ANEMIA FERROPRIVA INFANTIL – UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Marisa Aparecida Machiafavel¹, Claudia Maria Correa e Silva²
RESUMO
A carência de ferro é a deficiência nutricional mais comum em países desenvolvidos e em
desenvolvimento, constituindo um problema importante de saúde pública no Brasil e no
mundo. A anemia ferropriva ou ferropênica é causada pela insuficiência de fornecimento de
ferro aos eritrócitos, dificultando a produção de hemoglobina. O ferro é o elemento essencial
na constituição da hemoglobina, proteína transportadora de oxigênio existente nas hemácias
do sangue. Na ausência de ferro, a medula óssea não produz hemoglobina, o que clinicamente
caracteriza a anemia ferropriva. A ocorrência da anemia ferropriva em crianças está ligada a
vários fatores, dentre eles a própria ingestão deficiente de ferro, que resulta em uma série de
complicações ao organismo. A Organização Mundial da Saúde estima que metade da
população com menos de cinco anos nos países em desenvolvimento sofrem de anemia
ferropriva. A grande incidência e prevalência deste tipo de anemia devem desprender atenção
da saúde pública para melhorar e garantir a qualidade de vida às crianças. É necessário atuar
de forma preventiva em relação à anemia ferropriva e deficiência de ferro em crianças, bem
como alertar os profissionais da saúde quanto ao diagnóstico precoce, profilaxia e tratamento.
Palavras-chave: anemia ferropriva, crianças, deficiência de ferro
ABSTRACT
The lack of iron is the more common nutritional deficiency in developed countries and in
developing ones constituting an important problem of public health in Brazil and in the world.
The iron is the essential element in the constitution of the hemoglobin, protein in red bood
cells that carries oxygen to all parts of the body. In the absence of iron, the bone marrow
doesn't produce hemoglobin, what clinically characterizes the iron deficiency anemia. The
occurrence of the iron deficiency anemia in children is linked to several factors, among them
the own deficient ingestion of iron, that results in a series of complications to the organism.
The World Health Organization esteems that half of the population with less than five years
old in developing countries suffers of iron deficiency anemia. The great incidence and
prevalence of this anemia type should demand attention of the public health in order to
improve and garantee the children’s quality of life. It is necessary to act in a preventive way
in relation to the iron deficiency anemia in children, as well as to alert the professionals of the
health as for the precocious diagnosis, prophylaxis and treatment.
Key - words: sideropenic anemia, Iron deficiency anemia, children
¹Graduada em Farmacia pelo Instituto de Ensino Superior de Londrina – INESUL.
²Docente do curso de graduação em Farmácia do Instituto de Ensino Superior de Londrina –
INESUL.
INTRODUÇÃO
Por definição, o termo anemia aplica-se, simultaneamente, a uma síndrome clínica,
sendo a síndrome crônica de maior prevalência na medicina, e a um quadro laboratorial
caracterizado por diminuição do hematócrito, da concentração de hemoglobina no sangue ou
da concentração de hemácias por unidade de volume, em comparação com parâmetros de
sangue periférico de uma população de referência. Em qualquer faixa etária, anemia não é um
diagnóstico em si, mas apenas um sinal objetivo da presença de doença básica que a está
causando, sendo uma das manifestações mais comuns de doença em todo o mundo (ZAGO,
FALCÃO e PASQUINI, 2004).
Dentre as doenças nutricionais, a considerada em todo o mundo a mais prevalente é a
anemia, sendo um importante problema de saúde pública. Há vários tipos de anemia, mas a
anemia ferropriva é o tipo mais comum e é causada pela deficiência de ferro, sendo esse um
dos principais constituintes da hemoglobina pelo transporte de oxigênio para os tecidos, pois
o ferro é um nutriente essencial para a vida e atua principalmente na fabricação das células
vermelhas do sangue (SILVEIRA et al., 2008).
A anemia é definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como a condição na
qual o nível de hemoglobina (Hb) circulante está abaixo dos valores considerados normais
para a idade, o sexo, o estado fisiológico e a altitude.
A anemia ferropriva, também denominada ferropênica, pode estar associada com a
desnutrição, causada pela dieta pobre em ferro, vitamina A, folato, porém sua etiologia resulta
de múltiplos fatores, como a perda de ferro, a velocidade de crescimento da criança e as
infecções parasitárias (OLIVEIRA, 2005; PINHEIRO, 2008).
O diagnóstico desta pode ser identificado por alguns sintomas aparentes, mas com
maior precisão por meio de exames laboratoriais, como o hemograma completo.
A carência de ferro, mesmo antes de suas manifestações hematológicas, provoca um
acontecimento sistêmico com repercussões na imunidade e resistência a infecções, na
capacidade para o trabalho e no desenvolvimento neuropsicomotor.
Como no Brasil a causa mais freqüente de anemia ferropriva, sobretudo em crianças,
está relacionada à subnutrição, faz-se necessário o conhecimento dos diversos fatores acerca
da anemia ferropriva infantil, especialmente quanto à orientação da importância de medidas
preventivas e da detecção laboratorial correlacionados a esta forma de anemia (ALMEIDA,
2007).
Anemia ferropriva: definição e etiologia
A anemia nutricional é definida pela OMS como “um estado em que a concentração de
hemoglobina do sangue é anormalmente baixa em conseqüência da carência de um ou mais
nutrientes essenciais, qualquer que seja a origem dessa carência”. De acordo com alguns
autores, aproximadamente 90% da anemia mundial decorrem da deficiência de ferro ou
anemia ferropriva, que resulta de longo período de balanço negativo entre a quantidade de
ferro biologicamente disponível e a necessidade orgânica desse oligoelemento, prejudicando o
desenvolvimento mental e psicomotor e causando aumento da morbimortalidade materna e
infantil, além da queda no desempenho do indivíduo no trabalho e redução da resistência às
infecções (SIQUEIRA et al., 2006; JORDÃO et al., 2009).
Segundo Queiroz e Torres (2000) de modo geral a anemia ferropriva instala-se em
conseqüência de perdas sangüíneas e/ ou por deficiência prolongada da ingestão de ferro
alimentar, principalmente em períodos de maior demanda, como crianças e adolescentes que
apresentam acentuada velocidade de crescimento. Além disso, a gestação e a lactação também
são períodos de maior demanda de ferro.
A anemia ferropriva constitui um sério problema de saúde pública e é conseqüência de
diversos fatores etiológicos. Entre as causas mais importantes destacam-se a ingestão
deficiente de ferro na forma heme devido ao baixo consumo de alimentos de origem animal e
ao baixo nível socioeconômico, as precárias condições de saneamento e a incidência de
parasitoses, principalmente as que provocam perdas sanguíneas crônicas (OLIVEIRA e
OSÓRIO, 2005).
Em janeiro de 2004 a OMS definiu os melhores indicadores do status de ferro em
crianças com idade inferior a cinco anos, sendo hemoglobina inferior a 11g/dL e ferritina
inferior a 12ug/L (SILVEIRA et al., 2008).
De acordo com Queiroz e Torres (2000) as causas de anemia ferropriva e deficiência
de ferro podem ter início no período intra-uterino, sendo que as reservas fisiológicas de ferro
são formadas no último trimestre de gestação e sua demanda sustentada com o ferro
proveniente do leite materno, principalmente até o sexto mês de vida. Já na primeira infância
o problema é agravado pela ocorrência de erros alimentares, principalmente no período de
desmame, quando o leite materno é substituído por alimentos pobres em ferro ou que
apresentam biodisponibilidade muito reduzida.
Os principais fatores etiológicos que podem determinar a anemia ferropriva estão
relacionados com (ZAGO, FALCÃO e PASQUINI, 2004; LOIOLA, 2008):
1.
menor ingestão do nutriente;
2.
baixa reserva de ferro neonatal em situações como, prematuridade, gemelaridade
e anemia materna grave;
3.
aporte insuficiente e a baixa disponibilidade do ferro devido à ingestão
insuficiente;
4.
defeitos do transporte ou metabolismo que resultam em menor oferta efetiva do
nutriente para a medula óssea;
5.
em decorrência de uma absorção intestinal reduzida influenciada por fatores
fisiológicos ou nutricionais;
6.
aumento das necessidades fisiológicas ou patológicas;
7.
aumento da excreção ou das perdas como, por exemplo, nos casos de hemorragias
agudas ou crônicas comuns em parasitoses intestinais e neoplasias de intestinos.
Segundo Carvalho et al. (2006) os lactentes, crianças menores de cinco anos e mulheres em
idade fértil estão propensos a desenvolverem anemia ferropriva, sendo considerada não uma
doença, mas um sinal de doença, pois o início desta forma de anemia é insidioso, gradual até a
progressão dos sintomas evidentes.
Estágios da anemia ferropriva
A deficiência de ferro no organismo desenvolve-se em três estágios (tabela 5), que se
manifestam de maneira gradual e progressiva no organismo até o desenvolvimento da anemia
ferropriva. No primeiro, ocorre diminuição da ferritina sérica, no segundo já há um declínio
da concentração do ferro sérico e aumento da capacidade de ligação do ferro e finalmente um
terceiro estágio onde há restrição na síntese de hemoglobina, podendo se instalar assim a
anemia ferropriva, onde as hemácias, até então normocíticas e normocrômicas, passam a
sofrer alterações morfológicas, tornando-se microcíticas e hipocrômicas (ARAÚJO, 2006;
CARDOSO et al., 2008).
Tabela 5: Estágios do Estoque de Ferro
Características
Laboratoriais
Anemia
Morfologia das
Hemácias
Estágios do Estoque de Ferro
Normal
Depósitos
Eritropoiese
Reduzidos
Deficiente
Ausente
Ausente
Presente
Normal
Normal
Normal
Anemia
Ferropriva
Presente
Microcitose
Hipocromia
+++
+
0
0
Depósitos de
Ferro
100 ± 60
< 25
< 10
< 10
Ferritina Sérica
ng/L
115 ± 50
< 115
< 60
< 40
Ferro Sérico
µg/dL
330 ± 30
330 a 360
> 390
> 410
TIBC µg/dL
Normal
Normal ou
< 16%
< 16%
Saturação de
Diminuída
Transferrina
Abreviatura: TIBC = (total iron bound capacity) capacidade total de ligação do ferro
Fonte: ARAÚJO, 2006
O primeiro estágio da anemia ferropriva, também chamado de depleção de ferro ou
ferropenia latente, ocorre quando o aporte de ferro é incapaz de suprir as necessidades,
produzindo uma redução dos seus depósitos, que se caracteriza por ferritina sérica abaixo de
12 microgramas por litro, mas sem alterações funcionais.
Havendo continuidade do balanço negativo, instala-se uma segunda fase, denominada
eritropoese ferro deficiente, a qual é caracterizada por diminuição do ferro medular e sérico,
saturação da transferrina abaixo de 16% e elevação da protoporfirina eritrocitária livre,
podendo haver nessa fase a diminuição da capacidade de trabalho. Como conseqüência da
deficiência de ferro medular, ocorre uma eritropoiese ineficaz. E finalmente, quando há
restrição na síntese de hemoglobina, desenvolve-se o terceiro e último estágio, ou a anemia
por deficiência de ferro, anemia ferropriva instalada, onde a hemoglobina situa-se abaixo dos
padrões para a idade e o sexo caracterizando-se pelo surgimento de microcitose e de
hipocromia das hemácias (QUEIROZ e TORRES, 2000).
Para Zago, Falcão e Pasquini (2004), entre a deficiência de ferro e a anemia ferropriva
propriamente dita, há situações intermediárias em que a morfologia das hemácias (microcitose
e hipocromia), o ferro sérico, a capacidade total de transporte de ferro (TIBC), os depósitos de
ferro na medula óssea e a ferritina sérica não apresentam ainda todas as alterações
características da anemia ferropriva. Nesta hipótese, há uma anemia leve e moderada, com as
hemácias ainda apresentando-se normais.
A deficiência de ferro ocorre: quando a sua ingestão é insuficiente, como por
exemplo, durante o período de crescimento ou gravidez; quando ocorre a má absorção do
ferro; nos casos de perdas aumentadas em conseqüências de perdas sangüíneas uterinas ou no
trato digestivo; quando há perda renal de hemossiderina em conseqüência de hemólise
intravascular crônica; em situações de seqüestração de ferro em um sítio inacessível e até nas
perdas urinárias de sangue (BAIN, 2007).
O esgotamento dos estoques de ferro na medula óssea e a insuficiente oferta de ferro
aos eritroblastos levam a uma diminuição da síntese de heme e como conseqüência a uma
redução na produção de hemoglobina e de eritrócitos (BAIN, 2007).
Diagnóstico
Diversos parâmetros hematológicos e bioquímicos refletem os estágios da depleção de
ferro. Para o diagnóstico precoce de depleção de estoques de ferro in vitro há um parâmetro
considerado padrão ouro, é a hemossiderina da medula óssea, a qual irá determinar a ausência
de ferro medular indicando a depleção. No entanto, este procedimento é invasivo, não sendo
apropriado como exame de triagem (ARAÚJO, 2006). O diagnóstico da anemia ferropriva
pode ser realizado através de uma correlação entre valores laboratoriais, aferindo-se os níveis
sanguíneos de hemoglobina e de estoque de ferro.
Atualmente a concentração de hemoglobina é considerada o parâmetro mais usado
como indicativo das conseqüências fisiopatológicas da anemia, porém não apresenta boa
especificidade e sensibilidade para avaliar o estado nutricional do ferro, uma vez que pode se
encontrar alterada em processos infecciosos e inflamatórios, hemorragias, desnutrição
protéico-calórica, uso de medicamentos e tabagismo (BARBOSA et al., 2006).
A determinação de ferritina sérica é considerada o parâmetro bioquímico mais
específico e apropriado como indicador real das reservas de ferro corporal e é considerada um
método útil por utilizar sangue periférico e apresentar forte correlação com os depósitos de
ferro tissular. Saturação de transferrina, protoporfirinas eritrocitárias livres e o cálculo dos
índices hematimétricos também são utilizados no diagnóstico da anemia ferropriva
(ARAÚJO, 2006; UMBELINO e ROSSI, 2006; MATTOS, 2007).
As alterações no tamanho e na cor das hemácias proporcionam uma informação útil
em relação ao estado nutricional de ferro, e o uso de contadores eletrônicos tem melhorado a
confiabilidade do diagnóstico. Os índices hematimétricos baseados no VCM e RDW são
elementos importantes no diagnóstico de anemia ferropriva já instalada. A associação da
classificação morfológica das anemias a partir dos índices hematimétricos com a
caracterização da anemia de acordo com a resposta medular auxilia no diagnóstico diferencial
e na provável etiologia da anemia (PAIVA, 2000; ARAÚJO, 2006; GROTTO, 2009).
A depleção de ferro faz com que as hemácias produzidas sejam, na média, pequenas e
com grande variação no tamanho (anisocitose), que é medida pelo RDW - amplitude de
variação do tamanho das hemácias. Na anemia ferropriva, o RDW aumenta precocemente,
antes mesmo de ocorrer grande diminuição do VCM, fato que permite detectar a carência
incipiente de ferro (ARAÚJO, 2006).
Valores reduzidos na concentração de ferro sérico são um forte indicador de depleção
de ferro. Na anemia ferropriva ocorre diminuição da hemoglobina, redução do hematócrito, a
Capacidade Total de Transporte de Ferro (TIBC) está normal ou aumentado, levando à
diminuição da saturação da transferrina a níveis menores que 10%. No exame do esfregaço
sangüíneo corado as hemácias encontram-se microcíticas e hipocrômicas (ZAGO et al., 2004;
ALVES et al., 2007).
Para o diagnóstico do estado nutricional de ferro não há um parâmetro ótimo, sendo a
escolha do mesmo, dependente de diversos fatores, como: algumas características inerentes ao
indivíduo ou grupo populacional (idade, gestação); prevalência e severidade da deficiência de
ferro; incidência de doenças inflamatórias e infecciosas e freqüência de doenças
hematológicas. Fatores como, volume da amostra de sangue requerido, custo, complexidade
da metodologia e suscetibilidade a erros laboratoriais, também não podem ser
desconsiderados (PAIVA et al., 2000).
Fatores de risco da anemia ferropriva na infância
Os fatores de risco para anemia ferropriva infantil, podem estar associados e, assim,
agravam a situação nutricional e de deficiência de ferro. A prematuridade, baixo peso ao
nascer, sangramento perinatal, baixa hemoglobina ao nascimento, infecções freqüentes,
ingestão freqüente de chás, infestação por ancilostomídeos, baixa escolaridade dos pais,
excesso de co-habitantes no domicílio, crianças com dois ou mais irmãos com menos de cinco
anos são alguns dos fatores que podem determinar anemia ferropriva (CARDOSO e
SANTOS, 2008).
Há vários fatores determinantes da anemia ferropriva, entre eles a ingestão deficiente
de ferro na forma heme devido ao baixo consumo de alimentos de origem animal, o baixo
nível sócio econômico, as precárias condições de saneamento e a alta incidência de doenças
parasitárias, principalmente aquelas que provocam perdas sanguíneas crônicas. São
considerados agravantes da anemia ferropriva: a falta de saneamento básico, as baixas
condições socioeconômicas e a alta morbidade na infância (QUEIROZ e TORRES, 2000;
OLIVEIRA e OSÓRIO, 2005).
Silva e colaboradores (2006) descreveram que o curto tempo de aleitamento materno,
a introdução tardia ou insuficiente de alimentos ricos em ferro e o consumo inadequado de
estimuladores de sua absorção, apresentam-se como fatores de risco de anemia em crianças.
Nenhuma criança é imune à deficiência de ferro, sendo a anemia neste grupo
decorrente de vários fatores que incluem: crianças menores de 24 meses de idade com uma
dieta exclusivamente láctea juntamente com a introdução dos alimentos de transição de forma
inadequada; a utilização de fórmulas pobres em ferro bem como a preferência delas por
alimentos com pouco ferro; dieta totalmente vegetariana; a prevalência de doenças infectocontagiosas; a utilização precoce do leite de vaca; verminoses. Estes fatores contribuem para
diminuir as reservas de ferro do organismo podendo levar a um quadro de anemia ferropriva
(LOIOLA, 2008; SILVEIRA et al., 2008).
A literatura destaca que o baixo peso ao nascer é um dos fatores mais importantes que
predispõe ao aparecimento da anemia em lactentes, seja pela desnutrição intra-uterina, pela
prematuridade ou ainda pelas baixas reservas de ferro ao nascer (SILVEIRA et al., 2008).
A escolaridade materna é também considerada um fator socioeconômico importante na
determinação da anemia, pois uma maior escolaridade repercute numa maior chance de
emprego e renda, contribuindo para uma melhor qualidade da alimentação da família
(SILVEIRA et al., 2008).
Segundo Castro (2007), a habilidade em adquirir alimentos em quantidade e qualidade
para todos os membros da família, a capacidade e a prática de cuidados adequados da mãe
para com a criança, o acesso da família a serviços de saúde de qualidade, o ambiente saudável
e as causas de nível básico que incluem a pobreza, o baixo status (poder de decisão)
escolaridade da mulher e degradação ambiental são fatores importantes que poderão
determinar ou não a anemia ferropriva na infância.
Incidência e prevalência
A OMS estima que metade da população das crianças com menos de cinco anos de
idade nos países em desenvolvimento sofrem de anemia ferropriva.
Diversos estudos realizados em diferentes locais e populações indicam uma alta
prevalência de anemia ferropriva no Brasil. Estima-se que haja 5 milhões de crianças menores
de 4 anos com anemia ferropriva em todo o país e, ao contrário do que ocorre com a
desnutrição, a prevalência de anemia ferropriva vem aumentando nas últimas décadas
(CARDOSO, SANTOS e COLOSSI, 2008).
Devido à rápida expansão da massa celular vermelha e ao crescimento acentuado dos
tecidos, as crianças estão mais vulneráveis à carência de ferro em virtude do aumento de suas
necessidades (SILVA e CAMARGOS, 2006).
Segundo Carvalho et al. (2006) os lactentes, crianças menores de cinco anos e
mulheres em idade fértil estão propensas a desenvolverem anemia ferropriva, sendo
considerada não uma doença, mas um sinal de doença, pois o início desta forma de anemia é
insidioso, gradual até a progressão dos sintomas evidentes. Este grupo de indivíduos são
considerados os grupos mais vulneráveis à deficiência de ferro (UMBELINO e ROSSI, 2006).
A faixa etária mais acometida na infância pelo baixo aporte de ferro são crianças entre
6 e 24 meses, em função de crescimento e desenvolvimento acelerados, que exigem
necessidades de ferro aumentadas. Além disso, a dieta das crianças nesta faixa etária tende a
ser mais monótona com baixo consumo de carnes e alimentos enriquecidos com ferro,
associada ao desmame precoce (CARDOSO et al., 2008; SILVEIRA et al., 2008).
Torres apud Cardoso et al. (2008) em estudo realizado, detectaram um aumento da
prevalência de anemia ferropriva à medida que diminuía a duração do aleitamento materno,
comprovando uma associação estatisticamente significativa.
Os estudos de Carvalho et al. (2006) demonstraram que, segundo estimativa realizada
pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS), o Peru representa o país de maior
prevalência de anemia da América Latina, seguido do Caribe (57%) e Brasil, onde 35% das
crianças, com idade entre 1 e 4 anos, encontram-se anêmicas. Estudos apontam elevada
prevalência de anemia principalmente em crianças menores de cinco anos, sendo a faixa etária
de 6 a 23 meses a de maior risco para o desenvolvimento desta doença.
A prevalência da anemia é maior em países em desenvolvimento. Os grupos de maior
risco para desenvolver anemia são mulheres grávidas e crianças, particularmente as menores
de dois anos de idade (HEIJBLOM e SANTOS, 2007). De acordo com JORDÃO et al.
(2009) as crianças entre seis e 24 meses apresentam risco duas vezes maior para desenvolver
anemia ferropriva do que aquelas entre 25 e 60 meses.
O aumento da prevalência da anemia ferropriva em crianças pode ser decorrente das
mudanças nos hábitos alimentares, que acompanham a transição nutricional do país.
Segundo a OMS, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a
Organização das Nações Unidas (ONU) a prevalência média de anemia em crianças menores
de quatro anos em países industrializados é de 20% e de 39% em países em desenvolvimento
e segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) a anemia por carência de
ferro no Brasil atinge cerca de 50% de crianças em idade pré-escolar, 20% de adolescentes e
15 a 30% de gestantes (UMBELINO e ROSSI, 2006).
Dados recentes alertam sobre a incidência de casos de anemia em crianças de todo o
Brasil, principalmente na região Nordeste, na faixa etária que compreende onze e treze meses
de idade, sendo moradoras nessas cidades (VINHAL, 2009). De acordo com Jordão, Bernardi
e Filho (2009) os fatores associados à maior prevalência de anemia na região rural do
Nordeste são: baixo consumo de ferro heme devido às precárias condições de pobreza, rede de
distribuição pobre em alimentos de origem animal, condições ambientais desfavoráveis para o
plantio de frutas e verduras, saneamento básico precário e alto risco de parasitoses.
Diversos estudos demonstram que a prevalência de anemia ferropriva nas áreas rurais
do Brasil é bem maior do que nas áreas urbanas, estando presente em cerca de 50% nas
crianças (SILVA e CAMARGOS, 2006).
Segundo Queiroz e Torres (2000) em uma população com 50% de crianças com
anemia, 100%, de fato, são deficientes em ferro.
Estudos realizados em diversas regiões do Brasil demonstram um aumento
significativo em relação à gravidade da doença, principalmente entre crianças menores de dois
anos, onde a proporção situa-se entre 50% e 83% (QUEIROZ e TORRES, 2000).
Assim, Jordão, Bernardi e Filho (2009) relatam que o aumento da prevalência da
anemia ferropriva em crianças se dá em decorrência das mudanças nos hábitos alimentares
que acompanham a transição nutricional no país e combatê-la deve ser prioridade para os
profissionais responsáveis pelo planejamento de Programas de Nutrição em Saúde Pública.
Mattos (2007) explica que 40 a 50% das crianças menores de cinco anos são afetadas
pela anemia no Brasil, independentemente das condições socioeconômicas, distúrbio
nutricional este que se encontra em expansão em diversas regiões brasileiras.
Conseqüências da anemia ferropriva infantil
A redução da concentração de hemoglobina sangüínea compromete o transporte de
oxigênio para os tecidos e tem como conseqüências diversos sinais e sintomas, entre eles,
alterações da pele e das mucosas (palidez, glossite), alterações gastrointestinais (estomatite,
disfagia), fadiga, fraqueza, palpitação, redução da função cognitiva, do crescimento e do
desenvolvimento psicomotor, além de afetar a termorregulação e a imunidade da criança
(CARDOSO et al. 2008).
A anemia por deficiência de ferro, ou apenas a deficiência leve ou moderada do
mineral, pode causar fadiga, prejuízo no crescimento e no desempenho muscular, acarretando
prejuízos também no desenvolvimento neurológico e no desempenho escolar. Outras
conseqüências incluem distúrbios comportamentais e cognitivos, como irritabilidade, pouca
atenção, falta de interesse, dificuldade no aprendizado, prejuízo na capacidade de manter a
temperatura corporal na exposição ao frio; alterações no crânio, em crianças com anemia
ferropriva de longa duração; anormalidades nos ossos longos; alterações na função
tireoidiana, na produção e metabolismo das catecolaminas e de outros neurotransmissores e
aumento da capacidade de absorção de metais pesados (HEIJBLOM e SANTOS, 2007;
CARVALHO et al., 2006).
Segundo Silva e Camargos (2006) as crianças anêmicas apresentam um retardo no
desenvolvimento neuromotor que não se altera mesmo após o tratamento prolongado.
A conseqüência mais óbvia da deficiência de ferro é a anemia e todas as suas seqüelas
e evidências indicam que essa deficiência pode afetar processos metabólicos, como a síntese
de DNA, o metabolismo de várias enzimas e o transporte de elétrons, provocando alterações
na resposta imune e nas funções cognitivas do lactente e da criança (UMBELINO e ROSSI,
2006).
Como o ferro está envolvido na respiração celular, os baixos níveis de hemoglobina
interferem no metabolismo energético podendo afetar o nível de atividade física; portanto no
sistema nervoso central ele pode estar associado a retardo na capacidade cognitiva da criança
e na pele e mucosas a queda de hemoglobina reflete-se por palidez cutânea e de mucosas,
utilizada para avaliar a presença de anemia em crianças (PALOMBO e FUJIMORI, 2006).
Fato este comprovado por estudos realizados em crianças com idade inferior a cinco anos que
demonstram que a anemia ferropriva relaciona-se, entre outras alterações, a baixos escores em
testes de desenvolvimento mental e de atividade motora, podendo levar a seqüela irreversível,
mesmo na presença de tratamento adequado (CARDOSO, SANTOS e COLOSSI, 2008).
Tratamento da anemia ferropriva infantil
Para combater e prevenir a anemia por carência de ferro há várias estratégias
importantes
como:
educação
alimentar;
suplementação
medicamentosa
profilática;
fortificação alimentar e melhoria da qualidade da dieta oferecida; incentivo ao aleitamento
materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida, que é de fundamental importância; nãoutilização do leite de vaca no primeiro ano de vida; fortificação dos alimentos; controle de
infecções; acesso a água e esgoto adequados; e o estímulo ao consumo de alimentos que
contenham ferro de alta biodisponibilidade na fase de introdução da alimentação
complementar (QUEIROZ e TORRES, 2000; SILVA e CAMARGOS, 2006; MATTOS,
2007).
O tratamento principal da anemia ferropriva envolve administração oral de ferro na forma
ferrosa e associado ao tratamento medicamentoso, deve-se orientar o consumo de alimentos
com quantidade e biodisponibilidade elevadas de ferro (TRINDADE et al., 2009).
Osório (2002) explica que é preciso haver uma assistência especial às áreas rurais e de
risco onde as baixas condições socioeconômicas e as dificuldades de acesso ao alimento
agravam ainda mais o problema da anemia ferropriva.
Outra medida importante para diminuir a prevalência de anemia, principalmente entre
crianças pré-escolares, é a utilização de alimentos fortificados ou enriquecidos com ferro,
como as farinhas de trigo e de milho e o leite utilizado na alimentação infantil, além da
fortificação da própria água de beber, considerada um bom veículo para o carreamento de
ferro (OSÓRIO, 2002).
O Ministério da Saúde tornou obrigatória a fortificação das farinhas de milho e trigo
com ferro e ácido fólico, por serem alimentos de fácil acesso a população e não terem
alterações de suas características organolépticas no processo de fortificação, além de ser
economicamente viável ao país implantando-se, assim, o Programa Nacional de Combate à
Anemia Carencial Ferropriva aos grupos de risco que compreendem crianças de seis a 18
meses, gestantes e mulheres no pós-parto (JORDÃO, BERNARDI e FILHO, 2009).
O sulfato ferroso é recomendado para o tratamento e prevenção da anemia ferropriva
cuja absorção se torna melhor quando é administrado juntamente com uma fonte de vitamina
C, como o suco de laranja, associando-se ao tratamento o consumo de alimentos com
quantidade e biodisponibilidade elevadas de ferro (MATTOS, 2007).
Apesar de diversos programas de combate a anemia ferropriva os índices continuam
em ascensão, principalmente devido à baixa adesão ao método por fraco vínculo mãe-filho,
baixo grau de instrução e falta de informações sobre a gravidade da doença, levando os
próprios pais a interromperem o tratamento (MATTOS, 2007).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A rápida expansão da massa celular vermelha e o crescimento acentuado dos tecidos
tornam as crianças mais vulneráveis à carência de ferro em virtude do aumento de suas
necessidades.
A anemia, principalmente por carência alimentar de ferro biodisponível, representa um
problema nutricional em nível de saúde coletiva nos países em desenvolvimento,
especialmente no Brasil, sendo conseqüência de diversos fatores etiológicos.
Entre os segmentos da população mais vulneráveis ao problema da anemia por
deficiência de ferro encontram-se os lactentes, crianças menores de cinco anos e mulheres em
idade fértil, incluindo o período gestacional.
A anemia ferropriva é um problema de saúde pública que apresenta conseqüências de
grande alcance para a saúde humana e para o desenvolvimento social e econômico.
A anemia ferropriva infantil destaca-se, não só pela freqüência com que se manifesta,
principalmente a faixa etária, mas também pelos efeitos resultantes.
Levantamento realizado pela Organização Mundial da Saúde aponta que metade das
crianças com menos de cinco anos de idade, nos países em desenvolvimento, sofrem de
anemia ferropriva e no Brasil estudos relatam uma incidência média em torno de 35% com
idade entre um e quatro anos.
A prevalência brasileira de anemia ferropriva em crianças é elevada em diversas regiões e
constitui uma das mais relevantes deficiências nutricionais pela ocorrência de erros
alimentares, principalmente no período de desmame, quando o leite materno passa a ser
substituído por alimentos pobres em ferro ou que apresentam biodisponibilidade muito
reduzida.
A ingestão deficiente de ferro na forma heme, o baixo nível socioeconômico, as precárias
condições de saneamento e a incidência de parasitoses, principalmente as que provocam
perdas sangüíneas crônicas, constituem as principais causas de anemia ferropriva nas crianças.
Diante desta problemática, conclui-se que a anemia ferropriva na infância apresenta
múltiplas causas, o que exige uma ação conjunta de diversas estratégias para seu combate,
dentre elas ações de suplementação medicamentosa rotineira de ferro, fortificação com ferro
em alimentos utilizados na alimentação infantil e programas de educação alimentar para
melhor adequação do ferro total e biodisponível; juntamente com a intensificação de
campanhas objetivando a prevenção e o tratamento deste tipo de anemia considerada de alta
prevalência e de conseqüências diversas para o organismo da criança.
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