EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DE JOVENS: ESTUDO SOBRE AS
RELAÇÕES ENTRE ATIVIDADES TEÓRICAS E PRÁTICAS EM
UM PROGRAMA DE APRENDIZAGEM
Paula Elizabeth Nogueira SALES1
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
RESUMO: Este trabalho é parte de um Projeto de Mestrado, em andamento, que visa a estudar
a Educação Profissional de jovens em um Programa de Aprendizagem. O desenvolvimento
deste programa é pautado pela Lei da Aprendizagem, que obriga empresas de médio e grande
porte a contratarem jovens aprendizes, patrocinando sua formação profissional, que contempla
atividades práticas e teóricas. As atividades práticas são realizadas pelas empresas contratantes,
no ambiente profissional. Por sua vez, essas empresas estabelecem parceria com organizações
de formação profissional que são responsáveis por ministrar o conteúdo teórico da
aprendizagem, bem como acompanhar o desenvolvimento produtivo e social do aprendiz. Nesse
contexto, pretende-se analisar as relações entre atividades teóricas e práticas no Programa de
Aprendizagem desenvolvido pela Fundação CDL em Belo Horizonte – MG.
PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem Profissional; Relação teoria-prática; Programa de
Aprendizagem.
1. Introdução
A juventude brasileira se constitui como um dos segmentos mais desfavorecidos
pelo crescimento dos problemas sócio-econômicos do País, tais como concentração de
renda, educação de baixa qualidade, desemprego, baixos salários, entre outros. Diante
do quadro exposto, grande parte da juventude vem se inserindo precocemente no
mercado de trabalho, buscando sua sustentação e, muitas vezes, de seus familiares. Em
decorrência, geralmente os jovens são afastados da escola pela dificuldade de
conciliação entre estudo e trabalho, impedindo que avancem seus estudos e tenham
melhores possibilidades de ascensão sócio-econômica.
Esses jovens, que não têm oportunidade de prolongamento dos estudos, tornamse uma força laboral de baixo custo e desqualificada, submetendo-se a situações de
precariedade nos mais diversos setores, inclusive no mercado informal e ilegal, como o
1
tráfico de drogas e a prostituição. Muitas vezes, iniciam atividades profissionais antes
da idade permitida pela legislação – a partir de dezesseis anos. Além disso, não têm seus
direitos trabalhistas garantidos e realizam atividades impróprias para suas fases de
desenvolvimento, como trabalho noturno, perigoso e insalubre. Pochmann2 (apud
LEHMAN, 2006, p. 82) ressalta:
Diante das transformações atuais na economia brasileira, as alternativas ocupacionais do
jovem estão distantes, cada vez mais, dos setores modernos da economia e associadas,
geralmente, aos segmentos de baixa produtividade, bem como à alta precariedade do posto
de trabalho. Hoje, os padrões ocupacionais dos jovens apontam para o agravamento do
quadro de marginalização e desagregação social produzido pelas políticas
macroeconômicas e reproduzidas pelo funcionamento desfavorável do mercado de trabalho.
Acrescenta-se ainda que o funcionamento atual do mercado de trabalho é
caracterizado pela imprevisibilidade, velocidade de mudanças tecnológicas e
organizacionais, competição e grande exigência quanto ao conhecimento, qualidade e
produtividade, o que demanda o desenvolvimento de competências profissionais em
graus de complexidade maiores.
Diante desse panorama do mercado, que requer um novo perfil de trabalhador,
há uma tendência de reestruturação nas propostas de educação, a fim de atender às
novas demandas da economia. A educação profissional tem se tornado um lócus
importante para a formação de trabalhadores, recebendo aportes e normalizações da
SETEC (Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica), ligada ao Ministério da
Educação, e sendo cada vez mais influenciada pelas instâncias ligadas ao trabalho,
como o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e as empresas. Cabe ressaltar que,
excetuando-se a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica, sua estrutura
tem sofrido um empobrecimento da dimensão pedagógica, reduzindo-se na maioria das
vezes a programas rápidos de treinamento (COSTA, 2002).
Tal empobrecimento se relaciona com uma educação dual, que vem se repetindo
na história brasileira, ao promover a separação entre educação profissional e educação
geral. A educação profissional sempre foi direcionada à população desfavorecida, tais
como escravos, operários, pobres, órfãos e desvalidos da sorte, em geral, visando ao
preparo para o trabalho manual. Para os mais favorecidos, ao contrário, era reservada
uma educação propedêutica, possibilitando a continuidade dos estudos e o ingresso no
2
ensino superior e, conseqüentemente, a manutenção de suas posições sócio-econômicas
privilegiadas (CORDÃO, 2006).
Diversos autores (DELUIZ, 1996; OLIVEIRA, 2000; CIAVATTA, 2005;
CORDÃO, 2006; SILVA, 2006) discorrem sobre a importância de superar o dualismo
ainda presente na educação, sendo a favor de uma educação unitária, que integre
qualidade e eqüidade. Sobre isso, Kuenzer3 (apud OLIVEIRA, 2000, p.9) afirma:
A verdadeira democracia se estabelece pela possibilidade dos alunos, sejam eles oriundos
de quaisquer classes sociais desfrutarem de uma escola que articule igualmente o
conhecimento prático e teórico, possibilitando, assim, no futuro, aos setores populares,
disporem de conhecimentos diversos que lhes permitam exercer, em melhores condições
intelectuais, a sua cidadania.
Em princípio, constata-se na legislação brasileira uma tentativa de superação
dessa dualidade. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – Lei nº
9.394/1996 (BRASIL, 1996) – estabelece que a educação objetiva “o pleno
desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho” (art. 2º) e define o trabalho educativo como “atividade
laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social
do educando prevalecem sobre o aspecto produtivo.” (art. 68). Entretanto, existe uma
distância entre o que os documentos normativos propõem e o que a prática concretiza.
O Decreto nº 5.154/2004, que trata da estruturação da Educação Profissional e
Tecnológica, definiu as seguintes modalidades de cursos profissionalizantes: formação
inicial e continuada de trabalhadores; educação profissional técnica de nível médio; e
educação profissional tecnológica de graduação e de pós-graduação.
Na modalidade de formação inicial e continuada inserem-se os Programas de
Aprendizagem para jovens, criados com o intuito de desenvolver aptidões para a vida
produtiva e social, através de formação profissional que contemple conteúdos teóricos e
práticos.
Recentemente, a implantação de tais programas tem se intensificado, devido à
promulgação da Lei da Aprendizagem (Lei nº 10.097/2000) e à regulamentação dela
através do Decreto nº 5.598/2005. Essa lei, que consta na Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT) desde 1943, deve ser promovida e patrocinada por médias e grandes
empresas, de qualquer natureza, contratando-se jovens aprendizes entre catorze e vinte e
3
quatro anos. As vagas destinadas a aprendizes devem ser de 5 a 15% do total de
funcionários da empresa, cujos cargos demandam formação profissional.
Os jovens aprendizes têm direito ao contrato formal, sendo assegurados de todos
os direitos trabalhistas e previdenciários. Eles devem receber salário mínimo hora, salvo
condição mais favorável. É necessário cursarem, concomitantemente, o ensino
fundamental, caso ainda não o tenham concluído. Além disso, o trabalho dos aprendizes
com idade inferior a dezoito anos deve ser protegido, de acordo com as normas
estabelecidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que veda o trabalho realizado
em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral
e social; realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.
As empresas contratantes estabelecem parceria com instituições que oferecem
formação profissional, tais como os Serviços Nacionais de Aprendizagem (SENAI,
SENAC, SENAR, SENAT e SESCOOP) e entidades do terceiro setor. Essas últimas,
para desenvolverem seus Programas de Aprendizagem, precisam ser regulamentadas
pelos Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).
Outro órgão envolvido nesses programas é a Delegacia Regional do Trabalho
(DRT), vinculada ao MTE, a qual é responsável por fiscalizar tanto o cumprimento da
Lei da Aprendizagem pelas empresas, como a execução do programa pelas entidades de
formação profissional. O MTE também é responsável, de acordo com o Decreto nº
5.598/2005, por editar, ouvindo o Ministério da Educação, normas para avaliação da
competência das entidades responsáveis pela formação técnico-profissional dos
aprendizes.
Considera-se importante que o processo educacional desses programas,
articulados ao ensino regular, compreenda não uma mera formação para o mercado de
trabalho, mas o preparo de cidadãos conscientes, cujas potencialidades sejam
desenvolvidas integralmente, favorecendo a sua efetiva inclusão na sociedade. Cabe
ressaltar a relevância das atividades teóricas e práticas nesse tipo de programa,
conforme aponta Machado (1989, p.129):
A instrução combinada com o trabalho produtivo seria mais uma das expressões da relação
teoria e prática. Esta relação tem sua dimensão prática, pois enquanto a teoria serve de guia
de ação, a atividade prática constitui o fundamento de todo conhecimento. O homem se
completa, se aperfeiçoa teoricamente, à medida que estabeleça esta relação sempre de
maneira consciente. Portanto, o ensino politécnico, não é suficiente apenas um domínio de
técnicas; faz-se necessário dominá-las a um nível intelectual. Além da iniciação no manejo
4
das ferramentas básicas utilizadas nas diversas atividades de trabalho, é fundamental
permitir à criança e ao jovem o acesso aos conhecimentos necessários à compreensão
científica do objeto em estudo, seja ele uma máquina, um fenômeno da natureza ou uma
relação socialmente produzida.
É nesse contexto de aprendizagem profissional que o presente trabalho propõe o
estudo da relação entre atividades teóricas e práticas em um Programa de Aprendizagem
de Belo Horizonte – MG, sob as perspectivas dos diferentes atores sociais envolvidos:
jovens aprendizes, professores, organização de formação profissional, empresa e DRT.
Os documentos que regulamentam os Programas de Aprendizagem enfatizam a
importância das atividades teóricas na mesma direção que a LDB. O Decreto nº
5.598/2005 (BRASIL, 2005), no art. 6º do capítulo III, estabelece que a formação
técnico-profissional que integra o contrato de aprendizagem deve compreender
“atividades teóricas e práticas, metodicamente organizadas em tarefas de complexidade
progressiva desenvolvidas no ambiente de trabalho.”
A Resolução CMDCA nº 51/2003 (BELO HORIZONTE, 2003), que dispõe
sobre a execução de Programas de Aprendizagem em Belo Horizonte, determina que a
formação profissional deve incluir “teoria e prática, com preponderância da pedagogia
do desenvolvimento pessoal e social do educando sobre o aspecto laboral produtivo.”
(art. 5º). Essa resolução ainda dispõe que “A prática supervisionada, executada dentro
do curso de formação profissional, integrante do programa de aprendizagem, deverá
corresponder, no máximo, a 75% da carga horária total do curso.” (art. 8º).
Assim, o presente estudo pretende contribuir para a reflexão sobre a importância
de haver uma relação de complementaridade entre atividades teóricas e práticas na
formação profissional, possibilitando a inclusão qualificada do jovem no mercado de
trabalho e o exercício de sua cidadania. Outra possível contribuição é a divulgação das
experiências dos Programas de Aprendizagem ainda pouco conhecidas, inclusive pelas
empresas que devem implantá-los, já que é recente a regulamentação da Lei de
Aprendizagem, que aconteceu em dezembro de 2005.
2. Objetivos
O objetivo geral desta pesquisa é analisar as relações entre atividades teóricas e
práticas na educação profissional de jovens em um Programa de Aprendizagem.
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Os objetivos específicos, assim se apresentam:
•
Contextualizar historicamente a educação profissional e o desenvolvimento
dos Programas de Aprendizagem no Brasil.
•
Investigar a percepção e a importância atribuída pelos atores sociais aos
aspectos teóricos e práticos do Programa de Aprendizagem.
•
Avaliar a dinâmica de funcionamento do programa e o desenvolvimento de
suas atividades teóricas e práticas.
•
Verificar a coerência das relações estabelecidas entre as atividades
desenvolvidas, as percepções dos atores e os documentos normativos
referenciados pelo programa (LDB – Lei nº 9346/96, Resolução CMDCA nº
51/2003, Lei da Aprendizagem – Lei nº 10.097/2000).
3. Fundamentação teórica
Estão sendo considerados neste estudo autores que abordam a educação
profissional e aspectos da relação teoria e prática (Saviani, 1989; Deluiz, 1996; Ferreti,
1999; Kuenzer, 2003; Barato, 2004; Frigotto e Ciavatta, 2005) e a temática da juventude
e trabalho (Tanguy, 1999; Frigotto, 2004; Pochmann, 2004).
4. Metodologia
A pesquisa que está sendo desenvolvida tem um enfoque predominantemente
qualitativo, pois se preocupa com o processo dos fenômenos e não só com os resultados
e o produto deles decorrentes. Contudo, o estudo também terá uma etapa quantitativa,
em que serão analisados dados estatísticos relacionados ao perfil dos atores.
A estratégia de pesquisa utilizada é a de estudo de caso, tendo como contexto o
Programa de Aprendizagem da Fundação CDL/BH. Os participantes, bem como as
relações que se estabelecem entre eles estão descritas na FIG. 1.
F
Organização
de Formação
Profissional
DRT
F
T
Aprendizes
6
Empresa
P
Figura 1: Relação entre os atores sociais envolvidos na aprendizagem
Legenda: T – Teoria / P – Prática / F – Fiscalização
Fonte: elaborado pelas autoras
Dentre as fontes para coletas de dados, optou-se nesta pesquisa por utilizar:
pesquisa documental, questionários, entrevistas semi-estruturadas e observação livre. A
análise dos dados, por sua vez, será realizada utilizando-se o método de Análise de
Conteúdo.
5. Resultados parciais
Através da Pesquisa Bibliográfica e Virtual, constatou-se que existem poucos
estudos sobre os Programas de Aprendizagem, principalmente aqueles que são
desenvolvidos por organizações do terceiro setor.
Na Pesquisa Exploratória realizada na CDL, observou-se que as atividades
teóricas ocorrem uma vez por semana e as atividades práticas, quatro vezes por semana,
havendo, assim, uma predominância da prática sobre a teoria.
A análise dos documentos normativos referentes ao Programa de Aprendizagem
também apontou essa preponderância, já que a carga horária mínima exigida para as
atividades teóricas é de 25%.
6. Referências bibliográficas
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7
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