FRAUDE DE RELATO FINANCEIRO Procedimentos de auditoria em resposta aos riscos avaliados de distorção material das demonstrações financeiras em virtude do reconhecimento inadequado do rédito (ISA 240, NCRF 20) 12 Susana Cristina da Silva Miranda Gonçalves MEMBRO ESTAGIÁRIO Objectivo A fraude é um tema demasiado controverso e o âmbito da responsabilidade do auditor pela prevenção e detecção de fraude tem sido alvo de forte discussão e reflexão nos últimos tempos. De acordo com a ISA 240 (clarificada) “A responsabilidade do auditor ao considerar a fraude numa auditoria de demonstrações financeiras”, os dois tipos de fraude mais relevantes para o auditor são as distorções resultantes de relato financeiro fraudulento e da apropriação indevida de activos. O auditor apenas se interessa pelos actos que resultem em distorções materiais nas demonstrações financeiras. As distorções nas demonstrações financeiras podem advir quer de erro quer de fraude, sendo que o que os distingue é o carácter intencional ou não. Dois tipos de distorções materiais intencionais são relevantes para fins de auditoria: relato financeiro fraudulento e apropriação indevida de activos. DISTRIBUIÇÃO DAS PERDAS ORIGINADAS PELA FRAUDE Características da Fraude TIPOS DE FRAUDE A “Fraude ocupacional” (Anexos 6.1) poderá ser definida como o aproveitamento pelo(s) individuo(s) das funções que exercem para enriquecimento pessoal através do desvio deliberado ou utilização indevida de recursos ou activos de uma organização. A ISA 240 (clarificada) define fraude como sendo “um acto intencional por um ou mais indivíduos entre a gerência, os encarregados da governação, os empregados ou terceiros, envolvendo o uso de enganar para obter uma vantagem injusta ou ilegal”. A fraude constitui um problema significativo com que se defrontam todas as organizações de todos os tipos, dimensões, localizações e sectores de actividade. Os esquemas de fraude podem ser tão simples como os pequenos furtos de empregados e tão complexos como a sofisticada fraude de relato financeiro da autoria dos gestores e proprietários. Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” 13 AUDITORIA De acordo com a Association of Certified Fraud Examiners (ACFE) (2006 & 2008 Report to the Nation), nos casos de fraude estudados, a mediana das perdas é de $ 175 mil. Porém, mais de 25% dos casos do relatório 2008 envolvem perdas acima de $1 milhão. A fraude ocupacional divide-se em três principais categorias: apropriação indevida de activos, corrupção e fraude de relato financeiro. A fraude de relato financeiro representa o esquema de fraude menos FRAUDE OCUPACIONAL POR CATEGORIA - FREQUÊNCIA O estudo da PriceWaterHouseCoopers (PWC, 2009) revela que a incidência do crime económico varia entre os países (as economias emergentes possuem um nível de fraude superior à média), entre os sectores de actividade (os serviços financeiros, seguros, comunicações, hospitalidade e lazer são os que apresentam maior propensão à fraude), de acordo com a dimensão e tipo de organizações, contudo nenhuma organização é imune. O estudo conclui que todas as organizações, quer sofram ou não um declínio no desempenho financeiro em virtude da actual recessão económica e financeira, estão em risco de crime económico, sendo este um risco de negócio difuso que não discrimina as organizações de acordo com o seu desempenho. Contudo, as organizações que sofrem declínios relatam maiores níveis de um tipo de crime económico que é fraude na contabilidade. AUTORES DA FRAUDE DE RELATO FINANCEIRO Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” comum representando apenas 10,3%, em 2008. Contudo, trata-se do tipo de fraude mais onerosa representando perdas medianas de $2 milhões, perdas treze vezes superiores às resultantes da apropriação indevida de activos. Esta envolve a distorção ou omissão intencional de informação material do relato financeiro da organização, casos denominados de “cooking the books”. A fraude de relato financeiro envolve normalmente o relato de receitas fictícias ou ocultação de responsabilidades de forma a tornar a empresa mais rentável do que é na realidade. De acordo com o estudo da ACFE (2006 & 2008 Report to the Nation) e também conforme foi relatado no estudo COSO1 (1999) a grande maioria (cerca de 50%) da fraude de relato financeiro é desencadeada pelos gestores de topo e proprietários e (cerca de 30%) por pessoas do departamento de contabilidade. A gestão tem uma capacidade única para cometer fraude porque se encontra numa posição privilegiada que lhe permite manipular os registos contabilísticos (capacidade de derrogação dos controlos pela gestão). AUTORES DE ESQUEMAS DE FRAUDE FRAUDE OCUPACIONAL POR CATEGORIA - PERDAS MEDIANAS (MIL $) Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” 14 Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” Susana Cristina da Silva Miranda Gonçalves / MEMBRO ESTAGIÁRIO AUDITORIA FRAUDE DE RELATO FINANCEIRO - POR DEPARTAMENTO Albretch desenvolveu a “Balança da Fraude” que inclui três componentes: pressão situacional (pressão financeira impossível de partilhar), oportunidades de concretização (percepção da oportunidade para cometer e ocultar o acto desonesto) e a integridade pessoal. Quando a pressão situacional e as oportunidades de concretização são elevadas e a integridade pessoal é baixa é muito mais provável que ocorra a fraude do que quando se verifica o contrário. Os autores da fraude normalmente apresentam certas características ou comportamentos que podem servir como sinais de alerta (“red flags”), porém a simples presença de sintomas não significa que a fraude está a ocorrer ou irá ocorrer no futuro. O estudo da PWC refere que dos inquiridos que acreditavam que existia um maior risco de fraude no ambiente económico actual de crise, 68% atribuíram maior risco de fraude ao aumento dos incentivos/pressões, 18% às maiores oportunidades para cometer fraude e 14% à capacidade das pessoas para a justificar. % INQUIRIDOS QUE RESPONDEM QUE OS INCENTIVOS/PRESSÕES SÃO A PRINCUPAL RAZÃO PARA O MAIOR RISCO DE CRIME ECONÓMICO NUMA FASE DE CRISE ECONÓMICA Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” PRINCIPAIS MOTIVOS PARA INICIAR A FRAUDE DE RELATO FINANCEIRO (TRIÂNGULO DA FRAUDE) É fundamental conhecer as circunstâncias que podem motivar/pressionar os indivíduos a cometerem fraude de relato financeiro para ajudar na sua detecção e prevenção. Cressey tornou-se conhecido com o “Triângulo da Fraude” apresentando as três condições que normalmente estão presentes quando ocorre fraude. O primeiro vértice do triângulo representa uma necessidade financeira sentida que induz um indivíduo a cometer fraude; o segundo vértice representa a oportunidade apercebida (ausência ou ineficácia dos controlos, capacidade dos gestores derrogarem os controlos) e o terceiro vértice simboliza a justificação. Alguns indivíduos possuem uma atitude ou um conjunto de valores éticos que lhes permite cometer actos desonestos. Fonte: PricewaterhouseCoopers (2009), “The Global Economic Crime Survey” Os principais factores apresentados pelos inquiridos que mais contribuíram para o aumento das pressões/incentivos são: objectivos financeiros mais difíceis de atingir, medo de perder o emprego e a remuneração estar indexada ao desempenho financeiro. Entre os 18% que identificaram o aumento nas oportunidades para cometer fraude como a principal causa, consideraram que o principal factor que contribuiu foi a redução do pessoal resultando no enfraquecimento do controlo interno, em virtude da redução da segregação de funções e menor monitorização das transacções e actividades suspeitas. Uma das principais causas apresentadas pela literatura para a falha dos auditores externos na detecção de fraude é a incapacidade das equipas de trabalho em compreenderem os sinais de alerta de fraude. Para melhorar a compreensão destes sinais apresenta-se os resultados do estudo de Heiman-Hoffman et. al. (1996) onde identificam as percepções dos auditores da importância relativa dos sinais de alerta de fraude nas organizações (Anexos 6.2). Os auditores consideram que a desonestidade do cliente é o sinal 15 AUDITORIA de alerta mais importante. Para além disso, os auditores consideram que os clientes de alto risco são aqueles que enfatizam excessivamente a necessidade de cumprimento dos objectivos propostos, aqueles que recorrem à “compra de opiniões” e que são muito agressivos no relato financeiro. Adicionalmente, os auditores consideram que um fraco ambiente de controlo é também um importante sinal de alerta. FRAQUEZAS DE CONTROLO POR TIPO DE ESQUEMAS DE FRAUDE resultados devem ser utilizados como um ponto de partida na avaliação inicial do risco de fraude. Os auditores deverão construir uma checklist dos sinais de alerta mais importantes para os orientarem na revisão preliminar de um potencial cliente ou na fase de planeamento para que não se esqueçam dos factores de risco mais relevantes. Corbin (2009) no seu estudo conclui que os sinais de alerta identificados pelos auditores não são necessariamente os mais relevantes na perspectiva dos financiadores e investidores. Os financiadores e investidores analisam sinais de alerta que são mais apropriados aos seus interesses particulares e do acesso que possuem à informação das organizações e da sua gestão (Anexos 6.3). Os financiadores e investidores são os utilizadores das demonstrações financeiras que poderão desenvolver acções legais contra os auditores e gestores de acordo com as suas percepções de negligência em respeito à fraude de relato financeiro. “RED FLAGS” COMPORTAMENTAIS PRESENTES NAS FRAUDES DE RELATO FINANCEIRO Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” Este estudo é consistente com investigações anteriores como por exemplo o estudo de Peat Marwick (KPMG, 1995) que refere que empresas americanas de média e grande dimensão revelam que a principal acção no combate à fraude é a revisão e melhoria do ambiente de controlo, ou seja as organizações concordam que um ambiente de controlo fraco é um importante indicador de fraude. Os estudos revelam que os auditores consideram que o factor “atitude” é um sinal de alerta mais importante que o factor “pressão/incentivos”, ou seja atitudes desonestas, hostis, agressivas da gestão têm um maior peso para os auditores do que as condições económicas adversas. A percepção destes auditores é consistente com estudos anteriores que revelam uma ligação mais próxima entre factores “atitude” e a ocorrência de fraude do que factores “situação”. As normas ISA 240 e SAS 99 (nos EUA) apresentam uma lista de sinais de alerta que os auditores deverão considerar na avaliação dos riscos de fraude, mas não dão orientações em como utilizar esses alertas. O estudo de Hoffman (1996) fornece evidência dos factores de risco considerados como sendo sinais “chave” no relato financeiro fraudulento, porém os auditores não devem usar exclusivamente esta evidência e não devem aplicá-la de uma forma mecânica. Estes 16 Fonte: ACFE, “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse” O estudo revela que o sinal de alerta mais importante foca-se nas características dos gestores “Gestores desonestos e não éticos” e influência destes sobre o ambiente de controlo. Esta conclusão suporta os estudos anteriores, em que os sinais de alerta mais preditivos são os da atitude e pressões situacionais na gestão. Os sinais de alerta comportamentais mais frequentemente citados nos casos estudados pela ACFE foram: “Estilo de vida acima das possibilidades” (41,4%) e dificuldades financeiras (26,3%). ESQUEMAS DE FRAUDE DE RELATO FINANCEIRO A fraude de relato financeiro resulta de distorções intencionais ou omissões de montantes ou divulgações no relato financeiro de forma a enganar os seus utilizadores. Esta pode ser desencadeada através da: a) Manipulação, falsificação ou alteração de registos contabilísticos ou documentos de suporte; Susana Cristina da Silva Miranda Gonçalves / MEMBRO ESTAGIÁRIO AUDITORIA b) Representação incorrecta ou omissão intencional de eventos, transacções ou outras informações importantes; c) Aplicação incorrecta intencional dos princípios contabilísticos referentes a montantes, classificações, modos de apresentação ou divulgações. A fraude de relato financeiro pode assumir esquemas distintos. As diferenças de datação são o esquema menos comum (28,3%) tendo os restantes esquemas uma predominância muito semelhante próxima dos 40%. ESQUEMAS DE FRAUDE DE RELATO FINANCEIRO A gerência juntamente com os encarregados da governação deverá definir o “tom” adequado, ou seja, criar e manter uma cultura de honestidade e de altos valores éticos e estabelecer controlos adequados para prevenir, desincentivar e detectar a fraude. Se a gestão e os encarregados da governação cumprirem as suas responsabilidades, as oportunidades para cometer fraude serão reduzidas significativamente. De acordo com Vanasco (1998), a responsabilidade do auditor pela detecção de fraude nem sempre foi secundária. No início do século XX, até à década de 30, a detecção da fraude era o objectivo primário da auditoria. A partir da década de 40, essa responsabilidade foi-se transferindo para os responsáveis da gestão, os auditores externos passaram a não assumir uma responsabilidade directa pela fraude devido à sua incapacidade em detectar fraude envolvendo transacções não registadas, roubos e outras irregularidades. As fraudes descobertas nas últimas décadas do séc. XX provocaram uma grave crise de confiança no sistema de relato financeiro e no papel dos auditores. O aumento do número de alegações de fraude contribuiu largamente para que as preocupações se voltassem para a qualidade das demonstrações financeiras. Fonte: Wells, Joseph T. (2009), “Manual da Fraude na Empresa” O trabalho executado pelos auditores relativo a fraude de relato financeiro é fortemente influenciado pelo relatório COSO (1999) o qual identificou as técnicas (esquemas comuns) utilizadas pelas companhias americanas cotadas em bolsa para distorcer a informação financeira de forma fraudulenta (Anexos 6.4): reconhecimento inadequado dos réditos (registo de réditos fictícios; registo prematuro de réditos, outros), sobreavaliação de activos e subavaliação de despesas e responsabilidades. Responsabilidade pela Fraude QUE TIPO DE RESPONSABILIDADE? E DE QUEM? É da responsabilidade da gestão a preparação de demonstrações financeiras que representem fielmente o seu desempenho financeiro. Uma vez terminado o exame é exigido ao auditor a emissão de uma opinião sobre se essas demonstrações financeiras apresentam de forma verdadeira e apropriada, em todos os aspectos materialmente relevantes, a posição financeira, os resultados das operações e os fluxos de caixa da entidade de acordo com o referencial adoptado na sua preparação. De acordo com a ISA 240 #5 “Um auditor que conduza uma auditoria de acordo com as ISAs é responsável por obter uma segurança razoável de que as demonstrações financeiras tomadas como um todo estão isentas de distorção material, quer causada por fraude quer por erro”. Os auditores têm a responsabilidade de obter “segurança razoável” e não segurança absoluta. O #4 da citada ISA refere que: “A responsabilidade primária pela prevenção e detecção cabe não só aos encarregados da governação da entidade como à gerência”. É da responsabilidade da gerência desenhar e implementar programas e controlos de forma a prevenir, desincentivar e detectar a fraude. A gerência é responsável pela adopção de políticas contabilísticas, estabelecer e manter um controlo interno que irá autorizar, registar, processar e relatar transacções consistentes com as asserções embutidas nas demonstrações financeiras. Fonte:Wells, Joseph T. (2009), “Manual da Fraude na Empresa” A prevenção e detecção de fraude de relato financeiro são hoje o centro da atenção de investidores, legisladores, gestores e auditores. Ao longo da década de 90 foram feitos inúmeros esforços para melhorar a eficácia dos auditores, dos gestores e encarregados da governação na prevenção da fraude de relato financeiro. Os auditores independentes desempenham um papel fundamental na detecção de fraude de relato financeiro. Os investidores, financiadores olham para o processo de auditoria para obter segurança e confiança na fiabilidade das demonstrações financeiras e baseiam-se nela para a tomada de decisão. “AUDIT EXPECTATION GAP” A profissão de auditoria tem sido sujeita a determinados preconceitos, um deles é a crença da sociedade de que os auditores fornecem uma segurança absoluta da fiabilidade das demonstrações financeiras. A profissão tem enfrentado enorme controvérsia ao longo das duas décadas passadas devido aos diversos escândalos de fraude. A diferença entre as expectativas da sociedade das funções dos 17 AUDITORIA auditores e as suas reais responsabilidades, em virtude das normas profissionais que os abrangem, chama-se “audit expectation gap”. Perceber as expectativas da sociedade quanto ao papel e responsabilidades dos auditores é fundamental para dar passos no alinhamento destas ao desempenho dos auditores, melhorando assim a imagem dos profissionais. Uma área onde o “audit expectation gap” causa maiores problemas na imagem e reputação da profissão respeita aos casos de fraude. Os profissionais minimizam a importância do seu papel na detecção de fraude e continuam a realçar a responsabilidade da gestão. Hassink et al. (2009) reparte o “audit expectation gap” em três elementos: a) “desempenho deficiente” quando os auditores não executam as suas funções de acordo com o expectável pelas normas de auditoria; b) “expectativas não razoáveis” dada a natureza da auditoria financeira a qual não é primariamente direccionada para a detecção da fraude não é de esperar que os auditores sistematicamente detectem a fraude baseado nos procedimentos obrigatórios de auditoria uma vez que a fraude possui uma natureza não sistemática, c) “deficiência nas normas” o público em geral poderá ter expectativas que não estão reflectidas nas normas de auditoria. Mais de 50% das vítimas possuíam também um código de conduta, um departamento de auditoria interna ou de exame de fraude, assim como dois tipos de controlos exigidos pelo Sarbanes-Oxley Act: auditoria externa do controlo interno da entidade do relato financeiro e certificação das demonstrações financeiras pela gestão. Na opinião dos gestores os mecanismos de controlo interno mais importantes na detecção e prevenção de fraude de relato financeiro são: recompensas a delatores, departamento de auditoria interna e um sistema hotline formal. Fonte: Hassink, Harold et al. (2009), “Corporate fraud ant the audit expectations gap: A study among business managers” Fonte: PricewaterhouseCoopers (2009), “The Global Economic Crime Survey” Os auditores defrontam-se com restrições de vária ordem: as restrições referentes aos métodos que usam (análise por amostragem) e as restrições de custos da auditoria em si (tempo e honorários auferidos). Embora a auditoria não tenha voltado a assumir a responsabilidade primária pela detecção da fraude tem vindo a aumentar as suas responsabilidades e a capacidade para a sua detecção através do aperfeiçoamento dos normativos e orientações. O International Auditing and Assurance Standards Board (IAASB) deu um passo em frente no que respeita à abordagem deste problema com a ISA 240. A norma estabelece conceitos, exigências e orientações aos auditores no cumprimento das suas responsabilidades. Ao aplicar as orientações da norma, os auditores irão planear e executar auditorias com um espírito de “mente indagadora”, reconhecendo que a possibilidade de distorções materiais devido a fraude poderá estar presente colocando de lado as crenças sobre a honestidade e integridade dos gestores em resultado das experiências do passado. A avaliação do risco de fraude pela gerência é essencial para a identificação de ameaças de fraude potenciais e fraquezas nos controlos que criam oportunidades para a fraude. O estudo da PWC revela que 14% das fraudes relatadas foram detectadas através da gestão do risco de fraude. Questionou-se quantas vezes as organizações dos inquiridos tinham executado avaliações de risco de fraude, pelo que 26% referiram que não tinham executado qualquer avaliação e 31% referiu que foi executada apenas uma única vez. As organizações necessitam de rever numa base regular o risco de fraude porque se não compreendem adequadamente o risco de fraude inerente aos seus negócios então não a conseguem combater proactivamente. Existe uma correlação entre a fraude relatada e a frequência da avaliação do risco de fraude, em que as organizações que executam avaliações mais regulares são as que relatam mais fraude. Como a fraude não é uma ameaça estática, as organizações necessitam de avaliar de forma continuada os riscos de fraude. Controlos anti-fraude implementados nas organizações vítimas de fraude A auditoria externa às demonstrações financeiras constitui a forma de controlo anti-fraude mais comum nas empresas. Cerca de 70% das organizações vítimas de fraude possuíam auditorias externas independentes das suas demonstrações financeiras no momento da fraude. 18 CONTROLO ANTI-FRAUDE % INQUIRIDOS QUE ASSISTIRAM A CRIME ECONÓMICO NOS ÚLTIMOS 12 MESES Fonte: PricewaterhouseCoopers (2009), “The Global Economic Crime Survey” Susana Cristina da Silva Miranda Gonçalves / MEMBRO ESTAGIÁRIO AUDITORIA BIBLIOGRAFIA O estudo apresenta a auditoria interna como a “chave” para a detecção da fraude, no entanto a tendência é para a redução da importância no relato da fraude. Os controlos “anti-fraude” como a gestão dos riscos têm aumentado a sua importância na detecção de fraude. Conclusão As distorções nas demonstrações financeiras podem resultar quer de erro quer de fraude, sendo que o que os distingue é o carácter intencional. A fraude de relato financeiro representa o esquema de fraude ocupacional menos comum mas o mais oneroso. A grande maioria da fraude de relato financeiro é desencadeada pelos gestores de topo dada a sua posição privilegiada para manipulação dos registos contabilísticos e capacidade de derrogação dos controlos. De acordo com Cressey existem três condições que normalmente estão presentes quando ocorre a fraude: incentivos/pressões, oportunidade e atitude/racionalização, os quais podem servir de sinais de alerta (red flags) na avaliação do risco de fraude. A fraude de relato financeiro assume esquemas distintos, como por exemplo ocultação de responsabilidades, divulgações inadequadas, avaliação inadequada de activos, entre outros. A responsabilidade primária pela prevenção e detecção da fraude é da gerência e encarregados da governação enquanto os auditores possuem uma responsabilidade secundária. Porém, as fraudes descobertas nas últimas décadas provocaram uma grave crise de confiança no sistema de relato financeiro e no papel dos auditores dada a crença de que os auditores fornecem uma segurança absoluta da fiabilidade das demonstrações financeiras (audit expectation gap). A responsabilidade e capacidade dos auditores para detecção da fraude tem vindo a aumentar através do aperfeiçoamento dos normativos e das orientações das mesmas. A ISA 240 (clarificada) é um significativo passo em frente na expansão das funções da equipa de trabalho na fase de planeamento e execução da auditoria, sendo o seu principal objectivo restabelecer a confiança dos investidores através do aumento da qualidade das auditorias e reforço dos valores da profissão. Association of Certified Fraud Examiners (ACFE): “2008 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse”; “2006 Report to the Nation on Occupational Fraud & Abuse”; International Auditing and Assurance Standards Board (IAASB) (2009): ISA 200 (Clarificada) “Objectivos gerais do auditor independente e a condução de uma auditoria de acordo com as normas internacionais de auditoria”; ISA 240 (Clarificada) “A responsabilidade do auditor ao considerar a fraude numa auditoria de demonstrações financeiras”; ISA 315 (Clarificada) “Identificar e avaliar os riscos de distorção por meio da compreensão da entidade e do seu ambiente”; ISA 330 (Clarificada) “As respostas do auditor aos riscos avaliados”; ISA 450 (Clarificada) “Avaliação de distorções identificadas durante a auditoria”; Comissão de Normalização Contabilística (CNC), Norma Contabilística e de Relato Financeiro 20 – Rédito; Hassink, Harold et al. (2009), “Corporate fraud ant the audit expectations gap: A study among business managers”, Journal of International Accounting, Auditing and Taxation, Vol. 18, pg. 85-100; Heiman-Hoffman, Vicky B., Morgan, Kimberly P. e Patton, James M. (1996), “The warning signs of fraudulent financial reporting”, Journal of Accountancy, October, Vol. 182, pg. 75-77; Heiman-Hoffman, Vicky B. (1998), “Discussion of the effects of SAS n.º 82 on auditors’ attention to fraud risk factors and audit planning decisions”, Journal of Accounting Research, Vol. 35 Suplemento, pg. 99-104; Marwick, Peat (KPMG, 1995), “Combating fraud: Know the facts”, Journal of Accountancy, Vol. 180, 3, pg. 20-20; Ordem dos Revisores Oficiais de Contas, Directrizes de Revisão/Auditoria (DRA): DRA 300 – Planeamento DRA 310 – Conhecimento do negócio DRA 410 – Controlo interno DRA 505 – Confirmações externas DRA 510 – Prova de revisão/auditoria DRA 580 – Declaração do órgão de gestão PriceWaterHouseCoopers (2009), “The Global Economic Crime Survey”, Economic crime in a downturn, November; Vanasco, Rocco R. (1998), “Fraud auditing”, Managerial Auditing Journal, Vol. 13, 1, pg. 4-71. Documentos electrónicos: Corbin, David, “Financial statement fraud”, disponível em: http://www.bitwise.net/iawww/financial.htm, acedido em 08 de Dezembro de 2009; Public Company Accounting Oversight Board (PCAOB) (2007), “Observations on auditors’ implementation of PCAOB standards relating to auditors’ responsibilities with respect to fraud”, Release n.º 2007-001, January 22, disponível em www.iasplus.com/usa/0701pcaobfraud.pdf 1 Committee of Sponsoring Organizations (COSO) of the Treadway Commission, Fraudulent Financial Reporting: 1987-1997, An analysis of US Public Companies, March 1999. Anexos FRAUDE OCUPACIONAL E ABUSO 19 AUDITORIA RANKING DOS AUDITORES DA IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS SINAIS DE ALERTA DE FRAUDE RANKING 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13,5 13,5 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26,5 26,5 28 29 30 SINAIS DE ALERTA DE FRAUDE OS GESTORES MENTIRAM AOS AUDITORES OU TÊM SIDO EXCESSIVAMENTE EVASIVOS NA RESPOSTA ÀS QUESTÕES A EXPERIÊNCIA DO AUDITOR COM A GESTÃO INDICA UM GRAU DE DESONESTIDADE A GESTÃO COLOCA UMA ÊNFASE INDEVIDA EM ALCANÇAR OS RESULTADOS PROJECTADOS OU OUTROS OBJECTIVOS QUANTITATIVOS A GESTÃO TEM ENTRAVADO DISPUTAS COM OS AUDITORES, PARTICULARMENTE SOBRE A APLICAÇÃO AGRESSIVA DE PRINCÍPIOS CONTABILÍSTICOS QUE AUMENTAM OS RESULTADOS O CLIENTE PROCURA “COMPRAR OPINIÕES” (OPINION SHOPPING)* A ATITUDE DOS GESTORES NO SENTIDO DE RELATO FINANCEIRO EXCESSIVAMENTE AGRESSIVO O CLIENTE POSSUI UM AMBIENTE DE CONTROLO FRACO UMA PARTE SUBSTANCIAL DA COMPENSAÇÃO DOS GESTORES DEPENDE DO CUMPRIMENTO DOS OBJECTIVOS PROJECTADOS A GESTÃO DEMONSTRA UM DESRESPEITO SIGNIFICATIVO PELOS ORGANISMOS REGULADORES AS DECISÕES OPERACIONAIS E FINANCEIRAS SÃO DOMINADAS POR UMA ÚNICA PESSOA OU NÚMERO REDUZIDO DE PESSOAS ACTUANDO DE FORMA CONCERTADA OS GESTORES DO CLIENTE POSSUEM UMA ATITUDE HOSTIL PARA COM OS AUDITORES A GESTÃO APRESENTA UMA PROPENSÃO PARA ASSUMIR RISCOS EXCESSIVOS EXISTEM DIFICULDADES FREQUENTES E SIGNIFICATIVAS PARA AUDITAR DETERMINADAS TRANSACÇÕES OS GESTORES “CHAVE” SÃO CONSIDERADOS EXCESSIVAMENTE NÃO RACIONAIS A ORGANIZAÇÃO É DESCENTRALIZADA SEM ADEQUADA MONITORIZAÇÃO A ROTAÇÃO DA GESTÃO E PESSOAS “CHAVE” DA CONTABILIDADE É ALTA O PESSOAL DO CLIENTE APRESENTA UM SIGNIFICATIVO RESSENTIMENTO DA AUTORIDADE A GESTÃO COLOCA UMA PRESSÃO EXCESSIVA NOS AUDITORES, PARTICULARMENTE ATRAVÉS DA ESTRUTURA DE HONORÁRIOS OU IMPOSIÇÃO DE “DEADLINES” NÃO RAZOÁVEIS A RENTABILIDADE DO CLIENTE INADEQUADA OU INCONSISTENTE FACE AO SECTOR EM QUE SE INSERE O CLIENTE CONFRONTA-SE COM CIRCUNSTÂNCIAS LEGAIS ADVERSAS A GESTÃO EXIBE UMA PREOCUPAÇÃO EXCESSIVA NA MANUTENÇÃO OU MELHORIAS DA IMAGEM/REPUTAÇÃO DA ENTIDADE EXISTEM CONDIÇÕES ADVERSAS NO SECTOR EM QUE SE INSERE O CLIENTE OU OUTRAS CONDICIONANTES EXTERNAS O PESSOAL DA CONTABILIDADE É INEXPERIENTE E EXECUTAM AS SUAS TAREFAS DE FORMA LASCIVA O CLIENTE ENTROU EM UMA OU REDUZIDAS TRANSACÇÕES ESPECÍFICAS QUE POSSUEM UM EFEITO MATERIAL SOBRE AS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS A GESTÃO DA ENTIDADE É INEXPERIENTE O CLIENTE ESTÁ NUM PERÍODO DE RÁPIDO CRESCIMENTO TRATA-SE DE UM NOVO CLIENTE SEM HISTORIAL DE REVISÃO ANTERIOR OU INFORMAÇÃO INSUFICIENTE DO AUDITOR ANTERIOR O CLIENTE ESTÁ SUJEITO A SIGNIFICATIVOS COMPROMISSOS CONTRATUAIS OS RESULTADOS OPERACIONAIS DO CLIENTE SÃO ALTAMENTE SENSÍVEIS A FACTORES ECONÓMICOS, TAIS COMO INFLAÇÃO, TAXAS DE JURO, DESEMPREGO, ETC. O CLIENTE INICIOU RECENTEMENTE UM NÚMERO SIGNIFICATIVO DE TRANSACÇÕES DE AQUISIÇÃO O ranking dos auditores baseou-se na média dos rankings atribuídos pelos participantes no estudo. Rank 1 é o mais frequente; 30 é o menos frequente. *Opinion Shopping - quando as empresas pesquisam por um auditor que irá dar uma opinião positiva às suas práticas contabilísticas 20 Susana Cristina da Silva Miranda Gonçalves / MEMBRO ESTAGIÁRIO AUDITORIA SINAIS DE ALERTA RELEVANTES PARA OS INVESTIDORES E FINANCIADORES (ESTUDO DE CORBIN) OS 10 SINAIS DE ALERTA MAIS IMPORTANTES IDENTIFICADOS RANK 1 2 FINANCIADORES Gestores desonestos e não éticos Frequentes mudanças no conselho legal, auditores ou membros externos da administração 3 A gestão é dominada por uma pessoa(pequeno grupo) e não existe um comité de supervisão eficaz Suspensão ou exclusão da bolsa de valores Incapacidade para gerar cash flows das operações mas relato de resultados e crescimento de resultados Problemas contínuos com agências de regulamentação 4 5 6 7 8 9 10 Alta taxa de rotação de gestores “chave” especificamente executivos financeiros Existência de factores internos e externos que fazem aumentar as dúvidas sobre a continuidade da entidade Má reputação da gestão na comunidade negocial Relutância em fornecer aos investidores/financiadores a informação solicitada INVESTIDORES Gestores desonestos e não éticos Existência de uma quebra nos sistemas contabilísticos e de controlo conforme é percebido pelas demonstrações financeiras ou relatório qualificado do auditor Suspensão ou exclusão da bolsa de valores Má reputação da gestão na comunidade negocial A gestão é dominada por uma pessoa (pequeno grupo) e não existe um comité de supervisão eficaz Frequentes mudanças no conselho legal, auditores ou membros externos da administração Existência de factores internos e externos que fazem aumentar as dúvidas sobre a continuidade da entidade Problemas contínuos com agências de regulamentação Identificação de assuntos importantes não divulgados previamente pela gestão Incapacidade para gerar cash flows das operações mas relato de resultados e crescimento de resultados OS 10 SINAIS DE ALERTA MENOS IMPORTANTES IDENTIFICADOS RANK 1 2 FINANCIADORES Pressão exercida no pessoal da contabilidade para completar as demonstrações financeiras num período curto de tempo conforme reflectido na data das demonstrações financeiras Ciclos de negócio longos não usuais 3 4 Rápida expansão para novas linhas de produtos Garantia disponível limitada 5 A entidade possui um investimento significativo numa indústria ou linha de produto denotada pela rápida mudança Fraco relacionamento interpessoal entre executivos A entidade está fortemente dependente de um ou poucos produtos, clientes ou fornecedores Quebra na procura de produtos 6 7 8 9 10 Executivos chave com excessiva pressão de familiares, colegas, ou comunidade para atingir o sucesso Impacto político, social ou ambiental adverso INVESTIDORES Rápida expansão para novas linhas de produtos Pressão exercida no pessoal da contabilidade para completar as demonstrações financeiras num período curto de tempo conforme reflectido na data das demonstrações financeiras Ciclos de negócio longos não usuais Executivos chave com excessiva pressão de familiares, colegas, ou comunidade para atingir o sucesso Executivos “chave” com rendimentos inadequados relativamente à indústria Impacto político, social ou ambiental adverso Equipa de auditoria interna insuficiente A entidade possui um investimento significativo numa indústria ou linha de produto denotada pela rápida mudança Garantia disponível limitada Falha na informação aos investidores sobre o código de conduta e bom governo da sociedade TÉCNICAS DE FRAUDE MAIS COMUNS (RELATÓRIO COSO) Técnicas de fraude comuns Reconhecimento inadequado de réditos (COSO: 50%) COSO % 26% 24% 16% MÉTODOS/MECANISMOS UTILIZADOS Simulação de vendas Receitas prematuras Vendas condicionadas Cutoff de vendas inadequado Uso inadequado do método da percentagem de acabamento Transporte não autorizado Vendas à consignação Sobreavaliação de activos 37% 12% 6% Sobreavaliação de activos existentes (inventários, activos tangíveis, …) Registo de activos fictícios Capitalização de items que deveriam ser gastos Subavaliação de passivos 18% Derrogação de controlos pelos gestores Uso de lançamentos no diário Diferenças nas estimativas contabilísticas Transacções não usuais 21