UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS PROGRAMA DE EDUCAÇÃO PARA A DIVERSIDADE MARIA IRENI NERES ROCHA RACISMO: NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO NA ESCOLA ESTADUAL IRMÃOS FERNANDES, MUNICÍPIO DE ITAOBIM, NO ANO 2012 Araçuaí-MG Julho - 2012 MARIA IRENI NERES ROCHA RACISMO: NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO NA ESCOLA ESTADUAL IRMÃOS FERNANDES, MUNICÍPIO DE ITAOBIM, NO ANO 2012 Monografia apresentada ao Programa de Educação para a Diversidade, do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Ouro Preto, como requisito parcial à obtenção do grau de Especialista em Gestão de Políticas Públicas com ênfase em Gênero e Raça. Orientadora: Me. Alice Lino Araçuaí-MG Julho/2012 DEDICATÓRIA Dedico esse trabalho especialmente às pessoas que acreditaram na minha capacidade e me incentivaram incondicionalmente. Em especial, aos meus pais: Maria das Dores Neres Rocha (um exemplo de garra, força, persistência e coragem), e José Francisco Rocha (em memória), que além de me darem o dom da vida, ensinaram-me valores imprescindíveis à minha formação, tanto pessoal quanto profissional. AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço a Deus, pois ele tem sido a razão das minhas vitórias; À minha família, por estar sempre ao meu lado, apoiando-me nas minhas decisões e alegrando-se com o meu sucesso. Agradeço também à Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP, pelo empenho e dedicação na promoção desse curso que deu oportunidades aos alunos/cursistas de se tornarem profissionais competentes e mais humanizados. Em especial, aos alunos negros da Escola Estadual Irmãos Fernandes, por terem sido a motivação na elaboração desse trabalho científico, que demonstra em seu bojo o intuito de encontrar uma solução para os problemas que os mesmos enfrentam, principalmente no âmbito escolar e que refletem na aprendizagem. Racismo e ignorância caminham sempre de mãos dadas. Os estereótipos e as ideias préconcebidas vicejam se está ausente a informação, a falta do diálogo aberto, arejado, transparente. Cardoso (2001) ROCHA, Maria Ireni Neres. Racismo: necessidade de superação na Escola Estadual Irmãos Fernandes, município de Itaobim, no ano 2012. Araçuaí: UFOP, 2012. (Trabalho de Conclusão de Curso de PósGraduação Lato sensu). RESUMO O trabalho apresenta um estudo sobre o Racimo na Escola Estadual Irmãos Fernandes. No decorrer da pesquisa, procurou-se compreender como as instituições de educação pública têm contribuído para superar o racismo ainda presente em seu meio. A pesquisa assumiu a característica qualiquantitativa, com análise inicial de autores como: Fernandes (2008), Munanga (2001), Sant’Ana (2001), Gonçalves (2012), dentre outros que contribuíram com a fundamentação teórica do texto. Compreendeu-se que apesar de o racismo ser identificado legalmente como um crime, ele ainda se encontra presente em atitudes insanas no meio escolar. Essa realidade foi evidenciada na escola pesquisada no município de Itaobim. Nessa localidade, foi realizada uma pesquisa de campo que teve como recurso um questionário com cinco questões fechadas e uma aberta, que foi respondido por vinte alunos negros. Associada às descrições do estudo teórico, a pesquisa empírica demonstrou que nessa instituição os alunos negros se sentem vítimas da exclusão, do descaso, da discriminação e da concepção de que a aprendizagem é mais difícil para os mesmos. Diante dessa pesquisa, analisou-se a importância de se intensificar as políticas públicas afirmativas de combate ao racismo no meio escolar. Esses alunos têm direitos garantidos legalmente, e esses direitos precisam ser aplicados no âmbito educativo para que os alunos sejam beneficiados com a tão almejada igualdade de oportunidades. Palavras-chave: Racismo. Escola. Desafios. Superação. LISTA DE FIGURAS Figura 1. Como os alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes identificam a discriminação racial? ................................................................... 27 Figura 2. Você já foi vítima de discriminação racial? ........................................ 28 Figura 3. Se a resposta anterior for sim, sobre qual forma a discriminação racial se processou? ......................................................................................... 29 Figura 4. Se houve discriminação, quem se constituiu como agressor? .......... 31 Figura 5. A instituição escolar que você estuda promove intervenções pedagógicas como perspectiva de vencer os desafios da inclusão do aluno negro em seu meio? ............................................................................... 33 SUMÁRIO Introdução ......................................................................................................... 08 Capítulo I. O aluno negro: princípios históricos presentes na escola contemporânea ................................................................................................. 11 1.1 - O escravismo sobre o foco de princípios históricos ....................... 11 1.2 - Breves definições das ações que movem condutas desumanas contra os negros ................................................................. 13 1.3 - O aluno negro na escola contemporânea: novos desafios sobre problemas históricos..................................................................... 20 Capítulo II. O aluno negro na Escola Estadual Irmãos Fernandes no ano 2012 .................................................................................................................. 26 Conclusão ......................................................................................................... 38 Referências ....................................................................................................... 40 Apêndice I ......................................................................................................... 42 Anexo I .............................................................................................................. 44 8 INTRODUÇÃO Em virtude das transformações histórico sociais ocorridas nas últimas décadas, inclusive com os princípios legais de inclusão educacional, de valorização das diferenças, bem como das conquistas sociais que envolvem os alunos negros no contexto escolar, temáticas relacionadas à inclusão dos mesmos e dos afrodescendentes ganharam ênfase, conforme destaca Fernandes (2008). De acordo com Theodoro (2001), o grande ideal centra-se em rever os princípios de exclusão que os negros sempre enfrentaram na sociedade brasileira e, consequentemente, no meio escolar e promover processos plurais de convivência, com indivíduos conscientes de que somente com a união da diversidade torna-se possível construir um novo mundo. Ainda de acordo com Theodoro (2001), o grande problema é que o racismo, a discriminação e a exclusão possuem fortes marcas históricas, fixadas sobre bases dominadoras e que ainda prevalecem no mundo contemporâneo entre os seus indivíduos. A realidade é que a discriminação se constitui como um resultado comportamental da sociedade ao longo do tempo, motivo pelo qual Sant’ana (2001) defende que a própria educação formal, inserida nesse meio, construiu as bases da discriminação. Ainda de acordo com Sant’ana (2001), as práticas racistas se fizeram presentes de maneira implícita e explícita nos livros didáticos e nas práticas pedagógicas. Esse fator, pesar de ter sido questionado nas últimas décadas e, legalmente modificado, ainda prevaleceu arraigado tanto nas práticas educativas quanto nas ações discriminatórias presentes no contexto da educação formal. Essa temática torna-se inquietante à medida que existe o reconhecimento de que a sociedade precisa de leis para amparar legalmente uma inclusão que deveria ser uma ação espontânea. No entanto, necessita de princípios legais de inclusão para ser capaz de 9 valorizar o grande papel do negro na constituição histórica do povo brasileiro. A educação é um direito de todos, amparada por legislações como: a Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96, os Parâmetros Curriculares Nacionais e as diretrizes que se demonstram inovadoras. Dessa forma a escola assume a responsabilidade direta de vencer os desafios históricos, que envolvem os alunos negros, para construir, assim, uma nova perspectiva de trabalho em seu meio. Diante do exposto, verifica-se que a temática em discussão é de relevância social, haja vista que a sociedade é composta pela dinâmica da heterogeneidade. Em meio a esse contexto, os indivíduos injustiçados, sobretudo, os negros e os afrodescendentes, almejam descobrir estratégias capazes de impulsionar uma educação fixada em princípios de igualdade de oportunidade, direcionada a todos os cidadãos, independentemente da sua cor ou etnia. Nessa perspectiva, o presente trabalho discorre sobre os desafios históricos e perspectivas contemporâneas dos alunos negros no contexto escolar. O estudo se amparou na hipótese de que a partir de inovações na legislação brasileira contra as práticas racistas, o negro passou a ser visto sob um novo foco de inclusão social e educacional, conforme destaca Theodoro (2001). Diante deste pressuposto, questiona-se: Por que mesmo diante de inovações na legislação brasileira os alunos negros ainda são vítimas de discriminações raciais no contexto escolar? Este problema foi analisado com o objetivo principal de compreender como as instituições de educação pública têm contribuído para superar o racismo ainda presente em seu meio. Objetivou-se ainda: analisar a conjuntura histórica que envolve a trajetória do negro no meio social e escolar; diagnosticar as principais práticas racistas ainda prevelecentes em instituições públicas de ensino e investigar perspectivas de intervenção educacional capazes de erradicar o racismo no contexto escolar na Escola Estadual Irmãos Fernandes. 10 A pesquisa se amparou inicialmente na metodologia teórica, desenvolvida a partir de leituras, análises e fichamentos de livros, revistas e artigos científicos. Posteriormente, foi realizada uma pesquisa de campo com alunos negros da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012, instituição pública do município de Itaobim. Essa última pesquisa foi cunho quantitativo e qualitativo, e teve como recurso um questionário com seis questões. As respostas serviram como base para a construção de gráficos estatísticos que demonstram claramente os resultados da pesquisa. Um trabalho de enfoque na superação do racismo no meio escolar torna-se um viés ao estímulo da busca de novas reflexões e análises, tanto pessoais, pelo motivo de que a convivência com práticas racistas no cotidiano da escolar é inquietante, quanto institucionais e acadêmicas, já que tende a ampliar os estudos já existentes na área. 11 CAPÍTULO I O ALUNO NEGRO: FATOS HISTÓRICOS PRESENTES NA ESCOLA CONTEMPORÂNEA A sociedade contemporânea vivencia uma realidade em que a inclusão efetiva do aluno negro no contexto da educação formal ainda consiste em um desafio a ser vencido. A realidade exposta por Fernandes (2008), é que ainda prevalece na sociedade, um racismo sutil, ditado por fatores históricos presentes em atitudes sociais e educativas. Esse racismo se apoia em paradigmas presentes nas ações cotidianas e que são reconhecidos, como reflexos diretos de uma sociedade que se estruturou sobre as bases do sistema escravocrata, mas que não soube valorizar a participação do negro na constituição histórica e social do povo brasileiro (FERNANDES, 2008). Nesse sentido, Sant’ana (2001) considera que o negro foi privado de viver, de estudar, de ser gente e, em virtude da sua própria condição histórica no meio social, participa de uma sociedade desumana . Mesmo diante de inovações e de princípios éticos e legais de inclusão, sua participação na educação formal ainda consiste em minoria e a maioria entre os analfabetos. Esta situação referente à educação formal dos negros é um resultado direto de fatores históricos que se desencadearam até no contexto da sociedade contemporânea, e que contribuem diretamente para que as discriminações raciais se constituam em realidades presentes tanto no meio social quanto no meio escolar. 1.1 O Escravismo sobre o Foco de Fatos Históricos Estudos de Sant’Ana (2001) demonstram que a história da escravidão assume contextos diferenciados na narrativa da humanidade, 12 com indícios de que nem sempre o negro foi considerado um escravo. Existem registros na Grécia Antiga, de que seus habitantes, os persas, se consideravam superiores aos demais povos de outras civilizações que, por sua vez, eram reconhecidos como bárbaros. Essa forma de escravismo de raças demonstrava uma cultura em que o domínio entre os povos prevaleceu com base na diferença entre as civilizações (SANT’ANA, 2001). De acordo com as descrições de Mello (2000), na Grécia Antiga, a escravidão era considerada algo comum entre os pequenos agricultores, camponeses, artesãos, comerciantes, a população normalmente sem terras, povos considerados plebeus e clientes, que haviam contraído dívidas e não conseguiam pagá-las. Dessa forma, tornavam-se escravos, explorados em trabalhos diversos e com vivência precária. No entender de Brugnela (1998), em meio ao contexto de discriminação, a civilização grega vivenciou um racismo diferenciado, cultural, e não relativo à cor da pele, ou aos negros, mas presente no sentimento de superioridade e na vontade de dominação que se encontrava entre esses povos. Estas características se mostravam atuantes no berço das civilizações, a diferença é que essa discriminação não se distinguia pela cor da pele, mas somente pela cultura, ou conforme o posicionamento do indivíduo na sociedade (BRUGNELA, 1998). Somente na Idade Média, por intermédio de tendências inovadoras de saberes, surge a concepção de superioridade entre uma raça e outra com concentração na cor da pele. Essa diferenciação foi avigorada por intelectuais desse período, ligados à Igreja Católica Romana, e serviu como um dos pilares do racismo considerado moderno, conforme defende Sant’Ana (2001). Para Mello (2000), os princípios escravocratas da Antiguidade começaram a se transformar por intermédio das mudanças políticas, sociais e econômicas que impulsionaram as práticas mercantilistas e afloraram o capitalismo. Este, por sua vez, exigiu uma nova ordem, com características centradas na obtenção de lucros a baixos custos. 13 Em meio a esse cenário, o negro passou a ser sinônimo de mãode-obra barata, da capacidade de sustentar as ambições do homem branco, considerado nesse período histórico como inteligente, sábio, superior, tanto pela sua cor de pele, quanto pela sua capacidade de conquistar o mundo a partir das suas ideias por intermédio do capital, conforme defende Sant’ana (2001). De acordo com Alencastro (1999), os negros se transformaram, assim, em grandes propulsores da captação de riquezas para o homem branco, pois eram responsáveis pelo trabalho pesado, com pouco, ou nenhum direito de serem educados, de constituírem estrutura familiar ou de pensarem como seres humanos livres. Nesse período, “[...] à diferença da escravidão na Grécia e na Roma antiga, o escravismo moderno reforça o estatuto legal do cativeiro com a discriminação racial: o escravo só podia ser preto ou mulato, nunca branco” (ALENCASTRO, 1999, p. 88). Em meio a esse contexto, imensuravelmente mais abrangente que as descrições acima expostas, surge o racismo contra os negros. Os fatores históricos contribuem então, para desencadear os preconceitos, as discriminações, bem como os atos de desumanidade para com os indivíduos cuja cor da pele era diferente. Estas características comportamentais foram consolidadas como doutrina racista no século XIX, conforme defende Sant’ana (2001). Os estudos de Brugnela (1998) contribuem para o reconhecimento de que se mudou somente o foco do escravismo: do homem branco e socialmente desprovido de recursos financeiros para o homem negro. Mas, os atos de dominação e atitudes desumanas prevaleceram como no princípio civilizatório, com ações de crueldade para com os seres humanos considerados diferentes. 1.2 - Breves definições das ações desumanas contra os negros As condutas desumanas acometidas contra os negros assumem distintas definições, e são identificadas como práticas inadequadas que 14 além de infringir os direitos legais dos cidadãos, ainda demonstram a incapacidade humana em valorizar as diferenças, conforme destaca Brugnela (1998). Uma dessas práticas consiste no racismo, definida como: A teoria ou ideia que existe uma relação de causa ou efeito entre as características físicas herdadas por uma pessoa e certos traços de sua personalidade, inteligência ou cultura. E, somados a isso, a noção de que certas raças são naturalmente inferiores ou superiores a outras (BEATO apud SANT’ANA, 2001, p. 53). As descrições de Beato (apud Sant’ana, 2001) distinguem que a concepção de inferioridade e superioridade entre os seres é que determina o racismo. Estas características estão presentes em comportamentos incapazes de valorizar as diferenças que demarcam o distanciamento entre uma raça e outra e que, apesar de retrógrada, ainda se encontra presente no meio social. Para Lourenço (2006), até a terminologia racismo é considerada como inadequada, deveria receber a nomenclatura de xenofobia. Este termo expõe explicitamente a desconfiança, a antipatia e se associa ao racismo à medida que ele é levado ao extremo, e se consolida no meio social como um dos mais desprezíveis comportamentos humanos. Assim como o racismo, o preconceito também se constitui como uma conduta desumana que atinge os negros, ele é definido como: [...] uma opinião preestabelecida, que é imposta pelo meio, época e educação. Ele regula as relações de uma pessoa com a sociedade. Ao regular, ele permeia toda a sociedade, tornando-a uma espécie de mediador de todas as relações humanas. Ele pode ser definido, também, como uma indisposição, um julgamento prévio, negativo, que se faz de pessoas estigmatizadas por estereótipos (SANT’ANA, 2001, p. 54). As atitudes preconceituosas são designadas por Sant’ana (2001) como formas prévias de julgar ou distinguir uma pessoa, com opiniões emitidas sem o devido conhecimento e que criam verdadeiras barreiras entre a pessoa preconceituosa e o indivíduo que sofre essa agressão. 15 Na mesma linha de defesa, Mendras (2004) aponta que o racismo consiste em uma expressão extrema da personalidade adquirida a partir da concepção estereotipada sobre uma determinada realidade. Nesse sentido, a sociedade cria aspectos racistas e, posteriormente, ela mesma sofre com esses comportamentos inadequados. Ainda segundo Mendras (2004), o racismo pode ser considerado como a incapacidade de conviver com as diferenças, ou ainda de conviver com as próprias características. Nesse sentido, rejeitar o outro se torna mais fácil que rejeitar a si próprio. Sobre esse foco, o racismo é considerado como uma atitude hostil, articulada sobre os preconceitos e estruturada em ações de “autoridade, nacionalismo, superioridade masculina, paternalismo, intolerância à diferença, especialmente racial” (MENDRAS, 2004, p. 88). Associada ao preconceito e ao racismo surge a discriminação, terminologia conceituada como uma conduta que infringe os direitos dos indivíduos e que faz parte das condutas desumanas contra os negros, conforme destaca Sant’Ana (2001). Este comportamento é definido com base em critérios infundados e injustos sobre a raça, o sexo, a opção religiosa, dentre outros aspectos, motivo pelo qual se distingue que “a discriminação é algo assim como a tradução prática, a exteriorização, a manifestação, a materialização do racismo, do preconceito e do estereótipo” (SANT’ANA, 2001, p. 55-56). Em suma, o racismo consiste em uma concepção de inferioridade e superioridade entre uma determinada pessoa e outra, o que envolve diretamente características individuais, enquanto o preconceito é uma opinião direcionada ao comportamento humano em relação aos seres considerados diferentes. Por fim, a discriminação é a infração cometida através de atitudes preconceituosas e racistas. Apesar da existência de terminologias diferenciadas para distinguir práticas racistas na contemporaneidade, a conjuntura social na qual o negro se encontrava demarcou períodos de verdadeira inferioridade em relação aos seus dominadores. Um racismo que ultrapassou a barreira espaço-temporal, e que foi “fruto de um longo processo de amadurecimento, objetivando usar a mão-de-obra barata através da 16 exploração dos povos colonizados. Exploração que gerava riqueza e poder” (MUNANGA, 2001, p. 35) ao homem branco, com toda sua superioridade e exploração. Todas essas características se fizeram presentes entre os brasileiros na constituição da sua sociedade. As bases da exploração se estruturaram no trabalho escravo, com violências cotidianas das relações escravistas e condições extremamente subumanas de sobrevivência, conforme descreve Chauhoub (apud FONSECA 2002). Ainda conforme as descrições de Chauhoub (apud FONSECA 2002), em meio a esse contexto, a mão de obra escrava passou a ser uma mercadoria no território brasileiro. Com sobrevivência em cativeiros e lançados à sorte determinada pelos seus senhores, os negros eram tratados como animais. Na relação entre o senhor e o escravo, as ordens eram relativas à promoção da riqueza do seu Senhor. Esse motivo promoveu um rudimentar desenvolvimento intelectual e contribuiu para que os negros permanecessem por séculos totalmente submissos ao homem branco (FONSECA, 2002). As pesquisas de Chauhoub (apud FONSECA 2002) demonstram ainda que o Brasil foi construído basicamente pela força escrava, e foram justamente estes indivíduos que se viram privados do direito à educação, até porque as leis constitucionais da época os excluíam de todos os direitos garantidos aos cidadãos brancos e portadores de posses. Para Fonseca (2002), em meio às circunstâncias de injustiças, os filhos dos escravos somente aprendiam sobre como ser escravo, eram preparados para o trabalho, sem direito à educação formal e com conhecimentos repassados de geração em geração. Alguns poucos filhos de escravos, que viviam mais próximos das casas grandes, eram instruídos na leitura e na escrita rudimentar para atender exclusivamente às necessidades de seus amos. Estes aspectos somente foram alterados através da Lei do Ventre Livre em 1871, momento em que os filhos dos escravos teriam direito a uma educação moral e religiosa, uma profissão que fosse de lavrador ou 17 trabalhador agrícola, com direito de escolha em servir aos amos dos seus pais ou a quem quisessem, conforme destaca Fonseca (2002). A Lei do Ventre Livre determinou que a aprendizagem dos filhos dos escravos deveria ser fundamentada em: [...] um ofício mecânico, uma profissão, de que possa tirar recursos para se manter e a família, se tiver. Alguns poderão mesmo ser aproveitados nas letras ou em outras profissões, as escolas lhes são francas, como livres que serão por nascimento. Obrigar os senhores a mandá-los a elas é ainda problema a resolver; a instrução obrigatória ou forçada não está admitida entre nós, nem mesmo para os demais cidadãos livres (MALHEIROS apud FONSECA, 2002, p. 43/44). É importante observar nas descrições de Fonseca (2002) que apesar de haverem progressos com a Lei do Ventre Livre, a educação dos negros não foi pensada como libertadora, mas sim, dentro de um plano direcionado ao atendimento do próprio trabalho escravo, pois se almejava treinar a mão de obra para os interesses de uma sociedade ainda marcada pelos princípios de discriminação racial. É possível observar através das descrições de Fonseca (2002) que o direito à educação veio em meio às tendências ditadas pelas necessidades do homem branco, e não como uma alternativa de melhoria da qualidade de vida dos negros por meio da formação. Contudo, havia o intuito de prepará-los para uma nova realidade na política da economia prevalecente no período. Mesmo diante da Lei do Ventre Livre que amparava a educação das crianças negras, Fonseca (2002) afirma ainda, que o número dessas crianças que frequentavam as escolas foi amplamente inferior ao número de crianças brancas. Isso se dava devido ao fato de que as instituições que se encarregavam de educar os alunos negros geralmente não recebiam os recursos previstos. Associado a esses fatores, é preciso considerar ainda, a exploração do trabalho infantil que dificultava a presença da criança negra no meio escolar, conforme complementa Fonseca (2002). Mesmo com direito à educação, a condição de vida da criança escrava não foi transformada, haja vista que suas mães continuavam 18 como escravas e seus filhos menores acompanhavam o mesmo processo de escravidão, conforme destaca Moura (2004). Segundo Fonseca (2002), havia ainda a cultura de entregar os filhos menores dos escravos ao Estado, para que fossem preparados e educados para atender exclusivamente à agricultura, uma atividade em expansão no período imperial brasileiro. De acordo com Moura (2004), a criança escrava não tinha o direito de brincar, nem de estudar, sua infância ela limitada, e, assim, sobrevivia maltratada pelos filhos do dono, com vivência totalmente dominada pelas vontades do seu senhor. Fonseca (2002) descreve que mesmo com a Lei do Ventre Livre em vigor, inúmeras crianças negras ainda eram obrigadas a permanecer no trabalho com seus pais e frequentavam a escola em idade avançada. Isso elevou a dificuldade de aprendizagem e o analfabetismo, impulsionados pela inoperância de um sistema que não garantiu igualdade de oportunidades para o acesso e a permanência dos negros no meio escolar. Nesse contexto, a escola foi pensada como estratégia “de dominação sobre os negros: o trabalho e a religiosidade” (FONSECA, 2002, p.183), logo, estruturada sobre princípios desumanos. Quase vinte anos após a Lei do Ventre Livre, a Princesa Isabel assina a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, momento em que todos os escravos são libertos legalmente. Essa foi uma liberdade tardia para muitos, entretanto, um grande passo na vida dos negros brasileiros (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE, 2012). O grande problema foi que, “após anos de dominação, os negros foram lançados numa sociedade preconceituosa, de forma desarticulada, sem dinheiro, sem casa, sem comida, sem nenhuma condição de se estabelecer” como os demais cidadãos brasileiros (IBGE, 2012, p. 1). A educação dos filhos não garantia a sobrevivência dos pais que, além de analfabetos, não demonstravam condições de sobressair em uma sociedade ditada pela discriminação e pela exclusão. Mesmo diante 19 da libertação, continuaram a sobreviver com os seus Senhores, como trabalhadores mal remunerados e submissos. De acordo com Munanga (2001), em meio a esse contexto, novas perspectivas surgiram para alguns negros, entretanto, os preconceitos, discriminações e racismos continuaram implícitos na aceitação da cultura negra na sociedade. Um dos problemas é que eles não estavam preparados para enfrentar uma sociedade extremamente racista, que havia lhe dominado durante séculos. Os estudos de Lourenço (2006) distinguem que a partir da lei do Ventre Livre, novos discursos invadiram o contexto brasileiro e a educação passou a ser alvo de lutas populares e de reivindicações, o que se estendeu por décadas até chegar às novas constituições brasileiras. Somente a partir da Constituição Federal de 1988, aconteceu a universalização do ensino, com direito garantido a todos os brasileiros, independente da sua raça, cor, etnia, religião ou cultura. Essa inovação constituiu um marco histórico e conseguiu prever igualdade de oportunidades a todos os brasileiros (CAVALCANTI et al., 2007). É importante reforçar que aliadas aos problemas da educação do negro vieram as altas taxas de analfabetismo; grandes desigualdades entre crianças brancas e crianças negras em relação à escolaridade, aos níveis de escolaridade entre jovens e adultos brancos e negros; além dos preconceitos ainda dominantes nos próprios conteúdos programáticos das instituições escolares, conforme destacam Gonçalves; Silva (2000). Esfinges essas herdadas de uma história de dominação, descaso e desumanidade para com a população negra. Quando saímos do século XIX e adentramos o século XX, deparamo-nos com o abandono a que foi relegada a população negra. A maior parte dos estudos retrata a situação dos negros nas áreas urbanas, no período em que algumas cidades do país iniciam rápido processo de modernização (GONÇALVES; SILVA, 2000, p. 15). No Brasil do século XXI, ainda é possível ver os reflexos dessa história de desigualdade e exploração. Alguns indicadores referentes à população, família, educação, trabalho e rendimento, que são importantes para retratar de forma resumida a situação social de brancos, pretos e 20 pardos, revelam desigualdades em todas as dimensões e áreas geográficas do país. Apontam também para uma situação marcada pela pobreza, sobretudo, para a população de pretos e pardos, conforme descreveu Cavalcanti (et. al. 2007). Para Gonçalves e Silva (2000), as circunstâncias que envolveram as lutas em prol da educação do negro são tão profundas que chegaram ao século XX com imensas desigualdades e poucas conquistas. O problema não se resolveu com a abolição da escravatura, haja vista que aliada à mesma sempre esteve a concepção arcaica de que o negro deve servir ao homem branco. As histórias, desenhos, caricaturas, enfim, ainda existe um contingente de más intenções aliadas às descrições sobre os negros, conforme destaca (MUNANGA, 2001). Todas essas características, além de contribuírem para que o brasileiro pudesse negar a sua identidade, deixou que a verdadeira história dos negros permanecesse escondida no meio escolar. Criou-se nessa população, a vergonha de ser descendente dessa etnia. Além disso, a sociedade continuou com suas injustiças edificadas no poderio do homem branco em detrimento ao negro, conforme destaca Moura (apud MUNANGA, 2001). 1.3 - O Aluno Negro na Escola Contemporânea: Novos Desafios sobre Problemas Históricos Os problemas históricos que envolveram os negros se constituíram como reflexos diretos da incapacidade humana em valorizar as diferenças. Essa realidade se mostrou presente no descaso para com a educação dos negros, conforme já exposto por Munanga (2001). Nesse contexto, ao invés de haver uma transformação “em relação à educação enquanto mecanismo de uma possível promoção social dos negros em uma sociedade livre e de um discurso transformador” (FONSECA, 2002, p. 184), são encontradas novas estratégias de dominação implícitas nas tentativas de dar continuidade a sociedade escravocrata. 21 Os aspectos discutidos acerca da precária educação dos negros, mesmo diante dos princípios de liberdade e direito à educação contidos na Lei do Ventre Livre, somente atingiram profundas mudanças atitudinais a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988. Esta lei foi considerada como um marco na esfera social e educativa de todas as raças, etnias, culturas e religiões, conforme destacou Lourenço (2006). Quase uma década após a sanção da Constituição Federal de 1988, foi aprovada a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96, também considerada uma grande evolução no contexto social e educacional. De acordo com as descrições de Favero (2012), somente assumiu caráter transformador com a aprovação da Lei Federal 10639/03 que modificou a LDB 9394/96 e instituiu a “obrigatoriedade dos sistemas de ensinos municipal, estadual e federal que precisam incluir aulas sobre questões étnico-culturais em seus currículos” (FAVERO, 2012, p. 1). A recente redação dada pela Lei nº 11645/2008 determina ainda que a obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira abrange o ensino fundamental e médio de instituições públicas e privadas. Nesse sentido, os conteúdos programáticos devem incluir a formação da população brasileira, “o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira” (BRASIL, 1996, redação dada pela Lei nº 11645/2008, § 1º). O objetivo desta lei se encontra arraigado no resgate às contribuições sociais, econômicas e políticas do negro na história do Brasil. O § 2º dessa mesma Lei determina que: § 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afrobrasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e histórias brasileiras (Lei nº 11.645, de 2008). Observa-se na lei nº 11.645, de 2008, a tentativa de resgatar a importância do negro no contexto brasileiro é parte integrante de uma intencionalidade de formar cidadãos conscientes, capazes de compreender a sua etnia, sua cultura como partes indissociáveis da história brasileira. 22 A realidade é que a sociedade contemporânea precisa de estratégias pedagógicas desenvolvidas no meio escolar para impulsionar a construção de novas concepções de igualdade de oportunidades, de inclusão e valorização das raças, das culturas e de suas crenças, conforme descreveu Gomes (2001). Assim como Gomes (2001), Favero (2012) destaca que a escola contemporânea enfrenta grandes desafios, principalmente, pelo fato de que ainda prevalecem tensas as relações sociais. Esta realidade não foi alterada a partir da legislação brasileira e faz parte de um universo educativo que pouco estuda esses fenômenos, que geralmente trata a discriminação racial de maneira singular e contribui para que o negro continue a ser tratado como um ser desigual. Essa forma de tratamento reflete diretamente nos percentuais de alunos negros que ingressam e que não permanecem no contexto escolar, o que foi diagnosticado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. A escolaridade dos alunos brancos gira em torno de 6 anos para uma média de 3 anos e meio para alunos negros conforme defende Gomes (2001). A diferença é gritante e demonstra que os desafios existentes na escola contemporânea precisam ser vencidos com estratégias eficazes, com trabalhos étnico-raciais e culturais desde o ingresso dos alunos no meio escolar. Nesse sentido, Favero (2012) indicia que o educador pode ainda propor leituras valorativas de personagens negros e envolver os alunos em confecções de bonecos de pano de diferentes características. Estes trabalhos são capazes de contribuir com percepções, reflexões e questionamentos sobre “a visão de superioridade ou inferioridade entre negros e não negros, etnias diferentes e características comuns ou não entre os variados grupos humanos que povoam a Terra” (FAVERO, 2012, p. 1). Gomes (2001) aponta que os projetos de trabalho em função da superação das ações desumanas contra os negros já existem, entretanto, não são valorizados na escola contemporânea. Esses trabalhos de limitam aos trabalhos de culminância e em poucas aulas, motivo pelo qual se torna difícil para o aluno introjetar a valorização das diferenças. 23 Por mais que inovações foram pensadas e amparadas legalmente, como: a criação de cotas para alunos negros e a criação do dia da consciência negra, obrigatório no calendário escolar, deve haver a plena responsabilidade de aplicar constantemente conteúdos programáticos com intencionalidade pedagógica de valorização do negro, e não somente como uma forma comemorativa. Sobre esta última, observa-se que: [...] o 20 de novembro busca promover ações afirmativas de valorização da população afro-descendente brasileira, mantendo luz sobre nosso passado escravista e criando formas de construir ações de combate ao seu legado funesco (BITTENCOURT, 2007, p. 272). A implantação de estratégias direcionadas às intervenções pedagógicas em prol do combate à discriminação racial se faz presente no contexto escolar como uma forma de reverter as questões históricas e promover a formação de cidadãos conscientes de que todo o ser humano é igual, independente da sua cor, da sua raça ou etnia. A discriminação ainda é uma realidade presente na escola contemporânea, mas não pode se proliferar de maneira desumana, conforme destaca Diniz (2012). Assim, se a sociedade promoveu as diferenças, ela se torna responsável em reverter essa situação por intermédio de ações concretas. Essas ações concretas reportam à necessidade de implantar um currículo escolar que considere a identidade negra em sua amplitude. Um currículo construído com essa perspectiva deve: “respeitar seu modo de ser e de pensar o mundo, considerar a imensa influência que a cultura africana sempre exerceu sobre o modo de ser do brasileiro, com seus mais de 40% de população negra e mestiça” (FAVERO, 2012, p. 1). Este currículo associado à proposta pedagógica da instituição escolar promove de maneira dinâmica e comprometida uma educação cidadã, estruturada sobre a garantia da igualdade de oportunidade de negros em relação aos demais cidadãos brasileiros, conforme destaca Moura (apud MUNANGA, 2001). Diniz (2012) aponta ainda ser importante conhecer os conceitos que envolvem o racismo, o preconceito e a discriminação, para que as ações de intervenção sejam realizadas de maneira significativa na constituição de uma sociedade capaz de reconhecer a importância da 24 heterogeneidade. Deve-se também ser capaz de descobrir através das definições que esses comportamentos desumanos precisam ser banidos tanto do meio escolar quanto da sociedade, pois, além de constituírem um crime, ainda determinam a falta de capacidade de superar as práticas racistas que ultrapassaram os tempos. Nesse sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais de História (1997) apontam sugestões de trabalho com a pluralidade cultural, como estratégia importante na luta contra a discriminação racial que ainda se encontram presentes no meio social. O documento aponta que o trabalho precisa ser desenvolvido por meio de reflexões e dentro da transversalidade entre os conteúdos programáticos da instituição escolar. Assim, pode-se romper então, com as injustiças silenciosas, com as práticas discriminatórias silenciosas reproduzidas desde cedo no ambiente escolar. Favero (2012) defende que para que seja possível a conquista de uma educação transformadora, tanto na escola quanto entre os alunos, as famílias; a sociedade em geral; as instituições de educação formal, sejam elas públicas ou privadas, devem trabalhar fundamentadas em objetivos específicos, que exigem trabalhos sistematizados em teorias capazes de promover a igualdade racial. Outro ponto importante consiste na realização de planejamentos que estimulem a construção do conhecimento por parte de todos os alunos acerca da riqueza da cultura afro-descendente que se faz fortemente presente na cultura brasileira. Ainda destaca-se a estruturação do trabalho em questões que envolvam a identidade negra integrada às demais e em atividades que elevem a autoestima dos alunos socialmente discriminados e que sejam capazes de torná-los como pontos de referências culturalmente positivas no meio social, conforme defenderam autores como Fávero (2007) e Diniz (2012). Por fim, compreendemos que a educação construída sobre os princípios da igualdade racial e valorativa da cultura negra, como pertencente à rica e heterogênea cultura brasileira, torna-se um projeto de trabalho comprometido com o objetivo de vencer os desafios que envolvem as ações desumanas para com os negros. Dessa forma, será 25 possível fazer do espaço escolar um local livre das amarras históricas que envolvem o aluno negro. 26 CAPÍTULO II O ALUNO NEGRO NA ESCOLA ESTADUAL IRMÃOS FERNANDES NO ANO 2012 Com o intuito primordial de investigar sobre o aluno negro e os preconceitos históricos prevalecentes na Escola Estadual Irmãos Fernandes, foram organizadas metodologias que envolveram bases teóricas, empíricas e estatísticas. O método inicial e que foi determinante desde o início das pesquisas realizadas foi o teórico, que se deu por meio da busca bibliográfica do tipo exploratória, com leituras, fichamentos, resenhas e resumos efetuados em livros, revistas, sites da Internet e artigos científicos sobre a temática em estudo. Esse estudo assumiu a responsabilidade de investigar e manter um posicionamento crítico acerca das descrições dos autores pesquisados. A partir dessa perspectiva, foi inserida a pesquisa empírica, que aconteceu em uma instituição pública de ensino do município de Itaobim-MG, a Escola Estadual Irmãos Fernandes. Esta instituição encontra-se localizada em um bairro periférico, com a presença de, aproximadamente, 80% de educandos que se identificam como negros. Esse resultado foi adquirido a partir de um diagnóstico inicial realizado a partir do censo escolar da instituição. Para a coleta de dados, foi elaborada uma pesquisa com o prévio consentimento dos alunos entrevistados, bem como da diretora da instituição supramencionada. Como recurso, foi aplicado um questionário a 20 alunos negros do Ensino Médio, escolhidos de forma aleatória. O questionário foi composto por seis perguntas, dentre as quais, cinco questões foram fechadas e uma questão foi aberta. Nesse momento, a pesquisa empírica contribuiu para que o estudo pudesse assumir o dinamismo da constante interação entre teoria, pesquisador e grupo pesquisado. 27 Os dados coletados foram organizados de maneira sistematizada. Nesse momento, houve o tratamento dos mesmos com análise e discussão. As descrições dos alunos foram reforçadas e equiparadas à fundamentação teórica, com o intuito de verificar se teoria e prática se encontram em consonância. À pesquisa, foram acrescidos ainda, gráficos estatísticos, para melhor visualização dos resultados das informações adquiridas, conforme descrições que seguem: Figura 1. Como os alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes identificam a discriminação racial 30% 20% uma ação que se constitui legalmente como crime contra as etnias, inclusive a negra. Uma ação que nega a evidência de que, apesar das diferenças, todos são seres humanos, independentemente da cor da pele. 50% A falta de reconhecimento de que a cor da pele não define se um ser humano é melhor ou pior que outro. Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012. Os resultados obtidos a partir do questionamento sobre como cada aluno identifica a discriminação racial demonstrou que 20% dos entrevistados responderam que essa ação consiste em um preconceito que se constitui legalmente como crime contra as raças, inclusive a negra. Dentre os alunos questionados sobre essa questão, 50% identificaram a discriminação racial como uma ação que nega a evidência de que, apesar das diferenças, todos são seres humanos, independentemente da cor da pele. Por fim, dos entrevistados, 30% identificaram como a falta de 28 reconhecimento de que a cor da pele não define se um ser humano é melhor ou pior que outro. Apesar de todas as descrições se constituírem como teoricamente correntes, de acordo com as descrições de Sant’ana (2001), constata-se que a metade dos alunos entrevistados distingue a discriminação como uma negação da evidência de que a cor da pele não determina a superioridade ou inferioridade do ser humano. Esta negação reporta às descrições de Mendras (2004), que reconhece as ações preconceituosas como a incapacidade de conviver com as diferenças. Estas posturas somente podem ser transformadas a partir de ações concretas, que envolvam trabalhos comprometidos com teorias e demonstrações práticas de que a cultura negra é parte integrante do povo brasileiro e que a cor da pele somente determina diferenças étnicas, mas que não define a superioridade e nem a inferioridade de um ser. Figura 2. Você já foi vítima de discriminação racial? Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012. Frente ao reconhecimento de que os alunos pesquisados conseguem identificar a discriminação racial em sua amplitude, questionou-se o seu envolvimento em discriminações raciais. Nesta questão, 30% dos entrevistados responderam que já foram vítimas de 29 discriminação racial no próprio meio escolar; 35% apontaram que já foram vítimas de discriminação racial na sociedade e 35% identificaram que nunca foram vítimas de discriminação racial. Os dados coletados demonstram que a própria instituição escolar se constitui como palco das discriminações. Essa realidade foi identificada teoricamente por autores como Favero (2012), Bittencourt (2007), dentre outros que reconhecem que as mudanças devem acontecer a partir desse meio. Nestes termos, se a instituição de educação formal, que se constitui como a base de formação dos indivíduos, não consegue assumir o seu papel, torna-se difícil que a sociedade possa mudar suas ações. Dessa forma, torna-se necessário adotar as estratégias demonstradas por Favero (2012) que apontam para a construção de um currículo escolar e de uma proposta pedagógica construídos com a intencionalidade de formar cidadãos capazes de respeitar as diferenças e que reconheçam que o negro faz cultura e contribuiu diretamente com a constituição histórica e social de todo o povo brasileiro. Figura 3. Se a resposta anterior for sim, sobre qual forma a discriminação racial se processou? Com agressões verbais sobre a cor da pele. 20% 20% 60% Com suposta inferioridade da capacidade de o aluno negro aprender. Com agressões físicas. Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012. A partir do percentual de alunos que descreveram que já foram vítimas de discriminação racial, foi possível identificar que 60% apontaram que a discriminação ocorreu por intermédio de agressões verbais à cor da 30 pele; 20% afirmaram que a discriminação ocorreu através da suposta inferioridade da capacidade de o aluno negro aprender; 20% apontaram que a discriminação ocorreu por meio de agressões físicas. Os resultados demonstram o estado desafiante sobre o qual se encontra a escola pesquisada. Por mais que a Escola Estadual Irmãos Fernandes consiste como uma instituição em meio a inúmeras outras em nível de Brasil e até mesmo de cidade, é possível identificar por intermédio dos seus alunos, que a discriminação racial é uma realidade que necessita de intervenção. As agressões verbais e físicas aos alunos negros precisam ser erradicadas desse contexto para que eles sejam vistos como seres capazes, e não como indivíduos dotados de dificuldades de aprendizagem por conta da cor da sua pele, conforme destacaram os argumentos de Gomes (2001). Assim como Gomes (2001), Favero (2012) identifica que toda e qualquer forma de discriminação deve ser erradicada tanto do meio escolar quanto da sociedade em geral e, para tanto, o negro deve ser visto como um indivíduo igual aos demais, capaz de aprender e de transformar para melhor sua realidade, o que irá depender diretamente da igualdade de oportunidades garantidas pelos sistemas de ensino. Estas deverão ser construídas por meio de ações concretas e trabalhos reeducativos promovidos em parceria entre a escola, famílias e sociedade em geral. Os dados estatísticos não podem persistir em relação ao aluno negro, e esse precisa encontrar na escola a valorização necessária à superação das marcas históricas que prevaleceram por séculos em meio à população brasileira. Essas marcas se encontram impregnadas em caricaturas maldosas, em desenhos mal intencionados, em leituras tendenciosas e até mesmo em livros didáticos, conforme apontou Munanga (2001). Assim, destaca-se que as mudanças se iniciam por intermédio das ações que se constituem como um reflexo direto da vontade dos próprios seres humanos. Quando essas mudanças se relacionam ao aluno negro, elas devem assumir uma responsabilidade valorativa dessa identidade, 31 que seja capaz de estimular nos alunos e nos professores, o reconhecimento de que ser negro implica em ter a cor da pele diferente, mas não se constitui como um fator decisivo para a aprendizagem e nem deve ser motivo de agressões verbais ou físicas sobre esses indivíduos que, ao longo do tempo foram vítimas das grandes injustiças sociais. Por esse motivo, é fundamental compreender o perfil do discriminador no meio escolar, para que assim, seja possível ampliar o trabalho com políticas públicas de intervenção. Figura 4. Se houve discriminação, quem se constituiu como agressor? Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012. O gráfico acima determina que 35% dos alunos entrevistados apontaram que a discriminação racial identificada na figura 3 foi promovida por colegas de classe; 50% responderam que as discriminações partiram de pessoas da sociedade; enquanto 15% distinguiram que as discriminações partiram de funcionários da própria instituição e/ou do próprio professor. Reforça-se que mesmo diante uma legislação vigente de inovações como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96, das sugestões sobre o trabalho com a pluralidade cultural contidas nos 32 Parâmetros Curriculares Nacionais de História, e de teorias que reconhecem a necessidade de vencer os desafios da valorização do negro enquanto ser humano, ainda prevalecem práticas inadequadas como a discriminação de colegas de classe, de funcionários da instituição e, principalmente, da sociedade. Assim, defende-se com base nas teorias de Sant’ana (2001), Favero (2012), Diniz (2012) dentre outros autores estudados, que as mudanças precisam partir da vontade de cada um e não são determinadas exclusivamente por fatores externos. Os docentes e demais funcionários da instituição precisam rever seus conceitos, com o intuito de se preparar para atuar em uma instituição composta por diferentes alunos. O docente precisa reconhecer que, para além da cor da pele, existe um ser humano dotado de anseios, de sentimentos, de vontades e de expectativas de que a sociedade e a grande função da escola é reconhecê-lo como um ser capaz, como um cidadão que possui os mesmos direitos que os demais que frequentam o ambiente escolar. Existe a necessidade de integrar as ações educativas, de promover grupos de debate dentro da escola, de saber selecionar teorias adequadas para o trabalho em sala de aula e estar consciente de que o professor e os demais funcionários da instituição escolar se constituem como exemplos a serem seguidos. Eles devem se fixar em estímulos adequados para que a convivência entre as etnias, as diferenças sociais, econômicas e culturais aconteça de maneira plural, heterogênea, carregada da beleza do encontro entre os diferentes de cor. É fundamental que os seres humanos, independentemente da sua condição, sejam reconhecidos com indivíduos capazes de agir, de sentir e de transformar para melhor o mundo que os rodeia. Nesse sentido, a instituição escolar, enquanto espaço transformador e formador de opiniões, precisa promover intervenções pedagógicas que venham impulsionar uma inclusão significativa do aluno negro em seu contexto. Com base nessa concepção, questionou-se 33 acerca da intervenção pedagógica aplicada na Escola Estadual Irmãos Fernandes (FIGURA 5). Figura 5. A instituição escolar que você estuda promove intervenções pedagógicas com perspectiva de vencer os desafios da inclusão do aluno negro em seu meio? Sim, ela trabalha com projetos em todo o ano letivo que abrangem a inclusão educacional do aluno negro. 15% 50% 35% Sim, mas os projetos se limitam ao mês de novembro, período em que o calendário escolar prevê o trabalho sobre a consciência negra. Não existem projetos de intervenção pedagógica capazes de promover a inclusão do aluno negro no meio escolar. Fonte: pesquisa realizada pela cursista Maria Ireni Neres Rocha, com alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012. Diante do reconhecimento de que a discriminação racial é uma realidade presente entre os alunos pesquisados na Escola Estadual Irmãos Fernandes no ano 2012, questionou-se sobre as intervenções pedagógicas utilizadas para vencer os desafios da inclusão do aluno negro no meio escolar de maneira humana e significativa. Nesse momento, foi possível diagnosticar que 50% dos alunos responderam que a Escola Estadual Irmãos Fernandes trabalha com projetos em todo o ano letivo, projetos esses que abrangem a inclusão educacional do aluno negro. Enquanto 35% dos alunos afirmaram que a instituição trabalha com projetos, mas que os mesmos se limitam ao mês de novembro, período em que o calendário escolar prevê atividades valorativas da consciência negra. Por fim, 15% dos entrevistados apontaram que não existem projetos de intervenção pedagógica capazes de promover a inclusão do aluno negro no meio escolar. 34 Os dados indiciam que a instituição escolar pesquisada valoriza uma cultura de trabalho com a inclusão dos alunos considerados diferentes, inclusive da população negra. Entretanto, ainda existe uma parcela de alunos que não consegue identificar esse trabalho como uma intervenção pedagógica em prol do aluno negro. Esse fator evidencia que as atividades não conseguem atingir os objetivos esperados, motivo pelo qual, ainda existe uma parcela de alunos que ainda não reconhece essas atividades de intervenção. Nesse sentido, os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) sugerem que o trabalho com a pluralidade cultural seja articulado de maneira clara e objetiva, dentro da transversalidade, com envolvimento direto de todas as demais áreas do conhecimento. Nessa mesma linha de pensamento, Favero (2012) aponta que não basta existir apenas um dia para trabalhar com a consciência negra, pois ela deve ser desenvolvida constantemente, com exemplos diários, com reconhecimento de que o negro possuiu uma identidade que deve ser respeitada e, sobretudo, fundamentada na concepção de que o povo brasileiro dependeu diretamente dos negros para estruturar a sociedade contemporânea. Dessa forma, as atividades de intervenção precisam acontecer sob a forma de projetos de pesquisas sobre a importância do negro no reconhecimento dos personagens que contribuíram diretamente com a constituição da nação brasileira. Assim, essas intervenções se transformam em importantes agentes dessa história, conforme destacou destaca Moura (apud MUNANGA, 2001). A falta de ações inovadoras na educação formal se reflete nas atitudes da sociedade. Assim, por intermédio de intervenções afirmativas, os desafios que ainda permeiam o aluno negro no meio escolar serão vencidos de maneira dinâmica, com a valorização do negro em sua amplitude. O reflexo da falta de atividade de intervenção afirmativa da discriminação se demonstra como deficitário à medida que os alunos pesquisados enunciam seus anseios em frases de angústias, decepções e que almejam por uma realidade diferente com sua etnia. 35 Essas frases foram identificadas em expressões como: “que Deus dê forças aos meus inimigos para eles assistam de pé a minha vitória” (ALUNO DA ESCOLA ESTADUAL IRMÃOS FERNANDES, 2012). Essa frase evidencia que o aluno discriminado visualiza o discriminador como um inimigo e almeja, assim, mostrar a sua capacidade de superar o racismo e demonstrar que ele é capaz. As respostas das perguntas abertas demonstraram que os próprios alunos acreditam ser difícil vencer o racismo no meio escolar, pois apontam que a sociedade não reconhece o negro como gente e que essa condição precisa ser mudada a partir das ações do meio escolar. Cabe ressaltar que essa população, reconhecida como marginalizada por autores como Sant’Ana (2001), como Gomes (2001), dentre outros, necessita de ações interventivas, capazes de reverter as injustiças em oportunidades para um novo recomeço. Essas ações de intervenção foram reconhecidas por Favero (2012) como leituras valorativas de personagens negros e trabalhos capazes de contribuir com percepções, reflexões, questionamentos sobre a importância do negro, conforme já exposto. Destaca-se, assim, que a sociedade contemporânea, com todo o seu conhecimento e toda a sua heterogeneidade, não deve contribuir para que a discriminação do negro se estenda por outros períodos históricos. As intervenções precisam acontecer constantemente, de maneira explícita e implícita, nos conteúdos programáticos de todas as disciplinas curriculares, conforme determina Favero (2012). Por mais que existam raízes profundas de desvalorização e discriminação dos negros, é preciso reverter esta realidade com um trabalho integrado, valorativo das diferenças e da contribuição que o negro ofereceu ao longo do tempo para a formalização da sociedade brasileira, conforme afirma Fonseca (2002). É importante destacar ainda que a sociedade mudou, que as políticas públicas foram alteradas, e que as atitudes dos seres humanos também precisam acompanhar essas mudanças. Para chegar ao contexto social e histórico da contemporaneidade, muitos movimentos foram organizados, lutas foram travadas e as 36 conquistas legais legitimaram o reconhecimento do negro enquanto um indivíduo igual aos demais. Essas ações impõem mudanças que precisam ocorrer na prática, e não somente no plano ideológico, para que os procedimentos educativos possam acompanhar essa tendência de maneira significativa. Por mais que as leis deleguem ao aluno negro o mesmo direito delegado às demais etnias, ainda prevalecem práticas racistas que desafiam a educação formal. Conforme o estudo teórico e o diagnóstico empírico discutido, essa prática revela a discriminação que ocorre tanto na escola quanto na sociedade, o que determina que a sociedade brasileira ainda não conseguiu se livrar das amarras históricas e que ainda prevalecem preconceitos contra os negros. Destaca-se, assim, que a escola pública, enquanto espaço de formação cidadã, precisa observar atentamente as discriminações sofridas por seus alunos negros e promover projetos de capacitação direcionados aos seus profissionais. Juntos, esses profissionais serão capazes de desenvolver trabalhados valorativos de todas as diferenças, com atividades que manifestem a intencionalidade pedagógica de vencer os desafios do racismo. É preciso superar a visão de que o negro não é capaz de aprender. É fundamental superar os preconceitos impregnados na sociedade e que se apresentaram no meio escolar sob a forma de ações inadequadas, haja vista que a educação é um direito de todos, garantida pelas leis federais, estaduais e municipais. Conhecer e praticar esse direito torna-se essencial à construção de uma sociedade mais justa, que ofereça igualdade de oportunidade a todos os cidadãos, independente da sua cor. Dessa forma, reforça-se que garantir o direito somente através de leis não é suficiente. É indispensável que tanto a sociedade quanto as instituições escolares possam interiorizar as necessidades de mudanças procedimentais. Assim, a conquista de uma educação de qualidade, devidamente fundamentada no respeito e na garantia dos princípios de igualdade será garantida legalmente. 37 Quando a escola e a sociedade passarem a atuar juntas na busca de uma educação que valorize os direitos de todos os seus cidadãos, as perspectivas de erradicar as práticas desumanas para com os alunos negros irão ser maximizadas, e os problemas serão enfrentados com responsabilidade e comprometimento de todos os cidadãos. É preciso superar a discriminação e o preconceito racial que ainda se encontra presente na escola pública, para tanto, as intencionalidades devem se fixar em ações concretas, que ampliem o reconhecimento da escola enquanto instituição social que deve se preparar para receber todos os alunos considerados diferentes, inclusive os negros. Essa se torna a grande condição “para que brancos e negros, como cidadãos, se coloquem como sujeitos do processo da formação da educação” (MELO; COELHO, 1988) e não se sintam submissos a um sistema incapaz de valorizar as diferenças. Infelizmente, os fatos denunciam que a escola pesquisada ainda não foi capaz de vencer os desafios que rondam a valorização do aluno negro, mas mudar é preciso para que seja possível vencer os desafios. Somente assim, novas conquistas irão demarcar o surgimento de uma sociedade realmente cidadã, conquistada por intermédio das ações desenvolvidas na escola e que foram capazes de promover as verdadeiras transformações sociais. 38 CONCLUSÃO Com base na análise realizada, foi possível reconhecer que ao longo da história, sobretudo, na constituição da nação brasileira, o negro sofreu um verdadeiro massacre moral, psicológico e físico. Os negros e seus descendentes foram privados de ter uma vida social, familiar, autônoma e, consequentemente, não tiveram acesso a uma educação formal de qualidade. Essas características ultrapassaram os séculos e, mesmo diante da abolição da escravatura e frente às novas perspectivas educacionais, ainda existem práticas discriminatórias que dificultam a superação das grandes desigualdades nos níveis de escolaridade e no campo social em geral. Essa realidade se encontra presente na escola Estadual Irmãos Fernandes, que vivencia grandes desafios em relação ao aluno negro. Eles ainda são vítimas de discriminações e atitudes pouco aceitáveis em um mundo contemporâneo, no qual grandes conquistas legais foram legitimadas teoricamente, mas não foram aplicadas na prática. O grande problema, que se constitui como uma realidade pouco aceitável aos olhos dos defensores da valorização da identidade negra, é que ainda existem instituições da educação pública que não têm contribuído para superar o racismo ainda presente em seu meio. Este aspecto evidencia a inoperância na aplicabilidade das leis que regem o sistema educacional, e ainda denuncia a incapacidade de algumas instituições públicas de ensino em desenvolver estratégias de formação cidadã fixadas em bases firmes da igualdade étnica. Com base na pesquisa realizada na Escola Estadual Irmãos Fernandes, foi possível analisar que ainda existem práticas racistas na escola. Estas se manifestam por meio de agressões verbais e, sobretudo, de agressões físicas, e configuram situações extremas que constituem a vivência do negro no cotidiano escolar. Dessa forma, compreendeu-se que uma das grandes alternativas de transformar essa realidade é investir em intervenções pedagógicas 39 com atividades capazes de valorizar a importância do negro e de demonstrar que todos são importantes na constituição histórica e social de uma determinada sociedade. As conquistas legais como a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96 já fazem parte dessa realidade, assim, é necessário rever as mudanças comportamentais e atitudinais para que tanto o aluno branco quanto o aluno negro participem de uma formação cidadã e sejam os agentes sociais proliferadores da igualdade de oportunidades e da igualdade racial. Por intermédio do estudo realizado, o conhecimento sobre os desafios e sobre as perspectivas do aluno negro no meio educacional foram ampliadas e houve a concepção de que esses desafios podem ser vencidos com práticas pedagógicas capazes de valorizar o ser humano em sua amplitude, com suas diferenças étnicas, econômicas e culturais, livre de qualquer tipo de discriminação. 40 REFERÊNCIAS ALENCASTRO, L. F. “Vida privada e ordem privada no Império”. In.: ALENCASTRO, Luiz Felipe (org.). História da vida privada no Brasil. v. 2. São Paulo: Companhia da Letras, 1999. BITTENCOURT, C. M. F. Dicionário de datas da história do Brasil. São Paulo: Contexto, 2007. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Ontem e hoje, o negro no Brasil. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/discriminacao/ontemhoje.html>. Acesso em: 30 de março de 2012. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB 9394/96). Brasília, 1996. _______. Secretaria de Educação Fundamental. 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THEODORO, H. “Buscando caminhos nas tradições”. In: MUNANGA, K. (Org.) Superando o racismo na escola. 3. ed. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Fundamental, 2001. 42 APÊNDICE I Questionário aplicado aos alunos da Escola Estadual Irmãos Fernandes, no ano 2012. Questões: 1. Como você identifica a discriminação racial? ( ) uma ação que se constitui legalmente como crime contra as etnias, inclusive a negra. ( ) um ação que nega a evidência de que, apesar das diferenças, todos são seres humanos, independentemente da cor da pele. ( ) a falta de reconhecimento de que a cor da pele não define se um ser humano é melhor ou pior que outro. 2. Você já foi vítima de discriminação racial? ( ) Sim, no meio escolar. ( ) Sim, na sociedade. ( ) Não, nunca fui vítima. 3. Se a resposta anterior for sim, sob a qual forma a discriminação racial se processou? ( ) com agressões verbais sobre a cor da pele. ( ) Com suposta inferioridade da capacidade de o aluno negro aprender. ( ) com agressões físicas. 4. Se houve discriminação, quem se constituiu como agressor? ( ) o próprio colega de classe. ( ) pessoas da sociedade. ( ) funcionários da instituição escolar e/ou o próprio professor. 5. A instituição escolar que você estuda promove intervenções pedagógicas com a perspectiva de vencer os desafios da inclusão do aluno negro em seu meio? ( ) sim, ela trabalha com projetos em todo o ano letivo que abrangem a inclusão educacional do aluno negro. ( ) sim, mas os projetos se limitam ao mês de novembro, período em que o calendário escolar prevê o trabalho sobre a consciência negra. ( ) não existem projetos de intervenção pedagógica capazes de promover a inclusão do aluno negro no meio escolar. 43 6. Enquanto aluno negro, como você acredita que possam ser vencidos os desafios da inclusão e seja garantida a igualdade de oportunidades da sua etnia no contexto escolar? ___________________________________________________________ ___________________________________________________________ 44 ANEXO I AUTORIZAÇÃO A Escola Estadual Irmãos Fernandes, na pessoa da sua diretora Eliene Alves Pereira, autoriza Maria Ireni Neres Rocha, cursista da Especialização em Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça-Etnia, oferecida pela UFOP, Pólo de Araçuaí-MG, a desenvolver sua pesquisaação e relatório com base no questionário aplicado aos alunos do Ensino Médio dessa instituição, desde que sejam respeitadas as normas legais e os nomes dos mesmos sejam preservados. Itaobim-MG, 20 de março de 2012. Maria Hermilce Arifa Chaves