Mutilação genital feminina continua a ser feita às escondidas na zona leste do país Fernando Peixeiro, Lusa, 30.10.2011 Bafatá, Guiné-Bissau, 30 out (Lusa) - A mutilação genital feminina, apesar de proibida, continua a fazer-se às escondidas no leste da Guiné-Bissau, assegurou à Agência Lusa o governador de Bafatá, Adriano Ferreira. Na Guiné-Bissau, o corte do clítoris das crianças é uma prática em regiões como as de Gabú e Bafatá. Em Bafatá, seis mulheres (as chamadas fanatecas) são suspeitas daquela prática e uma foi mesmo detida por alegadamente ter violado a lei, já que a mutilação genital feminina é proibida por lei desde setembro. A excisão terá sido feita a quatro crianças e as consequências do caso agitaram Bafatá, onde a Lusa falou com responsáveis locais, quer tradicionais, quer com o representante do governo. Se os primeiros alegam o desconhecimento da lei e a falta de sensibilização junto das pessoas para pedir que o caso seja arquivado e a mulher libertada, o representante do Governo não tem dúvidas: a mulher sabia muitíssimo bem que o que estava a fazer é proibido por lei. E reconhece também que a prática não foi abandonada e que a excisão continua clandestinamente. "Se dissermos que já acabou é falso", mas "a tendência é acabar", garante, porque hoje já se notam diferenças. Noutros anos, por esta altura, "todo o mundo se encontrava com um cortejo de miúdas, todas com vestes cerimoniais de excisadas, a movimentarem-se pela cidade, agora não aparece ninguém". Bafatá é uma cidade pequena a centena e meia de quilómetros de Bissau, onde o Governo ainda não chega a todas as tabancas (pequenos aglomerados), como reconhece o governador. O próprio caso denunciado na semana passada apanhou-o de surpresa, conta à Lusa no seu gabinete, numa zona recatada da cidade, onde à hora do calor apenas passam crianças vindas da escola. Neste caso, admite, houve uma Organização não-governamental (ONG) que esteve mais atenta e denunciou o caso, que agora está com a Justiça, pelo que o governo não faz mais comentários. Mas garante que a lei foi amplamente divulgada e que a mulher que foi detida "participou em todas as reuniões de esclarecimento". "E nas reuniões de todo o mundo ficou a saber qual a pena em que incorria em caso de tentar fazer frente ao que está legislado", pelo que não houve um caso de desconhecimento já que "a pessoa que praticou o ato está muito bem metida no assunto, sabe que é ilegal e praticou". Mas Adriano Ferreira diz mais. Diz que a mutilação genital feminina não é na região um caso de meia dúzia de famílias e que "tradicionalmente" todas as miúdas devem de ser excisadas. No entanto, adianta, o que era uma "coisa normal" nas regiões de Gabú e Bafatá passou a ser contestado com o surgimento de ONG que lutavam contra a prática. "Há famílias que já deram um passo e já não deixam as filhas ir, embora não se manifestem contra. A etnia Fula é a que tem tendência para abandonar a prática mais rapidamente, porque gosta de evoluir, quer aprender e é desinibida na busca de conhecimentos". Adriano Ferreira espera que o ensino e a informação levem no futuro ao abandono total da excisão, mas sabe que "não vai ser de um dia para o outro". Não tolera é a conversa da falta de divulgação da lei, que não passa de "subterfúgios e artimanhas" para tentar travar a sua aplicabilidade. Mamadu Saliu Sidibé, representante dos régulos da região de Bafatá, que minutos antes, sentado junto da sua casa à beira da estrada principal da cidade, tinha usado o argumento da falta de divulgação para explicar o caso da semana passada, estava agora também sentado ao lado do governador. Em silêncio. FP. Lusa/fim