Quarta-feira, 16 de abril de 2015 Política, terceirização e ruas rachadas A LEI DA TERCEIRIZAÇÃO não passará sem mais nem menos, como um trem da alegria empresarial e como um tanque desembestado da guerra-relâmpago que Eduardo Cunha liderava na Câmara, por ambição e talvez convicção. Parte das "ruas" ou das arquibancadas gritou "falta", e o juiz, o Congresso, ouviu. O jogo da política e mesmo o da economia por um momento parecem um tanto mais complicados. Ficou outra vez evidente que, mesmo neste momento de desarticulação ainda maior do Congresso com diversas partes da sociedade, nem sempre se enfia qualquer coisa pela goela do povo, não importa aqui e agora a qualidade dos projetos de lei em debate. Enfim, o protesto contra a terceirização não parece boa notícia para o futuro dos projetos que os economistas de Dilma 2 enviaram ao Parlamento, que nem começaram a entrar nos plenários. Esse caldo ainda vai engrossar. Um primeiro efeito notável do resmungão das ruas contra a lei da terceirização foi uma pausa para reflexão nos partidos e no Congresso. Subitamente, metade do PSDB da Câmara decidiu rever seu voto quase unânime a favor da lei, pois ouviu a voz das "redes sociais", que chegou a zunir até no ouvido do DEM. Renan Calheiros (PMDB), presidente do Senado de ótimo olfato, sentiu o cheiro de queimado, assim como outros de seus pares, que, aliás, já eram menos simpáticos ao projeto da lei de terceirização. Os tanques de Cunha, também do PMDB, atolaram de leve numa trincheira. Muito parlamentar pode repensar se vai continuar embarcado, sem mais, na caravana das vitórias do presidente da Câmara. As controvérsias sobre o horrendo projeto da maioridade penal e sobre a terceirização ofereceram até oportunidade para que os desmoralizados PT e Dilma Rousseff tivessem alguma voz ativa ou menos passiva no debate público, além de oferecer uma bandeirinha de campanha para o também acuado Lula da Silva. Decerto o petismo e o governo continuam a ser destroçados por escândalos, novos ou no forno, e pelo passivo de Dilma 1, o mais novo deles sendo o risco de que seus economistas sejam processados sob a acusação de crime contra a responsabilidade fiscal. Além do mais, o PT ora parece sem liderança até para cuidar de modo mesquinho de seus próprios interesses, vide a atitude inepta do partido no caso da tão cantada prisão de seu tesoureiro, o que ainda vai dar em besteira. No entanto, o cenário de massacre puro e simples do governo e do PT no Congresso, ainda que até venha a se provar correto, é parcial. Há muitas outras disputas cruciais no Parlamento, divisões ou rachaduras ampliadas pelas "ruas" também rachadas. O PMDB ainda não aderiu ao impeachment, como agora ameaçam fazer oficialmente PSDB, DEM, PPS, PV e Solidariedade, que temem perder o butim do desmanche do governo e serem escorraçados das ruas do "Fora, Dilma". A prioridade do PMDB ainda é assumir parte do poder que escorreu de Dilma, no que vinha sendo bem sucedido. Vinha. A reação a certos projetos de lei sugere que outros desenvolvimentos políticos são possíveis. A "sociedade" e as "ruas" são divididas. O governo é um zumbi, mas não está enterrado e pode voltar a morder, se não lhe derem um golpe fatal, o que ora começa a assombrar os tucanos.