UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE
MARIA IRENI NERES ROCHA
RACISMO: NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO NA ESCOLA ESTADUAL
IRMÃOS FERNANDES, MUNICÍPIO DE ITAOBIM, NO ANO 2012
Araçuaí-MG
Julho - 2012
MARIA IRENI NERES ROCHA
RACISMO: NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO NA ESCOLA ESTADUAL
IRMÃOS FERNANDES, MUNICÍPIO DE ITAOBIM, NO ANO 2012
Monografia apresentada ao Programa de
Educação para a Diversidade, do Instituto
de Ciências Humanas e Sociais da
Universidade Federal de Ouro Preto,
como requisito parcial à obtenção do grau
de Especialista em Gestão de Políticas
Públicas com ênfase em Gênero e Raça.
Orientadora: Me. Alice Lino
Araçuaí-MG
Julho/2012
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho especialmente às
pessoas que acreditaram na minha
capacidade
e
me
incentivaram
incondicionalmente.
Em especial, aos meus pais: Maria das
Dores Neres Rocha (um exemplo de
garra, força, persistência e coragem), e
José Francisco Rocha (em memória), que
além de me darem o dom da vida,
ensinaram-me valores imprescindíveis à
minha formação, tanto pessoal quanto
profissional.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço a Deus, pois ele tem sido a razão das
minhas vitórias;
À minha família, por estar sempre ao meu lado, apoiando-me nas
minhas decisões e alegrando-se com o meu sucesso.
Agradeço também à Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP,
pelo empenho e dedicação na promoção desse curso que deu
oportunidades
aos
alunos/cursistas
de
se
tornarem
profissionais
competentes e mais humanizados.
Em especial, aos alunos negros da Escola Estadual Irmãos
Fernandes, por terem sido a motivação na elaboração desse trabalho
científico, que demonstra em seu bojo o intuito de encontrar uma solução
para os problemas que os mesmos enfrentam, principalmente no âmbito
escolar e que refletem na aprendizagem.
Racismo e ignorância caminham sempre de
mãos dadas. Os estereótipos e as ideias préconcebidas vicejam se está ausente a
informação, a falta do diálogo aberto, arejado,
transparente.
Cardoso (2001)
ROCHA, Maria Ireni Neres. Racismo: necessidade de superação na
Escola Estadual Irmãos Fernandes, município de Itaobim, no ano 2012.
Araçuaí: UFOP, 2012. (Trabalho de Conclusão de Curso de PósGraduação Lato sensu).
RESUMO
O trabalho apresenta um estudo sobre o Racimo na Escola Estadual
Irmãos Fernandes. No decorrer da pesquisa, procurou-se compreender
como as instituições de educação pública têm contribuído para superar o
racismo ainda presente em seu meio. A pesquisa assumiu a característica
qualiquantitativa, com análise inicial de autores como: Fernandes (2008),
Munanga (2001), Sant’Ana (2001), Gonçalves (2012), dentre outros que
contribuíram com a fundamentação teórica do texto. Compreendeu-se
que apesar de o racismo ser identificado legalmente como um crime, ele
ainda se encontra presente em atitudes insanas no meio escolar. Essa
realidade foi evidenciada na escola pesquisada no município de Itaobim.
Nessa localidade, foi realizada uma pesquisa de campo que teve como
recurso um questionário com cinco questões fechadas e uma aberta, que
foi respondido por vinte alunos negros. Associada às descrições do
estudo teórico, a pesquisa empírica demonstrou que nessa instituição os
alunos negros se sentem vítimas da exclusão, do descaso, da
discriminação e da concepção de que a aprendizagem é mais difícil para
os mesmos. Diante dessa pesquisa, analisou-se a importância de se
intensificar as políticas públicas afirmativas de combate ao racismo no
meio escolar. Esses alunos têm direitos garantidos legalmente, e esses
direitos precisam ser aplicados no âmbito educativo para que os alunos
sejam beneficiados com a tão almejada igualdade de oportunidades.
Palavras-chave: Racismo. Escola. Desafios. Superação.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Como os alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes
identificam a discriminação racial? ................................................................... 27
Figura 2. Você já foi vítima de discriminação racial? ........................................ 28
Figura 3. Se a resposta anterior for sim, sobre qual forma a discriminação
racial se processou? ......................................................................................... 29
Figura 4. Se houve discriminação, quem se constituiu como agressor? .......... 31
Figura 5. A instituição escolar que você estuda promove intervenções
pedagógicas como perspectiva de vencer os desafios da inclusão do
aluno negro em seu meio? ............................................................................... 33
SUMÁRIO
Introdução ......................................................................................................... 08
Capítulo I. O aluno negro: princípios históricos presentes na escola
contemporânea ................................................................................................. 11
1.1 - O escravismo sobre o foco de princípios históricos ....................... 11
1.2 - Breves definições das ações que movem condutas
desumanas contra os negros ................................................................. 13
1.3 - O aluno negro na escola contemporânea: novos desafios
sobre problemas históricos..................................................................... 20
Capítulo II. O aluno negro na Escola Estadual Irmãos Fernandes no ano
2012 .................................................................................................................. 26
Conclusão ......................................................................................................... 38
Referências ....................................................................................................... 40
Apêndice I ......................................................................................................... 42
Anexo I .............................................................................................................. 44
8
INTRODUÇÃO
Em virtude das transformações histórico sociais ocorridas nas
últimas décadas, inclusive com os princípios legais de inclusão
educacional, de valorização das diferenças, bem como das conquistas
sociais que envolvem os alunos negros no contexto escolar, temáticas
relacionadas à inclusão dos mesmos e dos afrodescendentes ganharam
ênfase, conforme destaca Fernandes (2008).
De acordo com Theodoro (2001), o grande ideal centra-se em rever
os princípios de exclusão que os negros sempre enfrentaram na
sociedade brasileira e, consequentemente, no meio escolar e promover
processos plurais de convivência, com indivíduos conscientes de que
somente com a união da diversidade torna-se possível construir um novo
mundo.
Ainda de acordo com Theodoro (2001), o grande problema é que o
racismo, a discriminação e a exclusão possuem fortes marcas históricas,
fixadas sobre bases dominadoras e que ainda prevalecem no mundo
contemporâneo entre os seus indivíduos.
A realidade é que a discriminação se constitui como um resultado
comportamental da sociedade ao longo do tempo, motivo pelo qual
Sant’ana (2001) defende que a própria educação formal, inserida nesse
meio, construiu as bases da discriminação.
Ainda de acordo com Sant’ana (2001), as práticas racistas se
fizeram presentes de maneira implícita e explícita nos livros didáticos e
nas práticas pedagógicas. Esse fator, pesar de ter sido questionado nas
últimas décadas e, legalmente modificado, ainda prevaleceu arraigado
tanto nas práticas educativas quanto nas ações discriminatórias presentes
no contexto da educação formal.
Essa temática torna-se inquietante à medida que existe o
reconhecimento de que a sociedade precisa de leis para amparar
legalmente uma inclusão que deveria ser uma ação espontânea. No
entanto, necessita de princípios legais de inclusão para ser capaz de
9
valorizar o grande papel do negro na constituição histórica do povo
brasileiro.
A educação é um direito de todos, amparada por legislações como:
a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDB 9394/96, os Parâmetros Curriculares Nacionais e as
diretrizes que se demonstram inovadoras.
Dessa forma a escola assume a responsabilidade direta de vencer
os desafios históricos, que envolvem os alunos negros, para construir,
assim, uma nova perspectiva de trabalho em seu meio.
Diante do exposto, verifica-se que a temática em discussão é de
relevância social, haja vista que a sociedade é composta pela dinâmica
da heterogeneidade. Em meio a esse contexto, os indivíduos injustiçados,
sobretudo, os negros e os afrodescendentes, almejam descobrir
estratégias capazes de impulsionar uma educação fixada em princípios
de igualdade de oportunidade, direcionada a todos os cidadãos,
independentemente da sua cor ou etnia.
Nessa perspectiva, o presente trabalho discorre sobre os desafios
históricos e perspectivas contemporâneas dos alunos negros no contexto
escolar. O estudo se amparou na hipótese de que a partir de inovações
na legislação brasileira contra as práticas racistas, o negro passou a ser
visto sob um novo foco de inclusão social e educacional, conforme
destaca Theodoro (2001).
Diante deste pressuposto, questiona-se: Por que mesmo diante de
inovações na legislação brasileira os alunos negros ainda são vítimas de
discriminações raciais no contexto escolar? Este problema foi analisado
com o objetivo principal de compreender como as instituições de
educação pública têm contribuído para superar o racismo ainda presente
em seu meio.
Objetivou-se ainda: analisar a conjuntura histórica que envolve a
trajetória do negro no meio social e escolar; diagnosticar as principais
práticas racistas ainda prevelecentes em instituições públicas de ensino e
investigar perspectivas de intervenção educacional capazes de erradicar
o racismo no contexto escolar na Escola Estadual Irmãos Fernandes.
10
A pesquisa se amparou inicialmente na metodologia teórica,
desenvolvida a partir de leituras, análises e fichamentos de livros, revistas
e artigos científicos.
Posteriormente, foi realizada uma pesquisa de campo com alunos
negros da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012, instituição
pública do município de Itaobim. Essa última pesquisa foi cunho
quantitativo e qualitativo, e teve como recurso um questionário com seis
questões. As respostas serviram como base para a construção de
gráficos estatísticos que demonstram claramente os resultados da
pesquisa.
Um trabalho de enfoque na superação do racismo no meio escolar
torna-se um viés ao estímulo da busca de novas reflexões e análises,
tanto pessoais, pelo motivo de que a convivência com práticas racistas no
cotidiano da escolar é inquietante, quanto institucionais e acadêmicas, já
que tende a ampliar os estudos já existentes na área.
11
CAPÍTULO I
O ALUNO NEGRO: FATOS HISTÓRICOS PRESENTES NA
ESCOLA CONTEMPORÂNEA
A sociedade contemporânea vivencia uma realidade em que a
inclusão efetiva do aluno negro no contexto da educação formal ainda
consiste em um desafio a ser vencido. A realidade exposta por Fernandes
(2008), é que ainda prevalece na sociedade, um racismo sutil, ditado por
fatores históricos presentes em atitudes sociais e educativas.
Esse racismo se apoia em paradigmas presentes nas ações
cotidianas e que são reconhecidos, como reflexos diretos de uma
sociedade que se estruturou sobre as bases do sistema escravocrata,
mas que não soube valorizar a participação do negro na constituição
histórica e social do povo brasileiro (FERNANDES, 2008).
Nesse sentido, Sant’ana (2001) considera que o negro foi privado
de viver, de estudar, de ser gente e, em virtude da sua própria condição
histórica no meio social, participa de uma sociedade desumana . Mesmo
diante de inovações e de princípios éticos e legais de inclusão, sua
participação na educação formal ainda consiste em minoria e a maioria
entre os analfabetos.
Esta situação referente à educação formal dos negros é um
resultado direto de fatores históricos que se desencadearam até no
contexto da sociedade contemporânea, e que contribuem diretamente
para que as discriminações raciais se constituam em realidades presentes
tanto no meio social quanto no meio escolar.
1.1 O Escravismo sobre o Foco de Fatos Históricos
Estudos de Sant’Ana (2001) demonstram que a história da
escravidão assume contextos diferenciados na narrativa da humanidade,
12
com indícios de que nem sempre o negro foi considerado um escravo.
Existem registros na Grécia Antiga, de que seus habitantes, os persas, se
consideravam superiores aos demais povos de outras civilizações que,
por sua vez, eram reconhecidos como bárbaros.
Essa forma de escravismo de raças demonstrava uma cultura em
que o domínio entre os povos prevaleceu com base na diferença entre as
civilizações (SANT’ANA, 2001).
De acordo com as descrições de Mello (2000), na Grécia Antiga, a
escravidão era considerada algo comum entre os pequenos agricultores,
camponeses, artesãos, comerciantes, a população normalmente sem
terras, povos considerados plebeus e clientes, que haviam contraído
dívidas e não conseguiam pagá-las. Dessa forma, tornavam-se escravos,
explorados em trabalhos diversos e com vivência precária.
No entender de Brugnela (1998), em meio ao contexto de
discriminação, a civilização grega vivenciou um racismo diferenciado,
cultural, e não relativo à cor da pele, ou aos negros, mas presente no
sentimento de superioridade e na vontade de
dominação
que se
encontrava entre esses povos.
Estas características se mostravam atuantes no berço das
civilizações, a diferença é que essa discriminação não se distinguia pela
cor da pele, mas somente pela cultura, ou conforme o posicionamento do
indivíduo na sociedade (BRUGNELA, 1998).
Somente na Idade Média, por intermédio de tendências inovadoras
de saberes, surge a concepção de superioridade entre uma raça e outra
com concentração na cor da pele. Essa diferenciação foi avigorada por
intelectuais desse período, ligados à Igreja Católica Romana, e serviu
como um dos pilares do racismo considerado moderno, conforme defende
Sant’Ana (2001).
Para Mello (2000), os princípios escravocratas da Antiguidade
começaram a se transformar por intermédio das mudanças políticas,
sociais e econômicas que impulsionaram as práticas mercantilistas e
afloraram o capitalismo. Este, por sua vez, exigiu uma nova ordem, com
características centradas na obtenção de lucros a baixos custos.
13
Em meio a esse cenário, o negro passou a ser sinônimo de mãode-obra barata, da capacidade de sustentar as ambições do homem
branco, considerado nesse período histórico como inteligente, sábio,
superior, tanto pela sua cor de pele, quanto pela sua capacidade de
conquistar o mundo a partir das suas ideias por intermédio do capital,
conforme defende Sant’ana (2001).
De acordo com Alencastro (1999), os negros se transformaram,
assim, em grandes propulsores da captação de riquezas para o homem
branco, pois eram responsáveis pelo trabalho pesado, com pouco, ou
nenhum direito de serem educados, de constituírem estrutura familiar ou
de pensarem como seres humanos livres.
Nesse período, “[...] à diferença da escravidão na Grécia e na
Roma antiga, o escravismo moderno reforça o estatuto legal do cativeiro
com a discriminação racial: o escravo só podia ser preto ou mulato, nunca
branco” (ALENCASTRO, 1999, p. 88).
Em meio a esse contexto, imensuravelmente mais abrangente que
as descrições acima expostas, surge o racismo contra os negros. Os
fatores históricos contribuem então, para desencadear os preconceitos,
as discriminações, bem como os atos de desumanidade para com os
indivíduos cuja cor da pele era diferente. Estas características
comportamentais foram consolidadas como doutrina racista no século
XIX, conforme defende Sant’ana (2001).
Os estudos de Brugnela (1998) contribuem para o reconhecimento
de que se mudou somente o foco do escravismo: do homem branco e
socialmente desprovido de recursos financeiros para o homem negro.
Mas, os atos de dominação e atitudes desumanas prevaleceram como no
princípio civilizatório, com ações de crueldade para com os seres
humanos considerados diferentes.
1.2 - Breves definições das ações desumanas contra os negros
As condutas desumanas acometidas contra os negros assumem
distintas definições, e são identificadas como práticas inadequadas que
14
além de infringir os direitos legais dos cidadãos, ainda demonstram a
incapacidade humana em valorizar as diferenças, conforme destaca
Brugnela (1998).
Uma dessas práticas consiste no racismo, definida como:
A teoria ou ideia que existe uma relação de causa ou
efeito entre as características físicas herdadas por uma
pessoa e certos traços de sua personalidade,
inteligência ou cultura. E, somados a isso, a noção de
que certas raças são naturalmente inferiores ou
superiores a outras (BEATO apud SANT’ANA, 2001, p.
53).
As descrições de Beato (apud Sant’ana, 2001) distinguem que a
concepção de inferioridade e superioridade entre os seres é que
determina
o
racismo.
Estas
características
estão
presentes
em
comportamentos incapazes de valorizar as diferenças que demarcam o
distanciamento entre uma raça e outra e que, apesar de retrógrada, ainda
se encontra presente no meio social.
Para Lourenço (2006), até a terminologia racismo é considerada
como inadequada, deveria receber a nomenclatura de xenofobia. Este
termo expõe explicitamente a desconfiança, a antipatia e se associa ao
racismo à medida que ele é levado ao extremo, e se consolida no meio
social como um dos mais desprezíveis comportamentos humanos.
Assim como o racismo, o preconceito também se constitui como
uma conduta desumana que atinge os negros, ele é definido como:
[...] uma opinião preestabelecida, que é imposta pelo
meio, época e educação. Ele regula as relações de uma
pessoa com a sociedade. Ao regular, ele permeia toda a
sociedade, tornando-a uma espécie de mediador de
todas as relações humanas. Ele pode ser definido,
também, como uma indisposição, um julgamento prévio,
negativo, que se faz de pessoas estigmatizadas por
estereótipos (SANT’ANA, 2001, p. 54).
As atitudes preconceituosas são designadas por Sant’ana (2001)
como formas prévias de julgar ou distinguir uma pessoa, com opiniões
emitidas sem o devido conhecimento e que criam verdadeiras barreiras
entre a pessoa preconceituosa e o indivíduo que sofre essa agressão.
15
Na mesma linha de defesa, Mendras (2004) aponta que o racismo
consiste em uma expressão extrema da personalidade adquirida a partir
da concepção estereotipada sobre uma determinada realidade. Nesse
sentido, a sociedade cria aspectos racistas e, posteriormente, ela mesma
sofre com esses comportamentos inadequados.
Ainda segundo Mendras (2004), o racismo pode ser considerado
como a incapacidade de conviver com as diferenças, ou ainda de conviver
com as próprias características.
Nesse sentido, rejeitar o outro se torna mais fácil que rejeitar a si
próprio. Sobre esse foco, o racismo é considerado como uma atitude
hostil, articulada sobre os preconceitos e estruturada em ações de
“autoridade,
nacionalismo,
superioridade
masculina,
paternalismo,
intolerância à diferença, especialmente racial” (MENDRAS, 2004, p. 88).
Associada ao preconceito e ao racismo surge a discriminação,
terminologia conceituada como uma conduta que infringe os direitos dos
indivíduos e que faz parte das condutas desumanas contra os negros,
conforme destaca Sant’Ana (2001).
Este comportamento é definido com base em critérios infundados e
injustos sobre a raça, o sexo, a opção religiosa, dentre outros aspectos,
motivo pelo qual se distingue que “a discriminação é algo assim como a
tradução prática, a exteriorização, a manifestação, a materialização do
racismo, do preconceito e do estereótipo” (SANT’ANA, 2001, p. 55-56).
Em suma, o racismo consiste em uma concepção de inferioridade e
superioridade entre uma determinada pessoa e outra, o que envolve
diretamente características individuais, enquanto o preconceito é uma
opinião direcionada ao comportamento humano em relação aos seres
considerados diferentes. Por fim, a discriminação é a infração cometida
através de atitudes preconceituosas e racistas.
Apesar da existência de terminologias diferenciadas para distinguir
práticas racistas na contemporaneidade, a conjuntura social na qual o
negro se encontrava demarcou períodos de verdadeira inferioridade em
relação aos seus dominadores. Um racismo que ultrapassou a barreira
espaço-temporal,
e
que
foi
“fruto
de
um
longo
processo
de
amadurecimento, objetivando usar a mão-de-obra barata através da
16
exploração dos povos colonizados. Exploração que gerava riqueza e
poder” (MUNANGA, 2001, p. 35) ao homem branco, com toda sua
superioridade e exploração.
Todas essas características se fizeram presentes entre os
brasileiros na constituição da sua sociedade. As bases da exploração se
estruturaram no trabalho escravo, com violências cotidianas das relações
escravistas e condições extremamente subumanas de sobrevivência,
conforme descreve Chauhoub (apud FONSECA 2002).
Ainda conforme as descrições de Chauhoub (apud FONSECA
2002), em meio a esse contexto, a mão de obra escrava passou a ser
uma mercadoria no território brasileiro. Com sobrevivência em cativeiros e
lançados à sorte determinada pelos seus senhores, os negros eram
tratados como animais.
Na relação entre o senhor e o escravo, as ordens eram relativas à
promoção da riqueza do seu Senhor. Esse motivo promoveu um
rudimentar desenvolvimento intelectual e contribuiu para que os negros
permanecessem por séculos totalmente submissos ao homem branco
(FONSECA, 2002).
As pesquisas de Chauhoub (apud FONSECA 2002) demonstram
ainda que o Brasil foi construído basicamente pela força escrava, e foram
justamente estes indivíduos que se viram privados do direito à educação,
até porque as leis constitucionais da época os excluíam de todos os
direitos garantidos aos cidadãos brancos e portadores de posses.
Para Fonseca (2002), em meio às circunstâncias de injustiças, os
filhos dos escravos somente aprendiam sobre como ser escravo, eram
preparados para o trabalho, sem direito à educação formal e com
conhecimentos repassados de geração em geração. Alguns poucos filhos
de escravos, que viviam mais próximos das casas grandes, eram
instruídos na leitura e na escrita rudimentar para atender exclusivamente
às necessidades de seus amos.
Estes aspectos somente foram alterados através da Lei do Ventre
Livre em 1871, momento em que os filhos dos escravos teriam direito a
uma educação moral e religiosa, uma profissão que fosse de lavrador ou
17
trabalhador agrícola, com direito de escolha em servir aos amos dos seus
pais ou a quem quisessem, conforme destaca Fonseca (2002).
A Lei do Ventre Livre determinou que a aprendizagem dos filhos
dos escravos deveria ser fundamentada em:
[...] um ofício mecânico, uma profissão, de que possa
tirar recursos para se manter e a família, se tiver. Alguns
poderão mesmo ser aproveitados nas letras ou em
outras profissões, as escolas lhes são francas, como
livres que serão por nascimento. Obrigar os senhores a
mandá-los a elas é ainda problema a resolver; a
instrução obrigatória ou forçada não está admitida entre
nós, nem mesmo para os demais cidadãos livres
(MALHEIROS apud FONSECA, 2002, p. 43/44).
É importante observar nas descrições de Fonseca (2002) que
apesar de haverem progressos com a Lei do Ventre Livre, a educação
dos negros não foi pensada como libertadora, mas sim, dentro de um
plano direcionado ao atendimento do próprio trabalho escravo, pois se
almejava treinar a mão de obra para os interesses de uma sociedade
ainda marcada pelos princípios de discriminação racial.
É possível observar através das descrições de Fonseca (2002) que
o direito à educação veio em meio às tendências ditadas pelas
necessidades do homem branco, e não como uma alternativa de melhoria
da qualidade de vida dos negros por meio da formação. Contudo, havia o
intuito de prepará-los para uma nova realidade na política da economia
prevalecente no período.
Mesmo diante da Lei do Ventre Livre que amparava a educação
das crianças negras, Fonseca (2002) afirma ainda, que o número dessas
crianças que frequentavam as escolas foi amplamente inferior ao número
de crianças brancas.
Isso se dava devido ao fato de que as instituições que se
encarregavam de educar os alunos negros geralmente não recebiam os
recursos previstos. Associado a esses fatores, é preciso considerar ainda,
a exploração do trabalho infantil que dificultava a presença da criança
negra no meio escolar, conforme complementa Fonseca (2002).
Mesmo com direito à educação, a condição de vida da criança
escrava não foi transformada, haja vista que suas mães continuavam
18
como escravas e seus filhos menores acompanhavam o mesmo processo
de escravidão, conforme destaca Moura (2004).
Segundo Fonseca (2002), havia ainda a cultura de entregar os
filhos menores dos escravos ao Estado, para que fossem preparados e
educados para atender exclusivamente à agricultura, uma atividade em
expansão no período imperial brasileiro.
De acordo com Moura (2004), a criança escrava não tinha o direito
de brincar, nem de estudar, sua infância ela limitada, e, assim, sobrevivia
maltratada pelos filhos do dono, com vivência totalmente dominada pelas
vontades do seu senhor.
Fonseca (2002) descreve que mesmo com a Lei do Ventre Livre
em vigor, inúmeras crianças negras ainda eram obrigadas a permanecer
no trabalho com seus pais e frequentavam a escola em idade avançada.
Isso elevou a dificuldade de aprendizagem e o analfabetismo,
impulsionados pela inoperância de um sistema que não garantiu
igualdade de oportunidades para o acesso e a permanência dos negros
no meio escolar.
Nesse contexto, a escola foi pensada como estratégia “de
dominação sobre os negros: o trabalho e a religiosidade” (FONSECA,
2002, p.183), logo, estruturada sobre princípios desumanos.
Quase vinte anos após a Lei do Ventre Livre, a Princesa Isabel
assina a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, momento em que todos os
escravos são libertos legalmente. Essa foi uma liberdade tardia para
muitos, entretanto, um grande passo na vida dos negros brasileiros
(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE,
2012).
O grande problema foi que, “após anos de dominação, os negros
foram lançados numa sociedade preconceituosa, de forma desarticulada,
sem dinheiro, sem casa, sem comida, sem nenhuma condição de se
estabelecer” como os demais cidadãos brasileiros (IBGE, 2012, p. 1).
A educação dos filhos não garantia a sobrevivência dos pais que,
além de analfabetos, não demonstravam condições de sobressair em
uma sociedade ditada pela discriminação e pela exclusão. Mesmo diante
19
da libertação, continuaram a sobreviver com os seus Senhores, como
trabalhadores mal remunerados e submissos.
De acordo com Munanga (2001), em meio a esse contexto, novas
perspectivas surgiram para alguns negros, entretanto, os preconceitos,
discriminações e racismos continuaram implícitos na aceitação da cultura
negra na sociedade. Um dos problemas é que eles não estavam
preparados para enfrentar uma sociedade extremamente racista, que
havia lhe dominado durante séculos.
Os estudos de Lourenço (2006) distinguem que a partir da lei do
Ventre Livre, novos discursos invadiram o contexto brasileiro e a
educação passou a ser alvo de lutas populares e de reivindicações, o que
se estendeu por décadas até chegar às novas constituições brasileiras.
Somente a partir da Constituição Federal de 1988, aconteceu a
universalização do ensino, com direito garantido a todos os brasileiros,
independente da sua raça, cor, etnia, religião ou cultura. Essa inovação
constituiu um marco histórico e conseguiu prever igualdade de
oportunidades a todos os brasileiros (CAVALCANTI et al., 2007).
É importante reforçar que aliadas aos problemas da educação do
negro vieram as altas taxas de analfabetismo; grandes desigualdades
entre crianças brancas e crianças negras em relação à escolaridade, aos
níveis de escolaridade entre jovens e adultos brancos e negros; além dos
preconceitos ainda dominantes nos próprios conteúdos programáticos das
instituições escolares, conforme destacam Gonçalves; Silva (2000).
Esfinges essas herdadas de uma história de dominação, descaso e
desumanidade para com a população negra.
Quando saímos do século XIX e adentramos o século
XX, deparamo-nos com o abandono a que foi relegada a
população negra. A maior parte dos estudos retrata a
situação dos negros nas áreas urbanas, no período em
que algumas cidades do país iniciam rápido processo de
modernização (GONÇALVES; SILVA, 2000, p. 15).
No Brasil do século XXI, ainda é possível ver os reflexos dessa
história de desigualdade e exploração. Alguns indicadores referentes à
população, família, educação, trabalho e rendimento, que são importantes
para retratar de forma resumida a situação social de brancos, pretos e
20
pardos, revelam desigualdades em todas as dimensões e áreas
geográficas do país. Apontam também para uma situação marcada pela
pobreza, sobretudo, para a população de pretos e pardos, conforme
descreveu Cavalcanti (et. al. 2007).
Para Gonçalves e Silva (2000), as circunstâncias que envolveram
as lutas em prol da educação do negro são tão profundas que chegaram
ao século XX com imensas desigualdades e poucas conquistas.
O problema não se resolveu com a abolição da escravatura, haja
vista que aliada à mesma sempre esteve a concepção arcaica de que o
negro deve servir ao homem branco. As histórias, desenhos, caricaturas,
enfim, ainda existe um contingente de más intenções aliadas às
descrições sobre os negros, conforme destaca (MUNANGA, 2001).
Todas essas características, além de contribuírem para que o
brasileiro pudesse negar a sua identidade, deixou que a verdadeira
história dos negros permanecesse escondida no meio escolar. Criou-se
nessa população, a vergonha de ser descendente dessa etnia. Além
disso, a sociedade continuou com suas injustiças edificadas no poderio do
homem branco em detrimento ao negro, conforme destaca Moura (apud
MUNANGA, 2001).
1.3 - O Aluno Negro na Escola Contemporânea: Novos Desafios
sobre Problemas Históricos
Os problemas históricos que envolveram os negros se constituíram
como reflexos diretos da incapacidade humana em valorizar as
diferenças. Essa realidade se mostrou presente no descaso para com a
educação dos negros, conforme já exposto por Munanga (2001).
Nesse contexto, ao invés de haver uma transformação “em relação
à educação enquanto mecanismo de uma possível promoção social dos
negros em uma sociedade livre e de um discurso transformador”
(FONSECA, 2002, p. 184), são encontradas novas estratégias de
dominação implícitas nas tentativas de dar continuidade a sociedade
escravocrata.
21
Os aspectos discutidos acerca da precária educação dos negros,
mesmo diante dos princípios de liberdade e direito à educação contidos
na Lei do Ventre Livre, somente atingiram profundas mudanças atitudinais
a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988. Esta lei foi
considerada como um marco na esfera social e educativa de todas as
raças, etnias, culturas e religiões, conforme destacou Lourenço (2006).
Quase uma década após a sanção da Constituição Federal de
1988, foi aprovada a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDB 9394/96, também considerada uma grande evolução no
contexto social e educacional.
De acordo com as descrições de Favero (2012), somente assumiu
caráter transformador com a aprovação da Lei Federal 10639/03 que
modificou a LDB 9394/96 e instituiu a “obrigatoriedade dos sistemas de
ensinos municipal, estadual e federal que precisam incluir aulas sobre
questões étnico-culturais em seus currículos” (FAVERO, 2012, p. 1).
A recente redação dada pela Lei nº 11645/2008 determina ainda
que a obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira
abrange o ensino fundamental e médio de instituições públicas e
privadas. Nesse sentido, os conteúdos programáticos devem incluir a
formação da população brasileira, “o estudo da história da África e dos
africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura
negra e indígena brasileira” (BRASIL, 1996, redação dada pela Lei nº
11645/2008, § 1º). O objetivo desta lei se encontra arraigado no resgate
às contribuições sociais, econômicas e políticas do negro na história do
Brasil. O § 2º dessa mesma Lei determina que:
§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afrobrasileira e dos povos indígenas brasileiros serão
ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em
especial nas áreas de educação artística e de literatura e
histórias brasileiras (Lei nº 11.645, de 2008).
Observa-se na lei nº 11.645, de 2008, a tentativa de resgatar a
importância do negro no contexto brasileiro é parte integrante de uma
intencionalidade
de
formar
cidadãos
conscientes,
capazes
de
compreender a sua etnia, sua cultura como partes indissociáveis da
história brasileira.
22
A realidade é que a sociedade contemporânea precisa de
estratégias pedagógicas desenvolvidas no meio escolar para impulsionar
a construção de novas concepções de igualdade de oportunidades, de
inclusão e valorização das raças, das culturas e de suas crenças,
conforme descreveu Gomes (2001).
Assim como Gomes (2001), Favero (2012) destaca que a escola
contemporânea enfrenta grandes desafios, principalmente, pelo fato de
que ainda prevalecem tensas as relações sociais. Esta realidade não foi
alterada a partir da legislação brasileira e faz parte de um universo
educativo que pouco estuda esses fenômenos, que geralmente trata a
discriminação racial de maneira singular e contribui para que o negro
continue a ser tratado como um ser desigual.
Essa forma de tratamento reflete diretamente nos percentuais de
alunos negros que ingressam e que não permanecem no contexto
escolar, o que foi diagnosticado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. A escolaridade dos alunos brancos gira em torno de 6 anos
para uma média de 3 anos e meio para alunos negros conforme defende
Gomes (2001).
A diferença é gritante e demonstra que os desafios existentes na
escola contemporânea precisam ser vencidos com estratégias eficazes,
com trabalhos étnico-raciais e culturais desde o ingresso dos alunos no
meio escolar. Nesse sentido, Favero (2012) indicia que o educador pode
ainda propor leituras valorativas de personagens negros e envolver os
alunos em confecções de bonecos de pano de diferentes características.
Estes trabalhos são capazes de contribuir com percepções,
reflexões e questionamentos sobre “a visão de superioridade ou
inferioridade entre negros e não negros, etnias diferentes e características
comuns ou não entre os variados grupos humanos que povoam a Terra”
(FAVERO, 2012, p. 1).
Gomes (2001) aponta que os projetos de trabalho em função da
superação das ações desumanas contra os negros já existem, entretanto,
não são valorizados na escola contemporânea. Esses trabalhos de
limitam aos trabalhos de culminância e em poucas aulas, motivo pelo qual
se torna difícil para o aluno introjetar a valorização das diferenças.
23
Por mais que inovações foram pensadas e amparadas legalmente,
como: a criação de cotas para alunos negros e a criação do dia da
consciência negra, obrigatório no calendário escolar, deve haver a plena
responsabilidade de aplicar constantemente conteúdos programáticos
com intencionalidade pedagógica de valorização do negro, e não somente
como uma forma comemorativa. Sobre esta última, observa-se que:
[...] o 20 de novembro busca promover ações afirmativas
de valorização da população afro-descendente brasileira,
mantendo luz sobre nosso passado escravista e criando
formas de construir ações de combate ao seu legado
funesco (BITTENCOURT, 2007, p. 272).
A implantação de estratégias direcionadas às intervenções
pedagógicas em prol do combate à discriminação racial se faz presente
no contexto escolar como uma forma de reverter as questões históricas e
promover a formação de cidadãos conscientes de que todo o ser humano
é igual, independente da sua cor, da sua raça ou etnia. A discriminação
ainda é uma realidade presente na escola contemporânea, mas não pode
se proliferar de maneira desumana, conforme destaca Diniz (2012).
Assim, se a sociedade promoveu as diferenças, ela se torna responsável
em reverter essa situação por intermédio de ações concretas.
Essas ações concretas reportam à necessidade de implantar um
currículo escolar que considere a identidade negra em sua amplitude. Um
currículo construído com essa perspectiva deve: “respeitar seu modo de
ser e de pensar o mundo, considerar a imensa influência que a cultura
africana sempre exerceu sobre o modo de ser do brasileiro, com seus
mais de 40% de população negra e mestiça” (FAVERO, 2012, p. 1).
Este currículo associado à proposta pedagógica da instituição
escolar promove de maneira dinâmica e comprometida uma educação
cidadã, estruturada sobre a garantia da igualdade de oportunidade de
negros em relação aos demais cidadãos brasileiros, conforme destaca
Moura (apud MUNANGA, 2001).
Diniz (2012) aponta ainda ser importante conhecer os conceitos
que envolvem o racismo, o preconceito e a discriminação, para que as
ações de intervenção sejam realizadas de maneira significativa na
constituição de uma sociedade capaz de reconhecer a importância da
24
heterogeneidade. Deve-se também ser capaz de descobrir através das
definições que esses comportamentos desumanos precisam ser banidos
tanto do meio escolar quanto da sociedade, pois, além de constituírem um
crime, ainda determinam a falta de capacidade de superar as práticas
racistas que ultrapassaram os tempos.
Nesse sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais de História
(1997) apontam sugestões de trabalho com a pluralidade cultural, como
estratégia importante na luta contra a discriminação racial que ainda se
encontram presentes no meio social.
O documento aponta que o trabalho precisa ser desenvolvido por
meio de reflexões e dentro da transversalidade entre os conteúdos
programáticos da instituição escolar. Assim, pode-se romper então, com
as injustiças silenciosas, com as práticas discriminatórias silenciosas
reproduzidas desde cedo no ambiente escolar.
Favero (2012) defende que para que seja possível a conquista de
uma educação transformadora, tanto na escola quanto entre os alunos, as
famílias; a sociedade em geral; as instituições de educação formal, sejam
elas públicas ou privadas, devem trabalhar fundamentadas em objetivos
específicos, que exigem trabalhos sistematizados em teorias capazes de
promover a igualdade racial.
Outro ponto importante consiste na realização de planejamentos
que estimulem a construção do conhecimento por parte de todos os
alunos acerca da riqueza da cultura afro-descendente que se faz
fortemente presente na cultura brasileira. Ainda destaca-se a estruturação
do trabalho em questões que envolvam a identidade negra integrada às
demais e em atividades que elevem a autoestima dos alunos socialmente
discriminados e que sejam capazes de torná-los como pontos de
referências culturalmente positivas no meio social, conforme defenderam
autores como Fávero (2007) e Diniz (2012).
Por fim, compreendemos que a educação construída sobre os
princípios da igualdade racial e valorativa da cultura negra, como
pertencente à rica e heterogênea cultura brasileira, torna-se um projeto de
trabalho comprometido com o objetivo de vencer os desafios que
envolvem as ações desumanas para com os negros. Dessa forma, será
25
possível fazer do espaço escolar um local livre das amarras históricas que
envolvem o aluno negro.
26
CAPÍTULO II
O ALUNO NEGRO NA ESCOLA ESTADUAL IRMÃOS
FERNANDES NO ANO 2012
Com o intuito primordial de investigar sobre o aluno negro e os
preconceitos históricos prevalecentes na Escola Estadual Irmãos
Fernandes, foram organizadas metodologias que envolveram bases
teóricas, empíricas e estatísticas.
O método inicial e que foi determinante desde o início das
pesquisas realizadas foi o teórico, que se deu por meio da busca
bibliográfica do tipo exploratória, com leituras, fichamentos, resenhas e
resumos efetuados em livros, revistas, sites da Internet e artigos
científicos sobre a temática em estudo.
Esse estudo assumiu a responsabilidade de investigar e manter um
posicionamento crítico acerca das descrições dos autores pesquisados. A
partir dessa perspectiva, foi inserida a pesquisa empírica, que aconteceu
em uma instituição pública de ensino do município de Itaobim-MG, a
Escola Estadual Irmãos Fernandes.
Esta instituição encontra-se localizada em um bairro periférico, com
a presença de, aproximadamente, 80% de educandos que se identificam
como negros. Esse resultado foi adquirido a partir de um diagnóstico
inicial realizado a partir do censo escolar da instituição.
Para a coleta de dados, foi elaborada uma pesquisa com o prévio
consentimento dos alunos entrevistados, bem como da diretora da
instituição supramencionada. Como recurso, foi aplicado um questionário
a 20 alunos negros do Ensino Médio, escolhidos de forma aleatória.
O questionário foi composto por seis perguntas, dentre as quais,
cinco questões foram fechadas e uma questão foi aberta. Nesse
momento, a pesquisa empírica contribuiu para que o estudo pudesse
assumir o dinamismo da constante interação entre teoria, pesquisador e
grupo pesquisado.
27
Os dados coletados foram organizados de maneira sistematizada.
Nesse momento, houve o tratamento dos mesmos com análise e
discussão. As descrições dos alunos foram reforçadas e equiparadas à
fundamentação teórica, com o intuito de verificar se teoria e prática se
encontram em consonância.
À pesquisa, foram acrescidos ainda, gráficos estatísticos, para
melhor visualização dos resultados das informações adquiridas, conforme
descrições que seguem:
Figura 1. Como os alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes
identificam a discriminação racial
30%
20%
uma ação que se constitui
legalmente como crime contra as
etnias, inclusive a negra.
Uma ação que nega a evidência de
que, apesar das diferenças, todos
são seres humanos,
independentemente da cor da pele.
50%
A falta de reconhecimento de que a
cor da pele não define se um ser
humano é melhor ou pior que outro.
Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola
Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012.
Os resultados obtidos a partir do questionamento sobre como cada
aluno identifica a discriminação racial demonstrou que 20% dos
entrevistados responderam que essa ação consiste em um preconceito
que se constitui legalmente como crime contra as raças, inclusive a negra.
Dentre os alunos questionados sobre essa questão, 50% identificaram a
discriminação racial como uma ação que nega a evidência de que, apesar
das diferenças, todos são seres humanos, independentemente da cor da
pele. Por fim, dos entrevistados, 30% identificaram como a falta de
28
reconhecimento de que a cor da pele não define se um ser humano é
melhor ou pior que outro.
Apesar de todas as descrições se constituírem como teoricamente
correntes, de acordo com as descrições de Sant’ana (2001), constata-se
que a metade dos alunos entrevistados distingue a discriminação como
uma negação da evidência de que a cor da pele não determina a
superioridade ou inferioridade do ser humano. Esta negação reporta às
descrições de Mendras (2004), que reconhece as ações preconceituosas
como a incapacidade de conviver com as diferenças.
Estas posturas somente podem ser transformadas a partir de
ações concretas, que envolvam trabalhos comprometidos com teorias e
demonstrações práticas de que a cultura negra é parte integrante do povo
brasileiro e que a cor da pele somente determina diferenças étnicas, mas
que não define a superioridade e nem a inferioridade de um ser.
Figura 2. Você já foi vítima de discriminação racial?
Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola
Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012.
Frente ao reconhecimento de que os alunos pesquisados
conseguem
identificar a discriminação racial em sua amplitude,
questionou-se o seu envolvimento em discriminações raciais. Nesta
questão, 30% dos entrevistados responderam que já foram vítimas de
29
discriminação racial no próprio meio escolar; 35% apontaram que já foram
vítimas de discriminação racial na sociedade e 35% identificaram que
nunca foram vítimas de discriminação racial.
Os dados coletados demonstram que a própria instituição escolar
se constitui como palco das discriminações. Essa realidade foi identificada
teoricamente por autores como Favero (2012), Bittencourt (2007), dentre
outros que reconhecem que as mudanças devem acontecer a partir desse
meio. Nestes termos, se a instituição de educação formal, que se constitui
como a base de formação dos indivíduos, não consegue assumir o seu
papel, torna-se difícil que a sociedade possa mudar suas ações.
Dessa
forma,
torna-se
necessário
adotar
as
estratégias
demonstradas por Favero (2012) que apontam para a construção de um
currículo escolar e de uma proposta pedagógica construídos com a
intencionalidade de formar cidadãos capazes de respeitar as diferenças e
que reconheçam que o negro faz cultura e contribuiu diretamente com a
constituição histórica e social de todo o povo brasileiro.
Figura 3. Se a resposta anterior for sim, sobre qual forma a
discriminação racial se processou?
Com agressões verbais
sobre a cor da pele.
20%
20%
60%
Com suposta inferioridade
da capacidade de o aluno
negro aprender.
Com agressões físicas.
Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com
alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012.
A partir do percentual de alunos que descreveram que já foram
vítimas de discriminação racial, foi possível identificar que 60% apontaram
que a discriminação ocorreu por intermédio de agressões verbais à cor da
30
pele; 20% afirmaram que a discriminação ocorreu através da suposta
inferioridade da capacidade de o aluno negro aprender; 20% apontaram
que a discriminação ocorreu por meio de agressões físicas.
Os resultados demonstram o estado desafiante sobre o qual se
encontra a escola pesquisada. Por mais que a Escola Estadual Irmãos
Fernandes consiste como uma instituição em meio a inúmeras outras em
nível de Brasil e até mesmo de cidade, é possível identificar por
intermédio dos seus alunos, que a discriminação racial é uma realidade
que necessita de intervenção.
As agressões verbais e físicas aos alunos negros precisam ser
erradicadas desse contexto para que eles sejam vistos como seres
capazes,
e
não
como
indivíduos
dotados
de
dificuldades
de
aprendizagem por conta da cor da sua pele, conforme destacaram os
argumentos de Gomes (2001).
Assim como Gomes (2001), Favero (2012) identifica que toda e
qualquer forma de discriminação deve ser erradicada tanto do meio
escolar quanto da sociedade em geral e, para tanto, o negro deve ser
visto como um indivíduo igual aos demais, capaz de aprender e de
transformar para melhor sua realidade, o que irá depender diretamente da
igualdade de oportunidades garantidas pelos sistemas de ensino. Estas
deverão ser construídas por meio de ações concretas e trabalhos reeducativos promovidos em parceria entre a escola, famílias e sociedade
em geral.
Os dados estatísticos não podem persistir em relação ao aluno
negro, e esse precisa encontrar na escola a valorização necessária à
superação das marcas históricas que prevaleceram por séculos em meio
à população brasileira. Essas marcas se encontram impregnadas em
caricaturas maldosas, em desenhos mal intencionados, em leituras
tendenciosas e até mesmo em livros didáticos, conforme apontou
Munanga (2001).
Assim, destaca-se que as mudanças se iniciam por intermédio das
ações que se constituem como um reflexo direto da vontade dos próprios
seres humanos. Quando essas mudanças se relacionam ao aluno negro,
elas devem assumir uma responsabilidade valorativa dessa identidade,
31
que seja capaz de estimular nos alunos e nos professores, o
reconhecimento de que ser negro implica em ter a cor da pele diferente,
mas não se constitui como um fator decisivo para a aprendizagem e nem
deve ser motivo de agressões verbais ou físicas sobre esses indivíduos
que, ao longo do tempo foram vítimas das grandes injustiças sociais.
Por esse motivo, é fundamental compreender o perfil do
discriminador no meio escolar, para que assim, seja possível ampliar o
trabalho com políticas públicas de intervenção.
Figura 4. Se houve discriminação, quem se constituiu como
agressor?
Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola
Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012.
O gráfico acima determina que 35% dos alunos entrevistados
apontaram que a discriminação racial identificada na figura 3 foi
promovida
por
colegas
de
classe;
50%
responderam
que
as
discriminações partiram de pessoas da sociedade; enquanto 15%
distinguiram que as discriminações partiram de funcionários da própria
instituição e/ou do próprio professor.
Reforça-se que mesmo diante uma legislação vigente de inovações
como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96,
das sugestões sobre o trabalho com a pluralidade cultural contidas nos
32
Parâmetros Curriculares Nacionais de História, e de teorias que
reconhecem a necessidade de vencer os desafios da valorização do
negro enquanto ser humano, ainda prevalecem práticas inadequadas
como a discriminação de colegas de classe, de funcionários da instituição
e, principalmente, da sociedade.
Assim, defende-se com base nas teorias de Sant’ana (2001),
Favero (2012), Diniz (2012) dentre outros autores estudados, que as
mudanças precisam partir da vontade de cada um e não são
determinadas exclusivamente por fatores externos. Os docentes e demais
funcionários da instituição precisam rever seus conceitos, com o intuito de
se preparar para atuar em uma instituição composta por diferentes
alunos.
O docente precisa reconhecer que, para além da cor da pele, existe
um ser humano dotado de anseios, de sentimentos, de vontades e de
expectativas de que a sociedade e a grande função da escola é
reconhecê-lo como um ser capaz, como um cidadão que possui os
mesmos direitos que os demais que frequentam o ambiente escolar.
Existe a necessidade de integrar as ações educativas, de promover
grupos de debate dentro da escola, de saber selecionar teorias
adequadas para o trabalho em sala de aula e estar consciente de que o
professor e os demais funcionários da instituição escolar se constituem
como exemplos a serem seguidos.
Eles devem se fixar em estímulos adequados para que a
convivência entre as etnias, as diferenças sociais, econômicas e culturais
aconteça de maneira plural, heterogênea, carregada da beleza do
encontro entre os diferentes de cor.
É fundamental que os seres humanos, independentemente da sua
condição, sejam reconhecidos com indivíduos capazes de agir, de sentir e
de transformar para melhor o mundo que os rodeia.
Nesse
sentido,
a
instituição
escolar,
enquanto
espaço
transformador e formador de opiniões, precisa promover intervenções
pedagógicas que venham impulsionar uma inclusão significativa do aluno
negro em seu contexto. Com base nessa concepção, questionou-se
33
acerca da intervenção pedagógica aplicada na Escola Estadual Irmãos
Fernandes (FIGURA 5).
Figura 5. A instituição escolar que você estuda promove
intervenções pedagógicas com perspectiva de vencer os desafios da
inclusão do aluno negro em seu meio?
Sim, ela trabalha com projetos em
todo o ano letivo que abrangem a
inclusão educacional do aluno
negro.
15%
50%
35%
Sim, mas os projetos se limitam ao
mês de novembro, período em que
o calendário escolar prevê o
trabalho sobre a consciência negra.
Não existem projetos de
intervenção pedagógica capazes de
promover a inclusão do aluno
negro no meio escolar.
Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola
Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012.
Diante do reconhecimento de que a discriminação racial é uma
realidade presente entre os alunos pesquisados na Escola Estadual
Irmãos Fernandes no ano 2012, questionou-se sobre as intervenções
pedagógicas utilizadas para vencer os desafios da inclusão do aluno
negro no meio escolar de maneira humana e significativa. Nesse
momento, foi possível diagnosticar que 50% dos alunos responderam que
a Escola Estadual Irmãos Fernandes trabalha com projetos em todo o ano
letivo, projetos esses que abrangem a inclusão educacional do aluno
negro. Enquanto 35% dos alunos afirmaram que a instituição trabalha
com projetos, mas que os mesmos se limitam ao mês de novembro,
período em que o calendário escolar prevê atividades valorativas da
consciência negra. Por fim, 15% dos entrevistados apontaram que não
existem projetos de intervenção pedagógica capazes de promover a
inclusão do aluno negro no meio escolar.
34
Os dados indiciam que a instituição escolar pesquisada valoriza
uma cultura de trabalho com a inclusão dos alunos considerados
diferentes, inclusive da população negra. Entretanto, ainda existe uma
parcela de alunos que não consegue identificar esse trabalho como uma
intervenção pedagógica em prol do aluno negro. Esse fator evidencia que
as atividades não conseguem atingir os objetivos esperados, motivo pelo
qual, ainda existe uma parcela de alunos que ainda não reconhece essas
atividades de intervenção.
Nesse sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997)
sugerem que o trabalho com a pluralidade cultural seja articulado de
maneira clara e objetiva, dentro da transversalidade, com envolvimento
direto de todas as demais áreas do conhecimento.
Nessa mesma linha de pensamento, Favero (2012) aponta que não
basta existir apenas um dia para trabalhar com a consciência negra, pois
ela deve ser desenvolvida constantemente, com exemplos diários, com
reconhecimento de que o negro possuiu uma identidade que deve ser
respeitada e, sobretudo, fundamentada na concepção de que o povo
brasileiro dependeu diretamente dos negros para estruturar a sociedade
contemporânea.
Dessa forma, as atividades de intervenção precisam acontecer sob
a forma de projetos de pesquisas sobre a importância do negro no
reconhecimento dos personagens que contribuíram diretamente com a
constituição
da
nação
brasileira.
Assim,
essas
intervenções
se
transformam em importantes agentes dessa história, conforme destacou
destaca Moura (apud MUNANGA, 2001).
A falta de ações inovadoras na educação formal se reflete nas
atitudes da sociedade. Assim, por intermédio de intervenções afirmativas,
os desafios que ainda permeiam o aluno negro no meio escolar serão
vencidos de maneira dinâmica, com a valorização do negro em sua
amplitude.
O reflexo da falta de atividade de intervenção afirmativa da
discriminação se demonstra como deficitário à medida que os alunos
pesquisados enunciam seus anseios em frases de angústias, decepções
e que almejam por uma realidade diferente com sua etnia.
35
Essas frases foram identificadas em expressões como: “que Deus
dê forças aos meus inimigos para eles assistam de pé a minha vitória”
(ALUNO DA ESCOLA ESTADUAL IRMÃOS FERNANDES, 2012). Essa
frase evidencia que o aluno discriminado visualiza o discriminador como
um inimigo e almeja, assim, mostrar a sua capacidade de superar o
racismo e demonstrar que ele é capaz.
As respostas das perguntas abertas demonstraram que os próprios
alunos acreditam ser difícil vencer o racismo no meio escolar, pois
apontam que a sociedade não reconhece o negro como gente e que essa
condição precisa ser mudada a partir das ações do meio escolar. Cabe
ressaltar que essa população, reconhecida como marginalizada por
autores como Sant’Ana (2001), como Gomes (2001), dentre outros,
necessita de ações interventivas, capazes de reverter as injustiças em
oportunidades para um novo recomeço.
Essas ações de intervenção foram reconhecidas por Favero (2012)
como leituras valorativas de personagens negros e trabalhos capazes de
contribuir
com
percepções,
reflexões,
questionamentos
sobre
a
importância do negro, conforme já exposto.
Destaca-se, assim, que a sociedade contemporânea, com todo o
seu conhecimento e toda a sua heterogeneidade, não deve contribuir para
que a discriminação do negro se estenda por outros períodos históricos.
As intervenções precisam acontecer constantemente, de maneira explícita
e implícita, nos conteúdos programáticos de todas as disciplinas
curriculares, conforme determina Favero (2012).
Por mais que existam raízes profundas de desvalorização e
discriminação dos negros, é preciso reverter esta realidade com um
trabalho integrado, valorativo das diferenças e da contribuição que o
negro ofereceu ao longo do tempo para a formalização da sociedade
brasileira, conforme afirma Fonseca (2002).
É importante destacar ainda que a sociedade mudou, que as
políticas públicas foram alteradas, e que as atitudes dos seres humanos
também precisam acompanhar essas mudanças.
Para chegar ao contexto social e histórico da contemporaneidade,
muitos movimentos foram organizados, lutas foram travadas e as
36
conquistas legais legitimaram o reconhecimento do negro enquanto um
indivíduo igual aos demais.
Essas ações impõem mudanças que precisam ocorrer na prática, e
não somente no plano ideológico, para que os procedimentos educativos
possam acompanhar essa tendência de maneira significativa.
Por mais que as leis deleguem ao aluno negro o mesmo direito
delegado às demais etnias, ainda prevalecem práticas racistas que
desafiam a educação formal. Conforme o estudo teórico e o diagnóstico
empírico discutido, essa prática revela a discriminação que ocorre tanto
na escola quanto na sociedade, o que determina que a sociedade
brasileira ainda não conseguiu se livrar das amarras históricas e que
ainda prevalecem preconceitos contra os negros.
Destaca-se, assim, que a escola pública, enquanto espaço de
formação cidadã, precisa observar atentamente as discriminações
sofridas por seus alunos negros e promover projetos de capacitação
direcionados aos seus profissionais.
Juntos,
esses profissionais serão
capazes de
desenvolver
trabalhados valorativos de todas as diferenças, com atividades que
manifestem a intencionalidade pedagógica de vencer os desafios do
racismo.
É preciso superar a visão de que o negro não é capaz de aprender.
É fundamental superar os preconceitos impregnados na sociedade e que
se apresentaram no meio escolar sob a forma de ações inadequadas,
haja vista que a educação é um direito de todos, garantida pelas leis
federais, estaduais e municipais. Conhecer e praticar esse direito torna-se
essencial à construção de uma sociedade mais justa, que ofereça
igualdade de oportunidade a todos os cidadãos, independente da sua cor.
Dessa forma, reforça-se que garantir o direito somente através de
leis não é suficiente. É indispensável que tanto a sociedade quanto as
instituições escolares possam interiorizar as necessidades de mudanças
procedimentais. Assim, a conquista de uma educação de qualidade,
devidamente fundamentada no respeito e na garantia dos princípios de
igualdade será garantida legalmente.
37
Quando a escola e a sociedade passarem a atuar juntas na busca
de uma educação que valorize os direitos de todos os seus cidadãos, as
perspectivas de erradicar as práticas desumanas para com os alunos
negros irão ser maximizadas, e os problemas serão enfrentados com
responsabilidade e comprometimento de todos os cidadãos.
É preciso superar a discriminação e o preconceito racial que ainda
se encontra presente na escola pública, para tanto, as intencionalidades
devem se fixar em ações concretas, que ampliem o reconhecimento da
escola enquanto instituição social que deve se preparar para receber
todos os alunos considerados diferentes, inclusive os negros.
Essa se torna a grande condição “para que brancos e negros,
como cidadãos, se coloquem como sujeitos do processo da formação da
educação” (MELO; COELHO, 1988) e não se sintam submissos a um
sistema incapaz de valorizar as diferenças.
Infelizmente, os fatos denunciam que a escola pesquisada ainda
não foi capaz de vencer os desafios que rondam a valorização do aluno
negro, mas mudar é preciso para que seja possível vencer os desafios.
Somente assim, novas conquistas irão demarcar o surgimento de uma
sociedade realmente cidadã, conquistada por intermédio das ações
desenvolvidas na escola e que foram capazes de promover as
verdadeiras transformações sociais.
38
CONCLUSÃO
Com base na análise realizada, foi possível reconhecer que ao
longo da história, sobretudo, na constituição da nação brasileira, o negro
sofreu um verdadeiro massacre moral, psicológico e físico.
Os negros e seus descendentes foram privados de ter uma vida
social, familiar, autônoma e, consequentemente, não tiveram acesso a
uma educação formal de qualidade.
Essas características ultrapassaram os séculos e, mesmo diante
da abolição da escravatura e frente às novas perspectivas educacionais,
ainda existem práticas discriminatórias que dificultam a superação das
grandes desigualdades nos níveis de escolaridade e no campo social em
geral.
Essa realidade se encontra presente na escola Estadual Irmãos
Fernandes, que vivencia grandes desafios em relação ao aluno negro.
Eles ainda são vítimas de discriminações e atitudes pouco aceitáveis em
um mundo contemporâneo, no qual grandes conquistas legais foram
legitimadas teoricamente, mas não foram aplicadas na prática.
O grande problema, que se constitui como uma realidade pouco
aceitável aos olhos dos defensores da valorização da identidade negra, é
que ainda existem instituições da educação pública que não têm
contribuído para superar o racismo ainda presente em seu meio. Este
aspecto evidencia a inoperância na aplicabilidade das leis que regem o
sistema educacional, e ainda denuncia a incapacidade de algumas
instituições públicas de ensino em desenvolver estratégias de formação
cidadã fixadas em bases firmes da igualdade étnica.
Com base na pesquisa realizada na Escola Estadual Irmãos
Fernandes, foi possível analisar que ainda existem práticas racistas na
escola. Estas se manifestam por meio de agressões verbais e, sobretudo,
de agressões físicas, e configuram situações extremas que constituem a
vivência do negro no cotidiano escolar.
Dessa forma, compreendeu-se que uma das grandes alternativas
de transformar essa realidade é investir em intervenções pedagógicas
39
com atividades capazes de valorizar a importância do negro e de
demonstrar que todos são importantes na constituição histórica e social
de uma determinada sociedade.
As conquistas legais como a Constituição Federal de 1988 e a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96 já fazem
parte dessa realidade, assim, é necessário rever as mudanças
comportamentais e atitudinais para que tanto o aluno branco quanto o
aluno negro participem de uma formação cidadã e sejam os agentes
sociais proliferadores da igualdade de oportunidades e da igualdade
racial.
Por intermédio do estudo realizado, o conhecimento sobre os
desafios e sobre as perspectivas do aluno negro no meio educacional
foram ampliadas e houve a concepção de que esses desafios podem ser
vencidos com práticas pedagógicas capazes de valorizar o ser humano
em sua amplitude, com suas diferenças étnicas, econômicas e culturais,
livre de qualquer tipo de discriminação.
40
REFERÊNCIAS
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ALENCASTRO, Luiz Felipe (org.). História da vida privada no Brasil. v. 2.
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41
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São Paulo: Manole, 2004.
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Ministério da Educação, Secretaria de Educação Fundamental, 2001.
SANT’ANA, A. O. “Buscando caminhos nas tradições”. In: MUNANGA, K
(Org.). Superando o racismo na escola. 3. ed. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Fundamental, 2001.
THEODORO, H. “Buscando caminhos nas tradições”. In: MUNANGA, K.
(Org.) Superando o racismo na escola. 3. ed. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Fundamental, 2001.
42
APÊNDICE I
Questionário aplicado aos alunos da Escola Estadual Irmãos
Fernandes, no ano 2012.
Questões:
1. Como você identifica a discriminação racial?
( ) uma ação que se constitui legalmente como crime contra as etnias,
inclusive a negra.
( ) um ação que nega a evidência de que, apesar das diferenças, todos
são seres humanos, independentemente da cor da pele.
( ) a falta de reconhecimento de que a cor da pele não define se um ser
humano é melhor ou pior que outro.
2. Você já foi vítima de discriminação racial?
( ) Sim, no meio escolar.
( ) Sim, na sociedade.
( ) Não, nunca fui vítima.
3. Se a resposta anterior for sim, sob a qual forma a discriminação racial
se processou?
( ) com agressões verbais sobre a cor da pele.
( ) Com suposta inferioridade da capacidade de o aluno negro aprender.
( ) com agressões físicas.
4. Se houve discriminação, quem se constituiu como agressor?
( ) o próprio colega de classe.
( ) pessoas da sociedade.
( ) funcionários da instituição escolar e/ou o próprio professor.
5. A instituição escolar que você estuda promove intervenções
pedagógicas com a perspectiva de vencer os desafios da inclusão do
aluno negro em seu meio?
( ) sim, ela trabalha com projetos em todo o ano letivo que abrangem a
inclusão educacional do aluno negro.
( ) sim, mas os projetos se limitam ao mês de novembro, período em que
o calendário escolar prevê o trabalho sobre a consciência negra.
( ) não existem projetos de intervenção pedagógica capazes de promover
a inclusão do aluno negro no meio escolar.
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6. Enquanto aluno negro, como você acredita que possam ser vencidos
os desafios da inclusão e seja garantida a igualdade de oportunidades da
sua etnia no contexto escolar?
___________________________________________________________
___________________________________________________________
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ANEXO I
AUTORIZAÇÃO
A Escola Estadual Irmãos Fernandes, na pessoa da sua diretora
Eliene Alves Pereira, autoriza Maria Ireni Neres Rocha, cursista da
Especialização em Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça-Etnia,
oferecida pela UFOP, Pólo de Araçuaí-MG, a desenvolver sua pesquisaação e relatório com base no questionário aplicado aos alunos do Ensino
Médio dessa instituição, desde que sejam respeitadas as normas legais e
os nomes dos mesmos sejam preservados.
Itaobim-MG, 20 de março de 2012.
Maria Hermilce Arifa Chaves
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Maria Ireni Neres Rocha