A contribuição da Psicologia no Tratamento Clínico e Cirúrgico da Obesidade Thaís Cristina Simamoto* Thaís Silva Luiz* A obesidade mórbida é uma doença crônica metabólica que combina grandes chances de morte prematura com perspectiva de acumulação de co-morbidades influenciando negativamente na qualidade de vida dos indivíduos obesos. O número de pessoas com sobrepeso e obesidade nas nações desenvolvidas é tão alarmante que faz com que tais eventos possam ser considerados epidemias. Estudos mostram que mais de 60% dos americanos estão acima do peso e aproximadamente metade deles está com índice de massa corporal (IMC) correspondente à obesidade. No sul do Brasil cerca de 30% da população é obesa. Os conhecimentos a respeito da associação de obesidade a diversos problemas de saúde são de longa data. O aumento da obesidade no mundo tem um impacto importante na incidência global de doenças cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 2, câncer, artrite, apnéia do sono, invalidez e transtornos psicológicos A obesidade é considerada uma doença multifatorial, que envolve aspectos genéticos e hereditários, hormonais, metabólicos, nutricionais e psicológicos. Isto significa que o tratamento da obesidade deve ser feito num âmbito multi-disciplinar, garantindo que todas as esferas que exercem influência sobre a doença sejam levadas em consideração e devidamente tratadas conjuntamente. Psicologicamente falando, os portadores de obesidade convivem com uma diversidade de fatores que afetam sua estabilidade psicológica e qualidade de vida Os obesos são, freqüentemente, considerados como portadores de personalidade imatura caracterizada pelo controle rígido, desinibição, impulsividade, tendência a negar ou evitar seus problemas e compensar estresse emocional com a comida. Tendem a apresentar depressão, transtornos alimentares, ansiedade, fobia, somatização, desordens obsessivocompulsivas, distorção na imagem corporal, baixa auto-estima, ideação suicida, problemas de relacionamento familiar, conjugal ou social. Pensando a obesidade à luz da Psicanálise, entendemos que a mesma configura-se num sintoma. Um sintoma estruturado a partir da subjetividade do sujeito. Acredita-se que a doença tenha uma função no próprio equilíbrio psíquico do indivíduo, o que pode tornar ainda mais difícil seu tratamento, principalmente em termos de perda de peso. O paciente portador de obesidade simboliza tudo aquilo que odeia em si mesmo na gordura que envolve seu corpo, construindo a fantasia de que todos os seus problemas e conflitos serão resolvidos a partir do momento que conseguir se ver livre dela. Não percebe que, inconscientemente, aquela gordura pode representar uma camada protetora que o resguarda em seu contato com o outro e consigo mesmo, mantendo uma distância garantida por uma barreira literalmente física. Além disso, o ato de comer pode ser associado à uma tentativa de tamponar angústias, lidar com frustrações, ou seja, como expressão do estado emocional do indivíduo, funcionando como válvula de escape na qual ele obtém um prazer fácil e imediato e preenche um vazio interior e subjetivo através da comida. Assim, a psicologia traz consigo a tarefa de acolher e acompanhar este paciente que, como muitos, sofre tanto com o corpo quanto com a alma, levando-o a fazer associações que, na medida em que são identificadas e compreendidas, vão tornando-se mais amenas permitindo com que o indivíduo sinta-se apto a lidar consigo mesmo, em suas questões e particularidades. Além dos tratamentos clínicos convencionais da obesidade, surgem novas propostas de tratamentos como as cirurgias bariátricas. O tratamento cirúrgico da obesidade, iniciou-se no Brasil na década de 70, e desde o seu início até os dias atuais grandes progressos foram feitos. Em 2005, o conselho regional de medicina, através da ementa xxx, regulamenta a avaliação e acompanhamento psicológico aos pacientes que irão se submeter à cirurgia bariátrica. A indicação para a cirurgia exige que o paciente tenha IMC > 40, ou IMC de 35 a 40, desde que apresente comorbidades associadas. Além disso, é necessário que o paciente submeta-se a avaliações e exames médicos de diferentes especialidades, bem como, avaliação nutricional e psicológica. O tratamento cirúrgico para a obesidade ainda traz especificidades mais delicadas, como as mudanças radicais no estilo de vida. Transformações que envolvem os hábitos alimentares, mudanças na imagem corporal bem como uma mudança de postura diante da vida. Principalmente nas cirurgias mistas (Capella), a qual envolve uma restrição na capacidade gástrica, bem como uma disabsorção dos nutrientes. Estas exigem do paciente uma disciplina em relação aos seus hábitos alimentares, pois, com a restrição não conseguirão ter episódios de hiperfagia e com a disabsorção terão que ter uma maior preocupação com a qualidade dos alimentos ingeridos. Ainda há a necessidade de realizar atividade física regularmente e fazer uso de polivitamínicos. Como toda cirurgia suscita uma série de sentimentos e fantasias, torna-se essencialmente importante o acompanhamento psicológico nos períodos pré e pós-operatório. O objetivo do acompanhamento psicológico no pré-operatório é desmistificar algumas crenças sobre a cirurgia bariátrica e também analisar as expectativas do paciente em relação à mesma. Trabalhar medos e receios e esclarecer as dúvidas que porventura surjam nesse período. Identificar prováveis psicopatologias anteriores à cirurgia, e, principalmente, criar um espaço para pensar sobre a escolha da realização de um procedimento cirúrgico, bem como a implicação que este procedimento terá na vida do paciente. Em termos de acompanhamento psicológico pós-operatório objetiva-se ajudar na adaptação às mudanças nos hábitos alimentares, no esquema corporal e no estilo de vida. Tem-se como tarefa prestar um suporte emocional, identificar e tratar possíveis psicopatologias que surjam nesse período. Portanto, diante da complexidade da obesidade como doença e de todas as implicações que ela traz à vida do portador, faz-se necessário enfatizar a necessidade do acompanhamento interdisciplinar, tendo a psicologia um papel determinante na elaboração das questões psicológicas que tangem a doença. Desta forma o acompanhamento psicoterápico possibilita que o paciente tenha uma maior consciência da sua participação no tratamento, uma vez que, sem o desejo de mudança do paciente o resultado pode ser bem diferente do esperado! * Thaís Cristina Simamoto – Psicóloga graduada pela Universidade Federal de Uberlândia; Especialização em Transtornos Alimentares e Obesidade pela Faculdade de Medicina da USP; psicóloga da equipe Centrobeso; membro da Cooperativa Unipsico Uberlândia. * Thaís Silva Luiz – Psicóloga graduada pela Universidade Federal de Uberlândia; Formação em Psicologia da Saúde e Hospitalar pelo Hospital Araújo Jorge/GO; psicóloga da equipe Centrobeso; membro da Cooperativa Unipsico Uberlândia.