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Anabela de Oliveira Figueiredo • A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o legado cultural e os valores em A. Redol
A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o
legado cultural e os valores em A. Redol
Anabela de Oliveira Figueiredo
Agrupamento de Escolas de Penacova
Resumo
O principal objectivo deste ensaio consistiu em fazer uma análise mais aprofundada
do texto A Vendedeira de Figos, de Alves Redol que adaptámos para um grupo de alunos,
do 4.º ano de escolaridade, do 1.º Ciclo do Ensino Básico, do Agrupamento de Escolas de
Penacova, incidindo, assim, sobre os trabalhos realizados pelos mesmos.
Este conto escrito é parte integrante do livro Histórias Afluentes, onde o escritor Alves
Redol reuniu alguns textos dispersos, num total de catorze composições, um livro que se
tem mantido na penumbra, no conjunto dos títulos escritos pelo romancista.
Na abordagem ao texto, destacámos como eixos fundamentais alguns aspectos
lúdicos, didácticos e pedagógicos, o legado cultural, alguns valores, comportamentos e
atitudes das personagens, presentes em A Vendedeira de Figos.
Palavras-chave
Alves Redol, Literatura infantil, Didáctica, Pedagogia, Legado cultural
Abstract
The main aim of this work consisted in a more detailed analysis of the text A
Vendedeira de Figos, from the writer Alves Redol that we have adapted to a group of
students, of the 4th level, from the Basic Education Schools of Penacova, focusing, thus,
on the work fulfilled by them.
This written tale is an integral part of the book Histórias Afluentes, where the writer
Alves Redol met some texts dispersed, a total of 14 compositions, a book which has
remained in the shadows, among all the other titles written by the novelist.
In the approach to the text, we have stressed as fundamental some leisure aspects,
didactic, and pedagogical teaching, the cultural legacy, some values, behaviors and
attitudes of the characters, present in A Vendedeira de Figos.
Key-words
Alves Redol, Literature for children, Didactics, Pedagogy, Cultural legacy
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Introdução
Dando corpo a este estudo, desenvolvemos uma breve resenha teórica sobre o conto
A Vendedeira de Figos, de Alves Redol, inserido na obra de onde foi extraído, Histórias
Afluentes, seguida da explicação de uma aplicação prática do texto, a uma turma do
4.ºano de escolaridade, na EB1 de Penacova.
Meramente a título de ilustração, faremos uma abordagem, muito breve, sobre
A Literatura Infantil em Portugal1, incidindo, essencialmente, na contextualização
referente ao período em que Alves Redol escreveu os seus livros para crianças e jovens.
Nesta perspectiva, à luz do que foi dito e escrito, podemos afirmar que o controle
ideológico inerente à época em que Alves Redol viveu – o Estado Novo – na área do
ensino e da literatura, mais especificamente na formação de mentalidades, foi de tal
forma importante que marcou uma geração.
Podemos sublinhar, à luz destes princípios, que um dos objectivos do Estado Novo era
o de controlar a doutrinação moral, reduzir a influência ideológica da população e poupar
nas despesas públicas. Reconhecidamente, afigura-se igualmente importante mencionar
que, enquanto não foi instituído o livro único, nos livros oficiais eram inseridas algumas
máximas conseguindo-se, assim, controlar os conteúdos programáticos do ensino. Estas
frases, com objectivos doutrinários, tinham o intuito de despertar a obediência e o
conformismo. Na escola, através da ideologia veiculada pelos manuais escolares, e em
casa, pela exaltação da importância da pobreza, era estimulada a prática da caridade, o
gosto pela disciplina, o amor a Deus e à Família e, também, a devoção à Pátria, que se
traduzia no interesse pelo conhecimento da História de Portugal e na difusão do ideal
nacionalista.
De igual modo, indo ao encontro das ideias anteriormente transmitidas, a realidade
do dia-a-dia, os assuntos verdadeiros e reais, eram defendidos, por muitos, como sendo
primordiais, opondo-se à ideia do maravilhoso2. Todavia, na década de 50, no período
que se seguiu à Segunda Guerra Mundial, a evolução do desenvolvimento industrial
levou a algumas alterações no sistema de ensino. Sobressai aqui, também, o facto de,
com a entrada de um grande número de produções estrangeiras no nosso País, se recear
a adesão às novas ideias que o mundo foi divulgando. Neste percurso, os livros de autores
estrangeiros para crianças, ilustrados e a preços de concorrência, começaram a invadir o
nosso mercado, principalmente a banda desenhada.
Em virtude das alterações verificadas em Portugal, a literatura tradicional de fantasia
é substituída por uma literatura mais ligada à verdade, ao real. Todavia, quando se foca
o real, não é tanto a realidade da criança e aquilo que a rodeia, mas sim a referência à
vida animal, aos aspectos geográficos, a uma figura ou facto histórico. Estamos perante
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Anabela de Oliveira Figueiredo • A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o legado cultural e os valores em A. Redol
um real diferente, que desperta para a vida, que apresenta animais a falar, a cantar e a
rir, como Redol tão bem ilustra nos quatro volumes da colecção «Flor»: A Flor Vai Ver o
Mar; A Flor Vai Pescar Num Bote; Uma Flor Chamada Maria; Maria Flor Abre o Livro das
Surpresas.
A ajuizar pelo que lemos, a reforma do Ensino Primário, por volta de 1936, veio
simplificar e submeter a uma certa ideologia os conteúdos de ensino. Estes aspectos
tiveram repercussão na Literatura Infantil, acabando por surgir obras de teor nacionalista
e moralizante, em que eram exaltados os valores nacionais, de acordo com a ideologia
do Estado Novo.
O que se pretende evidenciar, aqui, é que ao analisarmos os textos de Redol temos
que ter em conta as alterações políticas, económicas, sociais, ideológicas e culturais
que ocorreram na época em que escreveu. Urge não esquecer que o discurso do escritor
impõe um conjunto de pressupostos (sociais, morais, culturais) que são, assim, assumidos
como pertença de um grupo alargado de cidadãos e, por isso mesmo, vistos como traços
distintivos quando se compara esse povo com outros, criando o que se denomina de
identidade nacional3. Estes processos sociais ou socializantes podem ser modificados
e redefinidos por essa mesma sociedade já que “The social processes involved in the
formation and the maintenance of identity are determined by the social structure”4.
Abreviadamente, podemos dizer que, tentar esclarecer o conceito de identidade
implica questionar as coordenadas espácio-temporais, culturais e sociais bem como o
campo das crenças que se unem para construir o imaginário colectivo de um povo. Por
sua vez, esse universo simbólico vai ordenar a história, tecendo o passado, ditando o
futuro e levando o sujeito a ter em consideração que, também ele faz parte de uma
comunidade específica e única, por comparação com outras.
It locates all collective events in a cohesive unity that includes past, present
and future. With regard to the past, it establishes a ‘memory’ that is shared by
all the individuals socialized within the collectivity. With regard to the future,
it establishes a common frame of reference for the projection of individual
actions. Thus the symbolic universe links men with their predecessors and
their successors in a meaningful totality, serving to transcend the finitude
of individual existence and bestowing meaning upon the individual’s death.
All the members of a society can now conceive of themselves as belonging to a
meaningful universe, which was there before they were born and will be there
after they die5.
Como que imbuído destes pressupostos, Alves Redol, no conjunto das obras que
escreveu, tanto na literatura para adultos como na literatura infantil e juvenil, procurou
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divulgar, à sua maneira, um retrato de Portugal profundamente ideológico – o Portugal
ditatorial – do período do Estado Novo.
Em torno desta linha de pensamento, também não podemos deixar de notar que é
necessário ter em conta que qualquer livro em literatura é um produto dos acontecimentos
históricos e sociais que prevalecem no momento em que é produzido, numa relação
estreita entre o texto e o escritor. Importa por isso assentar que, em Histórias Afluentes,
Alves Redol reuniu alguns textos dispersos, um conjunto de catorze composições
antigas, que evidenciam algumas das recordações vividas pelo escritor, onde destacamos
A Vendedeira de Figos.
Numa perspectiva mais prática, com o presente trabalho, pensamos conseguir
também apresentar algumas reflexões sobre a importância da Literatura Infantil no
desenvolvimento da criança e, forçosamente, a sua ligação intrínseca com a leitura.
Mais do que transmitir conhecimentos sistemáticos (…), o ensino da Literatura
deve constituir uma iniciação a uma prática que se deseja duradoura e
continuada. Isto é, através do contacto com os textos e os escritores, o aluno
deve essencialmente recolher estímulos para continuar a ler livros (…)6.
Histórias Afluentes: A “Vendedeira de Figos”
Em Histórias Afluentes (1963), Redol reuniu num só volume, alguns textos dispersos
no tempo, um conjunto de catorze composições antigas que evidenciam algumas das
recordações vividas pelo escritor. Das ideias expressas ao longo dos textos, predomina
um conjunto de temas muito variado que Redol agrupa a seu gosto e com algum critério:
duas histórias com rapazes – O Castigo e O Mar entre as Mãos; três histórias com
raparigas – Porque não Hei-de Acreditar na Felicidade?, O Cheiro do Branco e O «Pai dos
Mortos»; quatro histórias curtas – Emigram as Andorinhas, A Vendedeira de Figos, Páginas
de Testamento e O Rapaz não Gostava das Mãos; cinco histórias de Natal – A Viagem à
Suiça, Noite Esquecida, Algumas Maneiras de um Homem sem Família Passar a Noite de
Natal, A Festa de Natal e A Noite Tranquila.
Em dois apontamentos breves, podemos acrescentar que nos contos O Castigo, O
Mar entre as Mãos e A Vendedeira de Figos se evidencia o mundo infantil, pelo facto de
a personagem principal de cada uma destas histórias ser uma criança, ou um jovem, à
volta da qual gira um mundo repleto de sonhos, povoado de personagens recriadas pela
imaginação do escritor, enfrentando as durezas da vida, mas onde o leitor pode encontrar
as coisas mais simples da existência humana. O facto de estes três contos serem os únicos
a girar em torno de figuras infantis e juvenis e de o seu conteúdo remeter para aspectos
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que em tudo se encontram relacionados com o universo literário infantil e juvenil levounos a realçá-los de entre o conjunto das catorze histórias apresentadas em Histórias
Afluentes e fazer uma breve abordagem das mesmas.
O primeiro conto a analisar é O Castigo, no qual o escritor evidencia a história de
um «rapazeco descalço», o Tóino, tido em pouca conta pelo pai que o chama «Vadio!»
e «Grande malandro!» (p. 11)7. Tem por companheiro um «cachorro branco, de malhas
amarelas […] perna curta e caneja […] de língua pendente» (p. 12), o “Teu Nome”. O
texto apresenta uma família de feirantes que deambula de um lado para o outro numa
carroça. Têm como única riqueza a carroça, a mula, os caixotes onde transportam a roupa
e «as lentes para mostrar postais» (p. 11). Ao longo da composição são focadas algumas
características físicas e comportamentais das personagens, alguns aspectos relacionados
com a família, destacando-se a personalidade destas figuras inseridas no mundo que as
rodeia. Assim, temos o Tóino que vende os moinhos feitos pela mãe, colaborando para o
ganha-pão da família. O rapaz sonha com uma viagem de barco, «uma viagem pelo rio, a
qualquer sítio, sabia lá até onde: até Lisboa, para baixo é que é Lisboa» (p. 18).
Por seu turno, a mãe, único elemento feminino da família, aparece aqui como uma
pessoa com poucas capacidades. Na sua tarefa, mistura as cores quando faz os moinhos,
o que leva a que mãe e filho entrem em conflito. Tóino vigia a mãe nos «acabamentos,
uma tonta com as cores, misturava tudo» (p. 14). O pai, também ajuda na tarefa, vai
buscar picos de piteira para espetarem as canas dos moinhos. Este elemento masculino
desempenha o papel negativo de “chefe” da família, bate na mulher quando as coisas
não correm bem, situação que ficamos a conhecer pelas palavras do filho: «se eu disser
ao pai ele dá-lhe poucas no cartucho e depois vossemecê chora para aí que ninguém a
cala» (p. 15). Situações como esta retratam a submissão da mulher ao homem e os maustratos que ocorriam, aspecto recorrente nas classes menos privilegiadas, na época em
que Redol escreveu.
Neste quadro de representações, o cão aparece como um dos protagonistas, sendo
caracterizado por uma certa humanização dos seus comportamentos. Parece compreender
os sentimentos do dono. Segue preso ao eixo da carroça e quer voltar-se para «animar o
amigo», o Tóino, «cujo choro lhe dava vontade de uivar» (p. 12). Todavia, ele «já sabia»
que esta sua atitude lhe «custava – duas ou três arrochadas no lombo […] e assim tinha
de se resignar» (Ibidem). O cão aparece também como um elemento maltratado. Ao
longo da história, o narrador vai assumindo o ponto de vista das várias personagens – na
cena da toirada improvisada, o toiro, tal como o “Teu Nome”, aparece como um ser que
pensa. O narrador regista o que lhe vai no pensamento: «Nunca se vira rodeado daquela
maneira, nem mesmo quando um dia fora obrigado a lutar com outro boi que o corneara
na manada» (p. 23). Aqui aparece em destaque a memória do boi, ele até se lembra do
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que lhe acontecera numa situação anterior quando se vira confrontado com outro boi.
O animal decide fazer qualquer coisa, adquire poder de decisão: «raivoso, apoucado nos
seus brios […] avançou para o vulto» (Ibidem). Surge o momento do confronto dos dois
animais, colocados frente a frente como se de duas pessoas se tratasse. O boi larga a
perseguição ao homem para ir atrás do «canito que recuava à sua frente ladriscando» (p.
24). Ele «movia a cabeça, de olhos esbugalhados e mansos, sem entender o que o outro
queria» (Ibidem). O cachorro não se fica atrás, «vira indecisão no olhar do gigante amarelo
e não deixava de avançar sobre ele» (Ibidem). O boi recua «acobardado», fora “vencido”
pelo cão. Este torna-se então um herói, deixando o seu dono vaidoso. Numa palavra, esta
passagem do confronto entre os dois animais atinge um dos pontos de maior relevo na
história. Destaque-se a humanização com que são descritos os seus comportamentos, o
que faz com que sejam colocados quase ao mesmo nível das restantes personagens, os
humanos. Porém, a sequência da acção mostra-nos um corte abrupto entre a euforia da
criança (o Tóino), a que se sucede um momento disfórico – o ambiente encontrado em
casa, em que os pais preocupados com o seu desaparecimento castigam o Tóino. Nesta
perspectiva, podemos afirmar que o conto mostra a aversão da criança pelo castigo que
recebe: «a consciência não o acusava de merecer o castigo» (p. 27). Mas o que lhe custa
mais não será o facto de os pais lhe baterem, mas a injustiça do castigo, que se estende ao
próprio cão, amarrado ao eixo da carroça «forçando-o a correr com a pata a manquejar.
É que não era coisa que se fizesse, nem a uma pessoa» (Ibidem). Saliente-se o interesse
manifestado pelo animal e a comparação feita ao ser humano.
O mote de O Mar entre as Mãos encontramo-lo nas palavras iniciais, «as coisas boas
da vida sabem melhor quando se conseguem com sacrifício» (p. 31). Neste texto Artur
consegue realizar o seu sonho, ter o mar nas suas mãos, quando a Tia Maria Vitória lhe
oferece um búzio pelo Natal.
Torna-se pertinente evidenciar que no percurso da história, o autor apresenta ao
leitor um conjunto de jogos tradicionais que aparecem como uma constante do dia-adia da rapaziada – atirar o pião, jogar a bilharda, os belindres, o pé-coxinho ou a malha.
Estas actividades infantis levam os rapazes a aliarem-se «uns contra os outros, depois os
pactos quebravam-se e havia troca de amigos e de inimigos, faziam-se tréguas» (p. 32).
Um outro passatempo, também referido, é o dos álbuns de cromos, com «a colecção de
bonecos de desporto, recortados de jornais e revistas para serem colados em folhas de
papel manteiga» (Ibidem), unem os rapazes, nos dias de Inverno. Reunidos em torno das
imagens recolhidas, desfolham e tentam imitar o que representam as gravuras.
Acresce a este panorama, um outro conjunto de imagens em que é descrita a rivalidade
existente entre os rapazes, gerada pelas diferenças económicas, e as repercussões que
isso traz. Mário, um dos amigos de Artur, «vezeiro em ir à gaveta da loja da mãe para
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derreter o dinheiro em revistas» (p. 33), colecciona bonecos de desporto que cola no
álbum das gravuras. O rapaz consegue arranjar uma fotografia de um grupo de futebol
inglês, o Arsenal. Propõe aos amigos uma corrida até ao fundo da rua. O primeiro a
chegar recebe o recorte da revista. Segue-se um momento típico muito frequente nos
jogos de crianças. Edmundo, um garoto de doze anos, coxo, conhecido pela alcunha de
«Roda Presa», será o juiz de chegada. Sardinheira, o rival de Artur nas disputas, começa
a destacar-se conjuntamente com este. Eis que o Sardinheira passa uma rasteira ao outro
que fica logo com um joelho em sangue. Mas o Mário entrega-lhe o boneco e faz justiça
ao Artur. Estas rivalidades e os jogos que as motivam nem sempre têm bons resultados.
No entanto, no grupo que o autor aqui apresenta predomina o bom senso. Faz-se justiça.
A problemática da justiça, do comportamento justo, que já surgiu no conto anterior,
aparece também aqui. Esta é uma questão sempre presente em Alves Redol.
Tão-pouco se pode depreender que, apesar de a situação ter sido resolvida da melhor
maneira pelos rapazes, o Artur tem ainda que enfrentar as reacções da família. Num
primeiro momento, a Tia Maria Vitória, que usava óculos na ponta do nariz vermelho e
bicudo, dá-lhe «um tabefe» quando o vê com o joelho naquele estado. A mulher grita,
aparece a vizinhança, e o Artur é levado às cavalitas para o hospital. A caminho de casa
o menino sente-se importante, nunca lhe tinham dispensado tanta atenção. Podemos ler
aqui, nesta breve passagem, a forma como “a criança” era tratada na época. A “tareia”
era remédio e solução para tudo. Já no conto anterior se verificou este comportamento
por parte dos adultos, em relação à criança. Daí o Artur temer a reacção do chefe de
família: «O teu pai derrete-te, lembrava-lhe a Tia Nova» (p. 39). A preponderância para
ter medo do pai mantém-se nesta história. O chefe de família aparece como o elemento
que bate e castiga. A tia representa o elemento apaziguador. Tia e sobrinho combinam
que este estará a dormir quando os pais chegarem e assim já não apanha. De facto, num
segundo momento, o pai grita, a mãe chora, e lá acabam por ver o seu menino. Ao pai,
Artur tem que mentir (um aspecto típico na realidade do dia-a-dia), conta a história de
um carneiro que o marra nas pernas enquanto brinca com os outros. A investigadora
Mercedes Gómez del Manzano, a respeito dos contos que retratam a vida real, tece a
seguinte afirmação: «Los protagonistas de estos libros que intentan poner al niño en
contacto con la vida real se mueven en el ámbito de la familia, en el mundo del adulto
con implicaciones sociales, en las realidades más variadas […]» (Manzano, 1987: 163).
Efectivamente, é este o ambiente que encontramos nestes textos que colocam a criança
em vivências reais, movem-se no mundo da família, reflectindo, deste modo, algumas
situações sociais – posição defendida na época em que Redol escreveu os livros para
crianças, como atrás já foi mencionado.
Em nosso entender, afigura-se igualmente importante mencionar que os quadros que
Redol nos descreve neste conto são compostos ao sabor do comportamento das crianças
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e resultam de um entrelaçar entre a reacção dos adultos e as consequências habituais
das brincadeiras dos mais novos, como é neste caso a queda e o esfolar do joelho. Artur
tem medo da reacção dos pais quando cai, no entanto, ele sabe que pode contar com a
protecção da tia. A mentira surge aqui com a ajuda da tia, como uma forma de proteger a
criança contra a reacção negativa dos adultos (principalmente os pais), destacando-se a
aplicação de um castigo pelas suas travessuras, numa situação tão comum e vulgar como
a da queda.
Meramente a título de ilustração, salientamos, também, a importância daquilo que
é simples, aqui tão bem representado no conto. Neste sentido, na história, a criança
valoriza mais a prenda que a tia lhe dá pelo Natal, um simples búzio, do que os restantes
presentes que recebe. O búzio representa um sonho deste menino, o de conhecer o mar.
Evidencia-se, também, a sua ingenuidade em relação ao desconhecido – o Artur julga ter
o «mar entre as mãos».
Em toda a sua extensão, podemos afirmar que se vai impondo a imagem da criança
ávida pelo saber e que coloca questões sobre tudo o que a rodeia. A Tia lá vai respondendo
aos porquês do rapaz. Reportamo-nos, mais uma vez, ao mundo real, apresentado por
Manzano, relativamente a este aspecto dos “porquês” da criança: «En el mundo real,
principalmente el mundo de la familia y de la escuela se va a convertir en lugar de forja
de personalidades y de ámbitos en los que los protagonistas viven la realidad impregnada
de repuestas y de interrogantes» (Ob. Cit., 22). Concordamos com Manzano quando
defende a ideia de que é na escola e no seio da família que a criança vai encontrar muitas
respostas para as questões que levanta.
Uma referência que aparece constantemente na obra para crianças do escritor
é o tema da escola. Artur ia fazer o «exame do primeiro grau» (Redol, 1963: 51), até
recebeu «uma camisa … e uma gravata» para poder levar neste dia tão importante da
sua vida. Este é mais um dos aspectos da obra de Redol que nos reporta à época em que
o conto foi escrito. Também na obra Constantino, Guardador de Vacas e de Sonhos aparece
referenciado o tema da escola – o exame do 4º ano.
No percurso percorrido através dos contos que compõem Histórias Afluentes,
gostaríamos ainda de nos deter em A Vendedeira de Figos que faz parte de um grupo de
quatro histórias a que Redol chamou Histórias Curtas. Trata-se de um conto escrito na
primeira pessoa, em que o protagonista não aparece identificado, todavia, faz referência
a um «deslumbramento» ocorrido no seu passado, quando ainda era um rapaz de catorze
anos, um acontecimento que o viria a marcar para sempre. A admiração recai sobre
uma figura feminina, «rapariga descalça» (p. 151), de «voz moça e galharda» (p. 150),
que apregoa os figos que anda a vender, precisamente na escola frequentada por esta
personagem masculina. O elemento feminino escolheu o seu alvo para «o jogo dos frutos
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e do amor» (p. 152). Ele é o eleito, nascendo «um amor de tantos anos» (p. 154), que ficou
para sempre na memória.
Recorrendo à analepse, o narrador coloca o protagonista da história, o alvo escolhido
pela vendedora de figos, a relatar, com saudade, eventos que ocorreram num momento
anterior ao tempo presente da acção: «Olho lá para o fundo do tempo (que fiz eu de
todos esses anos?...) e penso como foi bom o que vivi […]» (p. 149). Toda esta situação de
ter sido o nomeado para receber os figos oferecidos pela “Vendedeira de Figos” deixa-o
«aturdido e maravilhado» (p. 152). Apesar da «clausura do internato» (p. 151) e do «rigor
da vigilância dos contínuos» (Ibidem), onde era proibido o contacto entre os elementos do
sexo masculino e feminino (um aspecto vinculativo do sistema de ensino da época), com
algum receio, corre, «voando pelas escadas de pedra, tonto e feliz» (p. 153), até alcançar
a sua «dadora de figos e de promessas» (Ibidem), recebendo desta um «punhado» de figos.
Podemos ver aqui representadas as mais controversas emoções: prazer, alegria, angústia,
medo, timidez e coragem próprias da psicologia e das sensações que estes jovens têm
urgência em experimentar. oito dias sem recreio” (p. 154).
Como resultado de tanto encantamento, surge uma história de amor, um amor
inocente, puro, que o deixa trémulo. Um amor que ele encontra nos olhos dela, um amor
de sonho, um sonho vivido no silêncio das horas passadas no castigo, que o chega a privar
do recreio – “Fiquei oito dias sem recreio” (p. 154).
Por certo, em A Vendedeira de Figos é nítida a presença de uma interiorização de
comportamentos sociais resultantes de um conjunto de regras objectivas pertencentes
a um grupo que engloba a escola, a família e a sociedade em que se inserem. Como
resultado do conjunto de sensações novas, de tomadas de posição, muitas vezes
inconsequentes, sem pensar, exigidas pela urgência das vivências do momento, levam a
que muitas vezes o código próprio do grupo em que a criança ou jovem se integram entre
em colisão com o código familiar (um aspecto comum aos três contos), com o código da
escola e até com o código da sociedade em que estão integrados. Neste sentido, inserido
no grupo, o protagonista, com a ajuda dos colegas e dos amigos, realiza experiências de
reciprocidade e solidariedade, colocando em prática algumas peripécias que permitem o
incremento do espírito de entreajuda importante para o equilíbrio e desenvolvimento da
sua personalidade e, também, para uma tomada de consciência social que irá adquirir a
pouco e pouco.
Por seu turno, neste conto, muito curto, Redol evidencia alguns aspectos
preponderantes relativamente ao sistema de ensino da época, nomeadamente a separação
entre os elementos do sexo masculino e do sexo feminino no mesmo edifício escolar. Um
outro factor é o da relação de obediência e de reconhecimento da criança em relação ao
elemento adulto, neste caso os vigias da escola, aspecto sempre presente nos três contos
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analisados. Assim, verifica-se no desenrolar do tema a imposição e a obrigatoriedade do
cumprimento de regras e o rigor com que as escolas funcionavam.
A “Vendedeira de Figos”: actividade prática
É hoje mais ou menos consensual que “saber ler e saber escrever” são duas condições
essenciais para que o indivíduo tenha sucesso, quer em contexto escolar, quer na sua
vida profissional e até mesmo pessoal. Isto significa que a utilização da linguagem
escrita é imprescindível na vida quotidiana. Para tanto, torna-se indispensável saber ler
fluentemente e escrever de forma eficiente para uma boa consecução de um conjunto
de actividades diárias, como ler um jornal, ler a bula de um medicamento, consultar o
horário do comboio, do autocarro, o extracto bancário, preencher impressos ou usufruir
do prazer de ler um romance.
Neste quadro, reconhecemos que cabe à escola desempenhar este papel de
aprendizagem escrita e desenvolvimento do vocabulário dos alunos. Podemos inclusive
afirmar que ensinar a ler é, acima de tudo, ensinar a extrair a informação contida num
texto escrito, fornecendo-lhes as ferramentas essenciais para a abordagem eficaz de
um texto, no sentido de compreenderem o que está escrito, tornando-os leitores mais
fluentes.
Seguramente, é neste estádio de desenvolvimento que se torna pertinente a criação do
gosto pela leitura, que marcará e acompanhará a criança, trazendo-lhe, posteriormente,
benefícios na sua aprendizagem e na sua formação enquanto pessoa. Assim, entendemos
que cabe à escola, na figura do educador/ professor, uma quota-parte da responsabilidade
por uma certa “compensação”, àquelas crianças que no seu background familiar não
tiveram grande contacto com o livro, de forma a esbater desnivelamentos, logo nos
primeiros anos de escolaridade, particularmente ao nível do domínio linguístico e do
conhecimento literário.
Para mais, somos conscientes da urgência em se conseguir criar no aluno o prazer
da descoberta, do fascínio e do mistério da língua. Para tanto, salienta-se a importância
do estudo do texto literário, numa perspectiva de aprofundamento, enriquecimento e
“refinamento” da aprendizagem da língua.
Numa palavra, estamos de acordo que se deva cultivar a leitura8, sobretudo a literária,
pela sua função de criatividade, inovação, pelo conjunto de valores, referências, imagens
e todo uma consolidação da memória do vasto património cultural, que nos transmite.
Com efeito, como é sabido, de entre os factores que afectam a compreensão da leitura
destacamos o conhecimento linguístico, a riqueza lexical, o domínio das estruturas
sintácticas, a identificação do vocabulário escrito, a capacidade de automatizar a
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compreensão, o conhecimento sobre as particularidades da vida e do mundo que as
rodeia e, muito particularmente, os assuntos desenvolvidos nos textos. De resto, não é
necessário mencionar que ler é compreender, obter informação, aceder ao significado
do texto.
Está fora de dúvida que as estratégias de compreensão de um texto devem permitir
que os alunos do 1.º CEB consigam apreender o sentido global do mesmo, identificar o
tema central, distinguir entre ficção e não ficção, localizar informações mais específicas,
sintetizar as diferentes partes do texto, reconhecer o objectivo do texto, compreender as
inferências relacionando o texto com informação exterior, extrair informação daquilo
que foi lido, inferir o significado do vocabulário desconhecido.
Globalmente, define-se, aqui, a leitura como o resultado de uma interacção entre o
leitor e o texto, como se se tratasse do produto de um diálogo entre a coerência interna
do texto e a perspectiva que o leitor lhe atribui9. Meramente a título de ilustração,
destacamos o papel relevante da linguagem utilizada pelo escritor. De facto, no dizer
de Peter Stephens (1989), “it is through language that literatures seeks to define the
relationships between child and culture. Hence fiction produced for children is an
important área for discourse analisis, ir order do disclose the processes and effects of
those representations and definitions” (p. 5).
Em função do exposto, acrescentamos que Stephens traduz a importância do discurso
utilizado na literatura para crianças, uma vez que estas não têm um discurso próprio.
Como é sabido, a ficção irá contribuir para a socialização da criança, num período crucial
da sua formação como ser humano, em que ela vai aprender as noções básicas sobre o
mundo que a rodeia.
Assim dito, as estratégias de compreensão do texto são as “ferramentas” de que
os alunos se servem para compreender aquilo que lêem e que podem ocorrer antes da
leitura, durante a leitura e depois da leitura.
Ainda neste domínio e numa perspectiva mais prática, revela-se particularmente
produtiva a exploração do texto A Vendedeira de Figos, de Alves Redol por um grupo de
alunos do 4.ºano, do 1.ºCiclo do Ensino Básico10, da EB1 da Cheira, Penacova.
Ora, assim sendo, numa primeira fase (Tarefa I) pretendemos activar o conhecimento
prévio sobre o tema do texto, antecipando conteúdos com base no título (fig.1).
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Figura n.º1
Importa sensibilizar, também, as crianças para a importância do autor, da sua obra
e da sua época. Significa isto que a sua biografia deve ser um ponto a ser trabalhado.
Atentemos, então, à segunda tarefa em que os alunos escreveram uma pequena Biografia
sobre o autor do texto. Apresentamos o trabalho realizado pelas crianças, depois de uma
investigação efectuada na Internet (figs. 2-4).
Figura n.º2
Figura n.º3
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Anabela de Oliveira Figueiredo • A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o legado cultural e os valores em A. Redol
Figura n.º4
Outro aspecto importante é o das informações que se espera poder vir
a retirar do texto (fig. 5). Logo, a actividade seguinte vai ao encontro dessa
expectativa mostrando uma possível lista de auto-verificação a ser usada antes
da leitura do texto, na Tarefa III.
Antes da Leitura
Sim
Não
Sei para que vou ler?
Percebi pelo título qual é o assunto do texto?
Revi o que já sei sobre o texto?
Figura n.º5
Definidos estes pressupostos, é altura de trabalhar as estratégias a utilizar durante
a leitura. Nessa medida, deve ser feita uma leitura selectiva, em que as crianças podem
sublinhar palavras que não conhecem (fig. 6). Os alunos devem adivinhar / desvendar
o significado de palavras desconhecidas, usando materiais de referência (dicionários,
enciclopédias, …) ou o próprio texto. A Tarefa IV exemplifica esta pesquisa (fig. 7).
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Figura n.º6
Figura n.º7
Com o objectivo de aprofundar conhecimentos sobre a temática trabalhada podem ser
exploradas algumas das expressões aplicadas por Alves Redol, no texto, recorrendo-se,
aqui, à contextualização do texto na época. Assim, já na Tarefa V, as crianças justificaram
algumas expressões recolhidas (figs. 8,9).
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Figura n.º8
Figura n.º9
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Figura n.º10
Permanecendo ainda no plano da compreensão do texto convém fazer uma leitura
mais selectiva, criando uma imagem mental (ou mapa mental) daquilo que foi lido. Aqui,
os alunos vão poder parafrasear partes do texto, socorrendo-se de algumas estratégias,
como o sublinhar e o registo (fig. 10).
Atítulo exemplificativo, apresentamos alguns mapeamentos de ideias, realizados
pelas crianças, no quadro e em folha própria – Tarefa VI – com o objectivo de identificar
e organizar visualmente informação determinante, nomeadamente: descrição da escola;
referências temporais; descrição da Vendedeira; referências espaciais; descrição do “eu”
(figs. 11-15).
Figura n.º11
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Anabela de Oliveira Figueiredo • A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o legado cultural e os valores em A. Redol
Figura n.º12
Figura n.º13
Figura n.º14
Figura n.º15
Registamos, a título de ilustração, alguns mapeamentos de vocabulário levados a cabo
em trabalho de grupo, no quadro e em folha própria – Tarefa VII – com o objectivo de
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enriquecer o léxico, mais especificamente: vocabulário desconhecido; nomes (comuns/
próprios); verbos; adjectivos (figs 16,17).
Figura n.º16
Figura n.º17
Revela-se particularmente produtivo mencionar algumas estratégias aplicadas após
a leitura do texto. Certamente. A criança vai proceder a um auto-questionamento após a
leitura do texto. Logo, a Tarefa VIII vai encaminhá-la nessa perspectiva (figs. 18,19).
O que aprendi com o texto?
____________________
____________________
Quais são as ideias mais importantes
do texto?
____________________
____________________
Como posso dizer em poucas palavras
a mensagem do texto?
____________________
____________________
Figura n.º18
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Anabela de Oliveira Figueiredo • A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o legado cultural e os valores em A. Redol
Figura n.º19
Ainda no âmbito da compreensão de textos é importante trabalhar alguns processos
de inferências (fig. 20). Neste sentido apresentamos a tabela preenchida pelos alunos na
Tarefa IX.
Figura n.º20
Depois da Leitura
Sim
Não
Compreendi o sentido global do texto?
Consigo dizer o que aprendi com este texto?
Aprendi palavras novas com o texto?
Tomei notas sobre algumas partes do texto?
Fiquei a saber mais sobre a vida do escritor do texto?
Fiquei a conhecer outras obras do escritor?
Figura n.º21
Na criação de uma actividade de escrita, o docente deve desencadear diversas situações
em que o aluno vai recorrer ao registo escrito. Para tanto, devem ser incluídas diferentes
tarefas no decurso do processo. Entre elas vamos salientar a activação de conhecimentos
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sobre o tópico a desenvolver – Tarefa XI – em que se procede ao mapeamento dos
aspectos mais relevantes do texto trabalhado, em grande grupo (figs. 22,23).
Figura n.º22
Figura n.º23
Posteriormente, tendo por base a organização dos dados efectuada, as crianças
vão proceder à escrita do texto, recontando-o – Tarefa XII – num trabalho individual
(fig.24).
Figura n.º24
Por último, ainda individualmente, os alunos, numa actividade de escrita criativa,
vão poder dar um final ao texto, Tarefa XIII (fig.25).
Já ao nível da oralidade, as crianças vão poder comparar os diferentes finais de cada
grupo com o final escrito por Alves Redol.
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Figura n.º25
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Conclusão
No final deste trabalho, torna-se forçoso rematar apontando um conjunto de ideias
que sintetizam aspectos que consideramos essenciais para a clarificação da temática
apresentada.
É de sublinhar que, certamente, muitos de nós já fomos influenciados pela leitura
de um livro, enquanto crianças. O livro trouxe-nos conhecimento sobre – o mundo, a
humanidade, as coisas, a natureza – o livro formou-nos no gosto e permitiu-nos fazer
escolhas na vida presente e futura.
Nesta perspectiva, podemos afirmar que a Literatura Infantil, através do livro,
procura, através dos olhos da criança, mostrar-lhe alguns fragmentos do passado e da
vida quotidiana, do mundo e da sociedade que a rodeia. Neste processo, a criança adquire
valores, aprende regras, interpreta sentimentos, mediados pelo sistema simbólico da
linguagem e é preparada, inclusive, para a cidadania. O livro mostra-lhe o presente e o
longínquo, uma realidade inalcançável, mediante um conjunto de representações, quase
sempre com alguma reminiscência ao mundo da fantasia.
“Ler é também compreender”. Nessa medida, para ensinar uma criança, em idade
escolar, a construir o significado de um texto é necessário que se desenvolva o processo
cognitivo, linguístico, motivacional, textual, entre outros.
Meramente a título de ilustração, afigura-se igualmente importante sensibilizar
para um conjunto de descritores de desempenho em leitura para o 1.ºCEB, que cremos
ter colocado em prática no trabalho realizado: apreender o sentido global de um texto;
identificar o tema central e aspectos acessórios; relacionar a informação lida com
conhecimentos exteriores ao texto; inferir o significado de uma palavra desconhecida com
base na estrutura interna e no contexto; realizar inferências, mobilizando informações
textuais implícitas e explícitas e conhecimentos exteriores do texto; distinguir entre ficção
e não ficção; sintetizar partes do texto; extrair conclusões do que foi lido; reconhecer os
objectivos do escritor.
Podemos concluir afirmando que, actualmente, um elemento que poderá continuar
a ser apontado é o de que as crianças, apesar de rodeadas de artefactos moderníssimos,
continuam fascinadas, atraídas e estimuladas pelas histórias, contos, lendas, fábulas,
lengalengas e trava-línguas, que fazem parte do imaginário infantil.
Não gostaríamos de terminar sem registar a nossa opinião pessoal – como professora
e formadora – de plena confiança na implementação de um novo modelo de formação
contínua e inicial de professores, assim como, na disponibilidade dos educadores/
professores para a mudança. Ensinar Literatura Infantil e cativar os alunos para a
leitura, na conjuntura actual, revela-se uma tarefa bem diferenciada, e mais exigente
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Anabela de Oliveira Figueiredo • A “Vendedeira de Figos”, de Alves Redol: o legado cultural e os valores em A. Redol
do que foi outrora. No momento presente, a sociedade e o sistema educativo exigem um
leque bastante mais alargado de conhecimentos, competências e conteúdos de diferentes
áreas do saber e, também, relacionados com as novas tecnologias e a Arte.
Bibliografia
Bastos, G. (1990). Literatura infantil e juvenil. Lisboa: Universidade Aberta.
Berger, P. & Luckmann, T. (1985). The social construction of reality. Middlesex, England:
Penguin Books.
Bernardes, J. A. C. (2004). A Literatura no ensino secundário. Porto: Areal.
Figueiredo, A. O. (2005). A obra de Alves Redol para crianças. Tese de Mestrado.
Gomes del Manzano, M. (1987). El protagonista-niño en la literatura infantil del siglo XX,
incidências en la personalidad del niño lector. Madrid: Narcea.
Pires, M. L. B. (1983). História da literatura infantil portuguesa. Lisboa: Vega.
Quadros, A. (1972). O sentido educativo do maravilhoso. Exposição de Livros Infantis –
Ciclo de Conferências sobre Literatura Infantil. Lisboa.
Redol, A. A. (1963). A Vendedeira de Figos. In Histórias afluentes (1ª ed., pp. 147-154).
Lisboa: Portugália.
Reis, C. (2008). O day after de uma nova crise: novos horizontes de leitura. In A. S. Silva,
et al., Novos horizontes para as humanidades (pp. 67-88). Braga: Universidade
Católica Portuguesa/Faculdade de Filosofia.
Shavit, Z. (2003). Poética da literatura para crianças. Lisboa: Caminho.
Sim-Sim, I. (2007a). O ensino da leitura: a compreensão de textos. Lisboa: Ministério da
Educação. Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular.
Sim-Sim, I. & Viana, F.L. (2007b). Para a avaliação do desempenho de leitura. Lisboa:
Ministério da Educação, Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação.
Steohens, J. (1989). Language and ideology in children’s fiction. London: Longman.
Thiesse, A. M. (1999). La création des identités nationales: Europe XVIIIe – XXe siècle. Paris:
Seuil.
Veloso, R. M. (1994). A obra de Aquilino Ribeiro para crianças: imaginário e escrita. Porto:
Porto Editora.
Viana, F. L. (2009). O ensino da leitura: a avaliação. Lisboa: Ministério da Educação.
Direcção-Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular.
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1 Para um maior desenvolvimento desta temática, leia-se Pires (1983), Bastos (1990) ou Veloso
(1994), citados na Bibliografia que nos serviu de base ao presente trabalho.
2 Ainda a este respeito, a temática do maravilhoso encontrou em Portugal grandes admiradores. A
este propósito, revela-se particularmente esclarecedora e produtiva a leitura de O Sentido Educativo
do Maravilhoso, de António Quadros, com indicações na Bibliografia.
3 Anne-Marie Thiesse considera que as identidades nacionais mais não são do que algo fabricado
a partir da elaboração de um inventário de heranças legadas a cada povo e que lhes permite a sua
distinção dos demais. Desse inventário constariam itens como a história que os une aos antepassados,
uma língua própria, monumentos, folclore, entre muitos outros. É a partir dessa listagem e da
adesão dos habitantes de um dado território a esse construto que surge a nação e a afirmação de
uma identidade nacional. Por isso mesmo, Thiesse realça que “La nation a été intellectuellement
construite comme un organisme immuable, toujours identique à lui-même à travers les vicissitudes
de l’histoire. ” (Thiesse, 1999, p. 231).
4 (Berger, 1985, p. 194).
5 (Berger, Op. Cit., pp. 120-121).
6 (Bernardes, 2004, p. 42).
7 Para a análise dos contos O Castigo, que desenvolvemos neste ponto, O Mar entre as Mãos
e A Vendedeira de Figos, que desenvolvemos de seguida, servimo-nos da edição da obra Histórias
Afluentes, citada na Bibliografia.
8 Recordamos, aqui, dois sentidos do conceito do acto de ler, apresentados pelo Professor Carlos
Reis (2008, p. 74). O denominado sentido etimológico, “antes de mais, que é o que vem do verbo
legere, significando recolher, apanhar, escolher, captar com os olhos e ainda ler em voz alta,
especificação originária do acto de leitura que a chamada leitura silenciosa veio diversificar ou até,
se se preferir, pôr em causa”. E, também, os sentidos novos, hoje atribuídos ao conceito de leitura,
estes “não cancelam os que ficaram enunciados, mas são sentidos de deriva (quer dizer, de desvio
de rota em direcção a novos destinos semânticos) e são também sentidos translatos, consequências
sociais e culturais de novas solicitações e de diferentes contextos funcionais”.
9 Idealmente, pressupõe-se que o leitor infantil possua um conjunto de requisitos que o definam
como tal. Nesta perspectiva, o leitor deve ser caracterizado como tendo competência para entender
a linguagem escrita em que o texto está construído, que possui suficientes conhecimentos para
estabelecer relações semânticas e seja capaz de activar os seus conhecimentos sobre as propriedades
do discurso literário, isto é a competência literária.
10 Apresentamos, em anexo, o texto original (anexo 1), o texto trabalhado (anexo 2) e um exemplar
da ficha aplicada à turma (anexo 3). No corpo do trabalho, acompanhamos a estratégia aplicada
com algumas fotografias significativas.
Correspondência
Anabela de Oliveira Figueiredo
Agrupamento de Escolas de Penacova
[email protected]
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