DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
NEPE - NÚCLEO DE EXECUÇÃO PENAL
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, por meio do
NÚCLEO DE EXECUÇÃO PENAL – NEPE, no exercício de suas atribuições legais e
constitucionais, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com fulcro no artigo 5º,
Inciso LXVIII, da Constituição Federal, e artigos 647 a 667 do Código de Processo Penal
impetrar a presente ação constitucional de
HABEAS CORPUS com pedido liminar
em favor de
Nome
Filiação
Execução criminal nº
ADAILTON DE FREITAS
ADALTO DE SOUZA
ARACELIA DE FREITAS
MARIA APARECIDA DE SOUZA
0007379-82.2008.8.08.0011
0015176-97.2012.8.08.0002
1
Rua Henrique Moscoso, nº 1275, Centro, Vila Velha-ES.
(27) 3139-9260 – [email protected]
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ALAMIR ZANARDI ZANETTE
ALESSANDRO DE SOUZA
ANSELMO
ALEX OLIVEIRA DIORIO
ALEXANDRE CARVALHO
ALLEF DE SOUZA GOMES
ALBINO
ANDERSON FERREIRA DA
SILVA
ANIVALDO SILVA RICARDO
DO NASCIMENTO OU
ANIVALDO RICARDO SILVA
DO NASCIMENTO
ANTÔNIO FABIANO DA SILVA
FERREIRA
ANTÔNIO SIMÃO
BENEDITO HENRIQUE
PIMENTEL GONÇALVES
BENTO LUCIO PIRES
BRUCE LEE FERREIRA
MACHADO OU FABRICIO
FERREIRA MACHADO
BRUNO GOMES DE SOUZA
CAIO INÁCIO FARIA
CARLOS ALBERTO
CARVALHO
CARLOS EDUARDO FERREIRA
PEÇANHA
CARLOS HENRIQUE SILVA
PINTO
CESAR FACCINI DOS SANTOS
CLODOALDO ALBUQUERQUE
RIBEIRO
CRISTIANO DA SILVA
MIRANDA
CECILIA ZANETTE ZANARDI,
ANTONIO TEDESCO ZANARDI
MARIA APARECIDA DE SOUZA OU
APARECIDA DE SOUZA, WALTER
ANSELMO
ROSEANE APARECIDA COELHO
DE OLIVEIRA, JUMAR DE AGUIAR
DIORIO
CREUZA MORAIS CARVALHO,
JONACI CARVALHO
ADNÉLIA DE SOUZA GOMES, JOSÉ
AUGUSTO RAMOS ALBINO
EVA MARIA FERREIRA DA SILVA,
JORGE SANTOS DA SILVA
ROSIANE NASCIMENTO SILVA,
RICARDO ALVES DO
NASCIMENTO
0067471-84.2012.8.08.0011
AMÉLIA DA SILVA FERREIRA,
OZENI LOURENÇO ARARIBA
CLARA OTAVIANA, JOÃO SIMÃO
0010667-28.2014.8.08.0011
CLOTILDE GONÇALVES PEIXOTO,
ANTONIO PIMENTEL DE ALMEIDA
ERCILIA DO NASCIMENTO PIRES,
VALDOMIRO PIRES
AUDILÉIA FERREIRA MACHADO,
FERNANDO BATISTA MACHADO
0014056-38.2007.8.08.0020
MARIA DAS GRAÇAS ALVES
GOMES, ALTAMIRO VIANA DE
SOUZA
JUDITE ANTÔNIO DA SILVA,
JOAQUIM INÁCIO FARIA
MARIA LOURDES CARVALHO,
ESTEVAO ANDRADE CARVALHO
NILZA EDNA FERREIRA, JOSE
CARLOS PEÇANHA
LUZIA SILVA PORTO, OSVALDO
VICENTE PINTO
MARIA DA PENHA FACCINI DOS
SANTOS, SERGIO DOS SANTOS
AUREA VIEIRA RIBEIRO, ACIR
ERMELINO RIBEIRO
ZILDA DA SILVA MIRANDA, JOSE
FURTADO DE MIRANDA
0010615-32.2014.8.08.0011
0015175-15.2012.8.08.0002
00712270420128080011
0011212-45.2007.8.08.0011
0000605-29.2014.8.08.0010
222201102212
0000802-36.2013.8.08.0004
222201000914
222201109746
0005059-83.2013.8.08.0011
222201001939
222201108862
222201211678
00000524020138080002
0002626-03.2013.8.08.0013
0001999-25.2013.8.08.0069
222201213450
2
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DANNYEL LEANDRO
ALMEIDA DE AZEREDO
TANIA MARIA ALMEIDA
AZEREDO, MAURICIO LEANDRO
DE AZEREDO FILHO
MARIA DA CONCEIÇÃO DA SILVA,
JOCEMIRO SABINO DA SILVA
RITA GONÇALVES COELHO,
ANTÔNIO FERNANDES SOARES
VIANA
0015020-12.2012.8.08.0002
DIEGO SILVA DE SOUZA
BENEDITA LUZIÊ DO BRASIL SILVA,
JOSÉ FRANCISCO DA SILVA
0013667-50.2012.8.08.0029
DOMINGOS SAVIO THIENGO
ANA BRUNHARA THIENGO, JOSE
THIENGO
MARIA JORDÃO DE CARVALHO,
JOELSON PEREIRA DE CARVALHO
LUCINEIA GOMES DE AGUIAR,
ALCENIR FABER
BENEDITA BATISTA BARCELOS,
EDILSON FRANCISCO BARCELOS
IRANY GOMES DIAS OU IRANY
MARTINS GOMES
GLEIDE MARIA ZUCOLOTO
MOZER, GELSON MOZER
MARIA DA PENHA DE JESUS, JOSE
SILVEIRA
DAVI DA SILVA
DEILTON GONÇALVES
COELHO VIANA
DOUGLAS JORDÃO DE
CARVALHO
EDIELSON FABER
EDILSON BATISTA BARCELOS
FABRICIO GOMES
GEDSON ZUCOLOTO MOZER
GENERVAL BORGES DE
ARAUJO OU GENEVAL
BORGES DE ARAUJO
GENILSON DELFINO PEREIRA
GILDASIO PROCHNOW
GILMAR VALADARES
GILVAN ALVES DE OLIVEIRA
GIOVANNI SAMPAIO
IRLAN CARLOS DE LIMA
PAIXÃO
JOAO BATISTA DOS REIS
JOÃO MARIO BINOTI PAIVA
JOAO VITOR TURINO LAGAIS
OLIENE DELFINO PEREIRA, ARY
SILVA PEREIRA
FILINHA GERKE PROCHNOW,
ANTONIO PROCHNOW
GUIOMAR CANDIDA ANASTÁCIO
VALADARES, LEVI ANASTÁCIO
VALADARES
DERINA DOMICILIANO DE
OLIVEIRA, OSMAR ALVES DE
OLIVEIRA
LUZIA GONÇALVES MANÇO,
VALMIR SAMPAIO
MARIA PAIXÃO DO NASCIMENTO
DE LIMA, JOÃO SERAFIM DE LIMA
ISABEL DA SILVA REIS, JOAO
GOMES DOS REIS
JOELMA JOE BINOTI, JOSE MARIO
PAIVA
MARIA IZABEL NUNES TURINO,
ADAILTON LAGAIS DE SOUZA
0004613-58.2010.8.08.0020
0000156-53.2014.8.08.0016
222201008133
222201005358
0000422-04.2014.8.08.0028
222200901655
222200902867
222200709779
0000558-98.2014.8.08.0028
0010599-50.2007.8.08.0035
222201005849
0004931-05.2009.8.08.0011
222200902476
0001883-90.2013.8.08.0013
222201213782
0016936-20.2013.8.08.0011
0000125-57.2015.8.08.0029
222201109740
3
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JOCEI FORIGO OU JOSEI
ANA MARIA FORIGO, DEOCLECIO
0012212-07.2012.8.08.0011
FORIGO OU JOCEIR PEREIRA
PEREIRA
MOZER
JOHN MORRISEY MORAES
CITERO
JORDAN PEREIRA ESPOSITO
ROSEMERY DE SOUZA MORAES,
ISAÍAS MORAES CITERO
DINORAH PEREIRA DO
NASCIMENTO, JOÃO ESPÓSITO
RAIMUNDA ISAURA DA SILVA,
JOSE CARLOS SOBRAL
AMELIA VICENTE GABRIEL,
SEBASTIÃO GABRIEL
0000454-97.2013.8.08.0010
JOSE NILTON OBOLARI
CELMA ILZA MENDEL, JOSE OBOLARI
0001105-56.2013.8.08.0002
JOSE PROPICIO DOS SANTOS
MARIA CÍCERA DA CONCEIÇÃO,
JOSE PROPICIO DOS SANTOS
ERLI IZABEL MOREIRA TERLONI,
JOSE TERLONI
MARIA GONÇALVES EMENES,
MATIAS BILCE EMENES
MARIA GERUSA FERREIRA
0013664-95.2012.8.08.0029
JOSÉ CARLOS DA SILVA
SOBRAL
JOSE CARLOS GABRIEL
JOSE RENATO TERLONI
JOTALINO BILCE EMENES
LEANDRO FERREIRA
LEOMAR BARBOSA DE SOUZA
LUCIANO VILELA
LUIZ CARLOS SOARES DA
COSTA
LUIZ LEONARDO SILVA DE
AVELLAR PEÇANHA
MAICON BERNARDO DE
OLIVEIRA
MAIKEO TURINO ROSA OU
MAICON TURINO ROSA
MAISSON DA SILVA BARRETO
MARCELO FERNANDES DA
SILVA
MARCELO MARQUES DE
MORAES
MARCELO VIANA CUSTODIO
MARCIO DOS SANTOS
MARQUES
ANA BARBOSA DE SOUZA,
SEBASTIAO PEREIRA DE SOUZA
SONIA REGINA SEBASTIANA
VILELA
SEBASTIANA SOARES DE MATOS,
SEBASTIÃO FERREIRA DA COSTA
TERESA CRISTINA SILVA DE
AVELLAR, ARILDO MAGALHÃES
PEÇANHA
MARLUCIA BERNADO DE
OLIVEIRA, JOSE POLONINI DE
OLIVEIRA
LUCIVANE NUNES TURINO,
CLODES ROSA OU CLOUDES ROSA
MARILDES DA SILVA BARRETO,
WANDERLEY MENDES BARRETO
OU VANDERLEI SILVA BARRETO
DORACEA DA CONCEIÇÃO SOUZA
OU IRACI SILVA CARDOSO,
MANOEL FERNANDES DE SOUZA
SÔNIA MARIA MARQUES
MARIA DO CARMO DE JESUS
VIANA, FRANCISCO ALVES
CUSTÓDIO
JURACI DOS SANTOS, JOSÉ
MARQUES
222200816233
222200713882
0007126-21.2013.8.08.0011
0001508-03.2010.8.08.0011
222200907285
222201007008
222200709972
222201109748
222201004911
0009209-83.2008.8.08.0011
0010563-07.2012.8.08.0011
0009764-95.2011.8.08.0011
0071236-63.2012.8.08.0011
0001872-87.2013.8.08.0069
222201109754
222201005908
0010878-35.2012.8.08.0011
4
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MARCIO LIMA RODRIGUES
MANOELA LIMA RODRIGUES,
JORGE ROQUE RODRIGUES
0000438-55.2014.8.08.0028
MARCIO ROBERTO
FERNANDES
MARCOS JHONATA MACHADO
DE OLIVEIRA
MARCOS VINICIUS DE
OLIVEIRA RAIMUNDO
LUZIA REGINA FERNANDES
0000798-96.2013.8.08.0004
MAXUEL ZANGIROLAMI
GARCIA
ROZIMARE SOUZA MACHADO,
ANTONIO MARCOS DE OLIVEIRA
MARINA ELIANE DE OLIVEIRA,
REINALDO NASCIMENTO
RAIMUNDO
MARIA DO CARMO ZANGIROLAMI
GARCIA, FERNANDO MENDES
GARCIA
222201108185
0002157-36.2008.8.08.0011
0002649-12.2014.8.08.0013
ODARIO DE OLIVEIRA
FRANCISCA DE OLIVEIRA, EUCLIDES
RAFAEL
222200902494
PAULO ROBERTO GOMES DA
SILVA
PAULO SERGIO ROBERTO
SIMONE GOMES SILVA, DANIEL
ROBERTO GOMES DA SILVA
MARIA DE LOURDES QUIRINO
ROBERTO, ATHAIDE ROBERTO
ROSANGELA CARRIÇO SARA,
LOURENÇO SARA
ALDIRA RODRIGUES DA SILVA,
ANTONIO ADILSON DA SILVA
ELIS REGINA GOMES
222200709517
PHILIPE CARRIÇO SARA
RENILDO RODRIGUES DA
SILVA
RERISSON LUIZ GOMES
ROGÉRIO ANDRADE DE
SOUZA
ROMILDO JOSÉ
ROMILDO PEREIRA DA SILVA
RONDINELI SOUZA DE
FREITAS
SANDRO GOMES BAHIENSE
SEBASTIAO DOS SANTOS
AYRES
SEBASTIAO LINO DE
ALMEIDA
SEBASTIÃO LUIZ DA CRUZ
SEBASTIAO RODRIGUES DOS
SANTOS
THIAGO SILVA WERHEIN
CECÍLIA ANDRADE DE SOUZA,
HENRIQUE DE SOUZA
JUVERCINA DIAS CARVALHO,
FRANCISCO JOSE LUIS
ROSELEIA PEREIRA DA SILVA,
DEJAIR BRIDES DA SILVA
ROSEMARI SOUZA DE FREITAS,
LUIZ FRANÇA DE FREITAS
LEOPOLDINA GOMES BAHIENSE,
WALTER SOUZA BAHIENSE
MARIA RINGLER AYRES,
ESTEVAO AYRES
ALZIRA FRAUZINO DE ALMEIDA,
JOÃO LINO DE ALMEIDA
TEREZA APARECIDA DOS SANTOS
CRUZ, ANTÔNIO JOSÉ DA CRUZ
IRENE DESOUZA SANTOS, GECI
RODRIGUES DOS SANTOS
LÚCIA SILVA WERHEIN
0000122-39.2014.8.08.0029
222201109695
0015112-09.2012.8.08.0028
0006787-28.2014.8.08.0011
0001891-74.2014.8.08.0064
222200902416
222201004928
222201004727
0001661-83.2013.8.08.0026
222201103387
0002222-65.2007.8.08.0011
222200907283
0000184-62.2013.8.08.0046
0001985-15.2013.8.08.0013
5
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VANDERLEI FREITAS SANTOS
WALACE BAPTISTA PINHEIRO
WILLIAN ROSA DOS SANTOS
MARIA DA PENHA FREITAS
SANTOS, ANTONIO DOS SANTOS
MARIA DA GLORIA DE SOUZA
BAPTISTA, NICANOR PINHEIRO
FILHO
JOANA ROSA DE OLIVEIRA,
JOACIR CORTES DOS SANTOS
222201009691
0007043-73.2011.8.08.0011
0013888-24.2012.8.08.0032
todos estes atualmente reclusos na Penitenciária Estadual de Vila Velha IV, após terem sido
transferidos do Centro de Reintegração Social de Cachoeiro de Itapemirim (APAC), apontandose como autoridade coatora o Excelentíssimo Senhor Secretário de Justiça pelas razões
fáticas e jurídicas que a seguir expõe.
DOS FATOS
De início, faz-se necessário traçar algumas linhas a respeito do sistema penitenciário
capixaba. Um dos fatos que se destacam quando se cita o Estado do Espírito Santo nos cenários
internacional e nacional é o seu sistema penitenciário e as severas violações de direitos humanos
nele praticadas.
Não por acaso, em 2009 o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária
(CNPCP), após visita ao Estado, procedeu à provocação do Procurador-Geral da República para
que fosse avaliada a possibilidade de intervenção federal. Essa postura foi motivada pela
violação aos direitos da pessoa humana no sistema penitenciário, tendo sido expressamente
criticada pelo CNPCP a postura omissiva dos órgãos da execução penal.
E, muito embora possa se atestar que o sistema prisional capixaba evoluiu nesse
período, certamente não se pode afirmar que o mesmo se encontra em conformidade com as
disposições legais e com a dignidade da pessoa humana. É nesse contexto de avanços e
retrocessos que se insere a discussão do caso levado à apreciação do Tribunal de Justiça.
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Havia, em todo o Estado do Espírito Santo, segundo dados do Conselho Nacional de
Justiça, 2418 vagas para a execução da pena em regime semiaberto1 para apenados do sexo
masculino, conforme documentação anexa, sendo que 2874 pessoas eram mantidas presas no
regime intermediário. Saliente-se que a esse total devem ser somadas as inúmeras pessoas
que deixam de gozar do direito ao regime semiaberto por ineficiência estatal, sendo
mantidas em unidades de regime fechado quando já tem direito reconhecido à
transferência ao regime intermediário.
Mesmo diante de tal quadro, no dia 24 de agosto de 2015 a Secretaria de Justiça do
Estado do Espírito Santo (SEJUS) suspendeu a execução do convênio que possibilita a adoção
do método APAC no Centro de Reintegração Social de Cachoeiro de Itapemirim, resultando na
inutilização da unidade prisional para a custódia de apenados, a qual, diga-se, era a única
unidade destinada ao regime prisional semiaberto localizada na região sul do Estado. Tão
somente com essa medida, foram anuladas 140 vagas, fazendo com que, na presente data, o
sistema prisional conte atualmente com 2278 vagas para o regime semiaberto. Com isso, o
déficit de vagas Portanto, foi claramente agravado o quadro de superlotação das unidades de
regime semiaberto, fazendo com que a PEVV IV, por exemplo, passasse a apresentar
68,37% de lotação acima das vagas.
A SEJUS notificou a Defensoria Pública da suspensão do convênio que possibilitava
o funcionamento da APAC de Cachoeiro de Itapemirim (DOC. 01), apresentando como
motivação a existência de irregularidades, tais como a ausência de oferta à educação aos
internos, a ausência de convênio que regule obrigações dos internos para com as empresas que se
utilizam de sua mão-de-obra, a ausência de folga semanal aos apenados que trabalham na
1
Essas vagas destinadas a pessoas do sexo masculino para cumprimento da pena em regime semiaberto encontramse distribuídas da seguinte forma: 391 vagas na CASCUVV (Casa de Custódia de Vila Velha); 140 na APAC de
Cacheiro de Itapemirim; 96 na PSMCOL (Penitenciária Semiaberta Masculina de Colatina); 372 na PSC
(Penitenciária Semiaberta de Cariacica); 220 na PRL (Penitenciária de Linhares); 455 na PAES (Penitenciária
Agrícola do Espírito Santo); e 604 na PEVV IV (Penitenciária Estadual de Vila Velha IV).
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unidade, irregularidades no funcionamento da unidade de alimentação e na prestação de contas
concernentes ao recebimento de recursos financeiros.
Como consequência dessa decisão, 87 das 89 pessoas que se encontravam
custodiadas naquela unidade foram transferidas para a Penitenciária Estadual de Vila Velha IV
(PEVV IV) (DOC. 02), conforme se nota nos extratos do sistema INFOPEN/ES juntados ao
presente writ. Ou seja, apesar do notório déficit de vagas para o cumprimento de pena
regime semiaberto no sistema prisional do Estado, uma unidade de regime semiaberto foi
fechada e os pacientes transferidos para estabelecimento em situação de superlotação.
É fundamental, ainda, apontar que apesar de a PEVV IV se apresentar como
estabelecimento prisional formalmente destinado à execução da pena em regime semiaberto2,
em verdade trata-se de estrutura adequada ao regime fechado.
É sabido que o regime semiaberto se caracteriza pela execução da pena privativa de
liberdade em colônia agrícola (a qual deve conter área extensa e própria para plantio e cultivo de
vegetais, ou a produção pecuária), industrial (a qual deve possuir maquinário adequado ao ramo
da atividade desenvolvida) ou estabelecimento similar, onde as atividades tenham caráter
educativo e profissionalizante. Ademais, deve existir compartimento coletivo com dormitório,
aparelho sanitário e lavatório e que tenha como requisitos básicos a salubridade do ambiente pela
concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência
humana.
Além disso, as unidades de regime semiaberto devem ter configuração arquitetônica
mais simples, com poucos obstáculos contra fuga. São ambientes fechados, em que o detento não
2
A alteração da finalidade da PEVV IV, destinando-a não mais ao regime fechado, mas sim ao semiaberto, deu-se
por meio de mero ato normativo, sem que um prego tenha sido batido em sua estrutura física para adequá-la
propriamente ao regime prisional intermediário. Repete-se, nesse particular, o procedimento que ocorreu em
2007, quando diante da decisão do STF admitindo a progressão de regime para crimes hediondos, fez-se
necessária a criação de vagas em regime semiaberto. Em resposta a essa demanda, o Estado do Espírito do Santo
simplesmente transformou o Instituto de Readaptação Social (IRS) em unidade prisional adequada ao regime
semiaberto sem qualquer alteração estrutural na unidade prisional.
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pode sair dos limites territoriais, mas de segurança média, pois a capacidade de senso de
responsabilidade do condenado que cumpre pena no regime semiaberto deve ser estimulada e
valorizada. Assim, os apenados hão de consciente e voluntariamente cumprir os deveres e
exercer os direitos próprios dos presos que cumprem pena no regime semiaberto, já que a
progressão para o regime semiaberto, ou a fixação do regime semiaberto como o regime inicial
de cumprimento de pena, demonstram que ao apenado é creditada maior confiança em sua
autodisciplina e adequação social3.
Nesse regime, o condenado fica sujeito a trabalho comum durante o período diurno,
sendo o trabalho externo recomendado, assim como é possível a frequência a cursos supletivos
profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior (art. 35 do CP, e arts. 88 e 92 da
Lei nº 7.210/84).
Conforme já afirmado, a PEVV IV não se adequa ao regime semiaberto. Sua
arquitetura em nada se difere das outras unidades prisionais do Complexo de Xuri (PEVV I, II,
III e V), tendo sido construída nos mesmos moldes adaptados do modelo Supermax americano,
como ocorre com as unidades vizinhas. O estabelecimento, portanto, não possui qualquer
característica de colônia agrícola ou industrial. Não por acaso, o relatório do CNJ é taxativo ao
afirmar:
A unidade possui condições boas para uma unidade do regime fechado,
mas para Regime semiaberto apresenta condições regulares somente.
Em uma perspectiva otimista4, a cada dez presos que se encontram na PEVV IV sete
não estudam ou trabalham permanecendo trancados em suas celas durante a absoluta maioria das
horas do dia. Os obstáculos à fuga são ostensivos, sendo tal quadro absolutamente contrário à
3
BRITO, Alexis de Couto. Execução Penal. 3ª Edição. Editora Revista dos Tribunais. São Paulo. 2013. P. 223 e
224.
4
Segundo as informações do CNJ, há 94 vagas de trabalho (somando-se as oportunidades de trabalho interno e
externo) e 180 vagas de estudo. Assim, pressupondo-se que nenhum apenado trabalha e estuda
concomitantemente – o que, sabe-se, possivelmente não corresponde à realidade – tem-se que 274 presos
participam de alguma atividade.
9
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lógica de reinserção social.
Por fim, a unidade prisional apresenta o maior índice de
superlotação – 69% – em unidades de regime semiaberto em todo o estado, contando com 1021
presos para 604 vagas.
Assim, constata-se que com a suspensão da execução do convênio que permitia o
funcionamento da APAC de Cachoeiro de Itapemirim – unidade que adota o método que, digase, é o mais respeitador da dignidade da pessoa humana e que mais se aproxima do objetivo da
execução penal de proporcionar condições para a harmônica integração social dos condenados
(art. 1º da Lei nº 7.210/84) – agravou-se ainda mais o quadro de superlotação das unidades de
regime semiaberto no Estado do Espírito Santo.
E mesmo diante da patente ausência de vagas e do fato de as famílias dos
apenados residirem na região sul do Estado do Espírito Santo, a Secretaria de Justiça
entendeu por bem proceder à transferência dos apenados que estavam reclusos na APAC
de Cachoeiro de Itapemirim para a PEVV IV.
Diante desse quadro de submissão dos apenados à superlotação violadora dos mais
básicos direitos da execução penal e a condições incompatíveis com o regime semiaberto, bem
como da distância entre a PEVV IV e a residência dos familiares dos pacientes deste habeas
corpus, constata-se o evidente constrangimento ilegal à liberdade de locomoção dos pacientes, o
que motiva a impetração do presente writ.
DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS LITISCONSORCIAL
Inicialmente, mostra-se necessário tecer breves comentários sobre o cabimento da
presente medida. Cumpre ressaltar que não se trata de habeas corpus coletivo, mas sim de
habeas corpus litisconsorcial. Tal diferenciação é de suma importância. Explica-se.
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O habeas corpus coletivo tem como objetivo tutelar o direito à liberdade de um
grupo determinável de pessoas. Nesse contexto, diante de uma situação fática que viola
flagrantemente a liberdade de cada um dos membros, impetra-se writ em favor de todos os
afetados, apontando-se apenas elementos que possam posteriormente individualizar cada um
deles.
Muito embora a Defensoria Pública entenda ser plenamente possível a impetração de
habeas corpus coletivo, não é esta a situação dos autos.
No presente caso, verifica-se que o remédio constitucional impetrado tem natureza
litisconsorcial. Nesses termos, trata-se de único instrumento processual que visa tutelar direitos
de um grupo determinado de pessoas. Acrescente-se que tais apenados se encontram
devidamente individualizados no corpo desta ação constitucional.
Com a referida diferenciação, eliminam-se muitas das discussões que eventualmente
poderiam surgir quanto ao cabimento ou não deste writ, uma vez que é pacífica nos Tribunais
Superiores a possibilidade de impetração da habeas corpus em que figure mais de uma pessoa
como paciente. Nesse sentido, cite-se que o Superior Tribunal de Justiça expôs didaticamente tal
posicionamento no seguinte julgado, in verbis:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS
CORPUS
COLETIVO.
EXECUÇÃO
PENAL.
PACIENTES
INDETERMINADOS - TODOS OS CONDENADOS QUE VÊM
CUMPRINDO PENA NO CENTRO DE DETENÇÃO PROVISÓRIA II
DE OSASCO/SP COM DIREITO AO REGIME SEMIABERTO PEDIDO DE PRISÃO ALBERGUE DOMICILIAR. PETIÇÃO
INICIAL. REQUISITOS DO ART. 654, § 1º, ALÍNEA "A", DO CPP.
AUSÊNCIA.
1. Não se olvida a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no
sentido de que, tendo sido o agente condenado ou promovido ao regime
prisional semiaberto/aberto, constitui ilegalidade submetê-lo, ainda que
por pouco tempo, a local apropriado a presos em regime mais gravoso,
em razão da falta de vaga em estabelecimento adequado.
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2. Entretanto, conforme ressaltei na decisão agravada, não se pode
admitir habeas corpus coletivo, em favor de pessoas indeterminadas,
visto que se inviabiliza não só a apreciação do constrangimento, mas
também a expedição de salvo-conduto em favor dos supostos coagidos.
3. Com efeito, a teor do disposto no art. 654, § 1º, alínea "a", do
Código de Processo Penal, a petição de habeas corpus conterá o
nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou
coação, vale dizer, a identificação de quem esteja sofrendo o alegado
constrangimento ilegal.
4. Registro que não há obrigatoriedade legal de que se formule um
único pedido de habeas corpus para cada paciente, podendo a
impetração englobar duas ou mais pessoas, bastando que o cenário
fático-processual de cada um dos interessados seja comum para viabilizar
a concessão da medida.
5. Não obstante, a individualização dos vários pacientes é imprescindível,
não bastando a qualificação dos supostos coagidos como um grupo
determinável de sujeitos que se encontrem na mesma situação de fato.
6. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no RHC 40.334/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA
TURMA, julgado em 03/09/2013, DJe 16/09/2013)
Quanto ao citado decisum merecem ser destacados dois pontos. O primeiro deles diz
respeito ao fato de que o caso em concreto objeto da supracitada decisão foi novamente
analisado pelo Supremo Tribunal Federal, no HC 1197535. Na ocasião, o Pretório Excelso
manteve o entendimento do Tribunal da Cidadania.
O segundo ponto diz respeito propriamente ao teor da mencionada tese
jurisprudencial. Verificam-se, em síntese, os seguintes pontos quanto ao manejo do habeas
corpus:
1) Não existe obrigação legal de que a tutela de várias pessoas, cujas
liberdades estejam sendo afetadas, proceda-se por meio de vários
5
HC 119753 MC, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 24/10/2013, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-213 DIVULG 25/10/2013 PUBLIC 28/10/2013).
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habeas corpus individuais. Sendo assim, pode ser manipulado apenas um
writ em prol de mais de um indivíduo;
2) A individualização dos pacientes é imprescindível;
3) A impetração pode englobar dois ou mais indivíduos, bastando que o
cenário fático-processual de cada um dos interessados seja comum
para viabilizar a concessão da medida;
Por sua vez, no presente caso, estão presentes todos os requisitos elencados pela
jurisprudência. Destarte, respeitando-se os ditames expostos: está sendo realizada, em uma única
peça, a tutela dos direitos de várias pessoas; foi feita a individualização de todos os pacientes; e
todos os apenados estão sujeitos ao mesmo contexto fático-processual.
Ademais, quanto ao contexto fático-processual, observa-se que os pacientes:
encontravam-se presos na APAC de Cachoeiro de Itapemirim; possuem familiares residentes no
sul do Estado; foram transferidos para unidades prisionais situadas na Grande Vitória; e, em
razão da grande distância entre o local de cumprimento de pena e a residência de seus parentes,
estão sofrendo violações, inclusive, no que se refere ao seu direito de recebimento de visitas e de
manutenção do vínculo familiar.
Além do exposto, é indispensável apontar que o direito discutido neste habeas
corpus é indubitavelmente um dos desdobramentos do direito de liberdade, como será mais
bem desenvolvido em tópico próprio.
Portanto, verifica-se o pleno cabimento do presente remédio constitucional.
DA VIOLAÇÃO AO DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR
A convivência familiar recebe proteção especial pelo Estado, inclusive com
disposições no âmbito constitucional, o que demonstra a relevância do amparo ao núcleo social.
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Dispõe o art. 226 da Constituição Federal que:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
Além da incidência da referida proteção, tem-se que a sanção penal é regida pelo
princípio da intranscendência da pena, também com previsão constitucional:
Art. 5º, XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo
a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser,
nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até
o limite do valor do patrimônio transferido;
Em relação ao princípio supracitado, em uma visão realística, trata-se aqui da
transcendência mínima, uma vez que é impraticável a intranscendência absoluta dos efeitos
penais, pois, de algum modo, a família sempre sofre as consequências da imposição da pena a
um de seus membros.
Destarte, a transcendência da sanção penal deve ser coibida e reduzida pelo Estado
ao mínimo possível. E, entre as medidas que viabilizam a manutenção da impessoalidade da
pena e a proteção à família, está a garantia à convivência familiar do apenado.
Nesse sentido, no âmbito infraconstitucional a Lei de Execuções Penais cuida de
garantir ao preso a manutenção dos vínculos familiares e de amizades, salvaguardando o direito à
convivência familiar.
Prevê a Lei de Execuções Penais em seu art. 41, X, o direito à convivência familiar
por meio do recebimento de visitas. Para que tal direito lhe seja garantido, é mister que o sistema
carcerário disponha de meios hábeis a viabilizar a realização das visitas, sob pena de violação à
disposição legal.
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O ônus para a garantia do direito de o preso receber visitas não deve recair sobre a
própria família, o que ocorre quando o apenado está encarcerado em local distante do seio
familiar.
Ressalte-se que, em reconhecimento de tal direito, no âmbito do Poder Executivo
local, o artigo 18 da portaria 332-S da Secretaria de Justiça do Estado do Espírito Santo prevê a
possibilidade de se requerer a transferência entre unidades prisionais quando os familiares
residem em comarca diversa.
Nesse sentido, importante pontuar que a ausência de visita dos familiares à pessoa
presa implica frustação dos objetivos da execução penal consubstanciado na harmônica
integração social do condenado. É certo que, longe do seu núcleo familiar, o apenado encontrará
maiores dificuldades para a integração social.
Acrescentem-se a isso dois princípios que regem a execução das penas: o da
legalidade e da humanidade.
Pelo princípio da legalidade, previsto no artigo 3º da Lei 7.210/84, ao condenado
serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. Logo, não há razão
para restringir ao condenado à pena privativa de liberdade o convívio mínimo com seus
familiares, proporcionado por visitas à unidade prisional. E ao se prejudicar a realização da visita
a sentenciado que se encontra em estabelecimento prisional distante da residência de sua família,
por via transversa, o que se faz é restringir direitos além dos determinados pela sentença
condenatória e pela lei penal.
Por sua vez, o princípio da humanidade, decorrente do princípio da dignidade da
pessoa humana e derivado de garantia constitucional, adverte que são proibidas, entre outras,
penas de banimento ou cruéis.
Outrossim, o direito ao cumprimento da pena em local próximo da família possui
resguardo inclusive no âmbito do direito internacional dos direitos humanos. Neste sentido, as
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Regras Mínimas Padrão para o Tratamento de Prisioneiros previstas pela ONU6 estabelece em
diversos artigos essa garantia. Veja-se:
37. Os prisioneiros devem ter permissão, sob a supervisão necessária,
para comunicarem-se periodicamente com suas famílias e amigos de
boa reputação por correspondência ou por meio de visitas.
(...)
62. O tratamento de prisioneiros deve enfatizar não a sua exclusão da
comunidade, mas sua participação contínua nela. Assim, as agências
comunitárias devem, sempre que possível, ser indicadas para auxiliar a
equipe da instituição na tarefa de reabilitação social dos prisioneiros.
Toda instituição social deve ter trabalhadores encarregados de manter e
aperfeiçoar todas as relações desejáveis de um prisioneiro com sua
família e com agências sociais reconhecidas. Devem-se adotar
procedimentos para proteger, ao máximo possível, de acordo com a lei e
a sentença, os direitos relacionados aos interesses civis, de segurança
social e outros benefícios sociais dos prisioneiros.
(...)
79.
Atenção especial deve ser dada para a manutenção e o
aperfeiçoamento das relações entre o prisioneiro e sua família,
conforme adequado ao interesse de ambos.
(...)
80. Desde o início do cumprimento da pena de um prisioneiro, deve-se
considerar seu futuro após a liberação, e ele deve ser incentivado e
auxiliado a manter ou estabelecer relações com indivíduos ou
organismos fora da instituição, da melhor forma possível, para
promover os interesses de sua própria reabilitação social e de sua
família.
Frise-se que, no referido documento, o direito é conferido inclusive ao preso
provisório, sem distinção de tratamento em relação ao preso condenado. Neste sentido:
6
Primeiro Congresso das Nações Unidas para a Prevenção ao Crime e Tratamento dos Infratores, Genebra, 22
agosto a 03 setembro 1955, disponível em: https://www.unodc.org/documents/justice-and-prisonreform/projects/UN_Standards_and_Norms_CPCJ_-_Portuguese1.pdf
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92. Um prisioneiro não julgado deve poder informar sua família,
imediatamente após sua detenção, e deve ter acesso a todas as
instalações apropriadas para se comunicar e receber a visita de sua
família e amigos, contudo, deve estar sujeito às restrições e supervisão
necessárias no interesse da administração da justiça, da segurança e do
bom andamento da instituição.
Neste mesmo sentido, a Resolução n 14, de 11 de novembro de 1994 do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) – Ministério da Justiça, estabelece o
direito do preso em manter suas relações familiares. Vejamos:
Art. 33. O preso estará autorizado a comunicar-se periodicamente, sob
vigilância, com sua família, parentes, amigos ou instituições idôneas, por
correspondência ou por meio de visitas.
(...)
Art. 37. Deve-se estimular a manutenção e o melhoramento das relações
entre o preso e sua família.
Ainda, a Resolução de nº 03, de 15 de julho de 2009 prevê:
Art. 8º A visita de familiares e pais presos deve ser estimulada visando à
preservação do vínculo familiar e do reconhecimento de outros
personagens do círculo de relacionamento parental.
Portanto, o direito à convivência familiar do apenado constitui-se em figura
multilateral, ou seja, é direito da pessoa presa e de cada um dos componentes familiares,
simultaneamente. Isto porque é evidente que o direito não é apenas do interno em ter contato
com o mundo externo, mas também dos familiares em poderem se comunicar e manter o vínculo
afetivo com aquele que está preso, inclusive sendo responsáveis por participar do processo de
ressocialização.
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Dessa forma, o direito à visita e à convivência familiar do apenado deve ser garantida
pelo Estado, permitindo-se seu exercício de forma regular e sem oposição de obstáculos, sob
pena de configuração de ato ilícito.
Ainda sobre a questão da multilateralidade do direito de visita a doutrina aborda, de
forma crítica, a previsão de sanção consistente na suspensão da visita familiar em decorrência de
falta disciplinar. Na inteligência de ROIG7, um:
“exemplo de violação ao princípio da transcendência mínima o emprego
da proibição ou restrição de visita como forma de sanção disciplinar
(arts. 41, parágrafo único, e 53, III, da LEP). Isso porque não somente o
preso possui o direito de receber seus visitantes (art. 41, X, da LEP) e
receber assistência da família (art. 5 LXIII), mas os próprios visitantes
também tem direito de encontrar seus parentes e amigos presos e com
eles manter laços afetivos.
Logo, se o impedimento da efetivação de um dos direitos à convivência familiar,
qual seja, o direito de receber visitas, é merecedor de críticas por, equivocadamente, justificar
sua suspensão em decorrência da falta disciplinar, ainda mais reprovável é a visão de que o
apenado pode ter totalmente negado o direito constitucional à manutenção dos vínculos
familiares sem que tenha dado qualquer causa a isso.
É o que ocorre no presente caso, uma vez que inexiste estabelecimento prisional
adequado ao regime semiaberto próximo à região em que residem os familiares dos pacientes do
presente writ8.
Ocorre que conforme narrado, os apenados estão em cumprimento de pena em
regime semiaberto. Dessa forma, o estabelecimento prisional no qual devem ser encarcerados, na
forma estabelecida pela LEP, é a Colônia Agrícola, Industrial ou similar. Vejamos:
7
8
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal. Teoria Crítica. Saraiva, 2014. P. 67.
Os endereços dos pacientes e de seus familiares podem ser observados no DOC.02.
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Art. 91. A Colônia Agrícola, Industrial ou Similar destina-se ao
cumprimento da pena em regime semi-aberto.
O único estabelecimento prisional na região sul do Estado do Espírito Santo que se
amoldava à previsão legal era a APAC da cidade de Cachoeiro do Itapemirim.
Destarte, com a suspensão do convênio entre a APAC – CI e a SEJUS-ES de forma
súbita, em 24 de agosto de 2015, todos os 87 apenados foram transferidos para a unidade
prisional Penitenciária de Vila Velha – IV (PEVV-IV), localizada na região metropolitana de
Vitória, que dista aproximadamente 140 quilômetros do local de cumprimento de pena anterior.
A despeito das condições do cárcere totalmente inapropriadas ao cumprimento da
pena em regime semiaberto na unidade PEVV-IV, o que será abordado adiante, o fato é que com
a providência da transferência repentina e sem a existência de outra unidade prisional adequada
ao regime semiaberto em toda a região sul capixaba, o direito à convivência familiar foi
nitidamente inviabilizado, havendo ofensa aos direitos tanto dos presos quanto dos familiares.
Considerando que a maioria absoluta dos apenados é hipossuficiente, e que a
vulnerabilidade socioeconômica alcança também seus familiares, verifica-se que é impraticável o
exercício do direito de visita entre os familiares e os apenados, uma vez que seria exigido o
dispêndio de gastos que não podem ser suportados por aquelas famílias.
Outra violação notável é a relativa ao direito de saídas temporárias para visitas ao lar.
Para os apenados que cumprem pena em regime prisional semiaberto, obtiveram o direito à saída
temporária e estão presos em local a mais de 140 quilômetros de suas residências, o gozo efetivo
daquele direito é impedido, uma vez que os condenados sequer possuem, em sua maioria,
condições financeiras de arcar com as despesas de uma passagem entre as cidades.
Nesse sentido, o STF já tem se posicionado para reconhecer o direito à convivência
familiar, inclusive por manejo do remédio constitucional do habeas corpus, garantindo a
efetividade do direito. Vejamos:
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HABEAS CORPUS. 2. DIREITO DO PACIENTE, PRESO HÁ QUASE
10 ANOS, DE RECEBER A VISITA DE SEUS DOIS FILHOS E TRÊS
ENTEADOS.
3.
COGNOSCIBILIDADE.
POSSIBILIDADE.
LIBERDADE DE LOCOMOÇÃO ENTENDIDA DE FORMA AMPLA,
AFETANDO TODA E QUALQUER MEDIDA DE AUTORIDADE
QUE POSSA EM TESE ACARRETAR CONSTRANGIMENTO DA
LIBERDADE DE IR E VIR. ORDEM CONCEDIDA.
1.
COGNOSCIBILIDADE DO WRIT. A jurisprudência prevalente neste
Supremo Tribunal Federal é no sentido de que não terá seguimento
habeas corpus que não afete diretamente a liberdade de locomoção do
paciente.
Alargamento do campo de abrangência do remédio heroico.
Não raro, esta Corte depara-se com a impetração de habeas corpus contra
instauração de inquérito criminal para tomada de depoimento;
indiciamento de determinada pessoa em inquérito policial; recebimento
da denúncia; sentença de pronúncia no âmbito do processo do júri;
sentença condenatória etc.
Liberdade de locomoção entendida de
forma ampla, afetando toda e qualquer medida de autoridade que possa,
em tese, acarretar constrangimento para a liberdade de ir e vir. Direito
de visitas como desdobramento do direito de liberdade. Só há se falar
em direito de visitas porque a liberdade do apenado encontra-se tolhida.
Decisão do juízo das execuções que, ao indeferir o pedido de visitas
formulado, repercute na esfera de liberdade, porquanto agrava, ainda
mais, o grau de restrição da liberdade do paciente.
Eventuais erros
por parte do Estado ao promover a execução da pena podem e
devem ser sanados via habeas corpus, sob pena de, ao fim do
cumprimento da pena, não restar alcançado o objetivo de reinserção
eficaz do apenado em seu seio familiar e social.
Habeas corpus
conhecido.
2. RESSOCIALIZAÇÃO DO APENADO.
A
Constituição Federal de 1988 tem como um de seus princípios
norteadores o da humanidade, sendo vedadas as penas de morte, salvo em
caso de guerra declarada (nos termos do art. 84, XIX), de caráter
perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e cruéis (CF, art. 5º,
XLVII). Prevê, ainda, ser assegurado aos presos o respeito à integridade
física e moral (CF, art. 5º, XLIX). É fato que a pena assume o caráter
de prevenção e retribuição ao mal causado. Por outro lado, não se pode
olvidar seu necessário caráter ressocializador, devendo o Estado
preocupar-se, portanto, em recuperar o apenado. Assim, é que
dispõe o art. 10 da Lei de Execução Penal ser dever do Estado a
assistência ao preso e ao internado, objetivando prevenir o crime e
orientar o retorno à convivência em sociedade.
Aliás, o direito do
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preso receber visitas do cônjuge, da companheira, de parentes e de
amigos está assegurado expressamente pela própria Lei (art. 41, X),
sobretudo com o escopo de buscar a almejada ressocialização e
reeducação do apenado que, cedo ou tarde, retornará ao convívio
familiar e social.
Nem se diga que o paciente não faz jus à visita dos
filhos por se tratar de local impróprio, podendo trazer prejuízos à
formação psíquica dos menores. De fato, é público e notório o total
desajuste do sistema carcerário brasileiro à programação prevista pela Lei
de Execução Penal. Todavia, levando-se em conta a almejada
ressocialização e partindo-se da premissa de que o convício familiar é
salutar para a perseguição desse fim, cabe ao Poder Público
propiciar meios para que o apenado possa receber visitas, inclusive
dos filhos e enteados, em ambiente minimamente aceitável,
preparado para tanto e que não coloque em risco a integridade física
e psíquica dos visitantes.
3. ORDEM CONCEDIDA. (STF, HC
107701/RS. Min. Gilmar Mendes. DJ Nr. 61 do dia 26/03/2012). (Grifo
Nosso)
Habeas Corpus. 2. Pedido de transferência de estabelecimento
prisional. Possibilidade. Vínculo familiar e disponibilidade de vaga.
3. Constrangimento ilegal caracterizado. 4. Ordem concedida. (STF,
HC 105175 / SP. Min. Gilmar Mendes. DJe-146, em 29-07-2011)
HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REMOÇÃO DE PRESO.
ANÁLISE DO CASO CONCRETO. ART.86 DA LEP.
ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS SIMILARES. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA FALTA DE SEGURANÇA. NÃO
CARACTERIZAÇÃO - DA PERICULOSIDADE SEM DADOS
OBJETIVOS
E
CONCRETOS.
VÍNCULO
FAMILIAR
COMPROVADO.VAGA EXISTENTE. CONCESSÃO DO WRIT. 1. O
art. 86, caput, da LEP permite o cumprimento da pena corporal em local
diverso daquele em que houve a perpetração e consumação do crime. 2.
Entretanto, o exame minucioso de cada caso concreto pode afastar o
comando legal supramencionado, desde que comprovadas as assertivas
de falta de segurança do presídio destinatário da remoção, participação
do preso em facção criminosa e outras circunstâncias relevantes à
administração da Justiça. Ônus do Parquet. 3. No caso sob exame, não
ficou demonstrado o perigo na transferência, tampouco a
periculosidade, ao contrário, porquanto são prisões aptas ao
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cumprimento de pena em regime fechado, além do que o vínculo
familiar, a boa conduta carcerária e a respectiva vaga foram
documentalmente demonstrados pelo paciente. 4. A ressocialização
do preso e a proximidade da família devem ser prestigiadas sempre
que ausentes elementos concretos e objetivos ameaçadores da
segurança pública. 5. Ordem concedida. (STF, HC 100087/SP. Min.
Ellen Gracie. Julg. 16/03/2010) (Grifo Nosso)
Situação análoga foi apreciada de forma recente pelo Tribunal Constitucional quando
decidiu sobre o ato judicial que reconhece o direito à saída temporária do interno. Trata-se da
decisão proferida no HC 128.763/RJ, publicado no Informativo n 793. No brilhante voto do
Ministro Relator Gilmar Mendes, temos:
Habeas corpus. Direito Penal. Processo Penal. Execução penal. Saída
temporária. Visita periódica à família. 2. Um único ato judicial que
analisa o histórico do sentenciado e estabelece um calendário de saídas
temporárias, com a expressa ressalva de que as autorizações poderão ser
revistas em caso de cometimento de falta, é suficiente para fundamentar a
saída mais próxima e as futuras. A decisão única permite participação
suficiente do Ministério Público, que poderá falar sobre seu cabimento e,
caso alterada a situação fática, pugnar por sua revisão. 3. Ameaça
concreta de lesão ao direito do paciente. Dificuldades operacionais na
Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro. Muito provavelmente, se
cada condenado tiver que solicitar cada saída, muitas serão despachadas
apenas após perderem o objeto. 4. Ordem concedida. Expedição do ofício
ao Conselho Nacional de Justiça, ao Presidente do Tribunal de Justiça do
Rio de Janeiro e à Corregedoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, para
que avaliem e tomem providências quanto à situação da execução penal
no Estado do Rio de Janeiro. 5. Expedição de ofício ao Superior Tribunal
de Justiça e à Procuradoria-Geral de Justiça do Rio de Janeiro, dando
notícia do julgamento.
VOTO: (...) O caso trata da possibilidade de o Juiz de execuções penais
deferir a saída temporária em uma única decisão, válida para diversas
saídas. A saída temporária sem vigilância direta é um benefício destinado
aos sentenciados que cumprem pena em regime semiaberto, na forma do
art. 122 da Lei 7.210/84. Autoriza-se que o preso saia e, se for o caso,
pernoite, fora do estabelecimento prisional, para visitar a família, estudar
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ou participar de outras atividades, com intuito de reintegrá-lo ao convívio
social. Conforme o art. 123 da Lei 7.210/84, a autorização deve ser
concedida “por ato motivado”, ouvidas as partes e a administração
carcerária. (...) Um único ato judicial que analisa o histórico do
sentenciado e estabelece um calendário de saídas temporárias, com a
expressa ressalva de que as autorizações poderão ser revistas em caso de
cometimento de falta pelo sentenciado, é suficiente para fundamentar a
saída mais próxima e as futuras. (...) Se a força de trabalho não for usada
com eficiência, é provável que os pedidos de autorização de saída só
sejam apreciados após a data da saída pretendida. Registro que
negligenciar a observância da economia processual nas autorizações de
saída pode gerar reflexo inclusive na superlotação carcerária.
No caso apontado, decidiu-se que o juízo da execução penal poderia reconhecer os
direitos à saída temporária de um determinado período em um único ato, não sendo necessário
que a cada saída temporária fosse proferida uma nova autorização judicial, sob pena de lesão
total ao direito subjetivo do preso de gozar do que lhe é conferido no art. 122 da LEP. Em outros
termos, quando se coloca em risco, na prática, a inviabilização total daquele direito, estar-se-á
diante de situação ilegal que deve ser sanada, inclusive pelo manejo do habeas corpus.
Situação semelhante ocorre no presente caso, uma vez que a manutenção dos
presos em estabelecimento extremamente distante das suas residências impede, de forma
total, o direito à convivência familiar, seja pelas visitas periódicas dos familiares à pessoa
presa, seja pelo óbice ao gozo da vista periódica ao lar em saídas temporárias.
Dessa forma, a suspensão das atividades do único estabelecimento prisional
adequado ao regime semiaberto na região sul do Estado do Espírito Santo forçou a transferência
dos apenados que lá estavam para local longínquo do seio familiar, o que gera lesão permanente
à liberdade e obsta o processo de ressocialização que estava sendo desempenhado com mais
êxito, considerando que aquela unidade prisional na cidade de Cachoeiro de Itapemirim (ES)
seguia o modelo APAC.
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DA SUPERLOTAÇÃO DAS UNIDADES DE REGIME SEMIABERTO
Conforme acima explicitado, a suspensão das atividades da APAC de Cachoeiro de
Itapemirim, que comportava apenados em cumprimento de pena no regime semiaberto, resultou
na transferência destes para a Penitenciária Estadual de Vila Velha IV (PEVV IV). Em razão da
adoção dessa medida, deixou de existir unidade prisional destinada ao regime intermediário no
sul do Estado do Espírito Santo, de forma que, para os pacientes, restou a continuidade do
cumprimento de pena nesse estabelecimento conhecido pela superlotação.
Sabe-se que a execução penal é regida pelos princípios da humanidade, legalidade,
proporcionalidade e do numerus clausus. No entanto, o encarceramento excessivo de indivíduos
em estabelecimentos dotados de celas muito pequenas, com lotação superior à capacidade com a
qual foram construídos, fere frontalmente direitos fundamentais da pessoa privada de liberdade.
Isso porque, segundo o artigo 88, alínea “b”, da Lei nº 7.210/84, o condenado será
alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório, devendo-se
atender a requisitos básicos de salubridade do ambiente, o que compreende aeração, insolação e
condicionamento térmico adequados à existência humana, bem como área mínima de 6 m² (seis
metros quadrados).
Igualmente, a Resolução nº 14/94 (Regras Mínimas para o Tratamento de Presos no
Brasil) do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), estabelece que os
presos deverão ser alojados individualmente em locais que satisfaçam as exigências de higiene,
de acordo com o clima, particularmente no que se refere à superfície mínima, volume de ar,
calefação e ventilação (artigos 8º e 9º).
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No que concerne aos alojamentos coletivos, as Diretrizes Básicas para arquitetura
penal (2011)9, elaboradas pelo Ministério da Justiça com a participação das unidades da
federação, sob a coordenação do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária,
indicam que as celas com capacidade entre 06 (seis) e 08 (oito) pessoas devem ter dimensão
mínima de 13,85 m² (treze metros quadrados e oitenta e cinco centímetros).
Contudo, em decorrência da superlotação, verificada no sistema prisional capixaba,
notadamente no regime semiaberto, o recolhimento dos apenados em espaços reduzidos acarreta
a restrição física do movimento, além de comprometer sobremaneira as condições de higiene,
saúde (inclusive a mental) e privacidade, contribuindo para o acirramento das tensões no
ambiente prisional.
Nesse sentido, explica Rodrigo Duque Estrada Roig10:
(...) na presença dela [superlotação] é difícil pensar que o preso possa
desenvolver sua personalidade no cárcere, em uma situação que já é, por
si só, fortemente despersonalizante por causa da ruptura das esferas de
autogestão do próprio corpo, do próprio tempo e da própria psique,
ruptura que, estruturalmente, se manifesta na desagregação das barreiras
que habitualmente separam as três esferas de vida fundamentais, quais
sejam, o dormir, divertir-se e trabalhar em locais diversos e com
companhias diversas.
A título de ilustração, vale consignar que, de acordo com relatório de inspeção do
Conselho Nacional do Ministério Público, de 05 de julho de 2013, a Penitenciária Estadual de
Vila Velha IV (PEVV IV) contava, na ocasião, com 900 (novecentos) presos, distribuídos em
celas com capacidade para 08 (oito) pessoas cada uma. No entanto, devido ao número excessivo
de internos, cada cela alojava cerca de 11 (onze) indivíduos (DOC. 03).
9
Disponível em:
http://www.criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/ExecucaoPenal/CNPCP/2011Diretrizes_ArquiteturaPenal_resolucao
_09_11_CNPCP.pdf
10
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal: teoria crítica. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 521.
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Em 02 de outubro de 2014, a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo, por
meio do Núcleo de Execução Penal, realizou inspeção na PEVV IV, quando verificou que havia
937 (novecentos e trinta e sete) presos. A lotação de cada cela, à época, oscilava, em média,
entre 13 (treze) e 15 (quinze) pessoas (DOC. 04). Atualmente, estando a PEVV IV com 1021
presos, consoante dados extraídos do sistema INFOPEN/ES em 26/08/2015 (DOC. 05), é
inevitável a conclusão de que o problema se agravou.
Ademais, a superlotação nas unidades de regime semiaberto capixabas reflete-se,
também, na insuficiência de oportunidades de trabalho, seja interno, seja externo, bem como de
vagas para estudo, restando, mais uma vez, violados direitos básicos da pessoa. Com efeito,
comparando-se os dados do sistema INFOPEN/ES de 26/08/2015 com os relatórios de inspeção
obtidos no sítio do Conselho Nacional de Justiça (DOC. 06), chega-se às seguintes informações:
UNIDADE
PRISIONAL
Nº total de
presos em
regime
semiaberto
Nº de
vagas de
trabalho
externo
disponíveis
Nº de
vagas de
trabalho
interno
disponíveis
Nº de
vagas de
estudo na
unidade
disponíveis
Nº de
presos que
exercem
trabalho
externo
Nº de presos
que exercem
trabalho
interno
Nº de
presos que
estudam na
unidade
PEVV IV
1017
35
59
180
35
59
180
CASCUVV
489
20
30
50
108
30
50
PSC
352
181
30
0
178
22
0
PAES
426
171
40
14
171
40
14
PSMCOL
185
98
22
43
98
22
43
PRL
405
133
36
104
133
33
104
Assim, revela-se bastante significativo o déficit de atividades oferecidas aos
apenados porquanto, para o total de 2874 presos do Estado do Espírito Santo no regime
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semiaberto, estão disponíveis apenas 1246 vagas de trabalho externo, interno ou de estudo.
Ainda, relevante destacar que na APAC de Cachoeiro de Itapemirim 100% dos apenados que
lá estavam reclusos trabalhavam internamente, sendo que 15 deles exerciam também labor
externo àquela unidade prisional.
É, pois, nítida a violação à dignidade inerente ao ser humano, sendo os sentenciados
em regime semiaberto submetidos a tratamento desumano ou degradante, proibido pela
Constituição da República (artigo 5º, III). Consequentemente, o Estado do Espírito Santo
descumpre a garantia constitucional de tutela da integridade física e moral das pessoas presas
(artigo 5º, XLIX).
Afinal, o quadro de superlotação constatado nessa unidade da federação,
principalmente nos estabelecimentos prisionais semiabertos, não tem caráter pontual nem
emergencial, mas sim estrutural e sistêmico, decorrente do mau funcionamento crônico do
sistema penitenciário. O relatório da CPI do Sistema Penitenciário (2011), promovida pela
Câmara dos Deputados, já demonstrava que, em diligências iniciadas no ano de 2007, o Espírito
Santo possuía, no total, 14.062 presos para apenas 4.819 vagas, havendo um déficit de 9.243
vagas e uma superlotação de 195%11.
Ainda que seja evidente o problema, não são propostas medidas capazes de conter a
superlotação e aprimorar as condições materiais no cárcere; ao contrário, o Estado do Espírito
Santo, com a suspensão das atividades da APAC de Cachoeiro de Itapemirim, única unidade
prisional de regime semiaberto do sul do Estado, optou pelo agravamento das condições já
desumanas e ilegais a que são submetidos os sentenciados.
O cenário observado nas unidades prisionais semiabertas do Espírito Santo condiz
com o descrito por Rogério Greco, em sua obra Direitos Humanos, Sistema Prisional E
Alternativas À Privação De Liberdade12. Senão, veja-se:
11
12
Disponível em: http://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/2701
GRECO, Rogério. Direitos Humanos, Sistema Prisional E Alternativas À Privação De Liberdade. capítulo 10.6.
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A pena de privação de liberdade, em muitos lugares e situações, virou,
portanto, uma pena-castigo. Assim, quanto maior a dor, quanto maior o
sofrimento, quanto mais distante o delinquente permanecesse do convívio
social, melhor seria. Sua finalidade, portanto, era amedrontar, e não
ressocializar; era inocuizar, e não reintegrar.
(...)
Nas cadeias e nos presídios superlotados, os presos são jogados nas celas
como se fossem animais. O espaço interno é disputado com violência. Os
mais fracos ocupam os piores lugares. Muitas vezes, não têm onde
dormir. Celas que comportariam, coletivamente, até 4 presos abrigam,
muitas vezes, 20 ou mais pessoas.
Nesse contexto, o fenômeno da superlotação alerta para a necessidade de se adotar
uma medida de combate à “cultura do encarceramento” que se mostra evidente e incorporada à
sociedade brasileira, inclusive no âmbito judiciário, já tendo sido inclusive criticada e apontada
pelo ex-Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, como um dos maiores
problemas do sistema judicial.
Para tanto, é imprescindível a efetiva observância do sistema do numerus clausus,
o qual estabelece um equilíbrio entre a entrada e a saída de apenados do sistema prisional,
evitando-se, assim, a superlotação de presídios. Em suma, o princípio determina que a inserção
de um indivíduo no sistema prisional deve corresponder à saída de um outro.
Desse modo,
busca-se o respeito aos direitos fundamentais também na execução das penas privativas de
liberdade.
Oportuno recordar que “Nas democracias, mesmo os criminosos são sujeitos de
direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas,
inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (...)”.13
13
HC 91333/MG SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. JULGADO EM 09/10/2007, PUBLICADO EM 19/12/2007.
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No entender dos signatários, o sistema jurídico deve se preocupar em tutelar os
direitos dos mais vulneráveis e, por certo, em sede de execução penal o mais frágil é o
condenado (ensinamentos de Ferrajoli por demais repetidos).
Cabe ressaltar, ainda, que o numerus clausus ultrapassa a noção de mero sistema
organizacional que se restringe ao controle do número de saídas em função do número de
entradas dos apenados, promovendo, inclusive, a restituição da dignidade no cumprimento das
sanções penais.
Na realidade, a importância da implementação desse sistema decorre justamente do
seu alcance ao contexto social por meio da redução da população carcerária, e não da criação de
novas vagas. Afinal, a construção ou ampliação de novos estabelecimentos penais não é a
solução para o refreamento do quadro de superlotação.
Nilo Batista, aliás, combate veementemente a ampliação dos complexos
penitenciários, asseverando que “a adoção do princípio do numerus clausus, a par dos óbvios
benefícios para a convivência penitenciária, deslocaria os investimentos estatais da infecunda
construção de mais e mais presídios para programas de controle e auxílio aos egressos („clínica
da vulnerabilidade‟)”14.
Tampouco se revela razoável a transferência dos pacientes para algum outro
estabelecimento prisional em condições de superlotação menos alarmantes, como bem alerta
Roig15:
Outra premissa, essencial ao sucesso do sistema do numerus clausus,
consiste na vedação de que a Administração Penitenciária se valha do
poder de transferência entre estabelecimentos para, cumprindo
momentaneamente uma decisão judicial, deslocar o problema da
superlotação para outra unidade penal. Tal conduta significaria na
verdade o mascaramento da realidade, uma burla ao sistema do numerus
clausus.
14
15
BATISTA, Nilo. Novas tendências do Direito Penal. Rio de Janeiro: Revan, 2004, p. 92.
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal: teoria crítica. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 90.
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No contexto internacional, o referido princípio vem sendo reiteradamente adotado:
em 22/02/2011, o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha16, apreciando o caso de um
indivíduo mantido preso durante 151 dias, enclausurado por períodos diários de 23 a 24 horas
numa cela coletiva de 8 m², com sanitário, decidiu que, se o estado de reclusão é desumano e as
formas de solução se revelarem irrealizáveis, a execução deve ser interrompida, em observância
ao princípio da dignidade da pessoa humana; em 23/05/2011, a Suprema Corte dos Estados
Unidos17, posicionando-se pela possibilidade de o Poder Judiciário determinar a limitação do
número de presos em estabelecimentos penais, manteve decisão da Corte Federal da Califórnia
proferida com fundamento nas péssimas condições sanitárias e na insuficiente assistência
médica, causadas pela superlotação nas prisões estaduais da Califórnia.
No exercício de suas atribuições constitucionais e legais, a Defensoria Pública vem
sistematicamente sustentando perante as Varas de Execuções Penais que o Poder Judiciário pode
e deve assumir postura pró-ativa, de forma a compelir o gestor público a adotar as políticas que
respeitem os direitos insculpidos em nosso ordenamento jurídico. Do contrário, estará
chancelando a omissão e justificando o inconstitucional argumento de que a falta de
verbas/gestão é motivo suficiente para a violação dos direitos humanos.
E, no caso em apreço, assim o faz por entender, na esteira das lições de Roig, que o
sistema do numerus clausus “deveria ser fundamentalmente operacionalizado no âmbito do
Poder Judiciário, responsável pela tutela de direitos e controle da legalidade”18.
Aliás, a própria Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (Pacto de San José
da Costa Rica) prevê que, em casos de violação, deverá haver um sistema adequado e forte de
proteção judicial:
“Artigo 25º - Proteção judicial
16
Sentença 1BvR 409/09, do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha.
Disponível em: http://www.supremecourt.gov/Search.apsx?FileName=/docketfiles/09-1233.htm.
18
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal: teoria crítica. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 95.
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1. Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer
outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a
proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais
reconhecidos pela constituição, pela lei ou pela presente Convenção,
mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam
atuando no exercício de suas funções oficiais.”
Nesse sentido, o presente remédio constitucional serve à aplicação do numerus
clausus em sua modalidade direta, por meio do deferimento da prisão domiciliar em favor dos
sentenciados que cumpriam pena no regime semiaberto anteriormente na APAC de Cachoeiro de
Itapemirim e, devido ao estado de superlotação do regime intermediário em todo o Estado do
Espírito Santo, agravado pelo fechamento do referido estabelecimento, foram obrigados a
compor a cifra de 1021 pessoas confinadas em condições subumanas na PEVV IV – unidade
prisional com espaço limitado a 604 indivíduos.
Saliente-se que o pleito de concessão de prisão domiciliar tem farto
embasamento legal, doutrinário e jurisprudencial. A propósito, traz-se novamente à colação o
posicionamento de Roig sobre o tema19:
Analisando-se com atenção, é possível perceber que a concessão de
prisão domiciliar como medida reparatória da ilegalidade da prisão sob
condições de superlotação segue as mesmas premissas da autorização de
prisão domiciliar diante da inexistência de Casa de Albergado ou da falta
de vagas na mesma. Tais premissas são basicamente as seguintes: a) por
cultado do Estado o condenado não vem cumprindo sua pena da forma
legalmente prevista; b) em respeito à humanidade das penas, o
condenado não pode permanecer em regime mais gravoso, ou sob
condições mais severas, do que foi fixado em decisão judicial.
A respeito da questão, há, inclusive, um posicionamento do ministro do Supremo
Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, que argumenta: “a prisão domiciliar é uma alternativa
19
ROIG, Rodrigo Duque Estrada. Execução Penal: teoria crítica. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 99/100.
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humanitária para lidar com o déficit de estabelecimentos adequados e de vagas no sistema
penitenciário. Contudo ela não perde sua natureza de pena privativa de liberdade”20.
O Superior Tribunal de Justiça, na mesma linha, manifestou-se, em julgado
do ano de 2015, pela admissibilidade da prisão domiciliar na hipótese de ausência de vaga
em estabelecimento prisional adequado ao regime de cumprimento de pena em decorrência
da superlotação. Senão, veja-se:
EXECUÇÃO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS
CORPUS. WRIT SUBSTITUTIVO. RECORRENTE PROGREDIDO
AO REGIME SEMIABERTO. PERMANÊNCIA EM SITUAÇÃO
MAIS GRAVOSA. SUPERLOTAÇÃO E PRECARIEDADE DO
ESTABELECIMENTO PENAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL DE PRISÃO EM REGIME
ABERTO OU DOMICILIAR. RECURSO PROVIDO. 1. É ilegal a
submissão do apenado a um regime mais gravoso do que o fixado na
execução penal por omissão estatal e falta de estabelecimentos
prisionais adequados. 2. Recurso provido para, confirmando a liminar,
determinar que seja o recorrente transferido para estabelecimento
compatível com o regime semiaberto; na ausência de vaga, que
aguarde em regime aberto; a persistir o constrangimento ilegal, sejalhe assegurada a prisão domiciliar até o surgimento de vaga no
regime intermediário, se por outro motivo não estiver preso.
(STJ - RHC: 52315 SP 2014/0257295-7, Relator: Ministro ROGERIO
SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 10/03/2015, T6 - SEXTA
TURMA, Data de Publicação: DJe 17/03/2015)
O precedente acima coaduna-se com perfeição ao caso concreto na medida em que
há um déficit evidente no número de vagas destinadas ao regime semiaberto do sistema prisional
do Estado do Espírito Santo.
Saliente-se que esse é o entendimento há muito sustentado tanto pelo Supremo
Tribunal Federal, quanto pelo Superior Tribunal de Justiça, nos casos de inexistência de vagas no
20
PROGRESSÃO DE REGIME NA EXECUÇÃO PENAL 21 DISTRITO FEDERAL, RELATOR : MIN.
ROBERTO BARROSO, data do julgamento: 02/12/2014.
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regime prisional fixado na sentença condenatória ou definido em decisão de progressão de
regime, como se percebe nos precedentes abaixo:
"PENA - CUMPRIMENTO - REGIME SEMIABERTO. Incumbe ao
Estado aparelhar-se visando à observância irrestrita das decisões
judiciais. Se não houver sistema capaz de implicar o cumprimento da
pena em regime semiaberto, dá-se a transformação em aberto e,
inexistente a casa do albergado, a prisão domiciliar." (HC nº 96169, 1ª
Turma do STF., Rel. Ministro Marco Aurélio, j. em 25/08/2009).
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO
PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME DEFERIDA PELO JUÍZO DAS
EXECUÇÕES. AUSÊNCIA DE VAGA EM ESTABELECIMENTO
COMPATÍVEL COM O REGIME PRISIONAL SEMIABERTO.
CUMPRIMENTO
DA
PENA
EM
REGIME
FECHADO.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL DEMONSTRADO. DESVIO DE
FINALIDADE DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. PRISÃO
DOMICILIAR.
EXCEPCIONALIDADE.
CABIMENTO.
PRECEDENTES
DESTA
CORTE
SUPERIOR.
NÃO
APRESENTAÇÃO
DE
ARGUMENTOS
NOVOS
PELO
AGRAVANTE PARA INVALIDAR A DECISÃO AGRAVADA.
MANUTENÇÃO POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. Esta
Corte Superior de Justiça tem entendido que a ineficiência do Estado
em assegurar instituições em condições adequadas ao cumprimento
de pena em regime semiaberto autoriza, ainda que
excepcionalmente, a concessão da prisão domiciliar. A superlotação e
a precariedade do estabelecimento penal, é dizer, a ausência de
condições necessárias ao cumprimento da pena em regime
semiaberto, permite ao condenado a possibilidade de ser colocado em
prisão domiciliar, até que solvida a pendência, em homenagem aos
princípios da dignidade da pessoa humana, da humanidade das penas e da
individualização da pena. 2. O agravante não apresentou argumentos
novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão
agravada, razão que enseja a negativa de provimento ao agravo
regimental. 3. Agravo regimental improvido.
(STJ - AgRg no HC: 275742 RS 2013/0273754-2, Relator: Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Julgamento: 10/09/2013, T6 SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/09/2013).
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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO.
CONDENAÇÃO NO REGIME INICIAL FECHADO. PROGRESSÃO
PARA O REGIME SEMI-ABERTO. PRÉVIA OITIVA DO
MINISTÉRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA. VÍCIO FORMAL A QUE O
CONDENADO NÃO DEU CAUSA. MANIFESTAÇÃO POSTERIOR
DO PARQUET. SUFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE VAGAS NO
REGIME SEMI-ABERTO. CONCESSÃO DE PRISÃO DOMICILIAR.
POSSIBILIDADE.
EXCEPCIONALIDADE
CARACTERIZADA.
ACÓRDÃO ESTADUAL EM
CONSONÂNCIA COM
A
JURISPRUDÊNCIA
DO
STJ.
AGRAVO
REGIMENTAL
IMPROVIDO. 1. Ainda que ausente a prévia manifestação do Ministério
Público acerca do pleito de progressão de regime prisional (§ 1º, do art.
112 da Lei nº 7.210/84), esta Corte possui o entendimento de que não se
mostra razoável determinar o retorno do apenado ao regime mais
gravoso, pois ele não pode ser prejudicado com a nulidade à qual não deu
causa, sendo válido, nesse caso, a manifestação ministerial a posteriori. 2.
Na falta de vagas em estabelecimento compatível ao regime fixado na
condenação ou deferido em sede de progressão prisional, configura
constrangimento ilegal a submissão do réu ao cumprimento de pena em
regime mais gravoso, devendo o mesmo cumprir a reprimenda em
regime aberto, ou em prisão domiciliar, na hipótese de inexistência
de casa de albergado (HC 210.448/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson
Dipp, DJe de 24.4.2012). 3. Agravo regimental improvido.
(STJ - AgRg no REsp: 1364215 SE 2013/0033025-8, Relator: Ministro
CAMPOS MARQUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO
TJ/PR), Data de Julgamento: 02/05/2013, T5 - QUINTA TURMA, Data
de Publicação: DJe 08/05/2013)
[...] 1. Esta Corte Superior de Justiça tem entendido que a ineficiência do
Estado em assegurar instituições em condições adequadas ao
cumprimento de pena em regime semiaberto autoriza, ainda que
excepcionalmente, a concessão da prisão domiciliar. A superlotação e a
precariedade do estabelecimento penal, é dizer, a ausência de condições
necessárias ao cumprimento da pena em regime semiaberto, permite ao
condenado a possibilidade de ser colocado em prisão domiciliar, até que
solvida a pendência, em homenagem aos princípios da dignidade da
pessoa humana, da humanidade das penas e da individualização da pena.
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_______________________________________________________________________________
[...] (AgRg no HC 275.742⁄RS, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ªT.,
DJe 24⁄9⁄2013)
Seguem a orientação do STF e do STJ os Tribunais de Justiça Estaduais:
RECURSO DE AGRAVO - INTERPOSIÇÃO PELO MINISTÉRIO
PÚBLICO - DECISÃO DO JUÍZO DA EXECUÇÃO QUE
CONCEDEU PRISÃO DOMICILIAR, MEDIANTE CONDIÇÕES,
A APENADO EM REGIME SEMIABERTO, DIANTE DA
AUSÊNCIA DE VAGA EM ESTABELECIMENTO ADEQUADO PEDIDO DE REFORMA DO DECISUM COM A APLICAÇÃO DAS
MEDIDAS DE HARMONIZAÇÃO DECORRENTES DO ITEM 7.3.2
DO CNCGJ - NÃO ACOLHIMENTO - MANOBRA DO JUÍZO
SINGULAR QUE SE AFIGUROU ESCORREITA, ANTE AS
PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO - DECISÃO QUE
JUSTIFICOU A AUTORIZAÇÃO À PRISÃO DOMICILIAR EM
FACE DA SUPERLOTAÇÃO NOS ESTABELECIMENTOS
PRISIONAIS LOCAIS, DA INVIÁVEL POSSIBILIDADE DE
HARMONIZAÇÃO DO REGIME SEMIABERTO COM A
APLICAÇÃO DO ITEM 7.3.2 DO CNCGJ, E DA INEXISTÊNCIA DE
UNIDADES EXCLUSIVAS DE REGIME SEMIABERTO, BEM
COMO DE CASA DE ALBERGADO NA COMARCA PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA E DOS TRIBUNAIS
SUPERIORES - DECISÃO MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO MAIORIA DE VOTOS. (TJPR - 4ª C.Criminal - RA - 1336087-7 - Foz
do Iguaçu - Rel.: Renato Naves Barcellos - Por maioria - - J. 16.07.2015)
AGRAVO
EM
EXECUÇÃO.
REGIME
ABERTO.
EXCEPCIONALIDADE. PRISÃO DOMICILIAR. Embora o regime
aberto não preveja na sua forma de execução as condições da prisão
domiciliar, estas podem ser adotadas pelo juízo da execução em casos
excepcionais e fundamentadamente quando não houver casa de albergado
na Comarca e o estabelecimento prisional não apresentar as condições
estruturais exigidas na lei, houver superlotação e não for oportunizado
ao reeducando tratamento penal individualizado. Evita-se, assim,
transferir ao condenado os perversos efeitos do descaso e da
ineficiência do poder público diante do insolúvel problema do
encarceramento. No caso em apreço, não há vagas em estabelecimento
prisional compatível com o cumprimento da pena no regime aberto,
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restando caracterizado o constrangimento ilegal a submissão do preso a
condições não autorizadas pela legislação em vigor. Direito de
cumprimento da pena no regime adequado, em condições de
ressocialização. Ausentes estas premissas, caracterizada a violação dos
princípios da legalidade e da individualização da pena. Precedente do
STJ. POR MAIORIA, AGRAVO MINISTERIAL DESPROVIDO.
(Agravo Nº 70052284551, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Francesco Conti, Julgado em 30/01/2013)
Posto isso, cumpre ser deferido o pedido constante do presente remédio
constitucional contra ato do Ilmo. Sr. Secretário de Justiça do Espírito Santo, pois as deficiências
estatais, inclusive a histórica ausência de planejamento do sistema prisional, não podem ser
eternas justificativas para a imposição de tratamento desumano e degradante aos apenados.
DOS DIREITOS DA PESSOA PRESA E DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO:
Sabe-se que tanto a legislação pátria quanto a internacional elencam diversos direitos
da pessoa presa que devem ser seguidos pela Administração Pública.
A lei de execução penal e as regras mínimas para o tratamento de prisioneiros, da
Organização das Nações Unidas, são exemplos desses diplomas que preconizam como direitos
básicos e fundamentais da pessoa presa o cumprimento de pena em celas condignas, a
alimentação balanceada e de qualidade, a educação, o trabalho, a assistência médica,
odontológica e psicossocial, o convívio com a família, dentre outros. Relevante a transcrição de
alguns deles:
Lei de Execução Penal:
“Art. 41 - Constituem direitos do preso:
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I - alimentação suficiente e vestuário;
II - atribuição de trabalho e sua remuneração;
III - Previdência Social;
IV - constituição de pecúlio;
V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o
descanso e a recreação;
VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e
desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena;
VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e
religiosa;
VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo;
IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado;
X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias
determinados;
XI – (...).” (grifo nosso)
Regras Mínimas Para o Tratamento de Prisioneiros:
Locais destinados aos presos
9.(...).
10. Todos os locais destinados aos presos, especialmente aqueles que se
destinam ao alojamento dos presos durante a
noite, deverão satisfazer as exigências da higiene, levando-se em conta
o clima, especialmente no que concerne ao volume de ar, espaço
mínimo, iluminação, aquecimento e ventilação.
11. Em todos os locais onde os presos devam viver ou trabalhar:
a.As janelas deverão ser suficientemente grandes para que os presos
possam ler e trabalhar com luz natural, e deverão estar dispostas de
modo a permitir a entrada de ar fresco, haja ou não ventilação artificial.
b.A luz artificial deverá ser suficiente para os presos poderem ler ou
trabalhar sem prejudicar a visão.
12. As instalações sanitárias deverão ser adequadas para que os presos
possam satisfazer suas necessidades naturais no momento oportuno,
de um modo limpo e decente.
13. As instalações de banho deverão ser adequadas para que cada preso
possa tomar banho a uma temperatura adaptada ao clima, tão
freqüentemente quanto necessário à higiene geral, de acordo com a
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estação do ano e a região geográfica, mas pelo menos uma vez por
semana em um clima temperado.
14. Todos os locais de um estabelecimento penitenciário freqüentados
regularmente pelos presos deverão ser mantidos e conservados
escrupulosamente limpos.
Alimentação
20.
1.A administração fornecerá a cada preso, em horas determinadas,
uma alimentação de boa qualidade, bem preparada e servida, cujo
valor nutritivo seja suficiente para a manutenção da sua saúde e das suas
forças.
Serviços médicos
22.
1.Cada estabelecimento penitenciário terá à sua disposição os
serviços de pelo menos um médico qualificado, que deverá ter certos
conhecimentos de psiquiatria. Os serviços médicos deverão ser
organizados em estreita ligação com a administração geral de saúde da
comunidade ou nação. Deverão incluir um serviço de psiquiatria para o
diagnóstico, e em casos específicos, para o tratamento de estados de
anomalia.
Biblioteca
40. Cada estabelecimento prisional terá uma biblioteca para o uso de
todas as categorias de presos, devidamente provida com livros de
recreio e de instrução, e os presos serão estimulados a utilizá-la.
57. A prisão e outras medidas cujo efeito é separar um delinquente do
mundo exterior são dolorosas pelo próprio fato de retirarem do indivíduo
o direito à auto-determinação, privando-o da sua liberdade. Logo, o
sistema prisional não deverá, exceto por razões justificáveis de
segregação ou para a manutenção da disciplina, agravar o sofrimento
inerente a tal situação.
63.
1.Estes princípios exigem a individualização do tratamento que, por sua
vez, requer um sistema flexível de classificação dos presos em grupos.
Portanto, convém que os grupos sejam distribuídos em
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estabelecimentos distintos, onde cada um deles possa receber o
tratamento necessário.
Trabalho
71.
1.(...).
2.Todos os presos condenados deverão trabalhar, em conformidade
com as suas aptidões física e mental, de acordo com a determinação do
médico.
3.Trabalho suficiente de natureza útil será dado aos presos de modo
a conservá-los ativos durante um dia normal de
trabalho. (...)
Educação e recreio
77.
1.Serão tomadas medidas para melhorar a educação de todos os presos
em condições de aproveitá-la, incluindo instrução religiosa nos países em
que isso for possível. A educação de analfabetos e presos jovens será
obrigatória, prestando-lhe a administração especial atenção. (...)
Relações sociais e assistência pós-prisional
79. Será prestada especial atenção à manutenção e melhora das
relações entre o preso e sua família, que se mostrem de maior
vantagem para ambos.(...).” (grifo nosso)
Tais dispositivos, por evidente, devem ser interpretados conjuntamente com a
determinação de que a execução penal tem por objetivo, inclusive, proporcionar condições para a
harmônica integração social do condenado e do internado (artigo 1º da LEP) com respeito a
todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei (artigo 3º da LEP).
Nessa perspectiva, cumpre recordar que a Constituição do Estado do Espírito Santo
assim prevê:
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“Art. 132. A política penitenciária estadual visa assegurar a promoção e
valorização do indivíduo encarcerado, sua reintegração social, a
garantia dos seus direitos e a defesa de sua integridade física, psíquica e
mental no período de cumprimento da pena.
§ l ° (...).
§ 2° Para garantia do disposto no caput deste artigo, o Poder Público
assegurará ao encarcerado:
I - celas condignas para o cumprimento da pena, em quaisquer dos
regimes previstos na legislação federal;
II - assistência jurídica, médica, odontológica, farmacêutica e psicosocial;
III - aprendizado profissional e trabalho produtivo com remuneração
justa;
IV - visita e convívio com os familiares, na forma da lei;
V - alimentação condigna e higiene;
VI - educação, desporto e lazer;
VII – (...).” (grifo nosso)
Não bastasse, normas de mesmo conteúdo trazidas pela Convenção Americana de
Direitos Humanos (artigo 5º, itens 1, 2 e 6) e pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos da Organização das Nações Unidas (artigos 7º e 10), ambos recepcionados pelo
ordenamento jurídico brasileiro com status supralegal, são sistematicamente desobedecidas pelo
Estado do Espírito Santo.
Da breve análise das citadas legislações decorre a conclusão do flagrante
descumprimento, pela Administração Pública, das disposições nelas contidas, principalmente
quando analisadas perante o contexto fático das unidades prisionais brasileiras, em destaque, as
localizadas no estado do Espírito Santo.
É patente a constatação de que, em grande parte das penitenciárias capixabas, são
mínimos os quantitativos de sentenciados a que são oportunizados estudo e trabalho. São
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patentes, também, a superlotação e a ausência de vagas em unidades prisionais adequadas ao
cumprimento de pena em regime semiaberto o que, por sua vez, acarreta em precárias condições
estruturais de grande parte das celas e galerias, inviabilizando a execução da pena com dignidade
e de acordo com os direitos garantidos pela legislação vigente.
Neste contexto, passa a ter grande destaque a existência de unidades prisionais que
garantam aos presos os direitos aqui citados. No Brasil, atualmente, há cerca de 100 unidades
prisionais que adotam uma sistemática que, de fato, efetiva os direitos dos presos. São as
denominadas APACs (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), que operam como
entidades auxiliares do Poder Judiciário e do Poder Executivo na execução penal e na
administração do cumprimento das penas privativas de liberdade.
Para a aplicação da pena, o Código Penal, em seu art. 59, adotou a teoria mista ou
eclética, na qual a sanção penal deve ter, além do caráter punitivo, o caráter preventivo, com o
objetivo de fornecer meios de (re)inserção da pessoa presa. E as APACs têm como objetivo,
justamente, a humanização das prisões através do oferecimento de alternativas para a efetivação
dessa inserção, cumprindo, portanto, as funções declaradas da pena.
Desta feita, utilizam método de valorização humana em que o trabalho, a
assistência jurídica, a assistência à saúde, a alimentação balanceada e de qualidade, a
educação e o convívio com a família são elementos essenciais para o cumprimento da pena,
como se observa do folheto de apresentação da APAC elaborado pela SEJUS (DOC. 07).
O trabalho é tido como elemento fundamental para o cumprimento da pena, sendo
que
são
oferecidas
oportunidades
de
atividades
laborterápicas,
além
de
oficinas
profissionalizantes instaladas dentro da própria unidade e de trabalho externo. Destaca-se que
toda a pessoa que cumpre pena na APAC desenvolve algumas dessas atividades.
Ainda, são proporcionadas assistência médica, psicológica e odontológica, pois tais
necessidades são encaradas como vitais à execução da pena, e com isso, estão em primeiro
plano. Inclusive, há trabalho de prevenção e tratamento para dependentes químicos.
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A educação e o estudo fazem parte do contexto de valorização humana da pessoa que
cumpre pena e, portanto, são oferecidas vagas de estudo aos sentenciados, além de diversos
cursos.
Em relação à alimentação, há prioridade no fornecimento de refeições de qualidade e
balanceadas, sendo que, em regra, essas refeições são produzidas na própria unidade, pelos
internos, com acompanhamento de nutricionista, que elabora cardápios variados e de acordo com
as necessidades de determinadas pessoas que possuem alguma restrição alimentar.
A família da pessoa que cumpre pena é considerada de extrema importância. Com
isso, há a necessidade da integração entre o apenado e seus familiares, como parte do processo
de inserção social. Assim, as visitas sociais são semanais, e duram, aproximadamente, 05 (cinco)
horas. Ademais, não há limitação de parentesco nem de número de visitantes, como ocorre nas
demais unidades prisionais. A visita íntima é considerada mecanismo de inserção social e de
manutenção do vínculo afetivo familiar e, portanto, ocorre em quartos apropriados e no período
de pernoite (das 18h às 06h).
Ressalta-se que no Estado do Espírito Santo havia somente uma unidade prisional
que seguia o método APAC, localizada na cidade de Cachoeiro de Itapemirim, em que 89
(oitenta e nove) pessoas presas cumpriam pena em regime semiaberto.
Na UP eram fornecidas atividades laborterápicas, como a confecção de quadros de
pintura e mosaicos com azulejos, além de atividades internas (piscicultura, criação de patos e
galinhas, horta, fábrica de sabão) e externas, e, com isso, o trabalho era oportunizado para a
maioria dos sentenciados. Importa destacar que eram as pessoas que ali cumpriam pena que
desenvolviam atividades internas como a vigilância da UP, a limpeza e a elaboração das
refeições na cozinha, dentre muitas outras.
Como apontado, na APAC de Cachoeiro de Itapemirim também existiam vagas de
estudo para grande parte dos apenados, além de diversos cursos técnicos.
Ocorreu que, como já relatado, em 24 de agosto de 2015 foi determinado pela
Secretária de Justiça do Estado do Espírito Santo a suspensão do convênio celebrado entre o
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Estado e a APAC e, em consequência, a unidade foi fechada e 87 (oitenta e sete) pessoas que
nela estavam custodiadas foram transferidas pela Penitenciária Estadual de Vila Velha IV –
PEVV IV.
Como aqui também já destacado, grande parte das unidades prisionais do Estado,
além de apresentarem superlotação, não possuem condições para o adequado cumprimento de
pena em regime semiaberto, sendo que a PEVV IV é o estabelecimento que mais se desvia do
que deveria ser um semiaberto.
Desta feita, com a suspensão do convênio e a transferência dos apenados para a
PEVV IV houve flagrante retrocesso aos direitos já concedidos e efetivados às 87 (oitenta e
sete) pessoas presas que cumpriam pena na APAC de Cachoeiro de Itapemirim.
Na realidade do Estado Social de Direito, o legislador regulamenta os direitos sociais
constitucionalmente assegurados e que deverão ser implementados pelas políticas públicas.
Concretizado o direito, este não mais poderá ser diminuído ou esvaziado. E, com isso, impede-se
que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em
que ele vive. É o que a doutrina e a jurisprudência pátria denominam de princípio da vedação
ao retrocesso ou efeito cliquet. 21
Ao serem implementados, os direitos sociais passam a constituir, simultaneamente,
uma garantia institucional e um direito subjetivo, essencial à existência mínima inerente ao
respeito pela dignidade da pessoa humana. Por conseguinte, há uma limitação da reversibilidade
desses direitos adquiridos.
Desta feita, o reconhecimento desta proteção de direitos prestacionais subjetivamente
adquiridos passa a constituir um limite jurídico do legislador e, ao mesmo tempo, uma obrigação
de persecução de uma política congruente com os direitos concretos e as expectativas
subjetivamente alicerçadas. Assim, a violação no núcleo essencial efetivado deverá ser tida como
21
(GILMAR FERREIRA MENDES, INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO e PAULO GUSTAVO GONET
BRANCO, “Hermenêutica Constitucional e Direitos Fundamentais”, 1ª ed./2ª tir., p. 127/128, 2002, Brasília
Jurídica; J. J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional e Teoria da Constituição”, p. 320/322, item n. 03,
1998.).
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inconstitucional, uma vez que se a Constituição impõe ao Estado a realização de uma
determinada tarefa, sendo esta realizada, o resultado passa a ser a proteção direta da
Constituição. O Estado, consequentemente, não poderá retroceder, descumprir o que cumpriu. E,
se assim o fizer, incorrerá em violação positiva da Constituição.22
Todo o exposto demonstra a ocorrência de retrocesso dos direitos conquistados e
efetivados à pessoa presa que cumpria pena na APAC de Cachoeiro de Itapemirim. Aos
apenados que lá estavam custodiados foram efetivados diversos direitos das pessoas condenadas
previstos na legislação pátria e internacional, e que, ressalte-se, deveriam ser concedidos a todos
os sentenciados que cumprem pena em estabelecimentos prisionais e não o são.
Os sentenciados que cumpriam pena na APAC de Cachoeiro de Itapemirim
trabalhavam, estudavam, tinham assistência médica, odontológica e psicossocial, conviviam com
a família, recebiam alimentação de qualidade e permaneciam em celas com boas condições
estruturais. Ao serem transferidos para a PEVV IV perderam todos os direitos que lhe foram
garantidos e efetivados, sem que, para tanto, tenham dado causa a essa perda.
Neste contexto, e tendo em vista a impossibilidade de manutenção das 87 (oitenta
e sete) pessoas presas que estavam na APAC de Cachoeiro de Itapemirim em UP que também
possibilite a efetivação de todos os direitos concedidos e adquiridos pelos apenados – uma vez
que não há, no Estado do Espírito Santo, presídio que ofereça as mesmas condições ao
cumprimento da pena – tem-se por medida adequada e que não configure o retrocesso, a
concessão de prisão domiciliar.
22
STF – ARE 7 ARE 745745 AgR / MG - MINAS GERAIS. Relator Min. CELSO DE MELLO. 2ª Turma. Publi.
19/12/2014.
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DO PEDIDO
Diante de todo o exposto, com fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII da
Constituição Federal, combinado com o artigo 647 do Código de Processo Penal, REQUER-SE a
concessão da presente ordem de habeas corpus, LIMINARMENTE, em favor de todos os
pacientes qualificados no preâmbulo, aplicando-se o princípio do numerus clausus em sua
modalidade direta, por meio do deferimento da prisão domiciliar em favor dos sentenciados
que cumpriam pena no regime semiaberto anteriormente na APAC de Cachoeiro de
Itapemirim, a fim de que lhes seja garantido o direito de aguardarem em prisão domiciliar o
surgimento de vaga em estabelecimento adequado e compatível com o referido regime e em
local próximo à residência de seus familiares. No mérito, pugna-se pela confirmação do pedido
liminar.
Vila Velha para Vitória, 28 de agosto de 2015.
Ana Luisa Robazzi
Daniel Reis
David Saboya de Albuquerque
Defensoria Pública
Defensor Público
Defensor Público
Mariah Soares da Paixão
Defensora Pública
Rafael Amorim
Roberta Ferraz
Defensor Público
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Rochester Araújo
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núcleo de execução penal excelentíssimo senhor desembargador