para esse cientista social, os homens se distinguem dos animais quando produzem seus meios de existência e, indiretamente, a sua vida material. Isso é o que atribuí sentido à vida, que nesse caso é a produção da existência humana a partir do trabalho. Essa existência humana para Marx é, portanto, condição para a construção da história. Para ele, o primeiro fato histórico é a produção dos meios de existência que buscam satisfazer as necessidades humanas, sendo que 10 os homens se renovam a cada dia gerando novas formas de relações sociais. O autor afirma que: [...] somos obrigados a começar pela constatação de um primeiro pressuposto de toda a existência humana, e, portanto, de toda a história, ou seja, o de que todos os homens devem ter condições de viver para poder ‘fazer a história’. Mas, para viver, é preciso antes de tudo beber, comer, morar, vestir-se e algumas outras coisas mais. O primeiro fato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitem satisfazer essas necessidades, a produção da própria vida material; e isso mesmo constituiu um fato histórico, uma condição fundamental de toda a história que se deve, ainda hoje como há milhares de anos, preencher dia a dia, hora a hora, simplesmente para manter os homens com vida [...] (MARX, 1998, p. 21). Desse modo, ao analisar a questão da pessoa com deficiência no mundo do trabalho é necessário considerar que os homens, independentemente das diferenças sociais, físicas e étnicas, devem ter condições de produzir sua própria existência, sendo considerados sujeitos históricos. Compreender o mundo do trabalho, nesse sentido, é avaliar como a sociedade na atualidade consegue incluir os indivíduos no processo de produção. Refletir a respeito do mundo do trabalho nos dias atuais consiste em pensar um processo produtivo que dialoga com as diferentes habilidades individuais, que são expressas a partir da vida cotidiana, pois os homens demonstram suas capacidades pelo exercício do seu trabalho. Nesse caso, o trabalho está integrado como um fator de equilíbrio que colabora com a vida em sociedade, sendo um modo privilegiado de apresentar a existência e o pensamento dos seres humanos. Assim, o trabalho não é simplesmente um veículo para a acumulação de capital, é uma possibilidade especial de inserção social. No Brasil em 2008, pensando na questão da inclusão das pessoas com deficiência, o Congresso Nacional aprovou o Decreto Legislativo nº 186, apresentando diferentes direitos para esse grupo de sujeitos. No documento divulgado pelo Congresso, o Artº 27 reconhece o direito de trabalho para essas pessoas, destacando a igualdade de oportunidade de entrar e de se manter no mundo do trabalho. De tal modo, há um debate em relação à proibição de discriminar esses indivíduos baseados em argumentos relacionados a formas de empregos e tipos de contratação. Além disso, o artigo ainda destaca, entre outros elementos, que é dever do Estado assegurar que as pessoas com deficiência possam: “1) exercer seus direitos trabalhistas e sindicais; 2) ter acesso a programas de orientação técnica e profissional; 3) adquirir oportunidades de trabalho de maneira autônoma e empreendedora.” (BRASIL, 2008). De acordo com o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE realizado em 2010, vinte e quatro por cento da população brasileira apresenta um tipo de deficiência. Considerando esse grupo de sujeitos, a pesquisa realizada por esse instituto demonstrou que quarenta por cento tinha a carteira assinada e a maioria ganhava até um salário mínimo, esses são dados que contradizem as propostas de inserção das pessoas com deficiência no mundo do trabalho. Nos estudos realizados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, desenvolvido no mesmo ano são avaliados os números de pessoas empregadas e a remuneração correspondente, destacando o tipo de deficiência e gênero, como é observado na tabela abaixo: 11 Tabela 1: Pessoas com Deficiências e Empregos- Fonte: RAIS/ MTE- 2010. Esses dados permitem compreender que em geral, o salário das pessoas com deficiência de gênero masculino não ultrapassa R$2.255,51, enquanto o feminino é de R$1.789,34. O rendimento mensal dessas pessoas está relacionado ao tipo de deficiência, o que acaba influenciando no valor recebido pelos indivíduos, definindo casos em que o salário é paralelo ao piso nacional considerado mínimo, como é a situação das pessoas com deficiência mental. Ao refletir a respeito dessas informações apresentadas sobre as pessoas com deficiência, fica claro que há um processo desigual, no que se refere ao acesso e permanência deles no mundo do trabalho. Isso dificulta as ações que fortalecem a consolidação da produção dos meios de existência, como pensou Karl Marx, impedindo também a constituição do sujeito que desenvolve, de maneira filosófica, a sua história. Desse modo, foi analisada a proposta de criação de estratégias empreendedoras como práticas que incentivam a inclusão desses indivíduos nas relações sociais, como possibilidade de solucionar alguns problemas que envolvem essa temática. 3.2 EMPREENDEDORISMO COMO INCLUSÃO SOCIAL DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA O empreendedorismo social se apresenta como estratégia que vai de acordo com as propostas de inserção social das pessoas com deficiência, pois é um modelo que procura enfrentar os obstáculos que impedem a inclusão socioeconômica dos sujeitos nas relações estabelecidas na sociedade. Santana e Molina (2014) interpretam que o empreendedorismo social adota inovações técnicas que potencializam os recursos econômicos gerando emprego, renda e direitos sociais. Para as autoras, o comportamento empreendedor deve atuar como mediador de conflitos relacionados a questão social, o que possibilita refletir sobre problemas sociais existentes na atualidade. A finalidade do empreendedorismo social é criar estratégias de inclusão que ampliam os direitos, assim poderia contribuir com a redução da desigualdade vivenciada pelas pessoas com deficiência. Para a Artemísia (2014) as atitudes empreendedoras devem gerar um valor real para as comunidades, como parte de um processo de missão social. Os empreendedores podem pensar em soluções que funcionem localmente em suas regiões, pois a proximidade e os contatos diários abrem espaços para os diálogos e estratégias inovadoras. Deve-se também, considerar que a inovação no empreendedorismo não é algo buscado como um fim, mas que ocorre porque as premissas iniciais não funcionaram como esperado, como é o caso das pessoas com deficiência que vivem, muitas vezes, à margem das relações de trabalho e consequentemente da produção econômica. As implicações das desigualdades sociais vividas pelas pessoas com deficiência no setor produtivo promovem novos modelos de arranjos sociais como desafios para enfrentar a exclusão desses sujeitos. Segundo Rosolen, Tiscoski e Comini (2014) o empreendedorismo social pode ser considerado um comportamento, que tem como objetivo gerar um valor 12 econômico e social para os indivíduos que se encontram à margem da sociedade, pois está baseado na introdução de inovações metodológicas que motivam uma transformação da sociedade. Nesse sentido, a proposta do empreendedorismo social permite refletir sobre a melhoria de condições econômicas dos indivíduos, sendo que muitos começam a ter acesso ao mundo do trabalho de maneira competitiva. Essas reflexões expõem a importância de se compreender a questão da inserção da pessoa com deficiência nas relações sociais, de maneira ampla, uma vez que há inúmeras formas de ser consolidada essa ação, uma delas é a constituição de políticas públicas. 3.3 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O DESENVOLVIMENTO EMPREENDEDORISMO RELACIONADO A PESSOAS COM DEFICIÊNCIA DO Nos dias atuais, existem políticas públicas que buscam incluir as pessoas com deficiência no mundo do trabalho. Essas políticas compreendem que esses sujeitos têm o direito de buscar uma qualidade de vida melhor, pois possuem diferentes habilidades e competências que podem ser expressas a partir do processo produtivo. São ações que não se limitam apenas na perspectiva das políticas de governo, pois as organizações privadas e não governamentais também participam desse processo. As políticas públicas voltadas à inclusão das pessoas com deficiência, principalmente no mundo do trabalho, estão centradas muitas vezes em programas de acessibilidade. A constituição dessas políticas procura ressaltar que a inserção desses indivíduos gera um impacto na sociedade em relação a diminuição das desigualdades sociais existentes. Além disso, nos últimos anos houve uma concentração em garantir os direitos a partir da criação de leis específicas para essas pessoas, como por exemplo, a Lei nº 8.213 de 1991 do governo federal, que prevê assegurar à elas o acesso e a permanência no mundo de trabalho. Para alguns cientistas sociais, essas leis têm sido benéficas, pois garantem a oportunidade de trabalho, bem como superam as situações de dependência financeira e isolamento social. No entanto, apesar do aumento de números de vagas de trabalho exclusivas para as pessoas com deficiência, falta ainda entre outros elementos, o desenvolvimento de políticas que consolidem o processo de formação inicial e continuada desses indivíduos para atuarem de maneira colaborativa nas relações de trabalho. Destarte, os autores afirmam que: Apesar do aumento da oferta de vagas como cumprimento da exigência imposta pela lei, a falta de informação sobre a potencialidade para o trabalho da pessoa com deficiência (PcD) ainda persiste, como afirmam Tanaka e Manzini (2005), aliada à crença de que ela não irá corresponder ao ritmo imposto pela produtividade no emprego. Para os autores, a falha no processo de formação e qualificação profissional é o fator que dificulta a inserção de PcD no mercado de trabalho, aliada à falta de condições estruturais e funcionais das empresas para recebê-las. A força da lei que obriga as empresas a contratar pessoas com deficiência propiciou um cenário marcado pela coexistência de realidades diferentes, pois o acesso ao trabalho formal, antes reservado apenas para o trabalhador física e mentalmente "normal", também é direito das PcD. (LIMA; TAVARES; BRITO; CAPPELLE, 2013, p. 51) A partir dos estudos realizados sobre as políticas públicas para pessoas com deficiência, há uma reflexão de que é necessária a construção de novas estratégias, pois as ações que já existem não conseguem garantir em sua totalidade o acesso aos direitos considerados fundamentais para qualquer ser humano. Na legislação brasileira, a educação é considerada um direito básico que todos os cidadãos devem ter acesso, entretanto quando se trata das pessoas com deficiências esse direito ainda está em processo de constituição. O censo do IBGE (2010) indicou que existe um grande número desses sujeitos que não completaram o Ensino Fundamental, taxa que 13 supera sessenta por cento do grupo, um percentual que muda ao analisar as regiões do país. Isso pode ser confirmado no gráfico abaixo: Gráfico 1. Percentual de Pessoas com Deficiência e Grau de Instrução – Fonte: SNPD. Ao analisar esses dados, o debate a respeito da educação empreendedora de cunho social se tornou uma aliada para pensar em estratégias que possibilitam a diminuição dos indicadores relacionados às desigualdades sociais vividas pelas pessoas com deficiência. Dessaforma, pensar em políticas públicas voltadas para o desenvolvimento do empreendedorismo especialmente para essas pessoas é algo fundamental nos dias atuais. Para Dolabela e Torquato (2014) a educação empreendedora já vem sendo utilizada em todo o mundo, e no Brasil precisa ser incorporada nas redes públicas municipais. Os autores destacam que as pessoas com deficiência podem receber cursos específicos, de acordo com suas realidades, sempre envolvendo a família em seu desenvolvimento. A educação empreendedora é compreendida por eles como uma prática que possibilita aos sujeitos o conhecimento de si e de seu espaço. Desse modo, destacam que: [...] Em cursos de empreendedorismo para deficientes, cabe um forte componente que abordaria o ego, o conceito de si, o autoconhecimento, a auto estima. Esses temas já são comuns em algumas metodologias, a exemplo da Pedagogia Empreendedora. Para aplicação abrangendo pessoas com deficiência, tais elementos seriam ainda mais importantes, com a finalidade de neutralizar a auto rejeição. (Dolabela; Torquato, 2014, p.109). Segundo os autores citados acima, as políticas públicas de empreendedorismo para as pessoas com deficiência devem privilegiar canais centrais para sua efetivação, como: 1) a sensibilização (as pessoas com deficiência devem ser estimuladas a desenvolver o seu potencial empreendedor); 2) a implementação pelos municípios (as políticas públicas para essas pessoas devem ser implementadas nas cidades); 3) a educação (a educação formal deve ser um meio para o debate sobre o empreendedorismo como forma de ver o mundo); 4) núcleos de conectividade e inteligência (o desenvolvimento de núcleos para dar assistência e oferecer instrumentos para que essas pessoas se tornem empreendedores). Nas reflexões de Dolabela e Torquato (2014), as atitudes empreendedoras devem ser incorporadas de maneira cultural, como parte integradora nas relações sociais cotidianas. Eles afirmam ainda que, esse processo precisa ser uma disseminação radicalizada pelos municípios, pois os outros elementos como saúde, segurança e crescimento econômico, ocorrerão como conseqüência. A leitura do livro de Dolabela e Torquato (2014) possibilita compreender que os municípios são responsáveis pela estruturação de políticas públicas que objetivam a educação empreendedora, assim podem ser criados núcleos de conectividade com a função de colaborar com a geração de novas ideias empreendedoras, bem como oferecer instrumentos de planejamentos e facilitar a elaboração de novos negócios para pessoas com deficiência. Esse estudo permite entender que a inclusão desses indivíduos no mundo do trabalho pode ocorrer 14 pelo empreendedorismo, de tal modo, eles participam das relações econômicas e sociais como protagonistas. 4 METODOLOGIA O tipo de pesquisa selecionada para o estudo é a descritiva bibliográfica, de estudo de caso e analítica. Para tanto, foi realizada uma consulta em material bibliográfico sobre o tema, para a contextualização do tema, para o estudo de caso foi feita uma entrevista por intermédio de uma intérprete com um empreendedor deficiente auditivo da cidade de Andirá localizada no estado do Paraná, e por fim, foi tecida a análise dos resultados obtidos na realização da entrevista. O referencial teórico foi elaborado por meio de pesquisas bibliográficas, que segundo Gil (2009) consiste em uma pesquisa elaborada em livros, artigos e sites eletrônicos. Para a entrevista, optou-se pelo método biográfico, que ao ver de Le Guillant (2006) é um método que permite ao pesquisador obter informações preciosas sobre a trajetória de vida profissional percorrida pelo entrevistado ao longo de sua vivência. Além de permitir conhecer a história do entrevistado, este método permite conhecer e identificar algumas percepções da entrevista sobre o assunto pesquisado. Sobre esta perspectiva, utilizou-se o estudo de caso como método de abordagem, pois de acordo com Coutinho e Chaves (2002, p. 223) a “característica que melhor identifica e distingue esta abordagem metodológica é o fato de se tratar de um plano de investigação que envolve o estudo intensivo e detalhado de uma entidade bem definida: o caso”. Para que se fundamente e se valide a opção pelo método de estudo de caso, empregar-se-á a definição apresentada por Wolcott (1990), apud Stake (1995, p.84), na qual o autor afirma que para que um estudo de caso se fundamente é preciso que o mesmo apresente algumas características como: a definição clara do caso e delimitação de suas fronteiras; descrição pormenorizada do contexto em que se insere; justificação da pertinência do estudo e seu objetivo; identificação e justificativa da escolha por caso único ou múltiplo; definição de qual será a unidade de análise; fundamentação dos pressupostos teóricos que vão conduzir o trabalho de campo; descrição clara de como serão colhidos os dados, de quem e quando; descrição pormenorizada da análise dos dados; e definição dos critérios que aferirão a qualidade do estudo. Conforme Yin (2001) o estudo de caso consiste em uma investigação que pretende compreender de forma abrangente, com lógica do planejamento, coletando e analisando os dados. De acordo com Gil (1995) o estudo de caso está caracterizado pela reconstrução da história do indivíduo, grupo ou comunidade. Logo, este estudo refere-se a uma pesquisa de gênero qualitativo, e assim sendo, Godoy (1995) afirma que os estudos em pesquisa qualitativa utilizam diferentes métodos entre si, possuindo conjunto de características essenciais capazes de identificar a mesma, como o ambiente natural, fonte direta de dados e o pesquisado como instrumento fundamental do caráter descritivo, o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida como preocupação do investigado, enfoque indutivo. A pesquisa qualitativa possui diferentes significados que compreendem diferentes interpretações que objetivam descrever e decodificar os componentes de um sistema complexo de significados. A entrevista conteve perguntas de caráter qualitativo, com perguntas abertas, devido ao fato do interesse da pesquisa se dar justamente por identificar a percepção do entrevistado sobre as atuais políticas públicas para pessoas com deficiência. Após a realização da entrevista, foi realizada a análise dos dados obtidos, que será discutida a seguir. 15 5 ANÁLISE E DEMONSTRAÇÃO DOS RESULTADOS Esta seção apresenta os resultados obtidos por meio da entrevista realizada com um empreender deficiente auditivo da cidade de Andirá – PR, casado e que atua no mundo do trabalho formal, por intermédio de uma intérprete, bem como a análise e discussão dos dados obtidos por meio dessa entrevista. Vale destacar, que a intérprete que realizou a entrevista com o empreendedor é esposa do mesmo, devendo-se considerar as interferências nos resultados, que podem ter levado em consideração a opinião da intérprete, visto que a entrevista foi feita em Língua de Sinais – Libras, e as respostas repassadas à entrevistadora pela fala da esposa, o que representa uma limitação para estudo. A entrevista foi realizada no dia quinze de junho do ano de dois mil e quatorze, e como mencionado, utilizou-se de uma intérprete, a esposa do entrevistado, atualmente costureira de roupas sacras. Ambos são casados há 50 anos, e ela aprendeu língua de sinais antes de conhecê-lo. De acordo com Quadros (2004), LIBRAS é a Língua Brasileira de Sinais, e é articulada pelas mãos, expressões faciais e pelo corpo, língua comumente utilizada pela comunidade surda brasileira. A entrevista abordou seis categorias de análise, entre elas o perfil do entrevistado: com dados pessoais do mesmo; deficiência: apresentando as causas, limitações e potencialidades; empresa/produto: caracterização da atividade empreendedora; empreendedorismo e pessoa com deficiência: dificuldades e barreiras para tornar-se empreendedor; pessoa com deficiência empreendedora: características do perfil empreendedor; e por fim as considerações finais – avaliação: instruções para futuros empreendedores e considerações finais da entrevista. O empreendedor é residente domiciliar e comercial na cidade de Andirá, norte do Estado do Paraná, atualmente com 81 anos, com dois filhos, possui escolaridade de alfabetização de 2 anos realizados no Instituto Pestalozi de Curitiba, atuando há 50 anos como tapeceiro com empresa formalmente estabelecida na cidade de Andirá. No que se refere à deficiência, o entrevistado sofre de deficiência auditiva adquirida aos 2 anos de idade em virtude de sarampo, o mesmo também não fala, e tem grau de comprometimento da audição de 100%. Conforme estabelecido pela Convenção da ONU sobre os direitos das pessoas com deficiência, a definição de pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental e intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Observou-se que a deficiência em nada impede sua locomoção, pelo contrário, o empreendedor possui uma vida normal, e afirma fazer todas as coisas que uma pessoa sem deficiência faz, inclusive dirigir. Sua autonomia não é restringida, e ao ser questionado sobre a existência de alguma coisa que gostaria de fazer que a deficiência o impeça, ele afirma que gostaria que todos pudessem entendê-lo, gostaria também de ouvir música e participar de movimentos da igreja, já que é católico praticante, diz gostaria de participar de movimentos como o ECC – Encontro de Casais com Cristo, já que sempre foi a bailes, porém nunca participou ativamente dos movimentos da igreja, por falta de pessoas capacitadas para se comunicar com ele. O entrevistado possui uma empresa na cidade de Andirá no ramo de tapeçaria com nome Fantasia Tapeçaria Lemos - Reforma de Móveis e Estofados, atuando principalmente na reforma de móveis antigos, que segundo ele, é uma atividade muito valorizada nos dias atuais, pois a estrutura dos móveis comercializados hoje não é de boa qualidade como dos móveis antigos, que compensam ser reformados. Atualmente, opera sozinho na empresa, como proprietário e reformador, porém ao longo da empresa empregou mais de 20 pessoas e treinou muitas outras, não apenas na cidade de Andirá, mas em toda região no norte pioneiro. Pessoas das cidades vizinhas o procuravam 16 para ter aulas de estofamentos, sendo que estas aprendiam e acabavam abrindo suas próprias empresas em outras cidades. Ao narrar sobre a história da empresa o entrevista se emocionou ao contar que sua família tinha uma selaria na cidade de Assis – SP, sendo uma família tradicional e com posses. Por volta de 1960 as pessoas pararam de utilizar o cavalo como meio de locomoção e de trabalho, e a selaria deixou de ser um negócio atrativo. Seus irmãos, todos sem nenhuma deficiência, tinham bons empregos, estudavam fora, tinham uma vida independente, enfim, ele decidiu que teria direito as mesmas coisas que os irmãos tiveram. Foi convidado pelo Senhor Mauro Picelli, um proprietário de uma oficina de caminhões a vir para cidade de Andirá e ajudá-lo na oficina. Nesta oficina começou a costurar alguns bancos de caminhões que estavam rasgados, a trocar totalmente o couro de outros que não tinham condições de ser costurados, e assim, aprendeu sozinho o ofício de tapeceiro, sem nenhum curso, sem nenhum treinamento, sem nenhuma explicação, absolutamente sozinho. Ficou trabalhando nesta oficina por 5 anos, em seguida abriu a primeira empresa de reforma de estofados na cidade, porém foi surpreendido por um golpe financeiro aplicado pelo escritório que prestava contabilidade para a empresa. Decepcionado, resolveu ir embora para Londrina para ter acesso a atualização do curso de libras, já que a linguagem que ele utilizava era diferente da utilizada atualmente, baseada em desenhar objetos. Em Londrina, abriu uma tapeçaria chamada Carcará, porém sofreu outros golpes. Foi assaltado três vezes, na última, empregaram armas e violência, momento em que ele resolveu voltar a Andirá e recomeçar o negócio. Casou-se com a intérprete da entrevista, e afirma que ela foi a única pessoa que o apoiou, nesse momento houve uma pausa. Quando foi perguntado a ele, a intérprete/esposa respondeu “ninguém”, e ao perguntar novamente a ele, ele a apontou. Sobre o uso de planejamento no negócio, ele afirma que nunca planejou, nunca teve um sócio, sempre fez tudo sozinho, e as coisas foram dando certo e alcançando sucesso naturalmente graças à qualidade dos seus serviços, ele nunca teve o objetivo de abrir um negócio, mas sempre quis ser independente e queria poder se sustentar, nunca quis depender de sua família. Ao ser abordado sobre as dificuldades para se tornar empreendedor, o entrevistado afirma que sua deficiência não o limitou a fazer nada em sua vida, porém a intérprete teve dificuldade em explicar o que era empreendedor a ele. Sua família sempre teve boas condições financeiras, porém ele repete que nunca quis depender deles, sempre quis ganhar o próprio dinheiro, sempre quis ter dois carros, em determinado momento cita “um jipe”. Ao ser questionado se o empreendimento surgiu de uma necessidade ou oportunidade, o entrevistado acredita que surgiu das duas coisas, pois ele tinha uma necessidade pessoal de ser independente, e teve uma oportunidade ao ser convidado pelo Sr. Mauro Picelli para trabalhar na oficina, e ele aproveitou esta oportunidade. O empreendedor relata que antigamente não existiam muitos surdos trabalhando, e ele teve sorte de sempre encontrar as portas abertas. O entrevistado diz não se recordar de nenhuma situação na qual se sentiu desvalorizado, que vivenciou preconceito, ou qualquer ocasião em que sua deficiência o tenha feito se sentir em desvantagem com relação a qualquer outra pessoa, e ressalta ainda, que o trabalho o fez se sentir muito bem. As características pessoais mais importantes para a empresa foram o capricho nos acabamentos, a pontualidade na entrega dos produtos, e a longa experiência no ramo. Ao ser questionado se ele se considera uma pessoa empreendedora, novamente a interprete teve dificuldade em explicar o termo, ele disse que sim, pois ele tem vários certificados de qualidades, fazendo alusão aos certificados que a empresa ganhou em pesquisas de opinião realizadas na cidade, o que permite inferir que o entrevistado tenha entendido que empreendedor seja um empresário de sucesso, um empresário reconhecido. Ao descrever sua atuação como líder na sua empresa, o empreendedor relata quea maioria dos funcionários sempre o respeitou, porém houve empregados que o roubaram, 17 faltando com honestidade, e ele acredita que isso seja em virtude de acreditarem que a deficiência dele o torne menos “esperto” que os outros. No entanto, a maioria entraram aprendizes de tapeceiros, não sabendo nem segurar a tesoura, e ai saírem de lá abriam a própria empresa. O entrevistado cita pelo menos 6 ex-colaboradores que foram embora de Andirá e abriram suas tapeçarias, inclusive outras pessoas com deficiências. Sobre ser capacitado profissionalmente, obteve-se como resposta que 50 anos de profissão torna qualquer um capacitado, mas nunca fez curso algum, é autodidata. E que a surdez o coloca num mundo à parte, mas o trabalho é um mundo dele. O entrevistado diz trabalhar de domingo a domingo com muito prazer e satisfação. O empreendedor, apesar da idade avançada, em nenhum momento demonstrou que sua deficiência representou um motivo de empecilho para atingir seus objetivos durante sua vida profissional. Pelo simples fato de ter implantado um negócio, não poderia inferir que o entrevistado possa ser considerado um empreendedor, pois conforme observam Shane e Venkataraman (2000), é preciso que o mesmo tenha conhecimento sobre o empreendedorismo e tenha comportamentos empreendedores. No entanto, o entrevistado e a intérprete tiveram dificuldades em compreender o termo “empreendedorismo”, entendendo-o como “empresário”, ainda que na fala fossem encontradas diversas características empreendedoras, tais como “vontade de ser independente”, a “qualidade e inovação dos serviços prestados”, e a “capacidade de assumir riscos”. Assim como descreveu Huitt (2003), a motivação vem do interior de cada pessoa, e esta é uma característica presente nos empreendedores, e pode-se perceber que esta é uma constante no perfil do entrevistado, que constantemente se mostrou sorridente e feliz com a sua vida, apesar de todas as barreiras que a deficiência ocasionou em sua jornada e que foram superadas, nunca deixando que isso o atrapalhasse em nada. No que diz respeito à educação, o entrevistado teve acesso a boas escolas, e frequentou um grande instituto onde aprendeu a língua de sinais, porém sabe que nem sempre foi desta forma, ao relatar que antigamente não havia espaço de trabalho para surdos, e estes eram sempre deixados de lado em casa, sempre aguardando ajuda dos outros. Entretanto, através do espírito empreendedor, resolveu agir e abrir seu próprio empreendimento, confirmando o que foi estabelecido por Dejour (2004) sobre a importância do trabalho para o indivíduo, uma vez que ele contribui para a satisfação de diferentes necessidades, tais como econômicas, psicológicas, e sociais. O que mais chama a atenção, é que ao ser questionado sobre políticas públicas para pessoas com deficiências, o entrevistado afirma que nunca soube que teria direito a algum auxílio por ser deficiente, possivelmente por não se considerar um. Este fato permite estabelecer relações de como as atuais políticas públicas não foram, de certa forma, abrangentes a toda população com deficiência, pois o entrevistado alega só ter tomado conhecimento de alguns direitos que a lei o assegurava após sua aposentadoria por tempo de serviço, ressaltando que antes deste momento nunca tinha ouvido sobre como a lei o amparava. Algumas deficiências apresentam maior grau de comprometimento da capacidade laborativa do indivíduo, outras comprometem em menor grau, esta pesquisa apontou que a surdez não representa uma limitação, e que a pessoa portadora de deficiência auditiva pode ser tão produtiva quanto uma pessoa sem deficiência, e ainda poder participar do processo de desenvolvimento do país, como é o caso do objeto deste estudo, que criou sua própria empresa. Constatou-se também que o deficiente irá deparar com as mesmas dificuldades que as pessoas sem deficiências, como a necessidade de uma capacitação e formação necessária para o bom gerenciamento do negócio, pois como foi observado, por mais de uma vez o entrevistado sofreu com fraudes ocasionadas por seus colaboradores, com dificuldades no gerenciamento de bons fornecedores, e no estabelecimento de metas e objetivos em longo prazo. 18 CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir dos estudos realizados sobre as políticas públicas para pessoas com deficiência, há uma reflexão de que é necessária a construção de novas estratégias, pois as ações que já existem não conseguem garantir em sua totalidade o acesso aos direitos considerados fundamentais para as pessoas com deficiência, visto que muitas vezes esses indivíduos desconhecem as leis que os garantem certos benefícios, como é o caso do entrevistado dessa pesquisa. De maneira, a entrevista permitiu identificar que o empreendedorismo pode se manifestar com êxito mesmo quando não há uma formação adequada, e o caso em estudo comprovam algumas teorias de que algumas pessoas nascem com características empreendedoras, e que devido a essas características elas conseguem ser bem sucedidas no ramo do empreendedorismo. Pode-se constatar que as políticas públicas foram sendo difundidas com o passar dos anos, porém apenas recentemente se tornou mais conhecida pelas pessoas com deficiências. Ressaltando, nem sempre foi desta forma, como o entrevistado, por exemplo, que aos 80 anos alegou nunca ter tido conhecimento dos direitos que a lei lhe garantia. A pesquisa identificou que as políticas governamentais evoluíram, e muito contribuem para a melhoria da qualidade de vida das pessoas com deficiência, porém ainda há um longo caminho a ser percorrido. O estudo demonstrou que as políticas públicas não são uma condição “sine qua non” para que as pessoas com deficiência possam empreender, mas espera-se que elas possam com o passar dos anos ampliar as possibilidades, como um facilitador para o empreendedorismo como forma de autonomia das pessoas com deficiências. A pesquisa permitiu perceber que alguns tipos de deficiência, como a auditiva por exemplo, em nenhum momento representa uma barreira para o processo empreendedor.Descobriu-se que as políticas públicas ao longo dos anos não foram efetivas ao ponto de serem divulgadas aos portadores de deficiência, observe que o entrevistado não representa uma deficiente que não teve oportunidade de estudar, tanto que sua esposa e seus filhos possuem ensino superior, e ainda assim não recorreram a benefícios públicos para serem amparados, e preferiram dar continuidade ao empreendimento da família. Descobriu-se que o fator apoio da família, não é obrigatoriamente um elemento necessário para que o deficiente possa empreender, assim como qualquer outro indivíduo, o processo empreendedor pode surgir de uma vontade interior que buscar independência e autonomia financeira. Nos últimos anos houve uma concentração em garantir os direitos a partir da criação de leis específicas para essas pessoas, como por exemplo, a Lei nº 8.213 de 1991 do governo federal, que prevê assegurar o acesso e a permanência no mundo de trabalho, através de cotas de vagas para pessoas com deficiências dentro das empresas. No entanto, acredita-se que as políticas voltadas à educação empreendedora, e ao desenvolvimento do empreendedorismo, possam ser de igual valor para o desenvolvimento pessoal e econômico de pessoas com deficiência, pois as tornariam incluídas efetivamente no processo de desenvolvimento do país. As leis existentes na atualidade têm sido benéficas, pois garantem a oportunidade de trabalho, bem como superam as situações de dependência financeira e isolamento social. No entanto, apesar do aumento de números de vagas de trabalho, exclusivas para as pessoas com deficiência, falta ainda entre outros elementos, o desenvolvimento de políticas que consolidem o processo de formação inicial e continuada desses indivíduos para atuarem de maneira colaborativa nas relações de trabalho. Por fim, observa-se que o objetivo principal desse trabalho era identificar quais são as práticas atuais do governo para desenvolvimento do empreendedorismo para pessoas com deficiência, desse modo, pode-se concluir que o objetivo foi alcançado, uma vez que ao analisar a entrevista realizada com um empreendedor deficiente auditivo, percebeu-se que as 19 políticas públicas não o auxiliaram a superar as barreiras enfrentadas por ele ao longo de sua vida, até porque o entrevistado alegou não ter conhecimento dos direitos que as mesmas o asseguravam. Por outro lado, tal situação também não o impediu de ser bem sucedido em sua carreira profissional, visto que ele mesmo afirmou por diversas vezes, que sempre quis ser independente, que sempre lutou pelo sucesso de seu negócio, e que sua deficiência nunca o impediu que nada disso fosse feito com êxito. REFERÊNCIAS ALBERTON, L. Uma contribuição para a formação de auditores independentes na perspectiva comportamental. Tese de Doutorado. 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