25 ªr eu niã oa nu al II Concurso Negro e Educação Anped/Ação Educativa/Fundação Ford Entre o silêncio e a resistência: um estudo das expectativas acadêmicas e profissionais de moças e rapazes negros em cursos pré-vestibulares de São Paulo Bolsista: Elisabeth Fernandes de Sousa Orientadora: Prof ª Eunice de Jesus Prudente Acompanhante do projeto: Profª Maria Malta Campos “Não sabia por que eu queria escrever um livro sobre minha vida. Só no final descobri. Era pra rever meu passado, conversar com as pessoas que me conheceram e conversar comigo mesma, para entender por que não dancei, por que sobrevivi, por que voltei a estudar, consegui emprego e até pude sonhar em fazer faculdade” Esmeralda do Carmo Ortiz an pe d O silêncio e a resistência são estratégias de sobrevivência desenvolvidas por grupos oprimidos como: mulheres, negros, homossexuais que diante de padrões de comportamento considerados normais pela sociedade em geral, exigem que estejam enquadrados em padrões previamente definidos. Porém o cumprimento desses padrões limita-lhes a condição de sujeito social e os torna suscetíveis à práticas repressivas, sendo assim há momentos em que obedecem às ordens impostas e nem falam sobre isso, e há outros nos quais elaboram reações abruptas e significativas, individuais ou coletivas, que lhes permite alterar a condição de submissão. Nosso estudo pode verificar que tanto moças quanto rapazes negros, submetidos a difíceis condições de sobrevivência, cavam espaços nos quais possam garantir e ampliar sua participação no mercado de trabalho e a conseqüente ascensão social.Mas isto não é regra para todos, há aqueles que aspiram mudar sua condição social, porém estão ainda bastante imersos nas dificuldades de sobrevivência e precisam de maior tempo e investimento pessoal para conseguirem ingressar em um curso superior. É o caso de Jussara, uma de nossas entrevistadas. Empregada doméstica e residente em um bairro de classe média em São Paulo, na casa de seus patrões. Migrante e sem família residente na cidade de São Paulo, no ano de 2001, quando fez cursinho, pretendia ingressar no curso de letras de letras da Universidade de São Paulo. Fez a prova da primeira fase do vestibular dessa Universidade, porém não foi aprovada para a segunda fase, pois seu desempenho foi de um ponto abaixo da nota de corte. A moça almeja tornar-se professora de língua portuguesa e retornar para a cidade de origem, onde acredita poder interferir na maneira de lecionar do lugar, uma cidade do interior do Estado do Rio de Janeiro. Seu projeto profissional aspira liberdade, porém no contexto da entrevista ficou visível seu constrangimento, visto que ocorreu em um local público e sob os olhares atentos de seu patrão. an pe d 25 ªr eu niã oa nu al As expectativas acadêmicas e profissionais dos 21 jovens negros entrevistados, 11 moças e 10 rapazes, era a de tornarem-se alunos da Universidade de São Paulo. Os rapazes têm tendência para escolher cursos da área de exatas e as moças de humanas, mas há opções de curso diversificadas. Há momentos na pesquisa em que fica difícil depreender das falas dos entrevistados especificidades relacionadas à questão de gênero. O cotidiano daqueles que freqüentaram cursinho durante todo o ano foi bastante corrido, porque muitos deles aliaram estudos com trabalho diário e/ou fases de desemprego. Apenas dois dos entrevistados concretizaram o desejo de estudar na universidade escolhida. Um rapaz ingressou no curso de teatro e uma moça no curso de ciências sociais. Outros dois cursam universidades particulares, um rapaz faz administração; uma moça, ciências da computação. Todos os que não estão em curso superior pretendem continuar tentando estudar, porém apenas três retornaram ao cursinho em 2002, o restante diz que pretende estudar por conta própria. As condições de desemprego permanecem no grupo estudado, na mesma proporção para rapazes e moças, mesmo depois de um ano de cursinho. A opção profissional deles e delas é geralmente solitária, para os familiares é importante que consigam obter ao menos o sustento próprio, e preferencialmente auxiliem nas despesas domésticas. Toda a tensão de buscar por um curso pré-vestibular é escolha pessoal, não há cobrança da família. O estímulo parte de colegas e professores, apesar de o grupo de amigos do local de moradia não acreditar nem dar valor ao fato de os estudos serem uma forma da ascensão social. É o caso de Fernanda, que aos 21 anos, militante do PT e adventista, fez o cursinho da Consciência Negra objetivando fazer o curso de ciências sociais. Mas sem passar no vestibular da USP, ingressa em uma Faculdade Adventista para cursar ciências da computação, e ressalta que é o curso que pode pagar e que tem mercado de trabalho, revelando que sua escolha é difícil por que o desafio de continuar estudando é um problema que precisa resolver sozinha. Quanto aos rapazes há menos ansiedade da parte deles no enfrentamento da escolha profissional, mas o ingresso no mercado de trabalho foi invariavelmente em postos de pouco valor social. Alguns com o tempo conseguiram ocupar lugares um pouco mais privilegiados em empresas como o de contador ou representante de vendas. an pe d 25 ªr eu niã oa nu al Para chegarmos aos entrevistados o caminho metodológico utilizado foi o de contatar tipos diferentes de cursinhos da cidade de São Paulo. Como o recorte da pesquisa é racial foi preciso selecionar lugares em que alunos negros pudessem ser encontrados. A princípio pressupomos que mesmo naqueles cursos mais elitizados seria possível encontrar alunos negros, e a hipótese estava correra. Todavia o cursinho mais caro do município, cuja mensalidade é de R$ 1.000,00 disse ter apenas dois alunos negros, ambos rapazes, sendo que um deles era bolsista, filho de um funcionário e não permitiu que fossem entrevistados. Contatamos um outro cursinho de mensalidade um pouco mais barata, variando de R$ 400,00 a R$ 700,00 variando de acordo com o período, ali parecia ser possível realizar nosso trabalho, porém diversos entraves foram colocados pela direção e assessoria. Ao invés de entrevistarmos jovens de três cursinhos diferentes quanto ao tipo de inserção social, ficamos apenas com dois deles: o Cursinho de Consciência Negra e o Cursinho da Poli. O primeiro está localizado na Universidade de São Paulo, mas não tem vínculo com a mesma, funciona clandestinamente e pode atender até 100 alunos, mas em outubro no dia da aplicação dos questionários estavam presentes apenas 47 alunos. Os questionários foram aplicados nos dois cursos para identificar o percentual de negros, brancos, pardos e amarelos entre os matriculados. O cursinho da Poli tem um farto banco de dados sobre seus alunos, mas não foi possível usá-lo para este trabalho porque seu banco de dados não tinha o recorte de pertencimento racial. Este cursinho tem capacidade para atender cerca de 12.000 alunos. Os dois cursos cobram mensalidade de baixo custo, variando de ¼ a 1 salário mínimo. Depois de aplicados os questionários, construímos o mapa das opções profissionais de todos os alunos do curso da Consciência Negra e de 10% do cursinho da Poli, este trabalho será apresentado no artigo final. A seleção dos entrevistados obedeceu aos seguintes critérios: alunos negros que variassem a idade, sexo e opção profissional e que estivessem dispostos a dar entrevista. O questionário foi aplicado em outubro de 2001 e as entrevistas foram realizadas no mês de março de 2002, depois de terem sido finalizados os exames vestibulares. Para a maioria dos entrevistados falar sobre o assunto foi bastante dolorido porque estavam diante de um sonho não realizado. Ressaltamos a dignidade dos entrevistados que, mesmo diante desta situação relativamente constrangedora, mantiveram sua posição inicial e colaboraram com a pesquisa. Registramos que nos dois cursinhos todos os candidatos negros ao curso de medicina recusaram-se a dar entrevista. an pe d 25 ªr eu niã oa nu al Nossas conclusões são ainda tênues Dentre os entrevistados apenas os que cursaram o cursinho da Poli conseguiram ingressar na universidade de São Paulo. Ressaltamos que eles estavam matriculados em classes do curso consideradas de melhor desempenho e suas histórias de vida revelam um pertencimento social mais privilegiado e com maior participação dos familiares. O paradoxo principal pode ser percebido no Curso da Consciência Negra, localizado no interior da Universidade de São Paulo, durante todo o ano seus alunos entram ali, sonhando em um dia fazer parte do universo que vêem diariamente, porém a possibilidade de concretizá-lo é bastante remota. Os jovens negros, sem muitas variações para a questão de gênero estão solitários na opção profissional. Residem em regiões periféricas do município, nos quais a precariedade da urbanização e os altos índices de violência convivem, isto lhes dá um cotidiano marcado pelo stress. Precisam de mais tempo para conseguir escolarizar-se e obter um trabalho de caráter mais fixo e digno, e têm que fazer isso solitariamente. Nas entrevistas os candidatos falam pouco sobre coisas boas como: amor, paixão e lazer. As preocupações giram em torno de trabalho e estudo. 25 ªr eu niã oa nu al Bibliografia básica de apoio an pe d BASTIDE, R. e FERNANDES. Florestan - Brancos e Negros em São Paulo - Ed. Brasiliana - 2ª ed. - 1959 BAJOIT, G. e FRANSSEN, ª - “O trabalho, busca de sentido” In: Juventude e Contemporaniedade - Revista Brasileira de Educação - São paulo: ANPED, nº 5 e 6, 1997 BOURDIEU, Pierre - Novas reflexões sobre a dominação masculina - in Lopes, Marta Julia (org.) Gênero e Saúde . Porto alegre, Ed. Artes Médicas, 1996 CAVALLEIRO,Eliane - Do silêncio do lar ao silêncio escolar - racismo, preconceito e discriminação na educação infantil - Ed. Contexto - humanitas FFLCH-USP - São Paulo -2000 CHAGAS, Fundação Carlos - Cadernos de Pesquisa - nº 63 - Raça Negra e Educação - Ed. de nov/1987 (org.) Fulvia Rosemberg e Regina Pahim Pinto CHIESI, A e MARTINELLI “O trabalho como escolha e oportunidade” In: Juventude e Contemporaniedade- Revista Brasileira de Educação. São paulo. ANPED, números 5 e 6, 1997 FARIA, Nalu (org.) - Gênero nas Políticas Públicas - Cadernos Sempre Viva - SOF - Sempreviva Organização Feminista - São Paulo, 2000 ____, Gênero e Desigualdade - Cadernos Sempre Viva - SOF - Sempreviva Organização Feminista - São Paulo, 1997 ____, Sexualidade e Gênero - Cadernos Sempre Viva - SOF - Sempreviva Organização Feminista - São Paulo, 1998 FURLANI, Lúcia M. Teixeira - A Claridade da Noite - Os alunos do ensino superior noturno - Ed. Cortez - São paulo, 1998 GONÇALVES, Luiz Alberto - O silêncio de um ritual pedagógico a favor da discriminação racial- um estudo acerca da discriminação racial como fator de seltividade na escola pública de primeiro grau - 1985 - dissertação de mestrado - UFMG GOMES, Jerusa Vieira “jovens urbanos pobres: anotações sobre escolaridade e emprego” Revista Brasileira de Educação, ANPED, n. 5-6, 1997 GUIMARÃES, A Sérgio Alfredo e HUNTLEY, Lynn (org.). Tirando a máscara - ensaios sobre o racismo no Brasil - Ed. Paz e Terra - 2000 MELUCCI, Alberto - “Juventude, tempo e movimentos sociais” in Juventude e Contemporaneidade. Revista Brasileira de Educação São Paulo: ANPED, número 5 e 6, 1997 MOEHLECKE, Sabrina - Propostas de Ações Afirmativas no Brasil: o acesso da população negra ao ensino superior Dissertação de Mestrado - FEUSP - Orient. Romualdo Portella - 2000 MUNANGA, Kabenguelê (org.) - Estratégias e políticas de Combate à discriminação Racial - Edusp - Estação Ciência . 1996 - São Paulo NEN - Núcleo de Estudos Negros - Série o Pensamento Negro em Educação - Os Negros, Conteúdos Escolares e a Diversidade Cultural II (1998); Educação Popular Afro-Brasileira (1999); Negros e Currículo (1997); As idéias racistas, os negros e a Educação (1997); Os Negros e a Escola Brasileira (1999); Negros, conteúdos Escolares e diversidade Cultural (1998) NOGUEIRA, Isildinha Baptista - Significações do corpo Negro - Tese de Doutoramento - Orient. Prfª Drª Iray Carone USP - 1998 OLIVEIRA, Eliana - Relações Raciais nas Creches Diretas do município de São Paulo - Dissertação de mestrado apresentada na Pontifícia Universidade Católica - Orient. Prof. Dra. Fúlvia Rosemberg - 1992 OLIVEIRA, Iolanda - Desigualdades Raciais - construções da Infância e da Juventude - Ed. Intertexto - 1999 - RJ PEREIRA, João Baptista Borges, Côr, Profissão e Mobilidade - O negro e o Rádio de São Paulo - EDUSP - Livraria Pioneira - São Paulo - 1967 QUEIROZ, Renato da Silva e SCHWARTZ, L.Moritz (org.) - Raça e diversidade - Edusp - Estação Ciência - 1996 . São Paulo ROCHA, Maria Isabel Baltazar (org.) - Trabalho e gênero - Mudanças permanências e Desafios . ABEP, NEPO/UNICAMP e CEDEPLAR/UFMG - Editora 34 - 2000 an pe d 25 ªr eu niã oa nu al SILVA, Luiz Antonio Machado e CHINELLI, Filippina “Velhas e novas questões sobre a informalização do trabalho no Brasil atual” Contemporaneidade e Educação. IEA, número 1, maio de 1997 SORJ, Bila - O feminino como metáfora da natureza - Caderno Estudos feministas - 2º semestre 1992 SPOSITO, Marília Pontes. “Considerações em torno do conhecimento sobre juventude na àrea de educação” in SPOSITO, Marília Pontes (coord.) Estado do Conhecimento. Juventude Brasília: INEP, no prelo TEIXEIRA, Moema de Poli , org. BARRETO, Paula Cristina da Silva Identidade Racial e universidade pública no Rio de Janeiro in Educação, racismo e anti-racismo- Coleção a cor da Bahia - Ed. Novos Toques - 2000 TRINDADE, Azoilda (org.) - Multiculturalismo - mil e uma faces da escola - Col. O Sentido da Escola - DP&A Editora 1999 - RJ QUEIROZ, Delcele Mascarenhas, org. BARRETO, Paula Cristina da Silva Desigualdades raciais no ensino superior: a cor da UFBA in Educação, racismo e anti-racismo - Coleção a cor da Bahia - Ed, Novos Toques - 2000 WAISELFISZ, Júlio Jacobo - Juventude, violência e Cidadania: Os jovens de Brasília - Ed. Cortez - São Paulo -1998 WERNECK, Jurema e outros (org.) - O livro da Saúde das Mulheres Negras - Nossos passos vem de longe - Ed. Pallas e Ed. Crioula - RJ - 2000