1 Universidade de São Paulo Escola de Comunicação e Artes Matheus Disraeli de Souza Amado Silva Por que o Otaku compra Mangá, sendo que já leu? São Paulo/SP 2014 2 I – Introdução Este projeto de pesquisa busca estudar os hábitos de consumo do fã e especificamente o colecionador de mangá1, o otaku. Procura-se entender aqui um comportamento de alguns colecionadores e amantes de mangá, que após lê-lo em algum formato eletrônico, também compram este mesmo número da revista em seu formato físico. Essa questão vem à tona; com o alto grau de circulação, na internet, de produtos populares japoneses (como mangá, anime2 e etc.), vê-se uma grande quantidade de otakus, espalhados por vários grupos na internet, compartilhando e adquirindo vários animes e mangás gratuitamente, algo normal na internet, independente do objeto, mas que se contradiz quando se analisa os mesmos otakus reunidos em convenções de anime (eventos realizados aonde se reúnem vários aspectos desse gosto popular japonês, desde mangá e anime à música pop/rock japonês) aonde os vemos adquirindo os mesmos mangás que leram no passado. Esse comportamento peculiar, que vai contrário às práticas comuns de consumo, visto a grande influência da pirataria na internet, é a base dessa pesquisa; o questionamento do porquê o fã de mangá aceita gastar o seu dinheiro em algo que já viu é intrigante e pode desencadear em várias conclusões que possam, até, explicar comportamentos de fãs de outro objetos. Seria uma resposta simples se este comportamento fosse isonômico em algum sentido, como por exemplo, uma edição especial que interessa a toda a (ou uma grande parte da) comunidade, ou que fosse objeto de coleção; no entanto, aparentemente3 existe uma relação entre o indivíduo e uma edição específica, pois não são observados comportamentos de ambientes de colecionadores com preços diferenciados por edição devido a um valor de seu conteúdo. II – Revisão da Literatura Com a finalidade de entender este comportamento, iniciamos este estudo com uma pesquisa em artigos e livros, que tentam entender o otaku e a difusão da cultura japonesa nos países ocidentais (e.g., Kytabayashi, 2004), e outros que explicam os comportamentos do colecionador (Corrêa ET AL, 2006). Vê-se que embora a origem do mangá seja destacada em todos os seus conteúdos, a sua popularidade em países do ocidente é grande, independente das 1 Mangá é o nome dado às histórias em quadrinhos de origem japonesa, que possui características diferentes das histórias em quadrinhos de outros países. 2 Originado à partir do mangá, o anime é o desenho animado de origem japonesa. É comum haver uma relação entre os dois. 3 Afirmamos “aparentemente” por que não foi encontrado informação a este respeito a não ser as visitas informais a estes pontos de encontro 3 diferenças ideológicas entre tais países. Embora como relatado no artigo de Samantha Chambers (2012), isso nem sempre foi assim, uma vez que a revista sofreu, em seu início, a censura e a proibição de veiculação nos EUA, o que desencadeou numa grande quantidade de Fansubbing¸ ou seja um comportamento colaborativo entre otakus que consiste em adquirir por diversas formas (legais e/ou ilegais) um mangá ou um anime e traduzi-lo a partir do próprio conhecimento da língua japonesa. Um outro ponto relevante neste comportamento foi discutido por Ken Kitabayashi (2004) que afirma que o otaku é diferente de um colecionador comum porque não se limita apenas a comprar a coleção de mangá ou anime, pelo contrário, no intuito de não terminar a coleção, ele a expande, chegando até a criar novas atitudes e manias. O otaku não se contenta apenas com mangá, ele precisa ver o anime, ele precisa comprar os acessórios e objetos que remetem o mangá, e em casos extremos o otaku vê a necessidade de ser um personagem de seu mangá, assim o fã se fantasia do personagem e os interpretam, algo conhecido entre eles de cosplay, diferente de apenas se fantasiar. Farina, Toledo e Corrêa (2006), dentre as muitas características e ideias importantes sobre o colecionador apresentadas, vale ressaltar uma que defende que o colecionador, adquire e preserva sua coleção pois ela o ajuda a construir e preservar o passado. Disso, pode-se inferir que o otaku adquire o tal mangá, já lido, porque gosta de relembrar a experiência que teve ao lê-lo, o que nos leva a um outro ponto de vista, o efeito de transportation. O conceito de transportation foi inicialmente proposto por Green e Brock (2000), definido como o processo de imersão dentro de uma determinada história. Para mostrar que os indivíduos são “absorvidos” ou “transportados” para o mundo das narrativas, eles precisam evidenciar os efeitos que essas narrativas produzem sobre suas crenças no mundo real. Sendo assim, o “transporte” foi conceituado como um distinto processo mental, ou seja, uma fusão integradora entre atenção, imaginação e sentimentos (GREEN e BROCK, 2000). Seguindo esse raciocínio, Green e Brock (2000) concebem o mecanismo de transportation como um processo convergente, no qual todos os sistemas e capacidades mentais são direcionados aos eventos que ocorrem na narrativa. Vale destacar que isso não se restringe apenas a uma determinada forma específica de contato com uma história, já que pode acontecer com leitores, ouvintes, expectadores, entre outros (GREEN e BROCK, 2000). Outro ponto que pode ser observado, diz respeito a uma teoria de comunicação denominada usos e gratificações, embora este foco não tenha sido observado em nenhuma das bases estudadas para esse projeto, é algo que se pode inferir facilmente a partir de algumas considerações. Diferente da HQ ocidental, que suas histórias são 4 feitas e difundidas por grandes empresas ( como a Marvel comics), o mangá é produzido e criado por artistas independentes ou por pequenos estúdios, ligado diretamente com a editora, provocando uma ligação mais próxima e pessoal, entre o leitor e o autor, que pode desencadear no ato de compra do otaku, que acredita ser necessário a aquisição do mangá já lido, pois esse produto foi bom para ele, e a compra desse é uma forma de agradecimento, ou incentivo, para com o autor. III – Metodologia Fase 1: Identificação dos locais de encontro de fãs de mangá na Internet Fase 2: Coleta de comentários espontâneos postados por estes fãs e que sejam relacionados com os aspectos estudados neste projeto Fase 3: Entrevistas por questionários tipo survey, enviados aos pontos de encontro. IV – Cronograma Coleta e leitura de material bibliográfico – Meses 1 ao 3 Identificação dos pontos de encontro – Mês 1 Coleta de comentários – Meses 2 ao 4 Entrevistas – Meses 5 ao 7 Análise dos dados – Meses 8 e 9 Escrita final Meses 10-12 Referências BAUDRILLARD, J. O sistema dos objetos. São Paulo: Perspectiva, 1997; CHAMBERS, S. N. I. Anime: From Cult Following to Pop Culture Phenomenon. The Elon Journal of Undergraduate Research in Communications, Carolina do Norte, Vol. 3, No. 2, Setembro, 2012. Disponível em: <http://www.elon.edu/docs/eweb/academics/communications/research/vol3no2/08chambersejfall12.pdf>; CORRÊA, G. B. F; FARINA, M. C.; TOLEDO, G. L. 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