A TRANSPOSIÇÃO DA PROBLEMÁTICA DA IDEOLOGIA
PARA PRAXIS DO ENSINO DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA
DO BRASIL
Joélio Barros de Oliveira*
RESUMO: A problemática da Ideologia na práxis das ciências sociais está fundamentada na abordagem ou reprodução da ideologia dominante hegemônica da elite, produzindo um ensino alienante que dificulta ou impede a democratização social e provoca questões como a evasão escolar, repetências, baixa escolaridade em
função da descentralização dos conteúdos abordados no currículo regular de História e Geografia tanto no ensino fundamental como no ensino médio. O que se
propõe é criar uma situação social onde a exclusão social seja subvertida através
da prática de uma educação multicultural, democrática e integrada, permitindo a
construção de sujeitos humanos que fazem parte da diversidade cultural da humanidade.
PALAVRAS CHAVE: Ideologia; exclusão social; diversidade cultural.
ABSTRACT : The problem of the Ideology in the praxis of the social sciences is
based in the approach or reproduction of the elite dominante degemonic ideology,
producing an alienating teaching that hinders or it impedes the social
democratization and its incites subjects as the school escape, repetences, low
briefing in function of the descentralization of contents approached so much in the
History an Geography regular curriculum, in the fundamental teaching as I the
medium teaching. What is proposed is the creation of a social situation where the
social exclusion be subverted through the pratice of a multicultural upbringing
democratic and integrated, allowing the construction og human subjects who
belong of the humanity´s cultural diversity.
KEY WORDS: Ideology; social exclusion; cultural diversity.
É preciso contrapor a ideologia dominante de nação por
uma outra popular que negue a primeira.
Gramsci
*OLIVEIRA, Joélio Barros de. Professor de História da Educação no Curso Normal Superior e
Fundamentos Históricos-Filosóficos da Educação no Curso de Licenciatura em Geografia na FAMAM
(Faculdade Maria Milza); Mestrando em Ciências da Educação UPAP.
Textura, Cruz das Almas-BA, v. 01, n.º 1, p. 90-94, janeiro, 2006.
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O primeiro conhecimento que o homem adquire no processo de socialização é o senso comum, que é herdado do grupo primário (família) e dos antepassados, geralmente transmitido de forma consuetudinária; são idéias e valores que
permitem ao homem interpretar a sua realidade, criando valores para agir, avaliar
e julgar, dentro e seu contexto e de sua coletividade.
Por não ser um conhecimento científico, o senso comum tende a ser pouco
difuso e às vezes incoerente, resistente às mudanças e marcado por crenças e preconceitos, fugindo da realidade ou do conhecimento científico sistematizado.
Os meios de comunicação de massa são os grandes responsáveis por
difundir o senso comum, pela visão fragmentada da realidade, estimulando preconceitos e concepções rígidas, impedindo ou dificultando a visão crítica e a autoconsciência da realidade.
O senso comum é um dos obstáculos para a difusão da ideologia, ou seja
das idéias, concepções ou opiniões sobre um determinado ponto, sujeito a discussões. A ideologia escolar que orienta a prática pedagógica é geralmente o primeiro
instante em que o individuo passa a romper o senso comum e adquirir conhecimento científico. Como diz Gransci: “A ideologia tem a função positiva de atuar
como cimento de estrutura social. Quando incorporada ao senso comum, ajudará
a estabelecer o consenso, que confere a hegemonia a uma determinada classe
que passará a ser dominante”. (GRANSCI, 1920, p. 16).
A ideologia na escola expandiu-se e consolidou-se com a crítica à escola
conservadora (que predominava a ideologia hegemônica do dominante) através
da escola nova que defendia a idéia da educação como instrumento de democratização, capaz de gerar mobilidade social, pregava a escola única, pública e gratuita para todos como forma de igualdade social.
Porém, os resultados foram antagônicos, com altas taxas de repetência,
evasão escolar e distorção ainda maior entre ricos e pobres. Essa realidade fez
surgir a teoria crítico-reprodutiva que preconizava a escola como reprodutora das
diferenças sociais. Como diz Althusser: “O Estado utiliza a escola, assim como
outras instituições (família, igreja, partidos, etc) a fim de estabelecer o consenso
pela ideologia e que por isso são chamados aparelhos ideológicos do estado ...”
(ALTHUSSER L.1975).
A escola única, pública e gratuita, numa sociedade estratificada e de classes, é, na prática, uma utopia o que predomina é a distinção entre a escola pública
massificada para os pobres e a escola privada para a elite, o que dificulta a democratização e inibe os pobres ao acesso ao ensino superior. Dessa forma a escola
reproduz a estrutura hierarquizada e as relações autoritárias existentes fora dela,
acentuando a dicotomia entre a teoria e prática.
Os conteúdos trabalhados nos livros didáticos, mais especificamente nas
áreas de geografia e história, reproduzem o caráter ideológico da cultura dominante esteriotipada, idealizada, deformada e alienante, distante da realidade e da
cultura das classes dominadas, voltada para enaltecer mitos e valores da elite e da
cultura hegemônica; caracteriza a escola como função reprodutiva do sistema
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vigente vinculada à sociedade, às relações de produção, ao sistema político, mantendo e perpetuando a divisão e a estrutura da sociedade.
A problemática da ideologia na praxis das ciências sociais (geografia e história) deve ser abordada de forma a romper com essa estrutura, priorizando
desenvolver conteúdos e abordagens voltadas para o contexto do educando, através da utilização das culturas minoritárias (negros, índios, mulheres, trabalhadores) nas quais estão inseridas, contextualizando a história e a geografia dentro da
ótica de massa, de forma regular, nos conteúdos curriculares.
A abordagem histórico- crítica, reproduzindo a visão da coletividade, mas
não da elite dominante, vai resgatar a importância da massa popular dentro das
transformações sociais ao longo da história e permite ao educando uma visão uniforme, democrática e justa dos fatos históricos, ao mesmo tempo em que demonstra a diversidade cultural e desenvolve no aluno seu senso crítico e a habilidade de
interpretar, de forma imparcial, o processo que marcou a humanidade.
Portanto, a pratica das ciências sociais deve estar voltada para a não reprodução da ideologia dominante, hegemonia da elite, mas que seja capaz de produzir um ensino voltado para a democratização social que permita ao sujeito perceber a sua importância dentro da sociedade em que está inserido como elemento
crítico, solidário e capaz de transformar a realidade para o desenvolvimento justo,
uniforme e harmônico de sua coletividade e de todos os indivíduos, rompendo o
modelo de divisão social que só favorece à elite.
Dentre as causas que conduzem a esse processo, destaca-se a falta de integração dos conteúdos abordados com a realidade do educando, dissociando a
prática educacional com o contexto. Vê-se esse processo como falta de inclusão
da diversidade cultural nos currículos escolares, na maioria das escolas brasileiras, que apenas reproduzem o conteúdo dos livros didáticos, alimentam a cultura
dominante e afastam as chamadas sub-culturas ou culturas das minorias, que
representam a maior dos estudantes das escolas públicas no Brasil. Como diz Torres, Santomé “quando analisarmos detalhadamente os conteúdos que são objeção explicita na maioria das instituições escolares e nas propostas curriculares
chama nossa atenção a presença abusiva das denominadas culturas hegemônicas...” (TORRES, Santomé, 1998, p. 19-23).
Em grande parte, as instituições escolares produzem currículos com o discurso de valorização da cidadania, ou seja, a intenção é preparar os estudantes
para a transformação da realidade, de forma que sejam cidadãos participativos,
críticos, solidários e democráticos. Com tais competências, estarão aptos para
compertir na sociedade capitalista, contribuindo, dessa maneira para o desenvolvimento de sua coletividade.
Mas, na prática não é o que ocorre. O educando convive com uma estrutura
educacional em que conteúdos e disciplina são “depositados” como informações
sem que haja participação na atividade pedagógica.
Por não associar esse conteúdo com a sua realidade, com o conhecimento
do mundo, tampouco tem preparação para o mercado de trabalho, a maior parte
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apenas se esforça para a obtenção do certificado. Tais fatos contribuem para a
determinação da estrutura social, étnica, sexual, etc, vigente, isto é, sustenta o
poder de dominação.
É comum associar o fracasso escolar como uma concepção ou condição
única da escola, ou seja, da estrutura escolar, de professores incapacitados, gestores autoritários, falta de estrutura física adequada, pouco investimento em material, etc. Vale destacar que o que se discutiu contribuiu direta ou indiretamente
para este resultado, porém não se pode fazer esta análise apenas na perspectiva
das instituições escolares, sem uma compreensão da dimensão política e social a
que a escola está submetida. Ela, nessa direção, segue os mecanismos de
dependência instituídos pelas elites, servindo de uma ideologia de poder que
pode excluir uma grande parcela da população de acordo com o interesse do sistema como diz Arrojo, Miguel “O fracasso escolar é uma expressão do fracasso
social dos complexos processos de reprodução da lógica e da política de exclusão
que perpasse todas as instituições sociais e políticas o estado, os clubes, as fábricas, as igrejas, as escolas” (Arrojo, Miguel, 2000, p. 33-40). Muito se tem discutido, escutado, escrito, falado sobre o fracasso escolar; teorias, ideologias, alienação e radicalismo constituem abordagem desse tema por educadores, gestores e
outros profissionais ligados à educação.
O resultado da estrutura educacional com baixo rendimento, evasão escolar, pouca escolaridade, baixo conhecimento, habilidade e senso crítico, já está
associado à questão escolar como um todo, os questionamentos da ideologia e da
cultura dominante, a uma nova prática educacional que rompa com toda essa
estrutura e valores pré-estabelecidos. Como diz Arrojo Miguel.
O processo escolar mais eficaz para reeducar e situar o foco da
intervenção na estrutura do sistema escolar, na lógica que o inspira, pretendemos intervir no sistema escolar crentes de que esse sistema, sua cultura, rituais, lógicas, estruturas podem ser mais democráticos, menos seletivo. (ARROJO, MIGUEL, 2000, p. 33-40).
O que se propõe é desenvolver uma situação escolar que permita a garantia de acesso ou direito à cultura, ao conhecimento e ao desenvolvimento humano,
para que a exclusão social seja subvertida através da prática de uma educação
que permitirá a construção de sujeitos humanos que respeitem as diferenças e
que se reconheçam com sujeitos que fazem parte da diversidade cultural da humanidade.
REFERÊNCIAS
ALTHUSSER. L. Ideologia e aparelhos ideológicos do Estado. Lisboa: Presença
s/d.
Textura, Cruz das Almas-BA, v. 01, n.º 1, p. 90-94, janeiro, 2006.
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ARROYO, Miguel G. Fracasso/Sucesso: Um pesadelo que perturba nossos
sonhos. In: Revista em Aberto, Brasília, v. 17, nº 71, janeiro 2000.
CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES: Confederação Nacional do metalúrgicos, programa Integrar. Trabalho e tecnologia, Caderno do aluno, 1998.
PARO, Vitor Henrique. Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo: Ática,
1997.
ROMANELLI; Otaiza de Oliveira. História da Educação no Brasil. 20ª ed. São Paulo, vozes,1998.
SANTOMÉ, JURJO TORRES. Globalização e Interdisciplinaridade. O currículo
Integrado. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.
STRECK, Danilo (org.) Educação Básica e o Básico na Educação. Porto Alegre:
Sulina/unisinos, 1996.
Textura, Cruz das Almas-BA, v. 01, n.º 1, p. 90-94, janeiro, 2006.
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