[ESPAÇO GRUPO HPA SAÚDE] Cardiologia de Inter venção nas doenças das válvulas Mais segura, mais funcional, menos dolorosa A FEVEREIRO 2015 < s doenças cardiovasculares permanecem como a principal causa de morte no mundo. O último relatório da OCDE dava conta que estas doenças foram responsáveis por 40% da totalidade de morte na Europa, cujo valor isolado por doença foi liderado pela cardiopatia isquémica, com 18 por cento. Apesar dos esforços a nível mundial na prevenção primária e secundária da doença cardiovascular, a OMS prevê que, em 2030, esta condição permaneça como a principal causa de morte e uma importante causa de incapacidade. O advento da Cardiologia de Intervenção, onde se inclui a Implantação Percutânea de Válvulas Cardíacas, a par da Cirurgia Cardíaca Minimamente Invasiva, transformou em poucos os anos o percurso de vida dos doentes cardíacos, com resultados brilhantes ao nível da sua sobrevida, mas também do seu bem-estar. > 12 DEFICIÊNCIAS VALVULARES O coração pode definir-se como uma bomba muscular do tamanho do punho, que bombeia continuamente o sangue para o distribuir pelo corpo. É formado por quatro compartimentos ou câmaras: duas aurículas e dois ventrículos. Cada ventrículo tem uma válvula de entrada e outra de saída. As deficiências nas válvulas podem fazer com que não abram corretamente, o que dificulta a passagem do sangue, situação mais comum e chamada de estenose valvular (EV); ou que não fechem completamente e haja uma perda ou regurgitação, o caso da insuficiência valvular; ou ainda uma combinação das duas, a dupla lesão valvular. Os problemas com as válvulas cardíacas são causados, na maioria dos casos, por alterações congénitas, febre reumática, infeções ou ainda por causas degenerativas dos tecidos associadas à idade. A válvula aórtica tem como função não permitir que o sangue, após ter sido bombeado pelo coração, reflua para trás (para o ventrículo esquerdo), permitindo que chegue em volume e pressão adequados a todos os tecidos. Na presença da estenose ou estrangulamento da válvula aórtica, o sangue tem dificuldade em passar, manifestando-se esta deficiência, em termos de sintomatologia, por fadiga, dor no peito, dificuldade em respirar para pequenos esforços ou até desmaio. A EA quando presente na infância é considerada uma malformação congénita, enquanto na idade adulta surge por deterioração progressiva, por exemplo por acumulação de cálcio nas paredes da válvula ou após um episódio de febre reumática. A EA tem habitualmente uma evolução lenta e assintomática. No entanto, em estados avançados de degradação da válvula, esta condição evolui rapidamente, associando-se a uma mortalidade de cerca de 50% dois anos após o início dos sintomas; ou mesmo de 50% após um ano, quando coexistem sintomas de insuficiência cardíaca. A estenose valvular é uma das doenças mais comuns na população idosa, tendo uma prevalência de cerca de 4% acima dos 75 anos e correspondendo a 40% de todas as valvulopatias diagnosticadas. Em Portugal, estima-se que esta condição afete mais de 30.000 pessoas, número que tenderá a aumentar de acordo com a previsibilidade que possuímos acerca do envelhecimento populacional. As melhorias oferecidas pela medicação são limitadas, além de não evitarem a progressão nem as complicações mais graves. Nesse sentido, até há pouco tempo o tratamento da EA grave passava pela cirurgia de peito aberto, com a substituição da válvula por uma prótese (biológica ou mecânica). REVOLUÇÃO NA ABORDAGEM MÉDICA O Implante Percutâneo ou Transcatéter da Válvula Aórtica veio revolucionar a abordagem desta condição, ao proporcionar a substituição não-cirúrgica da válvula em doentes com EA grave inoperável ou que apresentam um risco muito elevado para a cirurgia de coração aberto. O tratamento consiste, tal como o nome indica, na implantação percutânea (geralmente através de pequena incisão de poucos milímetros na virilha) de uma prótese valvular biológica aplicada sobre um stent metálico. Este procedimento apresenta-se mais seguro, pois não possui o risco do gesto cirúrgico e anestésico, além de permitir uma recuperação substancialmente mais rápida, aliada a um impacto muito favorável na qualidade de vida. Contudo, esta técnica exige um conjunto de equipamentos que não está presente na maioria das unidades de saúde, fazendo com que grande parte dos doentes que necessitam e beneficiariam com esta intervenção fiquem vetados desta oportunidade. Aliás, o acesso a este tratamento tem assimetrias consideráveis em toda a Europa, sendo que em Portugal esse desfasamento é ainda mais significativo. Relatórios recentes referem que temos a menor taxa de implantes por milhão de habitantes e que só 5% dos candidatos a esta intervenção chegam efetivamente a ter esta possibilidade. O Laboratório de Hemodinâmica do Hospital de Alvor tem vindo a desenvolver esta técnica com resultados muito positivos, cuja casuística será apresentada no próximo congresso nacional. REPARAÇÃO DA VÁLVULA MITRAL Por seu lado, a doença valvular mitral está diagnosticada e tratada de forma insuficiente, fazendo com que muitos dos doentes diagnosticados com esta patologia não sejam referenciados para cirurgia, sendo que esta continua a ser a melhor opção terapêutica. No entanto, mesmo quando existe esse encaminhamento, a proposta cirúrgica é habitualmente realizada por esternotomia completa (a peito aberto), comportando este gesto os riscos já anteriormente descritos. A válvula mitral separa a aurícula esquerda do ventrículo esquerdo e a sua estenose manifesta-se de forma contínua, progressiva, com um início de desenvolvimento lento, mas seguido de uma fase de aceleração progressiva com incapacidade cada vez maior. Os principais sintomas são idênticos ao da EA. A reparação ou substituição da válvula mitral é considerada a opção terapêutica adequada em pacientes com doença degenerativa valvular ou regurgitação mitral severa isolada, sendo que a reparação é possível em cerca de 90% dos casos. Tem aumentado a evidência de que a Cirurgia Minimamente Invasiva (procedimentos cirúrgicos, através de pequenos orifícios, utilizando instrumentos e técnicas vídeo-endoscópicas) tem vantagens importantes sobre a esternotomia convencional, apresentando-se como uma técnica segura e com melhores resultados clínicos e funcionais no pós-operatório imediato. A redução da dor e a possibilidade de realizar as atividades diárias mais precocemente (por exemplo, é possível voltar a Porque a Sua Saúde é de Particular Importância, Estamos Consigo em Todos os Momentos conduzir aos fim de 2 semanas) são aspetos que deixam os doentes mais satisfeitos. Da mesma forma, o facto de se realizar uma pequena incisão faz com que o tempo de recobro nos Cuidados Intensivos seja menor, com menos necessidade de suporte ventilatório e de transfusões sanguíneas, menor incidência de infeções sistémicas, da ferida cirúrgica ou de lesões renais pósoperatórias. A reparação da válvula mitral por toracotomia é uma cirurgia que só muito recentemente começou a ser realizada em Portugal, sendo que na região Sul do País a primeira ocorreu em dezembro no Hospital Particular do Algarve, na unidade de Gambelas, em Faro.