UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO DO CAMPUS I
PEDAGOGIA HABILITAÇÃO EM ANOS INICIAIS
PRODESE
PROGRAMA DESCOLONIZAÇÃO
CAROLINE NEPOMUCENO DA SILVA
COMPONDO LINGUAGENS AFRICANO BRASILEIRAS PARA A
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
SALVADOR
2011
CAROLINE NEPOMUCENO DA SILVA
COMPONDO LINGUAGENS AFRICANO BRASILEIRAS PARA A
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Monografia apresentada ao Departamento
de Educação do Campus I da Universidade
do Estado da Bahia (UNEB) como requisito
para obtenção do grau de Licenciatura em
Pedagogia com habilitação em Anos
Iniciais. Orientadora: Profª. Drª. Narcimária
Correia do Patrocínio Luz. Área de
concentração Ciências Humanas/Educação.
SALVADOR
2011
FICHA CATALOGRÁFICA
Sistema de Bibliotecas da UNEB
Silva, Caroline Nepomuceno da
Compondo linguagens africano brasileiras para a educação matemática / Caroline
Nepomuceno da Silva . – Salvador, 2011.
100f.
Orientadora : Profª. Drª. Narcimária Correia do Patrocínio Luz.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Universidade do Estado da
Bahia. Departamento de Educação. Colegiado de Pedagogia. Campus I. 2011.
Contém referências, apêndices e anexos.
1. Matemática - Estudo e ensino. 2. Linguagem e cultura. 3. Negros - Identidade
racial. 4. Etnomatemática. 5. Brasil - Civilização – Influências africanas. I. Luz,
Narcimária Correia do Patrocínio. II.Universidade do Estado da Bahia, Departamento
de Educação, Colegiado de Pedagogia.
CDD: 510.7
CAROLINE NEPOMUCENO DA SILVA
COMPONDO LINGUAGENS AFRICANO BRASILEIRAS PARA A
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Monografia apresentada ao Departamento
de Educação do Campus I da Universidade
do Estado da Bahia (UNEB) como requisito
para obtenção do grau de Licenciatura em
Pedagogia com habilitação em Anos
Iniciais. Orientadora: Profª. Drª. Narcimária
Correia do Patrocínio Luz. Área de
concentração Ciências Humanas/Educação.
Salvador,_____ de______________________de 2011.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________
Profª Dr.ª Narcimária Correia do Patrocíno Luz (Orientadora) – UNEB
_________________________________________________
Professora Msª Claudia Sisan de Santana- UNEB
_________________________________________________
Professor Msº Otto Vinícius Agra Figueiredo- UEFS
DEDICATÓRIA
Dedico esta pesquisa a todas as crianças e jovens que fizeram parte dos encontros da
oficina: Compondo Linguagens Africano Brasileiras para a Educação Matemática e a todas
as crianças negras que merecem e devem ter o contato com a História e a Cultura Africana
para repensar a Cultura Africana Brasileira.
AGRADECIMENTOS
Por esse momento e pelo que me constitui hoje enquanto educadora e
pesquisadora agradeço aos que me fizeram nascer e erguer-me à luz do sol: Adil
Nepomuceno Puridade, minha mãe, meu exemplo vivo. Meu pai: Pedro Raimundo dos
Santos da Silva.
Às componentes do querido quinteto que conta com, além desta que vos fala:
Alessandra Cardoso dos Santos, Ana Cláudia Brandão Lima, Naiára dos Santos Bitencourtt
e Giselle Pires dos Santos, estas que estiveram comigo durante esses quatro anos de
caminhada e pelas quais me orgulhei em estar lado a lado.
Aos que me fizeram renascer a cada momento e recriar-me em meus vários
segmentos. Aos que me mostraram além do que eu poderia ver: minha orientadora,
Narcimária C. do Patrocínio Luz, que me oportunizou contatos teóricos e metodológicos
para o fundamento desta pesquisa.
A Vanderlino Santos, que esteve presente nesta composição.
Até àqueles que me mostraram o não-caminho a percorrer, são desses também
os meus agradecimentos. O merecimento não recae somente em mim, e sim a todos aqueles
que balizaram o meu caminhar.
[...] um indivíduo sem raízes é como uma árvore sem raízes ou uma casa
sem alicerces. Cai no primeiro vento! Indivíduos sem raízes sólidas estão
fragilizados, não resistem a assédios. O individuo necessita de um
referencial, que não se situa nas raízes de outros, mas sim, nas suas
próprias raízes. Se não tiver raízes, ao cair se agarra a outro e entra num
processo de dependência, campo fértil para a manifestação do poder de
um indivíduo sobre outro [...]
(Ubiratan D’ Ambrósio, 2005, p.41)
RESUMO
Compor tessituras de linguagens africano-brasileiras para o ensino da
Matemática é o objetivo principal deste trabalho. Procuramos desenvolver um processo
educativo que respeite e afirme os valores de civilização africano-brasileiros característicos
nos diferentes contextos sócio educacionais, atenta aos princípios estabelecidos pela Lei
10.639/03. A territorialidade da pesquisa é Itapuã no município de Salvador- Bahia.
Através das comunalidades africano-brasileiras existentes em Itapuã, estruturamos o nosso
trabalho, por identificar nas mesmas o contínuo milenar dos valores e linguagens
necessários à elaboração de perspectivas socioeducativas alicerçadas no pensamento
matemático africano. O espaço institucional onde desenvolveremos o trabalho será na
ACRA-Associação Crianças Raízes do Abaeté, que reúne um público de crianças e jovens
oriundos de Itapuã. O público envolvido representa as gerações de descendentes de
africanos e indígenas que durante séculos estabeleceram vínculos de sociabilidades
importantes com territorialidade envolvida, a exemplo dos modos de produção africano,
legado que se mantém através dos pescadores e lavadeiras. A base do nosso referencial
teórico se estrutura através das contribuições da Afroetnomatemática de Henrique Cunha
Júnior, a Etnomatemática com Ubiratan D’ Ambrósio, a dinâmica da civilização AfricanoBrasileira na abordagem de Marco Aurélio Luz e as linguagens lúdico-estéticas que
fomentam as iniciativas pluriculturais de Educação fomentadas por Narcimária C. P. Luz.
O resultado esperado é que o ensino da matemática passe a incorporar os valores ancestrais
e as africanidades existentes nos contextos socioeducacionais. E que estes locais possam
influenciar uma educação mais pluticultural.
Palavras- Chaves: comunalidades; africano-brasileiras; Matemática; Educação pluricultural.
RESUMEN
Componen la tela de los afro-brasileños idiomas para la enseñanza de las matemáticas es el
objetivo principal de este trabajo. Buscamos desarrollar un proceso educativo que respete y
afirme los valores de la civilización africana, brasileña características sociales en diferentes
contextos educativos, tanto de los principios establecidos por la Ley 10.639/03. La
territorialidad de la investigación es Itapuã, en Salvador, Bahia. A través de los puntos
comunes que existen en los afro-brasileños Itapúa, que la estructura de nuestro trabajo
mediante la identificación de los mismos idiomas continua antiguos y los valores necesarios
para la preparación de las perspectivas socio-educativa fundamentada en el pensamiento
matemático de África. El espacio institucional donde el trabajo se desarrollará en ACRARaíces Asociación Abaeté niños, que reúne a un público de niños y jóvenes de Itapúa. El
público está involucrado generaciones de descendientes de africanos y indios que durante
siglos se han establecido importantes vínculos con la territorialidad sociabilidad
involucrados, como el legado de los modos de producción africana que se mantiene a través
de antiguos pescadores y lavanderas. La base de nuestro marco teórico se estructura a
través de las contribuciones de Afroetnomatemática Henrique Cunha Júnior, con
Etnomatemáticas Ubiratan D'Ambrosio, la dinámica de la civilización en el enfoque de la
luz afro-brasileña de Marco Aurelio y los idiomas lúdico estéticos que promueven
iniciativas multiculturales educación promovidas por Narcimária C. P. La luz del resultado
esperado es que la enseñanza de las matemáticas pasan a incorporar los valores y los
ancestros africanos existentes en el contexto de la situación socioeconómica. Y estos sitios
pueden
influir
más
pluticultural
educación.
Palabras clave: afro-brasileña en común, las matemáticas y la educación multicultural.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1- Ideograma Sankofa.....................................................................................16
FIGURA 2- Crânio do mais antigo ancestral humano encontrado no Chade.................22
FIGURA 3- Pedra da Roseta...........................................................................................24
FIGURA 4- Bastão de Ishangó........................................................................................29
FIGURA 5- Imagem satélite da ACRA...........................................................................51
FIGURA 6- Representação do tabuleiro do jogo Mancala..............................................57
FIGURA 7-Mulheres africanas jogando Mancala...........................................................58
FIGURA 8- Participantes experienciando mapa do continente africano........................61
FIGURA 9- Participantes jogando Mancala....................................................................65
FIGURA 10-Participantes em momento de descontração após debate...........................68
FIGURA11-Participantes
em
confecção
do
Jogo
da
Memória
com
Figuras
Geométricas.....................................................................................................................69
FIGURA 12- Participantes da Oficina Lúdico Estética..................................................69
FIGURA 13- Materiais produzidos nos encontros da Oficina Lúdico Estética..............71
FIGURA 14- Participantes e Coordenadora da oficina em momento de construção......72
FIGURA 15-Participantes exibindo suas produções.......................................................73
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1- Disciplina que tem mais dificuldade?......................................................74
GRÁFICO 2- Sua relação com a Matemática é?............................................................74
GRÁFICO 3- E seu imaginário sobre o continente africano, mudou de alguma
forma?.............................................................................................................................77
LISTA DE TABELAS
TABELA 1- População da Pesquisa................................................................................53
SUMÁRIO
RESUMO
RESUMEN
INTRODUÇÃO
11
2 CAPÍTULO I- CONSIDERAÇÕES SOBRE O LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES
AFRICANAS PARA A HUMANIDADE
2.1 Contribuições da Epistemologia Africana
16
21
3 CAPÍTULO II- DESAFIOS PARA A AFIRMAÇÃO DO PENSAMENTO
MATEMÁTICO AFRICANO BRASILEIRO
31
3.1 Etnomatemática e Afroetnomatemática: perspectivas de abordagens para a
composição de linguagens antiracistas
41
4 CAPÍTULO III- PERSPECTIVAS METODOLÓGICAS
47
4.1 Caracterização do Campo de Pesquisa
50
4.2 Caracterização da População da Pesquisa
53
4.3 Dinâmica da Oficina Lúdico Estética
54
5 CAPÍTULO IV- COMPONDO O PENSAMENTO MATEMÁTICO AFRICANO
BRASILEIRO
59
5.1 Encontros da Oficina Lúdico Estética
59
5.2 Análise dos Questionários
73
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
78
REFERÊNCIAS
80
Apêndices
84
Anexos
101
11
1 INTRODUÇÃO
A minha história enquanto criança negra em um ambiente escolar nasce quando
tinha apenas um ano e seis meses. Sempre estudei em instituições de ensino particulares, isto
propiciou o convívio com crianças de diversas raças e condições sociais.
Em minhas experiências escolares obtive um desempenho acima do normal, o que
sempre me deixou em posição de destaque frente às outras crianças, inclusive às crianças que
possuíam pele mais clara que a minha e uma condição sócio econômica mais favorável.
Assim, esta se torna quase que um ponto exótico na sala de aula. Desta forma, tive
contato com a discriminação racial desde muito jovem, na escola e em outros locais, a
exemplo de espaços de lazer, como restaurantes, clubes, entre outros.
O meu ensino primário foi todo efetivado em escolas de bairro. O que fez com
que estivesse sempre com crianças de minha comunidade, a saber, Nordeste de Amaralina
bairro localizado próximo à orla de Salvador. Já meu ensino secundário, que engloba
atualmente o Ensino Fundamental II, foi realizado em uma escola católica- Escola Medalha
Milagrosa- localizada em um dos bairros mais privilegiados de Salvador. Este se denomina
Rio Vermelho, foi onde vivi grande parte de minha adolescência.
Nesta instituição se tornaram muito mais perceptíveis as divisões raciais dentro do
contexto escolar. Foi nesta época em que me deparei com as engrenagens do sistema racista,
sem saber direito como estas funcionavam. Assim como, Braz Júlio (1997, p. 8-13.) alega
Era bem pretinha [...] tinha o cabelo duro preso num monte de trancinhas [...]
Mesmo depois da surpresa e apesar de mostrar que era uma aluna superinteligenteacho que era por causa disso- volta e meia tinha alguém implicando, mexendo com
ela.[...] Pretinha era a Vânia que se calava quando alguém a chamava de 'pretinha',
pouco
ligando,
nem
se
importando
[...].
Por vezes fui intitulada como “a menina mais feia da sala” e como “a menina com
cabelo ruim”, isto se tornava mais incontrolável quando perceberam que o meu desempenho
escolar era superior à média da sala, o que causava mais incômodo ainda. Mas, isto não era
algo que me irritasse. Como Vânia, personagem do livro de Júlio Braz, eu sentia que havia
algo errado com aquela situação, mas não deixava que isso influenciasse meu
desenvolvimento dentro da escola.
Ao chegar ao ensino médio já tinha começado a estagiar no Método Kumon, um
método japonês de educação onde atendia crianças, jovens e adultos de classe média/ classe
média alta. Trabalhava possibilitando o contato de crianças, jovens e adultos com o método
12
matemático japonês marcado pela disciplina, concentração e raciocínio lógico. Durante o
terceiro ano do ensino médio já tinha optado pelo curso de Pedagogia na Universidade do
Estado da Bahia, eu não sei bem se foi uma revolta interna, esta fruto da minha indignação
com o racismo dentro do contexto escolar, que se apoderou de minhas escolhas ou se foi por
já estar inclusa nesse meio educacional através do Método Kumon.
Ao adentrar o espaço acadêmico tive contato com um lócus mais plural e aberto
para a discussão das questões raciais, o que me deixou perplexa. Interessei-me primeiramente
sobre a lei 10639/2003(Ver anexo A) que altera a LDB 93954/96 e inclui, entre outras
demandas, nos currículos oficiais, a obrigatoriedade do ensino da história e da cultura africana
e afro brasileira. Foi neste contexto que tive o prazer de conhecer Gabriel Swahili Sales de
Almeida, este que foi um dos primeiros responsáveis pela germinação em mim das idéias de
racialidade que compõe o contexto brasileiro.
Logo no primeiro semestre do curso escrevi um pré projeto sobre a lei em
questão, este foi questionado e desvalorizado pela professora da disciplina e foi assim durante
muitos outros semestres, todas as vezes que citava a Lei ou a temática em sala de aula, era
vista como a modista, a militante, adjetivos sempre empregados de forma pejorativa. Por
vezes, a temática do racismo na sociedade brasileira foi questionada por professores, muitos
até afirmaram que não existia este tipo de discriminação no Brasil, e que este era fruto da
discriminação social.
Até que resolvi me debruçar na construção de um artigo intitulado “A escola e a
Lei 10639/2003” em parceria com uma colega de luta Naiara Bittencourt, visitamos uma
escola localizada no bairro de São Cristóvão, um subdistrito da cidade de Salvador. A Escola
Municipal do Parque São Cristóvão Professor João Fernandes da Cunha, que contava com a
gestão da Professora Jacilene Santos da Silva, esta escola efetivava de forma objetiva e
democrática o que prescrevia a Lei 10.639/2003.
Foi uma experiência muito rica, que motivou mais ainda a estar dentro desta
discussão. Pude perceber que existiam espaços que já trabalhavam nesta vertente mesmo antes
de se sancionar a lei 10.639/2003, isto me encorajou a continuar efetuando minhas leituras e
minhas escritas sobre tema, sempre que possível levava esta questão para a sala da
universidade. Como por exemplo, numa aula de Literatura e Educação, onde questionei para a
professora em questão onde estaria a tão rica literatura africana brasileira e porque teríamos
que continuar recontando contos dos Irmãos Grim.
Por estar já incluso na minha vontade discutir questões raciais no contexto
escolar, o recorte para a área matemática encontra origem na minha experiência em um
13
método de ensino matemático e japonês (como já foi dito, Método Kumon de Educação).
Durante quatro anos vendo como as metodologias e as técnicas matemáticas são importantes
para que se alcancem os objetivos traçados, sejam eles quais forem. Então, me indaguei sobre
a relação de poder existente entre a seleção de conteúdos e a forma como os professores são
“treinados” a passá-los, de forma quase sempre acrítica e discriminatória.
Assim, continuei a refletir sobre a possibilidade da construção de uma educação
matemática pautada em referencias que afirmem e tragam à tona novas perspectivas, estas
desnudas de preconceitos e estigmas. Então, interroguei-me: Por que não pensar em novas
perspectivas de linguagens matemáticas, levantando, valorizando e contextualizando o legado
africano brasileiro, para se alcançar um objetivo em comum que una e valorize esta cultura?
Graduando na Universidade do Estado da Bahia, conheci a Professora Doutora
Narcimária Correia do P. Luz, esta ouviu meus anseios e possibilitou minha experiência na
Associação Crianças Raízes do Abaeté, através da monitoria de extensão oferecida pela
própria universidade. Tornei-me pesquisadora do Programa de Descolonização e Educação
(PRODESE) e estas experiências amadureceram mais ainda esta idéia quando me deparei com
várias possibilidades de novas perspectivas de se valorizar a cultura africana e africana
brasileira dentro de um contexto sócio educativo, no qual se configurava a Associação
Crianças Raízes do Abaeté (ACRA).
Assumindo o papel de pesquisadora do Grupo PRODESE- Programa de
Descolonização e Educação, escrevi alguns artigos e projetos apresentando-os em alguns
congressos. Esta experiência foi de fundamental importância para minha escolha na temática
desta pesquisa, pois pude entrar em contato com a territorialidade de Itapuã e com o
riquíssimo legado daquela comunalidade, esta que conta com descendentes de africanos e
indígenas. Nesse contato, também tive presente em algumas apresentações de dissertações,
em uma dessas apresentações, tive o prazer de conhecer um dos pesquisadores citados nessa
pesquisa, Professor Doutor Henrique Cunha, pesquisador da área de afroetnomatemática.
Como pesquisadora, também me possibilitei a uma experiência no CEPAIACentro de Estudos Afro-Índio Americanos, onde participei da Pesquisa “Egressos do Sistema
de Cotas da UNEB: Impactos da Ação Afirmativa na Trajetória e Desempenho Acadêmico”,
onde tive contato com alguns métodos de pesquisas e com a temática das cotas, a qual eu não
tinha experiência até então. Conheci neste local, pessoas de inquestionável confiança e
profissionalismo, entre estes, o Prof. Msº Otto Vinicius Agra Figueiredo, que me auxiliou na
organização das idéias sobre pesquisa na área afrocentrada.
14
Também tive uma experiência muito rica em um Curso de Extensão “ O ensino de
História e Cultura Africana e Afro- Brasileira: Textos fílmicos e textos escritos”, este
orientado pelo Prof. Dr. Raphael Rodrigues Vieira Filho. Este momento foi imprescindível
para que eu pudesse optar pela mostragem de filmes na oficina desta pesquisa, visto que este
recurso se torna um meio lúdico para construção de conhecimento. Dessa forma, todas essas
experiências contribuíram, de alguma forma, na construção desta pesquisa.
Assim, poderemos destacar que esta pesquisa já foi apresentada como pré-projeto
no I CILLAA- I Congresso Internacional de Línguas e Literaturas Africanas e AfroBrasileiras com o título: Compondo Perspectivas de Linguagens Africano Brasileiras para o
Ensino da Matemática em outubro de 2010 na cidade de Seabra- Bahia.
Podemos assim, afirmar que os principais objetivos desta pesquisa são:
caracterizar os pressupostos teóricos e metodológicos para a construção de uma educação
matemática numa perspectiva africano brasileira; apontar os principais desafios para a
afirmação do pensamento matemático africano brasileiro; interpretar as implicações possíveis
dessas contribuições na construção de uma matemática mais próxima do cotidiano e das
vivências de territorialidade africano brasileiras. Visto que estas são questões de
imprescindível relevância para o contexto escolar que ainda se mostra colonizado. Dessa
forma, Fanon apud Biko salienta que“[...] o colonialismo nunca se satisfaz em ter o nativo em
suas garras, mas, por uma estranha lógica, precisa se voltar para o seu passado e desfigurá-lo e
distorcê-lo.” (1990, p.118).
Não obstante, carrego nessa pesquisa outro objetivo que é a composição de uma
série de atividades a serem realizadas para a construção de novas linguagens para a educação
matemática. Isto se justifica porque as crianças de origem africana não têm acesso ao
conhecimento e às linguagens matemáticas afro-brasileiras por conta do racismo positivista e
eurocêntrico instaurado na estrutura social política e econômica brasileira.
Portanto, a apresentação da pesquisa se dividiu em quatro capítulos, sendo que o I
trouxe a discussão a cerca das contribuições da cultura africana para a humanidade e
consequentemente para a formação da sociedade brasileira, junto a qual esta cultura participou
de forma efetiva. Assim, devemos validar tais informações com vista a fundamentar a
validade e a necessidade dos nossos objetivos.
Já no II capítulo, o foco foi caracterizar os principais desafios para a afirmação do
pensamento matemático africano brasileiro. Como perspectivas de abordagens recorremos a
duas linhas de pesquisa: a Etnomatemática e a Afroetnomatemática. No III capítulo
apresentamos as ações metodológicas que sustentaram nossa pesquisa.
15
No IV capítulo, compomos linguagens para assegurar o pensamento matemático
africano brasileiro. Após levantar os principais desafios para esta composição, neste
momento, propomos uma série de atividades através das quais foi possível trabalhar as
linguagens africano brasileiras para a educação matemática. Este arranjo foi possível através
de uma experiência vivida na ACRA, espaço sócio educativo que trabalha nesta vertente.
É importante salientar que esta temática é de inquestionável relevância, pois a
produção de meios para a inclusão da História e da Cultura Africana e Afro-Brasileira no
currículo oficial educacional não deve se restringir somente à área das Ciências Humanas,
ainda que a Lei 10.639/2003 enfatize que estes conteúdos devem ser trabalhados
especialmente nas áreas de Educação Artística, de Literatura e História Brasileira, sua
presença deve permear todo o currículo escolar.
E o campo matemático deve estar ativo neste processo, pois a fortificação de
caminhos para a igualdade e o respeito às diversas culturas devem estar presente em todos os
momentos do cotidiano escolar e fora deste.
16
2 CAPÍTULO I- CONSIDERAÇÕES SOBRE O LEGADO DAS CIVILIZAÇÕES
AFRICANAS PARA A HUMANIDADE
Um dos maiores legados dos povos africanos que influenciaram os vínculos de
sociabilidades africanos brasileiros são os valores éticos necessários para que as comunidades
vivam em harmonia e aprendam com seu passado e desenvolvam um futuro que respeite o
legado dos nossos/as antepassados/as.
Para que estes valores éticos estejam presentes nestas comunalidades é preciso
que componhamos novas linguagens como forma de disponibilizar estes fins, visto que a
escola não vem atendendo esta necessidade.
Dessa forma, deparamo-nos neste primeiro momento com a necessidade de
compreender o passado africano para que possamos além de invalidar equívocos produzidos
nos discursos etnocêntricos que regem as instituições, destaque para a escola, possamos
também construir novas perspectivas para uma educação descolonizada1, que revitalize a
pujante civilização africana, assim como os valores éticos oriundos de tal continente.
FIGURA 1- Ideograma Sankofa
Fonte: http://www.adinkra.org/htmls/adinkra/sank.htm
Para iniciar nossa pesquisa, uma imagem da simbologia ADINKRA2 que consiste
num sistema de símbolos e conceitos que são transmitidos pela tradição Akan que se expressa
1
Educação descolonizada, nesse contexto, respeita a noção de descolonização discutida por Frantz Fanon em seu
livro, Os Condenados da Terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
2
A palavra Adinkra significa adeus. Esse conjunto de símbolos são normalmente representados em tecidos de
algodão por tinta vegetal sendo utilizados em ocasiões fúnebres ou em cerimônias de homenagens a algum
falecido. Essa simbologia faz parte da arte e cultura ganesa, a qual conta com mais de sessenta símbolos.
17
por diversos ideogramas e provérbios, estes trazem o conhecimento dessa tradição muitas
vezes representado por animais, os quais revelam a cultura de Gana.
Além de reconhecermos a imagem, faz-se necessário trazer também o conceito de
Sankofa, que para Elisa Larkin Nascimento (1996, p. 19) é exatamente “aprender do passado,
sobre as fundações do passado. Em outras palavras, volte às suas raízes e construa sobre elas
para o desenvolvimento, o progresso, e a prosperidade de sua comunidade, em todos os
aspectos da realização humana”.
Esta autora afirma a necessidade exposta à cima, em relação à valorização das
culturas de base africana para auxiliar o desenvolvimento e a formação dos povos africanos
brasileiros no que consta o conhecimento e reafirmação dos valores éticos, culturais e
científicos para o convívio pacífico de uma comunidade.
Nossa meta, portanto, é aproximar os educandos/as do legado africano através da
mensagem do ideograma Sankofa originário dos povos Akan da África Ocidental,
principalmente Gana e Costa do Marfim, cuja simbologia nos permite fazer o exercício de
recuperar o passado das civilizações do continente africano e aprender com elas para ter
condições de prover o futuro das gerações afrodescendentes com a dignidade que merecem.
Portanto, não há como aproximar as crianças e os jovens da história e da cultura
que a eles sempre foi extirpada sem explorar o máximo possível as pesquisas que tem como
objetivo descortinar a África do véu europeu e mostrar, definitivamente, os conhecimentos
que a ela pertencem e dela tiveram sua origem.
A idéia de que a África é desprovida de conhecimentos tecnológicos e científicos
foi por muitas vezes defendidas por muitos intelectuais brasileiros, tais como o médico
Raimundo Nina Rodrigues, discípulo de Gobineau- que escreveu o Ensaio Sobre a
Desigualdade da Raça Humana, em 1885- esta obra é conhecida por muitos como a bíblia do
racismo moderno. Isto só nos faz perceber o quanto a ciência européia, e consequentemente, a
elite brasileira, esteve a serviço das políticas racistas responsáveis pela manutenção do quadro
desigual atual.
Estes trabalhos acadêmicos perderam sua validade no que consta a oficialidade da
história, mas ainda continuam a influenciar padrões distorcidos e condizentes com a política
eurocêntrica de mundo que produzem e recriam deturpações relativas a tudo o que se refere ao
continente africano, Assim, Lázaro Cunha (p. 3, 2009) afirma:
[...] o sistema educacional que realmente pretende fornecer as bases para esse
desenvolvimento precisa possibilitar aos seus estudantes o conhecimento do seu
próprio povo, sob pena de não gerar nesses estudantes auto-estima suficiente para
18
fortalecê-los perante os desafios da vida, para a concretização dos empreendimentos
para o desenvolvimento social [...]
Nesse sentido, há a necessidade de se encontrar as raízes do conhecimento
africano e delas extraírem seu legado tecnológico milenar e consequentemente desmistificar a
imagem preconceituosa e racista que envolve os currículos escolares. No que se refere à
exemplificação das deturpações encontradas no contexto escolar: segue a tentativa de
relacionar a África e suas terras com as pertencentes ao inferno bíblico baseando-se no clima
tropical do continente, que caracterizaria aspectos negativos da formação de seus habitantes, o
que justificaria também a incapacidade intelectual dos povos de tais terras.
Portanto, a história da formação social brasileira que crianças, jovens e adultos
recebem na escola não disponibiliza para essas gerações, embasamentos culturais da cultura
africana tão importante para a construção da história e sociedade brasileira porque
[...] interessava muito aos escravocratas a desafricanização do africano escravizado,
porque a identidade africana representava o vinculo deste ser humano à sua terra,
sua ancestralidade, sua religião, sua liberdade, e, sobretudo à sua soberania sobre a
própria vida. (NASCIMENTO, 1996, p.79).
O ideal proposto pelos europeus escravocratas era que se extinguisse todo o relato
de conhecimento, cultura, religião e tradição com origem na civilização africana o que
resultaria no enfraquecimento das raízes desses povos transportados forçadamente para as
Américas e Brasil durante séculos. Acontece que este ideal não teve o resultado esperado. Os
africanos/as escravizados/as conseguiram transpor conhecimentos milenares e tradições pelo
território brasileiro, o que resultou na constituição da cultura africana brasileira, que é a base
de organização das nossas principais comunalidades.
Como comprovação da existência e da importância de tais conhecimentos de
origem africana no Brasil, o professor Cunha Júnior (2010, p.20) salienta que, “a mão de obra
africana e afrodescendente no Brasil foi em parte um conjunto de trabalhadores com formação
profissional esmerada e com especializações importantes para a economia da época em
diversas áreas de ofícios.” Então, estes escravizados oriundos do continente africano não
foram trazidos às nossas terras desprovidas de saber científico e tecnológico. O autor ainda
aborda como a estrutura social gerada pelo racismo europeu tenta diminuir, não só o conjunto
de conhecimento, como também a maioria das profissões realizadas pelos escravizados.
É nessa perspectiva que esta pesquisa seguirá, com o intuito de desmistificar a
idéia de que o continente africano é e foi durante toda a sua trajetória, um continente
19
desprovido de saber cientifico e tecnológico. Ao levantar tais informações, traçaremos a
ligação desses conhecimentos com os existentes na cultura africana brasileira.
Buscando compreender o contexto colonial brasileiro e a incalculável relevância
do conhecimento oriundo da África para não só a manutenção da cidade colonial, como
também para a construção e a criação de diversas técnicas desconhecidas pelos europeus
colonos, trataremos aqui pesquisas que investigam esta vertente com a finalidade de
desconstruir visões deterministas e eurocêntricas. Assim, de acordo com Cunha Júnior (2010,
p.10)
[...] o Brasil, Colônia e Império, em seus aspectos tecnológicos, começa no
continente africano e nos conhecimentos trazidos pela mão de obra africana. Assim,
é muito importante termos conhecimento mínimo das tecnologias africanas
desenvolvidas na história do Brasil.
Portanto, podemos afirmar que os conhecimentos necessários para que a
economia colonial, tanto no que se refere às técnicas agrícolas, já que os produtos tropicais
usados na agricultura brasileira não eram de domínio europeu, tanto no que se refere à
sobrevivência e manutenção da vida próspera em terras tropicais, eram da própria instrução e
experiência africana.
Os conhecimentos necessários para escolha do solo, as técnicas que respeitassem
mais a dinâmica agrícola e fosse condizente com o alimento a ser plantado, tudo estes
componentes tem origem no conhecimento tecnológico e agrícola africano. Na sociedade
mineradora também não foi muito diferente, algumas técnicas de mineração tipicamente
africanas e desconhecidas pelos portugueses, devido a diferença climática, foram substanciais
na mineração brasileira.
Outro traço importante da tecnologia milenar africana é a indústria têxtil, levada
para o continente europeu no século XVII nesse contato feito com a África. Os africanos
fabricavam sua própria roupa com elementos vegetais tirados da própria natureza, o que
demonstra além de conhecimento têxtil, o conhecimento químico em lidar com elementos
para tingimento de tecidos.
Sabe-se que até o século XVI os conhecimentos tecnológicos advindo do
continente africano eram mais sofisticados do que os europeus em vários aspectos, estes
conhecimentos eram muitas vezes fruto da mistura dos conhecimentos adquiridos através das
trocas entre os países árabes e a China em especial.
20
E não poderia ser diferente no desenvolvimento de tecnologias matemáticas, entre
as quais geometria, e aspectos medicinais e metalúrgicos eram resultantes das diversas rotas
entre os países árabes e africanos no mundo antigo. (CUNHA JÚNIOR H., 2010, p. 11)
Sobre esse conhecimento matemático, é importante ressaltar a contribuição do
povo africano, no período do sistema escravista no Brasil, com as suas diferentes formas de
superá-lo. Estamos nos referindo à organização do sistema monetário, através das juntas de
alforria, até então instituições político-estratégicas no contexto da escravidão no Brasil.
As juntas de alforria promoviam as condições materiais para a alforria dos
africanos/as que se associavam na instituição com o objetivo da compra de liberdade. Era uma
espécie de organização mútua, onde certa quantidade de escravizados se reunia com objetivo
de realizar o que conhecemos popularmente hoje como a articulação “caixa”, onde cada
escravizados depositava certa quantia em dinheiro à confiança de um líder e este ficava
responsável pela administração destas quantias.
Este líder deveria ser um homem ou uma mulher bem respeitado (a) e de alta
confiança no grupo. Este grupo normalmente era formado por escravizados de nações
comuns. Estes líderes demonstravam e surpreendiam os escravistas, não só na facilidade em
cálculos, como também no poder administrativo, onde era necessário arquivar quantias e
registrá-las dando conhecimento ao depositante.
No contexto da escravidão as formas de comunicação do pensamento matemático
foram reformuladas, já que uma boa parcela não tinha acesso a
[...] livro ou papéis, faziam incisões em um pedaço de madeira ou numa vara,
ordinariamente uma taboca, correspondentes às entradas dos associados, tendo o
banqueiro uma varinha para cada um dos seus clientes, causando admiração o fato
de não se enganarem e poderem fazer contas e ajustá-las, por processos de
contabilidade rudimentares. (REIS, 2008, p. 221)
Ainda segundo Reis (2008) faziam parte do grupo, não só negros escravizados,
como também, negros de ganho e comerciantes que sabiam fazer suas contas e, além disso,
dispunham de dinheiro para comprar papéis e livros. Para tanto, podemos perceber que essa
sistemática financeira não se tratava de contabilidade rudimentar e sim de um rodízio
financeiro responsável pela solidariedade coletiva no que toca a compra da liberdade de
muitos escravizados no período colonial.
Dessa forma podemos repensar a história que nós temos e nos reinterrogar sobre
como podermos agir. Pensar uma África rica em conhecimentos científicos e tecnológicos e
21
aceitar que estes foram trazidos em embarcações juntamente com nossos antepassados nos
fará repensar nossa postura como educadores na construção de novas formas de pensar
matematicamente o continente africano e nossas comunalidades africanas brasileiras. Para
isso é necessário ainda pensar sobre matrizes africanas e suas contribuições/participações
para/na humanidade.
2.1 CONTRIBUIÇÕES DA EPISTEMOLOGIA AFRICANA
Devemos reconhecer pesquisas que invalidam perspectivas eurocêntricas, e fazer
emergir o legado africano na forma inaugural que este se consolida, e entre elas, selecionamos
para a continuação desta pesquisa, a do estudioso Cheik Anta Diop que nos apresenta
evidências que afirmam o processo de “anterioridade africana”.
Esta noção de anterioridade africana é agora aceita graças a inúmeras pesquisas de
estudiosos que conseguiram comprovar que foi no continente africano que a humanidade deu
seus primeiros passos. É nesta perspectiva que a questão de anterioridade africana se baseia.
Pois todas as outras civilizações, pela lógica, surgiram depois da africana, obteve desta,
conhecimentos e construíram trocas culturais.
Pela necessidade de valorizar tais pesquisas, faz-se necessário conhecer a
trajetória de seus pesquisadores. Assim sendo, o senegalês Cheikh Anta Diop nasceu em 1923
e dedicou boa parte de sua vida aos estudos sobre o continente africano, em especial ao Egito
e seus desdobramentos, no que toca os conhecimentos civilizatórios. Por meio de seus
estudos, Diop revolucionou o cenário acadêmico intelectual mostrando que a África é o lócus
de origem para as demais civilizações. O especialista afirma que para refletir sobre o que
temos hoje é necessário voltar ao ponto inicial, no caso, ao antigo Egito para a partir da
ciência, arte e literatura concebermos as soluções para o confronto de opiniões no tocante ao
continente.
Dessa forma, o pai do africanismo, como ficou conhecido, e percussor da
egiptologia3 na África, seguiu durante toda a sua vida com investigações científicas e
metodológicas que fossem de encontro com o arcabouço produzido pelo modelo de ciência
3
Egiptologia: é o estudo da cultura egípcia. É uma área da arqueologia e da história antiga que se faz associada
ao período faraônico, a Egiptologia também se estende para as origens pré-dinásticas (anterior à unificação c.
3150 a.C) até períodos mais recentes da história do Egito.
22
européia, esta que visava marginalizar e desapropriar as civilizações milenares africanas. Em
seu livro Nações Negras e Cultura (1954), Diop traz uma nova proposta de historiografia
africana com vista à descolonização do conhecimento, tratando de aspectos diversos, tais
como afirma Diallo e Diallo (2008, p.117)
[...] identificação das grandes correntes migratórias e a formação das etnias;
a delimitação da áreacultural do mundo negro, que se estende até a Ásia
Ocidental, no Vale do Indus; a demonstração da aptidão das línguas africanas para
suportarem o pensamento cientifico e filosófico e, fazendo, pela primeira a
transcrição africana não etnográfica destas línguas [...].
Nessa perspectiva, podemos perceber as infindáveis contribuições de Diop para a
afirmação da civilização milenar africana. Assim, ficou comprovado que os primeiros homens
eram homogêneos e negróides tendo a presença da melanina em sua pigmentação, e que
conforme as rotas migratórias fossem surgindo, esta substância variava de acordo com o clima
dos ambientes. O estimado pesquisador ainda relacionou a escrita egípcia copta com as outras
línguas encontradas na região do extremo oeste da África, uma das principais e mais
conhecida como Wolof4 (língua nacional do Senegal), sendo assim possível constatar
correspondências entre as formas verbais com, ora semelhanças, ora identidade de
significados.
Pensando sobre a nossa origem, nosso ponto inaugural onde surgiu não só a
primeira civilização como também o local onde foram encontrados os fósseis mais antigos da
humanidade datados de até 10 milhões de anos estamos nos referindo ao continente
classificado pelos europeus como primitivo, selvagem, desprovido de qualquer forma de
civilização. Como afirma Carlos Moore Wedderburn (2005,p. 136.)
FIGURA 2- Crânio do mais antigo ancestral humano encontrado no Chade
4
Língua veicular utilizada para contato entre povos, grupos e etnias diferentes entre si. (Serrano; Waldman,
2007)
23
Fonte: http://www.lbem.icb.ufmg.br/aulas/grad/evol/choje/toumachojeemdia.html
(fotos: Missão Paleoantropológica Franco-Chadiana)
Desde o mais remoto ancestral Homo (o Sahelantropo Chadense, hominídeo de 6 a
7 milhões de anos, encontrado no Chade), passando pela própria aparição do gênero
Homo (Homo Habilis, de 2 a 5 milhões de anos) e o surgimento dos primeiros Homo
Sapiens Sapiens( Homo Sapiens Idaltur. 160.000 a 200.000 anos), a história da
espécie humana se confunde com a própria história da África, onde se originaram,
também, as primeiras civilizações do mundo.
Assim, diante de tais informações podemos perceber o quanto é importante
começar o ensino seja da História, seja da Matemática, Ciências ou qualquer outra área de
estudo, afirmando que o processo de hominização e sapienização ocorreram no continente
africano. Para assim, explorar, as primeiras civilizações surgidas neste continente.
No tocante à informação de que a África além de ser considerada como berço da
humanidade, também por ser comprovada que neste continente surgiram às primeiras
civilizações, como ainda afirma Wedderburn (2005, p.138)
Uma outra singularidade da África decorre, precisamente, do fato desse continente
ter sido o precursor mundial das sociedades agro-sedentárias e dos primeiros estados
burocráticos, particularmente ao longo do rio Nilo (Egito,Kerma, Napata e KushMeroé).
Este desenvolvimento das primeiras civilizações africanas gerou riquezas que
subsidiaram a construção de Impérios, o que foi responsável pelo desenvolvimento da cobiça
de outros povos para com o continente africano.
È imprescindível que estas informações sejam levadas ao contexto escolar com o
intuito de descolonizar as idéias racistas que retiram do continente africano qualquer forma de
vida inteligente.
24
Portanto, compreendendo o estudo da historiografia e buscando remontar à
civilização africana no que consta seu patrimônio histórico, retrataremos a escrita dos
africanos. Apesar da maioria dos pesquisadores acreditarem que a primeira forma de escrita
foi inventada pelos sumérios há 3800 a.C, alguns ainda continuam a contestar este título para
as escrituras egípcias, os hieróglifos, este traz como significado no nome, a noção de escrita
sagrada devido à utilização deste por escribas e sacerdotes em textos políticos e religiosos.
Esta forma de escrita egípcia ficou por muito tempo sem traduções, devido ao
desconhecimento de ferramentas que pudessem dar subsídios para tal acontecimento. Porém,
a Pedra da Rosetta se configurou como um achado arqueológico que deu possibilidade para
tal fato. Encontrada pelo exército de Napoleão Bonaparte em 1799, recebe este nome pelo
fato de ter sido encontrada na cidade El-Rashid, chamada de Rossette era como os franceses o
pronunciavam. O conteúdo deste achado viria a ajudar na leitura de inúmeros escritos
egípcios.
Assim, a pedra revela três escritas diferentes, sendo estas, o hieróglifo, o demótico
(que reproduzia basicamente a linguagem popular) e o grego. Era a primeira vez que a escrita
hieroglífica aparecia com um texto grego o que tornava muito mais fácil a tradução e o
entendimento da língua sagrada dos faraós, até então não compreendida O que resultava numa
terrível incógnita sobre a civilização egípcia e seus conhecimentos. Como afirma Nina (apud
SZKLARZ, 2010, p. 30) ao se referir à pedra: ”pouco se sabia sobre a civilização das
pirâmides. Aquela era a chance de se debruçar sobre os monumentos do Egito.”
FIGURA 3- Pedra da Rosetta
25
Fonte: http://www.portaldoastronomo.org/missao.php?missao=3&id=28.
Não seria irônico, até então, perceber que após a revelação dos inscritos da Pedra
da Rosetta se percebesse que civilizações ditas como principais, sendo estas a civilização
grega e romana, beberam da fonte civilizatória africana, já que esta última se configura como
primordial no que consta os achados arqueológicos?
Assim como afirma Cheikh Anta Diop (apud NASCIMENTO, 1996, p.44)
Já que o Egito é um país negro, com uma civilização criada por negros, qualquer
tese que tentasse provar o contrário careceria de futuro. Os protagonistas de tais
teorias não desconhecem este fato. Assim, seria mais seguro e mais sábio destituir o
Egito, simplesmente e muito discretamente, de todas as suas criações, em favor de
uma nação realmente branca ( a Grécia.) Esta atribuição falsa à Grécia dos valores
de um Egito chamado branco revela uma profunda contradição, que não é a menos
importante da origem negra do Egito.
Portanto, as teorias que afirmam que as civilizações grega e romana tiveram em
suas bases civilizatórias elementos ditos como puros pela hegemonia branca perdem a
validade quando este achado arqueológico é traduzido e traz em suas inscrições informações
que provam que a civilização negra Egípcia possuía conhecimentos científicos milenares, os
quais foram, por assim dizer, salteados pelas invasões sofridas a este país africano.
Além dos registros dos hieróglifos egípcios como uma escrita bem estruturada no
continente africano, Henrique Cunha Júnior em seu texto Escrita Etíope (2007) traz reflexões
sobre uma das formas de escritas da região da Etiópia desde a antiguidade até os dias recentes.
O autor defende que o continente africano ao contrário do que muitos pensam, sempre possuiu
sistemas de escritas diversificadas e eficientes. Marcadas por inúmeras contribuições dos
26
povos árabes, a África já possuía um sistema de escrita avançado antes mesmo de ser
adentrado por países europeus.
O debate para com essas noções se faz necessários devido à propagação das idéias
sobre o continente africano como um continente ágrafo desprovido de construções escritas de
forma organizada. Quando observamos pesquisas históricas, como a de Pereira (apud
CUNHA JÚNIOR, H., 2007. p.2) que afirma que ”muitos imigrantes europeus vindos depois
da abolição da escravatura eram analfabetos em seus países de origem”, observamos que estas
apontam o quão gritante é o equívoco em afirmar que o continente africano trouxe ao Brasil
sua erudita cultura.
Ainda nessa perspectiva, para justificar a idéia preconceituosa de que os povos
africanos são povos destituídos de saber, costuma ser usado o traço oral pertencente à cultura
africana como algo pejorativo. Esta que se apresenta de forma bem demarcada como veículo
para transmissão de conhecimento, de valores éticos e comunitários. Portanto, a palavra é um
fator fundamental na concepção africana, o valor dado à palavra é inquestionável no tocante
ao respeito e ao conhecimento.
Assim, Cunha Júnior H. (2007, p.2) afirma que “A oralidade é mantida com igual
força social mesmo nas sociedades africanas que criaram escritas e outras formas simbólicas
gráficas de comunicação. Portanto, a presença da oralidade nas culturas africanas não
significa a ausência de escrita”.
No entanto, uma sociedade que valoriza o que está escrito em papel: contratos,
livros didáticos, cheques, e tudo o mais que puder ser documentado, não poderá continuar
medindo a cultura do outro pela “balança cultural” própria. O desconhecimento de que a
cultura africana traz em seu legado características mais complexas e a descredibilidade dada a
historia oral, por muitas vezes, dificultou a compreensão da história africana.
Porém, a história oral não pode ser comparada à história escrita, o que não
podemos deixar de refletir é que da mesma forma que a primeira é passível de
infidedignidade, a segunda também é. Quando estamos a escrever, estamos num diálogo
interminantemente conosco e a subjetividade do sujeito está a todo o momento em volta dos
seus escritos. O que torna a escrita também um ato sensível a erros e comprometimento da
realidade. ( HAMPATÊ BÂ, 1982, p. 168- 212)
No que consta a complexidade de sistemas orais, percebemos a grandiosidade da
capacidade de memória desses povos que as possuem. Além disso, podemos notar que a
relação existente entre o homem e a palavra é muito mais íntima, pois aqueles não precisam
de papel, escrituras e acordos escritos, porque é no valor da palavra anunciada que mora a
27
veracidade da questão, isto nada mais é que um valor moral pouco difundido na sociedade
brasileira e que se é visível principalmente na região savana ao sul do Saara.
Dessa forma, faz-se necessário discutir a visão negativa dada às culturas de
tradição oral e nos indagar sobre o real motivo desta situação, portanto
[...] o ocultamento das formas das escritas africanas fez parte desta estratégia de
dominação ocidental. O desconhecimento sobre estas formas escritas africanas
induziu a idéia de um analfabetismo persistente entre africanos e da dependência
destes com relação aos europeus para acesso à civilização. (CUNHA JÚNIOR H.,
2007, p. 9.)
Assim, torna-se necessário a discussão destas questões de ordem gráfica, por
entender que esta ramificação do conhecimento também esteve e ainda está sendo
influenciada pelas heranças do racismo europeu que insiste em classificar como negativo
aquilo que o é diferente.
A forma de tratamento dada à produção intelectual do continente africano se
configura numa tentativa de genocídio no que consta também a produção e desenvolvimento
das escritas originárias deste continente. Isso se apresenta como mais uma forma de
“desafricanizar” os descendentes desta cultura e desta região do globo terrestre.
Portanto, trazer para o debate a existência de construção de inúmeras escritas
africanas vai de encontro a esta tentativa de ocultamento e consequentemente, favorece a
valorização e o reconhecimento da produção histórica e cultural deste continente.
Ainda no que toca as tentativas de descaracterizar Impérios e conhecimentos
tecnológicos, temos o que foi feito com o Egito retirando-o da dinâmica civilizatória africana,
colocando-o como civilização oriental, quando este se localiza dentro do continente africano,
podemos compreender que não é somente no plano gráfico, cultural e civilizatório que o
continente africano é alvo de ataques, podemos discutir mais vertentes.
É dessa forma que Serrano e Waldman (2007) afirmam que todos os atributos
referentes ao continente africano eram religiosamente, cartograficamente e moralmente
inadequados. Isto é afirmado quando os autores relatam a relação que o cristianismo tinha
com tal continente, onde seus habitantes eram considerados filhos de Caim, ou seja, os
indignos, fato que era relacionando com a cor da pele negra.
No que cabe o legado africano para com a humanidade, a África se mostra como
berço dos primeiros conhecimentos medicinais, matemáticos, arquitetônicos e astrológicos.
No que tange o espaço geofísico africano, as singularidades e as especificidades de tal
continente, este se apresenta como uma proeminência emersa em terras, uma área que só é
28
menor que dois continentes, a saber, a América e a Ásia. A costa do continente africano não
possui grandes recortes, como golfos, baías, cabos e penínsulas, salvo algumas exceções.
Algumas ilhas pertencentes ao território africano, devido ao contato com povos europeus
mostram alto grau de mestiçagem, traços do sistema de plantation e escravidão.
Ainda sobre as características deste, notamos que uma das diversas formas de
desvalorizar o continente é a noção também disseminada que este se mostra geofisicamente
impenetrável, e questionando a veracidade de tal informação, temos inúmeras pesquisas que
mostram exatamente o contrário.
M’Bokolo (2009, p. 28) deixa claro que “fontes escritas, relativamente numerosas,
atestam a existência de relações antigas entre o continente africano(inicialmente designado
‘Líbia’, ‘Etiópia’ depois) e o mundo mediterrânico.” Portanto, tal continente construiu e
manteve, durante séculos atrás, contato com diversos povos, estes que conseguiram adentrar o
espaço africano. Assim, desconstruindo o estigma de que o continente africano seria fechado e
isolado do restante do globo terrestre, temos evidências que este continente mantinha relações
intra e extra continente com povos mediterrâneos, europeus, americanos entre outros.
Outra questão muito debatida atualmente é a noção cinematográfica utilizada para
mostrar os desertos africanos que sempre tendem a apresentar cenários sobre a inexistência de
vida, planícies áridas, quentes e recobertas por dunas. Quando na realidade, o deserto nada
mais é que um ambiente natural diverso que possui em sua existência flora e fauna nessas
áreas desertas, o que comprova a complexificação do deserto, já que este em sua composição
apresenta organismos vivos capazes de sobreviver neste ambiente.
Ao observar a história e formação do Deserto do Saara, este localizado na região
norte da África, esta localidade ao contrário do muitos pensam, já foi detentora de imensas
florestas tropicais e uma enorme diversidade de animais em suas mediações. E que mudanças
climáticas ocasionadas pela alteração do eixo terrestre promovem essas variações na
paisagem, habitat, clima e vegetação deste espaço num período longo de 500 mil anos.
Um fator importante é a paisagem natural da África e sua relação com os
habitantes deste continente, não podemos esquecer, que os africanos não somente fizeram
parte da paisagem, e sim a transformaram. Como pertencentes ao berço da humanidade,
estando neste espaço desde os seus primórdios, estiveram em consoante com todas as
mudanças ocorridas nessa localidade.
Assim, é perceptível observar a grandiosidade e a diversidade ampla que o
continente africano possui entre suas variações territoriais, hídricas, climáticas e culturais. A
África se mostra com apresentações parecidas com América do Sul, a final, estiveram unidas,
29
então não há como demonizar tal continente, não há como querer dominá-lo, a África se
mostra com suas potencialidades e nossa história é remontada nesta.
É nessa perspectiva de reavaliar o que se tem dito sobre este continente que
trouxemos algumas das inúmeras contribuições para a construção da humanidade e
consequentemente para a construção da sociedade brasileira. Assim, podemos trazer a tona o
campo matemático com ponto inaugural no continente africano. Como traz D’Ambrósio
(apud ROSA; OREY, 2004, p.1).
Desde o princípio da humanidade, cada cultura tem desenvolvido diferentes idéias e
práticas matemáticas. Algumas delas originaram-se na antigüidade, desenvolveram-se
no Egito e na Mesopotâmia e rapidamente espalharam-se na Grécia antiga.
Podemos concluir que este espaço é o ponto referencial para entendimento de
qualquer outra forma de vida, compreender a história e a cultura africana, bem como todos os
aspectos geofísicos, históricos e sociais, é pertinente quando nos mostra o quão é distorcida a
imagem que temos e continuamos a ver se propagar no cotidiano das escolas.
Nessa perspectiva, inúmeras pesquisas comprovam que o conhecimento
matemático tem sua origem na África. Estas trazem alguns indícios, como por exemplo, a
descoberta de um osso que data 20.000 anos a.C, encontrado em Ishangó no Zaire. Este osso
traz marcações em sua estrutura, vários pesquisadores interpretaram o objeto chegando a
algumas conclusões. A primeira delas seria que este osso comportaria uma espécie de jogo
matemático, em que a aritmética estaria presente em uma cultura que respeitasse o sistema
numérico de base 10.
FIGURA 4- Bastão de Ishangó
Fonte: http://www.shp.hu/hpc/web.php?a=evajakabffy&o=ujdonsagok___matematika_2kj
30
Outro investigador relacionou as transcrições desse osso, com um calendário lunar
em que serviria como uma espécie de contagem das fases da lua. E ainda há pesquisas que
contextualizam o osso como forma de marcações dos ciclos menstruais. Portanto, podemos
tomar este achado como um dos exemplos de vestígios inaugurais do conhecimento
matemático africano dessa forma,
[...] as culturas africanas produzem conhecimentos matemáticos desde tempo
imemoriais. Nesse sentido, ‘a africanização do conhecimento’ pode ser entendida
como uma tentativa de entender, analisar e disseminar idéias produzidas por
diferentes culturas no continente africano. A disseminação de tais saberes pode
envolver a incorporação dessas idéias na educação dos dias de hoje e do futuro.
(CUNHA JÚNIOR, 2010, p.222).
O autor aborda a noção de africanização do conhecimento no sentido de buscar na
história africana os pilares necessários para combater essa eurocentrização de conteúdos
escolares e consequentemente, a construção de valores e posturas mais igualitárias frente ao
novo e ao diverso.
Após levantar as principais contribuições da cultura africana para a humanidade e
para a formação da civilização brasileira, temos fundamentos para reinterrogar o sistema
racista empregado na educação e principalmente na educação matemática, estes que ainda se
configuram como desafios para a implantação do pensamento matemático africano. Como e
por qual razão desapropriar um povo tão recoberto de história e de conhecimentos técnicos e
científicos?
Portanto, nesta perspectiva a construção de uma nova forma de fazer matemática
reavivando aspectos da cultura e história africana e africana brasileira irá combater os
preconceitos existentes que ridicularizam tais culturas e minam perspectivas pluriculturais de
educação.
Entretanto, podemos observar que esta nova forma de fazer matemática encontra
desafios a serem vencidos, assim no próximo capitulo iremos levantar os principais desafios
para a composição de novas linguagens antirracistas e após discuti-las, iremos analisar
algumas linhas de pesquisas que possibilitam tal mudança. Nossa missão será discutir e
caracterizar os princípios teóricos e metodológicos que subsidiam tais pesquisas e propor
novas linguagens descolonizadas de educação.
31
3 DESAFIOS PARA A AFIRMAÇÃO DO PENSAMENTO MATEMÁTICO
AFRICANO BRASILEIRO
Como já foi analisada, no tocante à inquestionável participação africana no legado
civilizatório e cientifico da humanidade, cabe nos interrogar sobre quais seriam os principais
desafios para a afirmação do pensamento matemático africano brasileiro e o que seria o motor
que impulsiona a seleção e desapropriação de conteúdos nos contextos escolares, e como estas
medidas acabam por colonizar o conhecimento de todas as áreas, inclusive do campo
matemático.
Paralelo a isso, vamos pensar um pouco sobre a situação que se encontra o
desenvolvimento da Matemática na área educacional, será que esta, enquanto campo de saber
vem alcançando seus objetivos nos espaços escolares? Por que as crianças sentem tanta
dificuldade com a disciplina da Matemática na escola? Isto é resultante da prática racista e
ideológica européia em selecionar e tomar pra si conhecimentos advindos de outras matrizes
civilizatórias? Procuraremos responder a estas indagações mais adiante.
Para dinamizar a pesquisa, trago um dado sobre um levantamento realizado pelo
Instituto Paulo Montenegro (IPM) e pela ONG Ação Educativa, no ano de 2004, este
levantamento, indicava que 2% da população era analfabeta em números, ou seja, incapaz de
realizar operações simples com números, como decodificar o preço de um produto ou anotar a
seqüência de algarismos que compõe um telefone.
Segundo a mesma pesquisa, que afere o Indicador Nacional de Alfabetismo
Funcional, o Inaf, instrumento de avaliação de competências numéricas e de leitura, 29% dos
brasileiros conseguem apenas extrair informações básicas em contextos específicos e
limitados, como a identificação de um horário, por exemplo.
Mesmo diante de tal realidade e reconhecendo a importância dada às Ciências
Exatas (este discurso que se apresenta como extensão do legado europeu no âmbito escolar), a
Matemática se mostra como campo de saber de extrema relevância nos espaços educacionais
e no mercado de trabalho, visto que as profissões mais valorizadas reconhecem no campo das
Ciências Exatas sua mina de ouro.
Sabemos também que as crianças, jovens e adultos que não conseguem aprender
os códigos desse pensamento matemático fixado nos valores europeus tendem a entrar nas
estatísticas da evasão e fracasso escolar, (aliás, estamos atentos de que se trata de um discurso
antigo de especialistas para atribuir o fracasso na aprendizagem ao aluno/a).
32
Entretanto, reconhecemos que o conhecimento matemático é importante quando
se afirma como uma área do conhecimento que auxilia na organização do pensamento e que
promove a qualidade nas práticas sociais cotidianas. Mas infelizmente, nos estudos realizados,
constatamos que a educação matemática está defasada, e que os métodos e técnicas utilizadas
pelos professores não atraem seus alunos como também não conseguem ter significância para
a sua vida.
Ciente dessa realidade escolar e reconhecendo, o abismo existente entre o ensino
privado e o público, percebendo a dificuldade do ensino e a aprendizagem da disciplina
Matemática e validando o atual cenário apresentado pelo levantamento do Instituto Paulo
Montenegro, podemos nos questionar sobre quais são as principais causas do mau
gerenciamento da educação da população brasileira em idade escolar, nesta disciplina, dando
ênfase a população negra brasileira.
Para subsidiar o nosso desafio é preciso: compreender por que essa população da
pesquisa, brasileira, baiana de Salvador, residente no bairro de Itapuã em idade escolar
encontra dificuldade na compreensão dos conteúdos matemáticos e interpretação dos
problemas que envolvem esta matéria. O objetivo é compor e propor linguagens matemáticas
para uma educação descolonizada.
Ao reconhecer esta dificuldade no campo matemático, Célia Braz (2010, p. 19)
traz também contribuições de pesquisas que além de perceber a dificuldade da Matemática no
contexto escolar, conseguem visualizar que as crianças negras são muito mais sensíveis ao
chamado, erroneamente, fracasso no campo matemático, como indica
Estudo realizado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Tecnologia (UNESCO) e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira (INEP), indica que os estudantes negros têm desempenho escolar pior dos que
os alunos brancos, mesmo quando estão na mesma classe socioeconômica. A pesquisa
revela que os estudantes negros e pardos possuem as mais baixas pontuações em
português e matemática, sendo que nesta última a diferença é mais acentuada. Só para
ilustrar, na 4ª série do Ensino Fundamental, 44,7% dos brancos tiveram nota baixa na
prova de matemática contra56% dos estudantes negros, perfazendo uma diferença de
11,3% pontos percentuais. .(BRAZ, 2010, p.19-20)
Desta forma, onde estará a origem desta dificuldade? Será que as teorias
eugênicas que procuravam provar que os negros não possuíam a mesma capacidade
intelectual dos brancos? Ou será que o discurso utilizado nas classes escolares causa
implicações tanto no que tange a seleção de conteúdos, como no tocante a postura utilizada
pelo professor matemático em sala de aula?
33
Não há como modificar estas situações se a história a ser contada continua
colonizada, continua a propor que os africanos e consequentemente, os africanos brasileiros
são desprovidos de construções científicas, matemáticas e incapazes de construir e disseminar
seu próprio conhecimento. Assim, como continua a afirmar Braz
As explicações para as desigualdades na educação podem ser atribuídas à reprodução
exclusiva dos valores eurocêntricos difundidos pelo sistema oficial de ensino e às
práticas cotidianas de preconceito e discriminação existentes nesses sistemas, em
consonância com a formação da sociedade brasileira. As análises fortalecem a crença da
discriminação que sofrem os alunos negros de ser a causa da existência de um estigma
negativo à sua história sobre o desempenho escolar institucionalizado (BRAZ, 2010, p.
19-20)
Esses dados da UNESCO E INEP demonstram o quanto as práticas racistas, que
alimentam os discursos sobre a incapacidade do povo negro em aprender Matemática, são
perversas e devem ser extintas das práticas escolares que costumam classificar os “outros”
(maioria geralmente negra) como aqueles/as que têm dificuldade cognitiva para aprender
Matemática.
Estas dificuldades são justificadas por Isabel Santos (2001, p. 97) quando esta
afirma que
[...] ao longo de nossa formação histórica, marcada pela colonização, pela
escravidão e pelo autoritarismo, o imaginário social construído sobre os negros não
foi o mais positivo. Esse imaginário possibilitou a incorporação de teorias racistas
repletas de um suposto cientificismo que por muito tempo atestaram a inferioridade
das pessoas negras, a degenerescência do mestiço, o ideal do branqueamento, a
primitividade da cultura negra e a democracia racial.
Portanto, a educação vista como processo de desenvolvimento humano e esta
realizada em espaços sócios educativos, estes entendidos como espaços onde se respeitam os
tratos pedagógicos e o desenvolvimento da cultura local, esta educação é concebida como um
direito social e deve garantir este espaço e a oportunidade de enfrentamento contra as
propostas educacionais que visam práticas racistas e discriminatórias.
Quando aceitamos a ideia de que existem disciplinas que são de difícil
entendimento para uma grande parte das crianças (estas em sua maioria são crianças negras de
escolas públicas) estamos reforçando as ideias racistas pesquisadas pela autora à cima,
estamos nos deixando vencer pela conformidade.
Para que consigamos ir contra esta tendência negativa, nos deparamos com alguns
desafios e para compreendermos um dos principais envolvidos neste processo educacional, é
preciso que se pense no educador responsável pela disciplina e a abordagem que este utiliza
34
em sala de aula. Assim, quando nos referimos ao campo profissional e nos indagamos sobre o
embasamento teórico e metodológico que sustenta esta formação, podemos notar que
O professor de matemática é chamado com freqüência de matemático. Esta
associação, entretanto, nem sempre é válida, pois suas práticas profissionais podem
ser distintas e seus conhecimentos que estão na base da profissão podem não
pertencer à mesma vertente epistemológica. Embora tenham em comum a
matemática, o olhar para esse campo de saber pode ser diferente, mesmo quando
ambos pensam sobre o ensino dessa matéria. (FIORENTINI; LORENZATO, 2006,
p. 7)
Entretanto, há quem imagine que um matemático e um professor de matemática
darão a mesma aula, da mesma forma. Ledo engano!
O matemático costuma visualizar a matemática como um fim em si mesmo, isso é
quase sempre justificado pela forma como este a concebeu como objeto de conhecimento. O
matemático observa seu campo de estudo com um nível de abstração e ferramentas diferentes
do professor de matemática.
Dessa forma, como afirma Moreira e David (2005, p.20) “a matemática da escola
básica desenvolve-se num contexto educativo, o que coloca a necessidade de uma visão
fundamentalmente diferente. Nesse contexto, definições mais descritivas, formas mais
alternativas (mais acessíveis ao aluno em cada um dos estágios escolares)”. Nesta vertente,
podemos compreender que o professor matemático estabelece uma relação social com o
objeto de conhecimento e seu público.
Portanto, podemos perceber que a Matemática escolar, a qual nos referimos nesta
pesquisa, parte de princípios diferentes da Matemática pura e aplicada, porém faz-se
necessário compreender que a primeira encontra suas raízes na segunda. Então não é de
surpreender que esta disciplina praticada nos espaços escolares apresente bases na Matemática
acadêmica, esta que apresenta um perfil muito peculiar: ocidentalizada e colonizada.
Assim, podemos compreender que as matemáticas reveladas pelas inúmeras
civilizações foram, de alguma forma, silenciadas pela Matemática oficial e ocidental presente
no currículo de instituições escolares. Podemos compreender que o raciocínio matemático é
inerente a espécie humana e como já foi observado no I capítulo, existem fortes indícios e
diversas comprovações de que este conhecimento matemático encontra origem no continente
africano. Porém, isto não é revelado em sala de aula, e nem tão pouco relativizado a história e
a cultura africana matemática.
Portanto, a universalização da Matemática, bem como a sua ocidentalização
surgiu como ferramenta importante na obtenção de poder por parte dos que assumiram pra si,
35
o lugar de berço da civilização mundial, o que é o caso do continente europeu. Essa
ocidentalização das matemáticas produziu este cenário engessado pelo qual está passando o
sistema educacional brasileiro.
Assim, a visão etnocêntrica da escola torna o ambiente escolar um espaço
desagradável para as crianças e jovens afro-brasileiros, pois não há acolhimento de
seus valores, de sua ascendência africana. Pelo contrário, há uma estrutura
organizativa que procura atribuir um caráter negativo a tudo que se relaciona ao
mundo do outro, das diferenças, procurando traduzi-las em desigualdades. (BRAZ,
2010, p. 43)
Esta situação era muito mais alarmante no meado da década de 90, quando a
história e a cultura africana eram ausentes no contexto escolar e mesmo quando esta se faziam
presentes era sempre de uma forma pejorativa ou folclorizada. A partir da criação da LDB
9394/96- Diretrizes de Bases para a Educação Nacional seguida dos PCN´s (Parâmetros
Curriculares Nacionais) em 1997, surgiram algumas reeinvidicações por uma educação que
respeitasse a pluriculturalidade dos povos, como segue
O documento de Pluralidade Cultural trata dessas questões, enfatizando as diversas
heranças culturais que convivem na população brasileira, oferecendo informações
que contribuam para a formação de novas mentalidades, voltadas para a superação
de todas as formas de discriminação e exclusão. (Parâmetros Curriculares Nacionais,
1997, p. 13)
Assim, com as diversas sugestões realizadas pela LDB e pelos Parâmetros
Curriculares Nacionais pairou no ar uma discussão sobre o caráter evasivo dado à discussão,
visto que esses documentos traziam propostas para que a história e a cultura africana e
africana brasileira fossem trabalhadas em sala de aula no formato de temas transversais.
Dando ênfase sempre para as disciplinas humanas, sendo estas, História, Geografia, Educação
Artística e Língua Portuguesa.
Dando continuidade à criação de documentos que visassem mudar o quadro
exposto, temos a construção das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Raciais para o Ensino da História e Cultura Afrobrasileira e Africana, este que traz
em seu texto a importância dos estudos sobre a história e a cultura africana nas escolas do
Ensino Fundamental e Médio.
Com a promulgação da Lei 10.639/2003 fez-se valer a obrigatoriedade da
inclusão da história e da cultura africana brasileira no currículo oficial de ensino, não no
formato em que os Parâmetros Curriculares Nacionais trazem como temas transversais, mas
36
sim inclusa nas diversas disciplinas. É lamentável que se precise sancionar uma lei para
colocar em prática algo que se faz tão necessário, como é esta questão.
Porém, é imprescindível salientar que esta lei é fruto da luta de militantes negros
em prol de uma educação mais respeitosa e descolonizada. Assim, vale ressaltar, que
propostas como a criação desta lei não são novidade na agenda de reivindicações do
Movimento Negro. Como é o caso do I Congresso do Negro Brasileiro realizado entre 26 de
agosto e 4 de setembro de 1950, que propôs o estímulo do estudo das reminiscências africanas
no país como forma de reparação da situação desigual.
Ou seja, mais de meio século se passou e ainda continuamos a reeinvindicar que o
legado africano seja respeitado na esfera social e consequentemente, educacional. Desta
forma, reconhecendo a atual defasagem pelo qual ainda vem passando o currículo oficial
escolar, o ensino da matemática e sua má contextualização, principalmente, no que diz
respeito às culturas que foram esquecidas e ainda continuam sendo pela sociedade, compor
novas perspectivas para o ensino da matemática compreendendo a importância da valorização
da cultura e da historia africana brasileira é importante desde quando essa traz elementos que
revitalizam a aprendizagem das crianças não só afros descendentes, fazendo as perceber que a
África sempre possuiu conhecimentos matemáticos e durante inúmeros encontros com outras
culturas, os transpôs. Ressaltando que este objetivo é legalmente aceito e proposto, como foi
afirmado em questões anteriores.
Vale ressaltar também, que o imaginário infantil a qual se destinou essa pesquisa
não foi restrito ao universo das crianças de pele escura, e sim ao universo sócio educativo que
abrange todas elas (de pele escura ou não) em um só contexto.
Assim, a relevância da temática da nossa pesquisa se justifica quando nos
permitimos pensar o espaço escolar vigente, como reprodutor da ideologia do racismo que
tenta calar os aportes e conhecimentos milenares da civilização africana. Visto isso, eis à
necessidade que temos em desenvolver reflexões que possam mobilizar educadores/as de ir
contra o sistema, e tirar o véu europeu que esconde a contribuição milenar de conhecimento
do continente africano. Como salienta Biko (1990, p.118) “diversos pontos requerem uma
pesquisa minuciosa, para que possamos desvendar alguns importantes elos perdidos. Seríamos
ingênuos demais se esperássemos que nossos conquistadores escrevessem sobre nós uma
história não- tendenciosa”
Essa pesquisa também procura enfatizar que os discursos produzidos pela ciência
eurocêntrica ao longo dos séculos sobre o continente africano, visavam atender o ideal de
37
“humano universal europeu”, e desta forma, tudo o que não atendesse a esses padrões de
humanidade era visto com desprezo e desvalorização.
Sendo assim, será que o cotidiano escolar leva em consideração o repertório das
civilizações que envolvem a organização das comunidades origem dessa população? Os/as
alunos/as reconhecem na Matemática legitimada pela escola o conhecimento característico do
seu viver cotidiano? Será que os/as alunos/as se sentem livres para apresentar outras formas
de comunicar o pensamento matemático legado dos seus antepassados/as? Os/as alunos/as se
sentem integrantes desse espaço escolar que enfatiza o recalque ao seu pensamento
matemático?Que pensamento civilizacional matemático os professores/as têm utilizado para
ensinar em territorialidades povoadas majoriatariamente por afrodesecendentes? Que
elaborações de mundo matemático a escola disponibiliza para promover a qualidade de vida
da população afrobrasileira?
De que forma a ideologia racista sobre a cultura e a história africana, dificulta a
implantação de perspectivas pluriculturais de educação visando à valorização e o respeito às
culturas componentes da formação social brasileira? O racismo se manifesta em sala de aula
com vista a marginalizar as diferentes formas de fazer matemática? Como e porque incluir a
história africana e africana brasileira como canal importante para beneficiar o processo de
ensino e aprendizagem e a formação da cidadania?
Para entendermos como o sistema racista trabalha na vertente educacional,
teremos que compreendê-lo de uma forma mais detalhada, para isto, precisamos buscar
subsídios nos autores que definem tal termo antes de nos aprofundar pelo debate entre esse
termo e a sua existência nos espaços sócios educativos e as implicações no ensino e
aprendizagem de conteúdos e procedimentos.
Para tanto, Biko corrobora que (1990, p. 114) “o racismo não implica apenas a
exclusão de uma raça por outra- ele sempre pressupõe que a exclusão se faz para fins de
dominação.”.
Levando em consideração as contribuições desse autor, podemos perceber que o
racismo se apresenta como um sistema que suporta em seus mecanismos meios para manter
uma determinada cultura ou grupo como dominante, enquanto outros grupos culturais são
mantidos às margens de qualquer forma de poder.
Esse sistema leva em consideração características físicas, tais como cor de pele,
textura do cabelo, tamanho do nariz e da boca como formas decisivas no enquadramento de
cada pessoa dentro da sociedade. Ou seja, quem apresenta padrões que se equalizem com a
estética branca poderá obter um poder social superior a quem está à margem desses padrões.
38
É esse sistema racista que sustenta os meios para que a fundamentação teórica
utilizada na sala de aula respeite somente a uma cultura, ou seja, a européia. Os
conhecimentos matemáticos vigentes surgem nesse contexto, como advindos da cultura grecoromana, quando, na realidade indícios apontam que tais culturas utilizaram conhecimentos
africanos e asiáticos na formação do seu legado.
Porém, muito se discute sobre a terminologia utilizada para se referir ao grupo de
pessoas que possuem características físicas e culturais semelhantes e que mantêm entre si
vínculos e compartilhamento de identidades de povos e nações. No Brasil, o conceito de cor,
como afirma Paulo Silva (2008, p. 66)
[...] passou a ser utilizada como tropo para raça. ‘Cor’, no contexto brasileiro,
informa sobre atributos diversos, cor da pele, outras características fenotípicas e
também outras características sociais atribuídas, tal como condição racial. Ou seja, a
cor assim entendida passou a ser utilizada no Brasil como uma das formas de
classificação das pessoas [...]
Esta relação entre raça e cor é resultante dos desenvolvimentos das idéias racistas
vindas da Europa no final dos Oitocentos, estas arraigadas do darwinismo social, que traz a o
pertencimento à raça branca como critério de alta hierarquização e bom comportamento e
produtividade intelectual.
Estas teorias foram ressignificadas no Brasil e propuseram durante muito tempo a
miscigenação como forma de embranquecimento da população, porém esta idéia foi debatida
por ser justificativa de alguns males genéticos causados pela junção de mais de uma raça.
Como sugere Silva, Paulo (2008, p. 67) que “a decorrência de que a miscigenação deixava a
nação inviabilizada levou à grande mal-estar. A saída encontrada foi à absorção parcial das
teorias racistas produzidas pela Europa, vindo a constituir-se um modelo racial particular.”
Porém, a técnica de miscigenação prevaleceu e o embranquecimento da população
foi politicamente fortalecido. O mito da democracia racial foi divulgado e diversos autores
negros expandiram e divulgaram seus trabalhos tentando desarmar este mito que consistia em
afirmar que a sociedade brasileira apresentava um igualitário quadro de oportunidades
independentemente da cor/raça.
Estas ideias que ainda insistem em pairar no imaginário social brasileiro ainda se
manifestam em discursos isolados: “Você é preta, minha filha! Tem que casar com um branco
pra limpar a família”! ou “ aqui não tem discriminação racial, aquele moreninho ali é tratado
como qualquer um”. Estes discursos chegam até a escola e esta disponibiliza e valoriza
39
conhecimentos e fazeres europeus, trazendo desta forma, uma educação eurocêntrica para a
sala de aula, desconstituída de todos os aportes africanos e não – europeus.
Assim, dizemos que foi produzido, no Brasil, um preconceito de cor e não de
origem como nos EUA. Portanto, possuir pele escura, cabelo crespo, lábios e nariz grossos
são condições substantiva e adjetiva para ser condicionado ao tratamento dado aos afros
descendentes. Porém a pesar do preconceito ser intitulado de cor, ele está intrinsecamente
ligado à origem do ser, ou seja, a civilização de qual ele descende.
Assim, “atribui-se a alguns aspectos superficiais das diferenças físicas humanas
todo aspecto a real diferença característica da humanidade que são seus variados fluxos
civilizatórios.”. (LUZ, MARCO AURÉLIO, 2004, p. 18). Podemos, portanto, compreender
que a tentativa em se anular as inúmeras civilizações africanas a uma terminologia única,
desta qual, se origina raça, se configura numa tentativa de não reconhecimento destas
singularidades, resultando assim, em mais uma forma racista de apoderamento.
Dessa forma, percebemos que todas essas idéias originadas pela ideologia racista
européia contribuem de forma negativa para a firmação do pensamento matemático africano e
como forma de abordagem para a construção de linguagens educativas que descolonizem tais
discursos é que se segue o objetivo desta pesquisa: criar em um ambiente sócio educativo,
novas possibilidades de descolonização. E o nosso meio será a linguagem matemática.
Partindo desse pressuposto, o racismo encontrado na sociedade brasileira além de
ser considerado velado, pois ainda vivemos com impressão de que estamos todos em uma
democracia racial, mas é necessário um olhar mais sensível para observar que ainda se
encontra presente nos mais diferentes meios sociais. Então visitando esta situação, nos
interrogamos sobre como lidar com esses problemas raciais dentro dos contextos sócios
educativos.
Para comprovar tal situação educacional trago dados de uma pesquisa realizada
pela autora Gonçalves (2007, p. 19), esta alega que os alunos negros sofrem “uma depreciação
de sua inteligência e uma descrença na sua capacidade, coloca-se em dúvida sua
probabilidade moral e ética”.
A autora ao concluir sua pesquisa relata que foi notável a diferenciação do ensino
e do cuidado entre alunos brancos e negros pelos professores envolvidos na pesquisa. Já que
já conseguimos observar que existem pesquisas que comprovam tais recusas à uma educação
que contemple a todos de forma igualitária, nos vemos imbuídos de discutir as estratégias que
poderão ser utilizadas no embate a tais práticas.
40
Portanto, poderemos receber as validades das pesquisas realizadas atualmente no
contexto com a finalidade de comprovar a existência do racismo presente no contexto escolar
e a relevância de estudos que venham a contribuir para diminuição e até aniquilação de
práticas racista dentro da escola.
Buscando debater mais sobre esse assunto nos questionamos sobre a atual
conjuntura política racial pela qual o país está passando poderemos debater sobre as nuances
que cobrem as polêmicas ações afirmativas e as legislações sancionadas com o objetivo de
corrigir as mazelas proporcionadas ao povo de matriz africana em meio ao cenário político,
social e econômico.
Porém, é necessário também nos questionar no que vem sendo feito atualmente
em sala de aula e no curso de formação de professores para que estes possam colocar a
legislação em efetiva prática. Como ensinar a história e a cultura africana e afro brasileira de
uma forma não folclorizada e não estigmatizada?
São perguntas intrigantes e necessárias, pois será necessário “mexer” na base da
sociedade, nas entranhas da educação para se lutar por uma sociedade menos preconceituosa e
racista. Um ensino voltado para a revitalização e a valorização dos conteúdos desprovidos de
estigmas será uma boa saída para alcançarmos esse resultado, mas para isso é preciso que
avancemos em discussões sobre metodologias e, principalmente, teorias que nos permitam tal
fato.
São essas inquietações que nos levaram a propor o tema em questão
“COMPONDO PERSPECTIVAS DE LINGUAGENS AFRICANO-BRASILEIRAS PARA
O ENSINO DA MATEMÁTICA”, e através dele, compreender os pressupostos teóricos e
metodológicos para o ensino da matemática numa perspectiva africana brasileira.
Portanto, se conclui que essas novas perspectivas para o ensino da Matemática
devem proporcionar novas visões, novos olhares, dessa mesma forma, trará para a sala de aula
uma cultura com seus costumes, seus fazeres matemáticos, bem como sua história e tradição,
sempre procurando relativiza-la com os conteúdos das diversas disciplinas. Dessa forma, além
de conseguir vencer os principais desafios para a afirmação do pensamento matemático
africano, irá disponibilizar aos educadores novas possibilidades que proporcionará uma visão
mais ampla no que tange o desenvolvimento sócio-critico do alunado em questão.
Nessa perspectiva, fica perceptível que o contexto educacional sente necessidade
de mudanças diante das características do meio social, assim sendo, procuramos trazer
algumas linhas de pesquisa que emergiram desta nova forma de encarar a Matemática, como
campo de conhecimento e como meio para o auxilio da formação da cidadania. Seguindo
41
perspectivas de diversos autores que dialogam com o campo matemático compreendemos a
possibilidade de corroer os muros da colonização imposta na seleção de conteúdos e formação
de profissionais da educação, que na sua grande maioria se configura numa perspectiva racista
e discriminatória.
Procuraremos descrever as principais contribuições da etnomatmática e da
afroetnomatemática para o ensino de uma Matemática mais descolonizada, para assim,
podermos compor novas linguagens matemáticas africanas brasileiras em contextos sócios
educativos.
3.1 ETNOMATEMÁTICA E AFROETNOMATEMÁTICA: PERSPECTIVAS DE
ABORDAGEM PARA A COMPOSIÇÃO DE LINGUAGENS ANTIRRACISTAS
Quando destacamos as perspectivas etnomatemática e a afroetnomatemática, é por
reconhecermos nelas meios para compreendermos que determinadas contribuições culturais
dos povos africanos que são recalcadas nos currículos escolares, podem criar alicerces
importantes para o ensino e aprendizagem da Matemática. Como já levantamos os principais
desafios para a composição de uma educação antiracista, buscamos agora, através de diálogos
com os teóricos responsáveis pelas duas perspectivas citadas a cima, dando-nos subsídios para
propor um ensino matemático condizente com a realidade brasileira.
Como já foi visto, para compreender as diversas formas do saber e do fazer
matemático das culturas que compõem a estrutura de nossa sociedade brasileira é preciso
repensar os aportes utilizados em sala de aula, os conteúdos, o currículo e a formação dos
profissionais de educação.
Mas, este não é o principal foco desta pesquisa, e sim a
composição de novas linguagens matemáticas em contextos sócios educativos que revitalizem
a história e a cultura africana brasileira. Esta proposta não está indissociada com esses
desafios, mas acredita-se que estas novas linguagens possam interferir de alguma forma nestes
tópicos.
Para tanto, trago para o diálogo duas linhas científicas, a primeira que tem sua
origem na Educação Matemática e a segunda que encontra suas raízes nas lutas do
Movimento Negro para a inserção de uma matemática mais contextualizada em quilombos e
locais com populações afro descendentes: A Etnommatemática com Ubiratan D’Ambrósio e a
Afroetnomatemática com Henrique Cunha Júnior .
São duas linhas de abordagens com características que nos ajudarão a sustentar
nossos propósitos. Essas duas linhas de produção possuem características semelhantes, mas
42
diferentes em alguns pontos, nos proporemos, a saber, um pouco sobre cada uma delas para
compreendê-las.
O estudo da Matemática deve ter suas bases em civilizações milenares, nesta a
Educação Matemática se diferencia por ser uma área de estudo emergente e atual que busca
entender o ensino e a aprendizagem deste campo de saber. Esta se configura “tanto uma área
da pesquisa teórica quanto uma área de atuação prática, além de ser, ao mesmo tempo,
ciência, arte e prática social.” (FIORENTINI; LORENZATO, 2006, p. 15).
Ou seja, a Educação Matemática envolve os conteúdos de domínio específico da
própria Matemática juntamente com os conhecimentos pedagógicos que se relacionam a
construção do saber matemático com o intuito de melhorar a qualidade de ensino e
aprendizagem desta disciplina e desenvolver o campo de investigação e de produção de
conhecimentos da Educação Matemática.
A Educação Matemática nasceu há pouco mais de 40 anos, tem sua origem
justificada na necessidade dos matemáticos e dos professores de matemática na divulgação e
socialização das idéias desta área de conhecimento às novas gerações. Com as novas
tecnologias chegando ao campo educacional começa-se a indagar sobre a necessidade de uma
nova roupagem e contextualização para a Matemática. Portanto a EM (Educação Matemática)
não se configura como um campo profissional somente, mas também como um campo
investigativo científico.
Como já podemos observar, fica evidente que o contexto educacional sente
necessidade de mudanças diante das características do meio social, assim sendo, procuro
trazer algumas linhas que emergiram desta nova forma de encarar a matemática, como campo
de conhecimento e como meio para o auxilio da formação da cidadania.
Assim, comecemos com as contribuições de D’Ambrósio (2004, p. 41) que
afirma: “somos uma cultura triangular, resultado das tradições européias, africanas e
ameríndias [..] em especial as culturas africanas, cuja complexidade e incorporação no saber e
fazer brasileiros têm sido pouco estudados.”
Fica perceptível na fala deste autor que somos uma cultura composta por diversos
grupos étnicos e isto resulta no amplo corpo cultural e de conhecimentos trazidos por esses
povos e assimilados ou reconstruídos por diversas culturas. Mas o que observamos em sala de
aula, como já foi dito, é que existe uma hegemonia de conteúdo europeu, excluindo ou
estigmatizando o conhecimento das outras civilizações. O que se reafirma quando se observa
que
43
A matemática acadêmica traz em seu bojo contribuições de várias
civilizações, entretanto o eurocentrismo não permite reconhecer a
origem do pensamento matemático no continente africano, quando
muito, fala das ‘contribuições das civilizações indiana e islâmica.
Reconhecer a origem da matemática é o primeiro passo para se fazer
uma releitura desse campo de conhecimento e, acima de tudo, resgatar
a alteridade de uma civilização que teve sua história perdida na noite
dos tempos’ (BRAZ, Apud LUZ, 2010, p.52)
Assim, partindo do pressuposto de que já tenha o reconhecimento da existência de
legados civilizatórios para além da perspectiva europeizada, e que estes conhecimentos devem
estar presentes nos diversos contextos escolares, podemos nos interrogar sobre as formas de
possibilidades para que estes conteúdos cheguem a esses locais de forma a resgatar a
alteridade defendida pela autora a cima.
Como uma dessas possibilidades, encontramos a linha de pesquisa do estudioso
Ubiratan D’Ambrósio que por muitas vezes se refere a esta forma de lidar com o saber
matemático como Programa Etnomatemático, ao compreender que este se caracteriza como
um campo de pesquisa dinâmico e constante, e não como um conceito estático.
O Programa em questão tem como principal objetivo compreender como os
diversos povos lidaram e lidam com a matemática desde os primórdios. O autor defende que
“a etnomatemática não é apenas o estudo de matemáticas de diversas etnias” (D’AMBRÓSIO,
2005, p. 63) e sim uma nova forma de avaliar as técnicas e maneiras de lidar com o
conhecimento matemático em diversos contextos.
Este tem como objetivo estudar, compreender e validar as diferentes formas de
pensar e fazer matematicamente de diversos grupos, seja eles culturais ou sociais. Um grupo
de feirantes em um subúrbio ou periferia de uma cidade possui uma lógica e uma forma de
pensar matematicamente que nem sempre é respeitado e validado pela instituição oficial
escolar. É nesse sentido que a Etnomatemática trabalha validando estas “matemáticas da
vida”.
Portanto, podemos perceber, assim como afirmam Carraher W. , Carraher N. e
Schliemann (1995, p. 47), “as diferenças entre uma situação de venda, em uma feira e uma
situação escolar são tantas que é difícil saber o que leva as crianças a se saírem bem nos
problemas na vida e a demonstrarem tantas dificuldades ao resolverem problemas na escola.”
O que estes autores trazem para a discussão engrandece nossa declarada
necessidade em contextualizar o conteúdo matemático no espaço escolar em contrapartida que
diminuímos o grau de abstração da Matemática e relativizamos não só com o cotidiano dos
44
educandos, como também, com sua história de vida e com a história de formação do legado
civilizatório do seu povo de origem.
É importante ressaltar que o objetivo desta pesquisa não é dizimar a cultura grecoromana ocidentalizada, não é diminuí-la ao ponto nulo, mas é colocá-la em grau de igualdade
com todas as outras culturas que fizeram e fazem parte da formação brasileira. Assim como
D’Ambrósio afirma que “conhecer e assimilar a cultura do dominador se torna positivo desde
que as raízes do dominado sejam fortes. Na educação matemática, a etnomatemática pode
fortalecer suas raízes” (2005.p. 43)
Este acredita que para superar as ideologias racistas que fomentam os currículos
eivados de preconceitos, o necessário é o amplo conhecimento, o discernimento de que não
existe somente uma história e só um povo provido de conhecimento e de sabedoria, mas que
existem a pluricidade de informações e critérios de convivência harmônica intercultural.
Portanto, é difícil dispor de uma cronologia exata sobre os primeiros pensamentos
matemáticos e em que localidades estes surgiram, porém, existem inúmeras pesquisas, como
as citadas no capitulo I, referente aos achados do Osso de Ishangó e sobre a localização deste,
que seria o continente africano. Estes achados datam de 10 mil anos atrás, além disso, o
Programa Etnomatemático dá conta de levantar alguns fragmentos históricos que comprovam
aparição dos pensamentos matemáticos.
Mas para o autor da Etnomatemática, D’Ambrósio é de fundamental importância
“conhecer, historicamente, pontos altos da cultura de ontem poderá, na melhor das hipóteses e
de fato faz isso, orientar no aprendizado e no desenvolvimento da matemática de hoje.”
(D’AMBRÓSIO, 1998, p.48).
Quando o autor traz a necessidade de compreender a história da matemática para
dinamizar o seu ensino hoje, ele fundamenta o que foi dito no primeiro capítulo. Há
inevitavelmente a precisão em voltar ao passado e contextualizar o presente. Isso se mostra
possível quando encontramos pesquisas que reescrevem a história recapitulando os
inequívocos do passado.
Como é o caso, de hoje sabermos que inúmeros conhecimentos da cultura grecoromana tiveram suas origens em textos antigos escritos por egípcios que já dominavam a
aritmética, geometria, repartições (frações) a 5mil anos atrás. Esta informação é de
fundamental importância para a construção de uma Matemática mais contextualizada,
principalmente, se tratar de um contexto escolar localizado em uma territorialidade com raízes
africanas.
45
O peso que tal informação pode ter para a formação da estima de crianças afro
descendentes pode tocar não somente na sua aprendizagem no campo da matemática, como
também na sua formação enquanto ser criança negra e se reconhecer como esta. E o programa
etnomatemático se responsabiliza por isso ao passo que busca resgatar tais matemáticas
esquecidas convenientemente por quem se apropriou de tais e as denominou como suas.
Nessa perspectiva, apoiamos também nossos estudos em outra linha de pesquisa,
conhecida como Afroetnomatemática, que encontra em Henrique Cunha Júnior, um dos seus
autores. Esta se configura como “a área da pesquisa que estuda os aportes de africanos e afros
descendentes à matemática e informática, como também desenvolve conhecimento sobre o
ensino e aprendizado da matemática, física e informática nos territórios da maioria afrodescendente”. (CUNHA JÚNIOR H., 2000 p.1)
Assim, esta comprova a riqueza do conhecimento matemático proveniente da
África e seus desdobramentos no Brasil. Henrique Cunha Júnior defende a perspectiva da
afroetnomatemática, área de pesquisa que estuda os conhecimentos africanos e
afrodescendentes. O objetivo maior desta linha de pesquisa é melhorar as práticas e o ensino
da matemática em territorialidades negras.
A afroetnomatemática tem seu início nas experiências pedagógicas do Movimento
Negro, estas experiências surgiram das tentativas de se melhorar o ensino e a aprendizagem
da matemática em comunalidades com populações afro descendentes. A não notoriedade
desta disciplina nas escolas destas áreas e o péssimo nível de satisfação no tocante à educação
formal favoreceram a luta por uma nova forma de pensar matematicamente.
Porém, alertamos que não basta discutir a afroetnomatemática reduzindo-a apenas
a essas territorialidades negras, todos os brasileiros necessitam conhecer as culturas e os
conhecimentos enraizados em territórios, dos quais saíram seres capazes de produzir e
construir memória e civilizações.
Assim, Júnior Cunha (2000, p.2) afirma que “uma das tarefas importantes da
Afroetnomatemática é o uso da historia dos africanos e afro descendentes para mostrar o
sucesso passado nas áreas da matemática e dos conhecimentos relacionados com esta, como a
arquitetura e a engenharia.”
Assim, este autor traz em suas pesquisas contribuições de grandes nomes
africanos e afros descendentes que foram os primeiros/as intelectuais negros a produzir
matemática. Entre estes, Theodoro Sampaio, André Rebouças, Antônio Rebouças e Manoel
Quirino.
46
Praticamente todos estes possuíam em seu legado civilizatório a matriz africana e,
em sua maioria, eram engenheiros, arquitetos, artistas plásticos, desenhistas e autodidatas e
deixavam poucos escritos, o que vale ressaltar é o contexto político da época, onde o
escravismo criminoso imperava e mesmo assim sobreviveu o legado civilizatório e científico
de matriz africana.
Um dos meios para o desenvolvimento da abordagem da afroetnomatemática é o
ensino da história dos feitos matemáticos no continente africano. Este ensino além de ajudar
no conhecimento da civilização africana, até então esquecido promove entre os /as
educandos/as uma nova postura para a aprendizagem matemática.
Dessa forma, depois de levantar quais são os principais desafios para uma
educação matemática antiracista e logo após de compreender e caracterizar as contribuições
de duas linhas de pesquisas diferentes que trabalham na vertente de resgatar e valorizar as
diversas formas de fazer e pensar matematicamente podemos nos sentir à vontade para nos
aprofundar na caminhada metodológica que trilhará a pesquisa e por fim compor novas
linguagens matemáticas para concretizar o nosso objetivo.
47
4 Perspectivas Metodológicas
Com o propósito de compor novas linguagens no campo da Matemática em um
contexto mais plural que respeite as singularidades das crianças negras, a escolha pela
abordagem qualitativa de pesquisa é satisfatória, visto que a mesma apresenta como
característica a obtenção e o entrelaçamento de dados descritivos obtidos no contato direto do
pesquisador com a situação estudada e enfatiza mais o processo do que o produto.
Assim, as características da pesquisa qualitativa são de fundamental importância
na dinâmica social, que deve ser conduzida, porque para perceber as engrenagens do sistema
racista e como este se manifesta na relação socioeducacional na formação das crianças negras
é necessário o contato direto do pesquisador com o objeto de pesquisa, com a localidade em
questão e com suas reais necessidades, além de perceber os dados de forma interpretativa e
descrevê-los de forma reflexiva, entendendo os fenômenos e propondo novas perspectivas.
Dentre as possibilidades sugeridas pela pesquisa qualitativa, seguiremos a
abordagem etnográfica, esta
[...] também conhecida como: pesquisa social, observação participante, pesquisa
interpretativa, pesquisa analítica, pesquisa hermenêutica. Compreende o estudo, pela
observação direta e por um período de tempo, das formas costumeiras de viver de
um grupo particular de pessoas: um grupo de pessoas associadas de alguma maneira,
uma unidade social representativa para estudo, seja ela formada por poucos ou
muitos elementos. Por exemplo: uma vila, uma escola, um hospital, etc. (MATTOS,
2001, p. 67)
Assim sendo, essa escolha é justificada pelas principais características que esta
modalidade de pesquisa traz, como, por exemplo, o senso crítico desenvolvido a partir do
trabalho de campo no contexto social da pesquisa. Além do mais, nesta abordagem científica
a cultura investigada não é vista como um mero reflexo das forças estruturais da sociedade,
mas como um conglomerado de significados resultantes ora pelas estruturas sociais, ora pela
ação humana.
Portanto, a pesquisa etnográfica dentro da área educacional vem sendo usada
constantemente, e esta deve dar conta de levantar os elementos culturais de um grupo e
envolve-los numa preocupação em repensar o ensino dentro de um contexto mais amplo que
absorva o que está dentro e fora da escola.
Nesse sentido, para José Luis Neves (1996, p. 1) ”o desenvolvimento de um
estudo de pesquisa qualitativa supõe um corte espacial-temporal de um determinado
48
fenômeno por parte do pesquisador”. Assim sendo, faz-se necessário delimitar de quando e de
onde se trata tal pesquisa.
Portanto, o campo de pesquisa será a Associação Crianças Raízes do AbaetéACRA e o recorte temporal será a atualidade. Reiteramos que o foco da pesquisa se configura
principalmente em enfatizar elementos do legado africano e da formação da comunalidade de
Itapuã e do espaço sócio-educativo da ACRA, o que nos fará muitas vezes buscar elementos
que estiveram envolvidos numa época anterior a nossa.
Para Cunha Júnior (2007, p.3), as sociedades africanas “são sociedades de ampla
representação do coletivo. Assim, a identidade é dada pela localidade, pela comunidade e pela
ancestralidade” e como a ACRA está situada em uma territorialidade que contava com povos
inaugurais, os tupinambás e os povos africanos, esta se mostrou como um espaço necessário
para a composição de linguagens matemáticas que respeitem tais valores, pois se apresenta
como espaço sócio-educativo ímpar nesta caminhada.
A exemplo de uma fonte de resistência contra a escravidão, surgiu nesta
territorialidade o Quilombo Buraco do Tatu, que teve uma duração de mais de vinte anos.
Como afirma Siqueira (2005, p.5)
[...] O Quilombo Buraco do Tatu, em Itapuã. Os chefes desses quilombos eram
Antonio de Sousa, um capitão de guerra, e Teodoro, com suas companheiras, que
tinham o título de rainhas. O Quilombo Buraco do Tatu durou 20 anos, até que a
comunidade foi exterminada pelo autoritarismo colonial.
Esta fonte de resistência negra foi destruída por uma expedição militar realizada
em 1763, quando quilombolas foram mortos e presos. Portanto, além de trazer o aspecto da
povoação inaugural de descendência africana e aborígene, esta territorialidade ainda conta
com pontos históricos, tais como, a antiga existência de pontos de embate ao escravismo
criminoso, que podem contribuir para o enfrentamento do sistema racista.
Realizamos uma revisão bibliográfica com o intuito de caracterizar os
pressupostos teóricos e metodológicos para a construção da educação matemática numa
perspectiva africana brasileira e também de caracterizar os principais desafios para a
afirmação do pensamento matemático africano brasileiro.
Fischer (2001, p.198) nos traz um pensamento que se faz necessário ao revisar
pesquisas bibliográficas, refletir e, a partir disto, analisar tais escritos. Ele diz que “precisamos
antes de tudo recusar as explicações unívocas, as fáceis interpretações e igualmente a busca
insistente do sentido último ou do sentido oculto das coisas”.
49
Ou seja, podemos compreender que não há somente uma versão da história, visto
que esta se mostra de diferentes formas conforme o recorte histórico e conforme os “lados”
que a contam. Devemos questionar o que está posto e nessa perspectiva é que tomamos como
objetivo compor novas linguagens matemáticas descolonizadas.
Portanto, é necessária a percepção de que as palavras são construções históricas
que ficam registradas e que a partir destas são construídos muitos padrões, que, na maioria das
vezes, acabam por respeitar a ideologia dominante, tomando as outras como inferiores e
desprovidas de saber.
Assim como a escolha da opção metodológica, a natureza da pesquisa e a técnica
de coleta de dados, tais como, a observação, entrevistas semi- estruturadas seguiram outras
demandas metodológicas, tais como, a experiência em Oficina Lúdico Estética.
A revisão bibliográfica, que contará com os autores Henrique Cunha, Cheick Anta
Diop, Elisa Larkin Nascimento, Lázaro Cunha, Narcimária Luz, Marco Aurélio Luz,
D’Ambrósio também deverá dar suporte para a dinamização da proposta de atividades da
Oficina Lúdico Estética, esta que deverá estar de acordo com o estudo do tema e com o
objetivo de compor novas linguagens matemáticas numa perspectiva africana brasileira.
A opção pelas entrevistas semi-estruturadas respeita uma série de características
que as fazem serem utilizadas diversas vezes pelos pesquisadores. Dessa forma, podemos
mencionar as principais características da entrevista semi- estruturada que estão embutidas em
alguns aspectos, tais como: um guia de entrevista (Ver apêndice A e B) previamente
preparado para que sirva de eixo para o pesquisador, a utilização deste mesmo guia para todos
os entrevistados, a não exigência de ordem rígida nas questões e a adaptação do desenrolar da
entrevista de acordo com o participante.
Dando continuidade a nossa proposta metodológica, os dados obtidos em uma
experiência em Oficina vão além da soma das opiniões individuais dos participantes desta, o
mais significativo esta no desenvolvimento processual do grupo como um todo. Podemos
observar isto no conceito de Candau (1995, p.17). Para esta, oficina nada mais é que “um
espaço de construção coletiva de um saber, de uma análise da realidade, de um confronto e
intercâmbio de experiências”.
Portanto, essa técnica de pesquisa tem como objetivo a coleta de dados
qualitativos e consiste, como já foi dito, na discussão do tema em questão. Este tema será
discutido no grupo nas suas diversas possibilidades dentro de um processo de interação e
participação dos envolvidos. A coleta de dados obtidos pela técnica de pesquisa oficina
50
permite perceber e analisar diversas outras formas de linguagens não possibilitadas por outros
tipos de técnicas de pesquisa.
Cabe aqui mencionar o papel imprescindível do mediador/coordenador da oficina,
pois este é responsável por manter o foco da discussão e sempre motivar os participantes às
indagações, como também às respostas das indagações feitas pelos outros participantes. Uma
das características mais definidas desta técnica de pesquisa é a reflexão expressa pelo meio da
fala, ou seja, é necessário que haja o diálogo reflexivo entre os participantes, assim como o
hábito em ouvir cada um.
Valorizar a fala de cada um e pensar nesta como algo construído e reforçado pelas
estruturas sociais será um dos focos dos encontros onde ocorrerá a oficina. É imprescindível
que esta escuta aconteça e que possamos com esta manter relações com o conteúdo abordado
em cada encontro, pois de acordo com Fischer (2001, p. 207)
Ao analisar um discurso, mesmo que o documento considerado seja a reprodução de
um simples ato de fala individual, não estamos diante da manifestação de um
sujeito, mas sim nos defrontamos com um lugar de sua dispersão e de sua
descontinuidade, já que o sujeito da linguagem não é um sujeito em si, idealizado,
essencial, origem inarredável do sentido: ele é ao mesmo tempo falante e falado,
porque através dele outros ditos se dizem.
Assim, ao ouvir as frases proferidas pelos participantes, o interessante não será
enxergar aquele como um ser acabado e pronto, portador daquela verdade única. Mas sim
compreender que aquele discurso é fruto de uma inumerável relação entre tantos outros
assuntos e que este se formou e agora se dispersa através da linguagem.
Portanto, não se trata de impor e revelar verdades aos participantes, mas sim
interrogar o discurso, a partir de uma provocação, compreender que a linguagem também é
portadora de ideologias e fazer com que eles percebam a força que isso pode ter.
Compreender as relações que as frases e os pensamentos podem manter e destacar os pontos
necessários para uma observação mais cuidadosa.
Assim sendo, é imprescindível que para o andamento e o bem-estar do grupo, o
ambiente de discussão seja um lócus identitário e confortável. Nesta vertente, a Associação
Crianças Raízes do Abaeté foi escolhida por já disponibilizar de experiências comunitárias e
por atender o público da própria comunalidade de Itapuã.
4.1 Caracterização do Campo de Pesquisa
51
Para caracterizar a localidade da pesquisa, podemos começar a entender o nome
dado a Itapuã, que encontra em tupi- guarani um significado bem interessante: ita significa a
pedra e puã significa ronco, chora ou gemido. Os povos inaugurais que lá se instalaram de
origem tupinambá, deram nome ao local. Esta nomeação é explicada por uma história que
conta que quando a maré se encontrava vazante, a pedra localizada em meio ao mar ecoava, e
fazia um barulho sugerindo um ronco.
Esse barulho é justificado pela cavidade existente nesta pedra que ao chegar a
época da vazante, se enchia de ar, o que produzia o som que para os tupinambás parecia-se
com um ronco. Dessa forma, a territorialidade de Itapuã nos remete à ancestralidade dos
povos que ali viveram e ajudaram a formar a população que ali existe hoje.
Assim como os povos egípcios estudados por Cheik Anta Diop, os povos
indígenas e africanos que em Itapuã fundaram o principio inaugural do lugar fizeram da
proximidade com as águas emergir sua produtividade e vida coletiva. Assim, das águas
salgadas criaram vínculos de sociabilidades imprescindíveis, até hoje, para a população desta
comunalidade, o que se configura como a vida cotidiana de inúmeros pescadores e rendeiras.
A ACRA - Associação Crianças Raízes do Abaeté, criada em 2005, está
localizada dentro da territorialidade Itapuã e junto com esta faz emergir a cada dia novas
possibilidades de confrontar o universo racista e discriminatório que ainda insiste em limitar o
acesso de crianças afro-brasileiras à educação.
FIGURA 5- Imagem satélite da ACRA
Fonte Google Earth,2011.
52
A ACRA oferece cursos e busca resgatar com ações constantes os aspectos
culturais e a herança africana e aborígene através de cursos, palestras, rodas de leitura,
excursões, exposição de filmes e empréstimo de livros. Busca combater valores gerados pela
sociedade atual que está submersa pela voracidade do capitalismo brutal e a utilização de
novas tecnologias que muitas vezes deixa de fora os jovens oriundos das classes trabalhadoras
nas comunidades mais carentes.
Esta associação nasceu da união entre José Luis Correia do Patrocínio, fundador
desta ONG, e a Oxford- Grupo Cultural de Capoeira Abolição da cidade de Oxford na
Inglaterra. Esta se configura como uma iniciativa sócio- educacional que abriga em seu
currículo conhecimentos inaugurais dos povos africanos e aborígenes.
Seu fundador teve parte relevante de sua história de vida no Abaeté, porém viajou
para viver na Inglaterra e, ao retornar, percebeu a situação de abandono a que estavam
submetidos os jovens. A partir de sua vivência em uma ONG em Oxford, Inglaterra, que
atendia comunidades carentes na África do Sul, resolveu criar em Salvador a Associação
Crianças Raízes do Abaeté.
A associação oferece cursos de línguas estrangeiras, a saber, Inglês e Espanhol,
conta também com curso de grafitagem, percussão, fotografia, arteterapia, teatro e dança. Mas
nenhum desses cursos se sobrepõe ao foco central desta associação que é a Capoeira. O curso
de Capoeira se mantem forte e vivo durante todos os meses do ano.
As instalações desta organização possuem quatro salas de aula, 02 banheiros, 01
sala para direção com sanitário, 01 sala para coordenação pedagógica com sanitário, uma
cozinha a ser equipada e área aberta para recreação.
A Associação Crianças Raízes do Abaeté foi escolhida como campo de pesquisa
para esta composição, devido ao amplo trabalho realizado pela associação e pelo corpo
pedagógico nela existente no que tange à implantação e dinamização dos valores comunais do
bairro e a ligação quase que umbilical feita entre o bairro e seus povos inaugurais.
Portanto, a territorialidade de Itapuã, como também a da ACRA são espaços
riquíssimos de elementos matemáticos que podem ser levados aos alunos de uma forma
descolonizada, desprovida de rigores e de preconceitos.
É necessário lembrar que a população da pesquisa a ser realizada será de crianças
e jovens residentes na territorialidade de Itapuã, devidamente matriculados na rede pública de
ensino. O levantamento de dados da pesquisa não se restringirá somente às entrevistas e
observações, mas também contemplará a composição de diálogos abertos e questionadores,
53
nos quais o foco principal será conseguir propor linguagens africanas brasileiras para uma
educação matemática descolonizada. Em cada encontro diário as crianças, além de dialogarem
entre si sobre a temática levantada pela mediadora, também produzirão algo material como
forma de concretizar o apreendido durante os encontros.
4.2 População da Pesquisa
A população da pesquisa é composta por nove participantes, sendo estes formados
por sete meninos e duas meninas. Estes encontram-se matriculados da seguinte forma:

2 participantes do 5º ano do Ensino Fundamental

2 participantes do 6º ano do Ensino Fundamental

2 participantes do 7º ano do Ensino Fundamental

3 participantes do 8º ano do Ensino Fundamental
Importante salientar que a quantidade de participantes foi concisa para que as
observações fossem feitas de forma mais concentrada. O grupo para a composição da oficina
não poderia ficar extenso demais nem muito pequeno, visto que o número de nove crianças e
adolescentes se mostrou de forma satisfatória.
Todos são moradores do bairro de Itapuã e estudam em escolas públicas também
da mesma localidade, estando devidamente matriculados nas seguintes instituições de ensino:
Escola Municipal Lagoa do Abaeté, Colégio Governador Lomanto Júnior e Escola Estadual
Rotary. Suas idades variam entre 11 e 14 anos. Os participantes estão distribuídos série, idade
e sexo, conforme tabela abaixo:
TABELA 1- População de Pesquisa
Identificação
Idade
Série
Sexo
Mar
14
7ª
Feminino
Tulipa
14
7ª
Masculino
Ar
14
5ª
Masculino
Vento
13
7ª
Masculino
Jasmin
12
6ª
Feminino
Raiz
12
6ª
Masculino
54
Cacto
12
5ª
Masculino
Mato
11
4ª
Masculino
Rocha
11
4ª
Masculino
Fonte: Própria, 2011.
4.3 Dinâmica da Oficina Lúdica Estética
Esta técnica de pesquisa se configura como uma possibilidade de abertura pro mundo
de uma forma mais flexível e dinâmica, onde não teremos as regras e as normas impostas pela
formalidade de um contexto escolar. E sim, teremos uma proposta de atividades lúdicas que
auxiliem no desenvolvimento das capacidades intelectuais, criativas, estéticas, expressivas e
emocionais dos participantes.
Dessa forma, fica muito mais atraente trazer conhecimentos de outras culturas para a
discussão, ainda mais que a população da pesquisa se configura como um grupo infantojuvenil, onde é preciso trazer para estes novas concepções de expressões corporais, isto
envolve sentar-se no chão, sentar-se na areia, movimentar-se, sem deixar a reflexão de lado.
A escolha da oficina também está ligada à necessidade de ouvir e analisar os
conhecimentos, imagens e conceitos trazidos pelos participantes. Esta externalização de idéias
será sempre motivada por um questionamento ou algo que excite a discussão coletiva.
Outro motivo pelo qual foi escolhida oficina foi a importância da participação dos
integrantes como compositores, juntamente com a moderadora, de novas linguagens
matemática africanas brasileiras.
Os encontros das oficinas deverão ser bem dinâmicos e diversificados: as
atividades serão expositivas, exploratórias e participativas, onde as vozes das crianças e
adolescentes serão sempre valorizadas e relativizadas com o seu contexto social e cultural que
se caracteriza com a população existente na comunalidade de Itapuã.
Como forma de atrair e conhecer a população da pesquisa para estes encontros,
será oferecida aos alunos da Associação Crianças Raízes do Abaeté três dias de aula de
reforço de matemática anteriormente aos encontros da oficina, para que seja possível conhecer
os participantes anteriormente aos encontros e para sentir as necessidades que estes trazem do
contexto escolar, principalmente na área matemática.
O começo dos encontros será sempre às 9 horas da manhã. A duração de cada
dia/encontro será de duas horas e meia, sendo que os primeiros 30 minutos deverão ser
55
reservados para que as crianças tomem o lanche da manhã, em meio ao lanche, será feita uma
roda de conversa e de socialização entre eles e a coordenadora da oficina.
Os horários dos encontros serão das 09h00minh até as 11h30minh. Será reservado
para a discussão do assunto abordado no dia, este encontro poderá ser realizado dentro do
espaço da ACRA ou nas imediações de Itapuã (a depender do cronograma). Os 30 minutos
finais foram reservados para que as crianças falassem, refletissem e repensassem o encontro
do dia e a registrassem em seu caderno. As crianças puderam enumerar o que gostaram, o que
não gostaram e propor sugestões para os próximos encontros.
Um ponto muito importante desses encontros foi fazer com que os participantes
pensassem e refletissem sobre a temática da discussão de cada encontro. Após este momento
de dialogo reflexivo é imprescindível que os participantes partam da reflexão para a prática e
será neste momento que os participantes juntamente com a moderadora da oficina irão sair do
lócus da instituição, no caso, a ACRA e irão realizar visitas monitoradas a outros locais do
bairro.
Assim, organizamos um cronograma de temáticas para cada encontro, este segue
da seguinte forma:
Cronograma/ Temáticas
 I Encontro: Entrevista, diálogo aberto, dinâmica. Sistema de Numeração Egípcia
Conteúdo Matemático: Sistema de numeração
 II Encontro: Família de jogos: Mancala
Conteúdo Matemático: Resolução de Problemas
 III Encontro: Confecção do tabuleiro do jogo Mancala/ Estamparias Africanas/ Cultura
e Arte Ndebele
Conteúdo Matemático: Formas Geométricas
 IV Encontro: Encerramento
Como a população da pesquisa é composta por crianças e jovens, ficou decidido
que os encontros iriam ter o grau de ludicidade bem aflorado, para que não fosse tedioso para
estes estarem reunidos em forma de discussão. Assim, com a temática de cada encontro,
concretizaremos o dialogo em forma de um objeto, este que deverá ser realizado com a
construção coletiva. Poderá ser a construção de algum objeto, um painel, um jogo ou algo que
simbolize a construção reflexiva daquele encontro.
56
As entrevistas semi-estruturadas só ocorreram em dois momentos: no primeiro e o
último dia de encontro, com o objetivo de se analisar e comparar diversos pontos abordados
no guia de entrevista e compreender em quais deste houve mudanças no pensamento de cada
criança e descrevê-lo minuciosamente com o auxilio dos cadernos de cada uma.
O guia de entrevista seguiu com alguns pontos relevantes para a descrição dos
dados a posteriores e até para o próprio caminhar da pesquisa, serão estes: nome, idade,
endereço, escola, série escolar, a relação mantêm com a Matemática, o que pensa sobre o
bairro de Itapuã, qual é a imagem que a África tem para cada um deles e qual o imaginário
deles sobre o continente africano.
Entre as temáticas dos encontros encontra-se a utilização de um jogo escolhido da
Família Mancala5. Esta utilização tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento do
pensamento matemático africano brasileiro, pois este jogo possui perfil estratégico e ao
mesmo tempo resgata valores matemáticos africanos. Quando me refiro ao jogo como
possuidor de perfil estratégico, trago as inúmeras possibilidades a serem alcançadas utilizando
este. A exemplo do desenvolvimento do raciocínio lógico, o estímulo do pensamento
independente, a criatividade e a articulação das estratégias de resolução de problemas.
Segundo Celso José dos Santos (2008, p.14) “Este é um jogo com profundas
raízes filosóficas. É jogado habitualmente, com pequenas pedras ou sementes. A
movimentação de peças tem um sentido de ‘semeaduras’ e ‘colheitas’”. Assim, além de
desenvolver aspectos pedagógicos no tocante ao desenvolvimento de estratégias, este também
traz elementos da cultura africana no tocante aos aspectos filosóficos e organizacionais.
Neste jogo, os participantes são orientados a “semear” as casas dos tabuleiros e
em um ritmo que envolve raciocínio matemático, regras, operações, deduções, etc. As
sementes são dispostas nas casas do tabuleiro, nesta são distribuídas quatro (em alguns casos,
somente três) sementes. Cada jogador é obrigado a colher e semear as sementes pelas
próximas casas do tabuleiro. De forma que poderá também semear as casas do adversário.
Seguindo-se essas regras (ver anexo B), em um dado momento, cada jogador poderá colher
sementes. Ganha quem tiver mais sementes ao final do jogo.
5
Criou-se esta denominação para se referir a estes jogos, visto que este é um conjunto de jogos com
características diferentes. São mais de 200 jogos que possuem praticamente a mesma lógica, variam somente no
tamanhos dos tabuleiros e na numeração de casas utilizadas nestes.
57
FIGURA 6- Representação do tabuleiro do jogo Mancala
Fonte: http://www.colegioglauciacosta.com.br/moodle/file.php/1/Regras_Awele_CLMasse.pdf
Portanto, este se configura como um jogo africano muito antigo, datado de 2 mil
anos, e há quem afirme que este tem até 7 mil anos de existência, estes pesquisadores o
intitulam como o “pai dos jogos”. Há fortes indícios que relacionam a origem do jogo ao
Egito. O nome Mancala encontra suas raízes numa palavra árabe (naagala) e que dizer mover.
Esta noção de mover semente, semear está atrelada a base da cultura agrícola africana.
Conforme Celso José dos Santos (2008, p. 15)
[...] os Mancalas foram levados da África para as Américas e, conseqüentemente,
para o Brasil, com os nomes de Ayu, Oulu, Walu, Adji, Ti, entre outros, tendo sido
jogado predominantemente na região nordeste do país. Os Mancala são atualmente
jogados em toda a África, ao Sul da Ásia, na América e na maior parte da Oceania,
no Brasil e cada vez mais na Europa. Em Portugal, por exemplo, a variação mais
conhecida de Mancala é a jogada em Cabo Verde, chamada Ouri.
Assim, com as diversas migrações ocorridas neste continente, a “Família de
Jogos” Mancala se espalhou por diversos continentes, chegando a perpetuar sua simbologia,
história e dinâmica lúdica e sagaz.
Em sua concepção filosófica, o jogo tinha caráter religioso, sendo jogado pelos
homens mais velhos ou, dependendo do lugar, somente pelos sacerdotes. Em alguns lugares o
jogo era realizado em rituais fúnebres com a justificativa de se espantar os espíritos. Em
outros locais, jogavam durante o dia para abençoar as plantações e colheitas. Há também
quem acredite que este jogo era utilizado para eleger um novo líder numa comunidade.
(Santos, Celso, 2008, p.16).
58
FIGURA 7- Mulheres africanas jogando Mancala.
Fonte: http://www.colegioglauciacosta.com.br/moodle/file.php/1/Regras_Awele_CLMasse.pdf
Outro ponto interessante da cultura africana é o povo Ndebeles, estes vivem na
cidade de Pretória, no noroeste da África do Sul, este povo compõe um dos mais exuberantes
traços artísticos e históricos desta região africana. O povo Ndebele possui um padrão de vida
em comunalidade específico, suas casas são pintadas pelas mulheres que neste povo, são
chamadas de mulheres-girafas por possuírem em volta do pescoço anéis de metal.
A pintura da suas casas é efetivada com tintas naturais produzidas com elementos
retirados da natureza de forma sábia, assim as mulheres- girafas formam as mais bem
orquestradas figuras geométricas nas paredes de suas próprias casas, e este ato acontece
sempre nas seguintes situações “[...]em cada rito de iniciação- cerimônia que marca a entrada
dos adolescentes no mundo adulto - ou em cada nascimento e casamento todos os muros da
umuzi são repintados. (QUNETIN; REISSER 2008. p. 17).
O principal objetivo a ser alcançado trazendo esta cultura para o círculo de discussões e
construções, nas oficinas lúdicas estéticas, é identificar elementos culturais e históricos para
desmontar a imagem preconcebida de uma África desprovida de saber, de arte, história e
conhecimento.
59
5
COMPONDO
O
PENSAMENTO
MATEMÁTICO
AFRICANO
BRASILEIRO
Após termos levantado algumas considerações sobre as contribuições das
civilizações africanas para a humanidade e para a formação da sociedade brasileira e apontar
os principais desafios para a formação do pensamento matemático africano brasileiro, iremos
compor este com o auxílio da população da pesquisa citada no capítulo anterior, visto que
estes serão co-autores destas novas linguagens, pois foram co-particípes do processo.
Como foi mencionado nas perspectivas metodológicas, anteriormente ao começo
dos encontros da oficina, foram oferecidas aos alunos da Associação Crianças Raízes do
Abaeté três dias de acompanhamento pedagógico à disciplina de Matemática. Neste momento,
os participantes poderiam levar para os encontros materiais escolares, como caderno, livro,
assim como o conteúdo estudado na rede regular de ensino. Este momento foi importante para
o delineamento dos encontros, pois se pôde perceber as dificuldades dos participantes e a
relação que estes possuem com a disciplina em questão.
São nove participantes apesar de a maioria estar matriculada no ensino
fundamental II, praticamente todos os participantes demonstraram dificuldades em conteúdos
de base encontrados no currículo do Ensino Fundamental I, como por exemplo, resolução de
contas armadas, principalmente subtração e divisão, valor posicional, raciocínio lógico para
resolução de problemas e dificuldades em interpretar questões, enunciados matemáticos e o
reconhecimento de figuras geométricas planas e sólidas.
Assim, os encontros da oficina foram reorganizados trazendo questões e
atividades que buscassem fazer com que estes participantes repensassem suas estratégias e seu
potencial matemático. Assim, com o intuito de atender as principais dificuldades destes
alunos devidamente matriculados na rede regular de ensino, a proposta da oficina seguiu da
forma como será exposta a seguir.
5.1 Encontros da Oficina Lúdica Estética
O primeiro encontro levou a temática da civilização egípcia para debate, os
participantes contribuíram em uma dinâmica de grupo, onde foram solicitados a escrever e
60
dialogar sobre a primeira palavra, imagem ou pensamento que viria à sua mente quando
pensava em África e em Egito. Foi quase unânime a idéia de que a África é um país pobre,
com pessoas passando fome, ao Egito foram delegadas as palavras: pirâmides e deserto.
Narcimária Luz traz uma reflexão sobre o que poderia ser entendido como origem
desta imagem limitada da África e do Egito pelos participantes deste grupo, quando afirma
que
[...] o projeto neocolonialista e imperialista de mundo impregnou as políticas
educacionais no Brasil, inviabilizou a coexistência entre as dinâmicas civilizatórias,
matrizes da nossa identidade nacional, abortou qualquer possibilidade de afirmação
do direito à alteridade própria da nossa diversidade étnico-cultural e isso tem-se
refletido de modo perverso entre as gerações mais jovens. (LUZ, 2002, p.76)
Assim, desde o que se configura como currículo e formação de professores,
encontram-se origens na herança colonial européia que tinha como principal objetivo destituir
de herança cultural os povos ditos como inferiores e dispor da “luz do conhecimento”.
E estas narrativas extraídas deste momento dos encontros são frutos desta imagem
estereotipada da África apresentada não só pela escola que nós temos hoje, mas também pela
mídia, pelos materiais didáticos e pela postura e fala dos professores da escola regular. A
prolongação da perspectiva neocolonial não pode mais vigorar na mente dos afrodescendentes como forma de manipulação e deteriorização da herança civilizatória que estes
possuem.
Assim, apoiada no que vigora na Lei 10.639/2003, a história da África
desmistificada de preconceitos deve seguir como ponto inicial na mudança nesse quadro e
como aponta também a dita lei, a história e a cultura africana brasileira devem estar presentes
em todo o currículo, isto inclui a área da disciplina Matemática que na maioria das vezes vem
sendo esquecida e descontextualizada de tal temática.
Os participantes também demonstraram desconhecimento no que toca a
localização, ao serem apresentados ao mapa-múndi e ao mapa do continente africano sentiram
muita dificuldade na identificação tanto do continente africano no mapa-múndi, quanto do
Egito no mapa do continente africano. Após algumas indagações, conseguiram se orientar e
localizar tais pontos.
61
FIGURA 8- Participante experienciando mapa do continente africano
Fonte: Própria, 2011.
Logo após, foram apresentados a estes dois vídeos intitulados: Antigo Egito I e
Antigo Egito II. Foi neste momento que puderam ter acesso a inúmeras informações sobre o
país em questão, a exemplo da história da formação da civilização egípcia, a economia e a
organização social do antigo Egito, com destaque para os conhecimentos matemáticos e
científicos de tal civilização.
Tulipa indagou: “Pró, é aula de História e de Geografia ou de Matemática?”
Demonstrando a dificuldade de intercruzar as disciplinas e transformá-las em um corpo único
e plural de conhecimento.
Nessa abordagem Thiesen (2007, p.88) contribui com seu estudo sobre
interdisciplinaridade trazendo a forma como esta “busca responder a necessidade de
superação da visão fragmentada nos processos de produção e socialização do conhecimento,
recuperando o caráter de unidade, de síntese, de totalidade e de integração dos saberes”.
Sendo assim, podemos pensar que o campo do conhecimento como um todo é
formado por diversas construções históricas e sociais, não podemos separá-los dessas
construções. Devemos concebê-los como algo formado conjuntamente com os mais variados
62
campos de saberes. Devemos também superar a fragmentação e especialização do
conhecimento, características estas pertencentes ao movimento positivista.
Para tanto, é necessário estabelecer uma relação entre o todo e as partes que o
compõe, não esquecendo que esta interdisciplinaridade não deve ficar somente relacionada
com o campo das Ciências Humanas, mas também das Ciências Naturais, indo de encontro
com a dinâmica normalizativa que insiste em colocar os conhecimentos bem definidos e
limitados de forma estanque e definitiva.
Há uma disparidade no tocante à área de Matemática neste recorte. O que acaba
por dificultar o acesso das crianças a essa área de conhecimento. Já que a Matemática tem se
mostrado tão difícil, e, além disto, esta não leva ao contexto educacional, os valores
imprescindíveis para tocar o aluno no seu corpo experiencial, ou seja, este se sente deslocado
ao estudar Matemática.
Ao observar as informações que os vídeos trouxeram, a maioria dos participantes
se mostrou encantada com as informações. Após a exposição dos dois vídeos, a dinâmica
inicial foi repetida, eles foram solicitados a expressar e registrar a primeira palavra que vinha
à sua mente quando pensassem na África e no Egito. As respostas se modificaram: “Os
egípcios eram inteligentes”, “povos ancestrais”, “riqueza”,” majestade”. Quando indagados
sobre o que entenderam dos vídeos, encontramos diversas respostas:
“Entendi que a Matemática existe há milhões de anos atrás”- Mar
“Eu entendi que no Egito existe História, Geografia, Ciências e Matemática” Jasmin
Essas falas demonstraram a forma como eles questionaram a antiga informação e
construíram coletivamente uma nova informação. O Egito até então era um país africano que
possuía pirâmides e deserto somente. Quando fizeram a ligação do conhecimento matemático
e científico utilizado pela civilização em questão para construir aqueles monumentos
esplêndidos e conviver com a desertificação, é que se deram conta do enorme grau de
conhecimento existente naquele território.
Para
continuar
disponibilizando
espaços
para
que
esta
mudança
de
posicionamento e pensamento continue ocorrendo Otto Figueiredo (2000, p. 188) contribui
afirmando
[...] os novos canais de comunicação e intercâmbio cultural e econômico
estabelecidos com o continente africano, juntamente com o aprofundamento do
conhecimento referente à história e cultura africana, as próximas gerações da
diáspora africana no Brasil poderão construir um outro referencial de sua cultura e
história, e desenvolverão um sentimento de pertencimento até então não
experimentado em nossa história.
63
Assim, podemos verificar que é possível desconstruir a imagem negativa e
colonizadora disseminada com o auxílio de vários setores da sociedade não somente com o
setor educacional. É imprescindível que ocorra uma mudança de postura não só dentro da
escola, como também dentro da família e na mídia de uma forma geral. O autor ainda traz a
noção de que é preciso construir e manter o laço com o continente africano para que o
intercâmbio cultural exista da forma merecedora.
Dando continuidade ao encontro, algumas questões foram lançadas ao grupo
sobre a cor da maioria das pessoas que moram no continente africano:
“A maioria das pessoas que moram na África são de que cor?” Coordenadora
“Negra” – geral
“Vocês sabem o motivo dessas pessoas terem essa cor?”
Silêncio geral.
“Algum de vocês já ouviram falar em melanina?”
“Não.”- geral
Esta informação merecia destaque no debate para que os participantes
percebessem que a cor da sua pela nada mais é do uma proteção natural e não um peso que
carregavam nas costas, compreender o motivo pelo qual os africanos possuíam cor escura me
pareceu imprescindível para o contexto, como afirma Charles S. Finch III (2009, p. 81) “nos
africanos de pele morena, naquela época e agora, a alta quantidade de melanina- que dá à pele
a cor escura- bloqueia a maior parte da luz solar ultravioleta”.
Algumas informações sobre a substância melanina foram lançadas e sobre a
adaptação ao meio climático de cada continente. Os participantes questionaram muito essas
informações, para eles era muito estranho pensar que eles possuíam a pele escura por conta
desta substância no sangue e que esta mesma era responsável pela proteção do organismo
contra os raios solares mais fortes. Após vários questionamentos, um participante declarou:
“É tudo uma questão de adaptação ao meio em que vivemos.” Tulipa
Após disso, foram questionados:
“Lembram que eu falei que os Egípcios possuem uma forma diferente de se
comunicar através da escrita? A numeração deles também é diferente da nossa, vocês
sabiam?”
“Não.”- Geral
Neste instante foi entregue a atividade xerocada contendo o sistema de numeração
egípcia, os participantes sentaram em duplas para resolverem a atividade. Ficaram
64
maravilhados com a possibilidade de estarem conhecendo a forma de comunicação de uma
nova língua. Um participante levantou um questionamento ao perceber que os símbolos
egípcios se repetiam inúmeras vezes para formar um número:
“Minha pró da escola disse que só pode repetir o número até quatro vezes, porque
aqui tá repetindo até dez vezes?” Mato
“Não são quatro vezes, são três. A sua pró deveria tá se referindo ao sistema de
numeração romano, neste, os símbolos só se repetem no máximo três vezes. Os símbolos
egípcios se reptem mais vezes, até dez.”- Coordenadora
Ao fim da realização da atividade xerocada, os participantes foram estimulados a
registrar no caderno as impressões sobre o primeiro encontro. Foi observado que estes não
queriam escrever muito, sintetizam em uma ou duas linhas suas opiniões.
Alguns registros:
“Eu vi os faraós calculano” (sic)- Ar
“Eu gostei da aula porque teve filme do Egito e da África” - Vento
“Eu gostei da aula porque foi muito interessante, aprendi mais do que eu já sabia.”
- Jasmin
Ao segundo encontro ficou reservada a apresentação de uma das variações da
“Família de Jogos” Mancala, aos participantes foi explicado à origem deste jogo no
continente africano, sua possível idade e o fato deste ser considerado “o pai dos jogos” por se
acreditar que tenha sido o primeiro jogo surgido.
As regras do jogo foram apresentadas aos participantes e foi solicitado a estes que
registrassem estas nos seus cadernos. Uma caixa de ovo foi levada para facilitar a explicação
das regras, fazendo esta se passar por um tabuleiro. Após os registros das regras nos cadernos,
os participantes foram convidados a uma visitação externa no Parque da Lagoa do Abaeté,
onde embaixo de uma árvore e sentados na areia cavaram os buracos do “tabuleiro” e na areia
releram as regras para após disso, começarem a jogar.
Os participantes ficaram eufóricos com a saída, isso dificultou a concentração no
começo da atividade, mas logo todos relaxaram e conduziram o jogo. Algumas conclusões
encontradas por estes ao jogar:
“Pró, é melhor jogar com esta casa!”- Rocha
“Não, nessa casa não! A melhor forma de semear com as sementes é esta casa
aqui!”- Cacto
“Tem que acumular oito sementes nesta casa e sete nesta outra pra poder capturar
pelo menos uma semente.” Mar
65
Ao fim do jogo, retornamos à ACRA para registrar o encontro deste dia no
caderno de cada um. Alguns dos registros:
FIGURA 9- Participantes jogando Mancala
Fonte: Própria, 2011.
“Você tinha que ficar atento à quantidade de sementes de cada casa e prever as
ações dos seus adversários”- Raiz
“Colher mais sementes para fazer mais pontos.” - Jasmin
“Dava pra fazer mais pontos semeando o adversário”- Vento
A partir desses registros, concordamos com Gerdes (2002, p. 222) quando este
afirma que
[...] a Matemática não é produto de uma esfera cultural particular, mas uma
experiência humana comum a todos os povos. O processo de estudar as suas ideias
em contextos culturais diversos permite o entendimento do que constitui a atividade
matemática. O pensamento matemático só é inteligível ao adotarmos uma
perspectiva intercultural.”
Portanto não podemos assimilar a “nossa” Matemática como única e vitalícia, esta
se torna universal à medida que reconhecemos que o corpo matemático se formou e se forma
com as participações de diversas culturas. Como então se interrogar sobre o que é
Matemática? Assim, compreender aspectos matemáticos de culturas africanas e reconhecer-se
em suas entranhas e caracterizar-se como pertencente se faz necessário porque dinamiza o
conhecimento e desmonta hegemonias.
Ao serem indagados sobre a presença da Matemática naquele jogo, alguns
responderam:
“Pró, consegui enxergar a Matemática ali.” - Mato
66
“Sim. Você tinha que memorizar a quantidade de sementes em cada casa e
planejar a melhor forma de estratégia, acho que isso tem a ver com a Matemática, né?”- Ar
Sobre o encontro, alguns registros:
“É uma aula muito boa, alegre, um jogo muito interessante porque é um jogo
milenar africano. Semear o jogo que se chama Mancala, semear vem do Egito.”- Rocha
“A aula foi boa, tomamos um ar, e o jogo foi interessante e antigo, achei fácil.” Vento
“A aula foi boa e interativa.”- Mar
Foi observado, que os participantes sempre se referiam aos encontros como aula e
à coordenadora como “Pró”.
O terceiro encontro foi muito interativo, foi apresentado após o lanche matinal,
um conjunto de slides contendo imagens da cultura Ndebele, das mulheres- girafas e de sua
arte em pintar paredes das suas próprias casas. Os participantes ficaram encantados com as
imagens que traziam referencia à pintura, mas em relação às imagens das mulheres-girafas,
um participante fez um comentário que denota mais uma vez a visão limitada e negativa
prostrada na mente das crianças e jovens quando se trata do continente africano e de sua
cultura:
“Vixe, parece o diabo!” - Mato
“Porque esta imagem te lembrou o diabo?”- Coordenadora
“Porque ela (a mulher-girafa que aparecia na imagem) é da mesma cor que o
diabo e se veste que nem o pessoal do candomblé.” - Mato
Este comentário serviu de base para que se abrisse uma discussão a cerca do que é
feio, do que é demoníaco e porque estes adjetivos sempre estão relacionados à cor preta e à
cultura africana e por extensão, à cultura africana brasileira. Gisleine Santos (2002. p.278)
aponta uma possível origem para tais discursos quando afirma que
[...] o imaginário europeu, durante toda a Idade Média até os séculos das Luzes, foi
constituído pela existência de seres fantásticos que lhes geravam simultaneamente
medo e fascínio. Raças monstruosas, homens com um pé só ou com duas orelhas
enormes, gigantes, seres com o rosto no peito, ocupavam lugar nas descrições da
África e Ásia desde a antiguidade e, figuravam na cosmogonia renascentista.
Ora, esse discurso apresentado por esse participante traz implícito a relação
apresentada à cima referente à imagem que o continente europeu formou da África e
continuou perpetuando relacionando a cor preta e a cultura africana ao demoníaco e ao
67
monstruoso. Esta imagem foi criada e reelaborada durante épocas e transmitidas por diversos
segmentos da sociedade.
Quais resultados podemos observar neste quadro? Podemos verificar que
[...] os estereótipos visam a baixar a auto-estima na constituição da identidade. A
introjeção dos estereótipos envolve dois lados. Os que sofrerão do complexo de
superioridade e os que sofrerão do complexo de inferioridade. Nos dois casos, é
preciso superar a trama que estabelece as relações discriminatórias de apartheid
ideológico[...](LUZ, Marco Aurélio. 2004, p. 22)
Portanto, podemos nos interrogar sobre o que leva uma criança de 11 anos a
reproduzir este discurso e destituir de si qualquer relação que possa existir com este
continente, com esta cor, com estas culturas? Como poder aceitar para si algo que sempre é
apresentado como ruim, demoníaco, perverso, monstruoso? A ação de não relacionar a si nada
que o faça parecer animalesco e menos merecedor de respeito faz com rejeitem imagens,
culturas e a arte deste território africano e continuem perpetuando tais discursos
inconscientemente.
Além de não conseguirem visualizar quaisquer semelhanças que relacione sua
cultura com a do outro. E se o faz, faz de forma negativa, relacionando sempre o que é ruim à
cultura do outro, num amplo processo interno de inferioridade.
Após este debate, foi apresentada a estes as estamparias africanas e foram
instigados a apontar as formas geométricas que poderiam observar nestas estamparias. A
maioria sentiu facilidade em apontar figuras planas como: o triângulo, quadrado, retângulo e
círculo, mas esta mesma maioria sentiu dificuldade em identificar figuras como: o losango e
trapézio.
Foi lembrado que esta forma de pintar trazia inúmeras características, como a
forma de produzir a tinta que seguia de forma natural, recolhendo conscientemente elementos
da natureza, tais como fuligem, lodo do rio, sementes, para produzir a tinta que embelezava
suas paredes. Assim, ao observar a forma como estas mulheres e consequentemente, esta
comunidade produzia arte, foi questionado se esta forma de produção poderia ser comparada
com a nossa produção, seja no que toca a arte, como no tocante a vestimenta:
“-Será que esta arte pode ser considerada primitiva?” - Coordenadora
“Não.”- Geral
“Por quê?” - Coordenadora
“Por que não é nada igual ao que a gente faz.” - Tulipa
“Mas, tem como a gente dizer se é melhor ou pior?”- Coordenadora
68
“É melhor, porque eles (os ndebeles) quando produziam não estão poluindo
nada.”- Jasmin
“E são muito originais, nós tudo que a gente faz, tem que ser copiado de alguém,
as marcas, as roupas...” - Rocha
“E estas mulheres que já pintavam estas formas há muitos anos atrás nesta região,
demonstra o que?” - Coordenadora
“Que já existia matemática neste lugar.”- Raiz
FIGURA 10- Participantes em momento de descontração após debate
Fonte: Própria, 2011.
Foram questionados se estas formas de pintar de alguma forma guardam a história
e a cultura daquele lugar, a resposta foi positiva, visto isto foi questionado se a localidade de
Itapuã, principalmente a região da Lagoa do Abaeté tinha alguma forma também de guardar a
história e a cultura do lugar. Alguns levantaram algumas reflexões:
“O gringo quando em chega em Itapuã, a primeira coisa que ele faz é comer o
acarajé de Cira”- Rocha
“O que mais?”- Coordenadora
“A praia, a Lagoa do Abaeté, o Malê, as Ganhadeiras de Itapuã”- Raiz
Eles também trouxeram as lendas que estão relacionadas com a Lagoa e as
contaram:
“Aqui no Abaeté era uma pequena tribo de índio, tinha o índio chamado Abaeté e
a índia chamada Potira, aí os dois saíram pra caçar e Abaeté foi pegar algumas frutas e Potira
também. Aí Abaeté se abaixou na beira da lagoa pra lavar o rosto, aí ele viu a sereia que
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chamou ele e ele foi e se afogou. Aí Potira ficou desesperada e o pajé da tribo batizou a lagoa
com o nome de Abaeté. Potira se matou porque ela queria se casar com Abaeté. Dizem que a
lagoa é escura porque é a lágrima dela, a areia branca é o véu e o mato verde é a esperança de
um dia se casar com ele.”- Cacto
Após esta etapa, foi apresentado a estes o livro Ao Sul da África foi solicitado que
eles lessem e observassem as pinturas desses povos e as formas geométricas pertencentes à
esta pintura. Após disso, eles receberam material para confeccionar um jogo da memória onde
as marcações das cartas devessem seguir às estampas das casas com as formas geométricas
escolhidas.
FIGURA 11- Participantes em confecção do Jogo da Memória com Figuras Geométricas.
Fonte: Própria, 2011.
Com a finalização desta tarefa, que foi muito produtiva, os participantes
receberam as caixas de ovos para que pudesse produzir os tabuleiros Mankala trabalhados no
encontro anterior. Um participante ao ver a caixa de ovos:
“Pró, vamos semear, é?”- Cacto
FIGURA 12- Participantes da Oficina Lúdica Estética
70
Fonte: Própria, 2011.
Pode-se observar neste encontro que os aspectos levantados, entre outros, o
reconhecimento de figuras geométricas proporcionaram não somente a identificação e
correlação das imagens com seus conceitos matemáticos, mas também na concretização de
situações matemáticas, como afirmam Ponte J. P.; Brocardo, J.; Oliveira (2005, p.71)
A exploração de diferentes tipos de investigação geométrica pode também contribuir
para concretizar a relação entre situações da realidade e situações matemáticas,
desenvolver capacidades, tais como a visualização espacial e o uso de diferentes
formas de representação, evidenciar conexões matemáticas e ilustrar aspectos
interessantes da história e da evolução da matemática.
Assim, esta experiência além de fazer conexões matemáticas, propiciou o
ilustramento da história, da cultura e da arte Ndebele. Isso contribui não só para o
reconhecimento da matemática em diversos contextos, mas também para reconhecer no
continente africano culturas que trazem em seus traços conhecimentos nunca antes revelados.
No decorrer do encontro, os participantes ao serem indagados nos questionários
de entrevista sobre o que eles sentiram falta nos encontros, eles tocaram na questão do dever,
alguns relacionaram as atividades realizadas com deveres, outros disseram que sentiram falta
do dever e alguns até questionaram:
“Pró, a gente ganha ponto, pra levar pra escola?”- Mato
Eles estavam preocupados com a falta de rigorosidade e com a necessidade de
atingir o padrão estabelecido nas instituições de ensino. o padrão da nota, da aprovação isto é
fruto do
71
[...] ato de educar nas sociedades impregnadas pelos valores industriais que é
submeter os sujeitos ao espaço e tempo da produção, ao consumo, é aprender a
acumular riqueza monetária-financeira, aprender a TER. (LUZ, 2002, p.79)
Assim, esses sinais que por muitas vezes se mostram de forma silenciosa aos nossos olhos,
impregnam instituições e fazem com que os educandos realmente acreditem que o necessário
é a aprovação e não importa os parâmetros que foram usados para alcançá-la. O aprender fica
restrito a norma da quantificação em nota, do conceito de aprovado e reprovado, isso cria uma
mentalidade engessada em que o gosto e o prazer pela aprendizagem ficam restritos aos
valores neocolonialistas liberais.
FIGURA 13- Materiais produzidos nos encontros da Oficina Lúdica Estética
Fonte: Própria, 2011.
No quarto encontro, foi possível discutir com os participantes sobre as lendas e
histórias que estes já tiveram acesso sobre a territorialidade que estes moram. Alguns se
mostraram muito ansiosos pra falar como se aquela história fosse relevar algo muito íntimo de
sua vida. Falaram muito sobre um morador que protegia a Lagoa do Abaeté, preservava
aquele lugar como espécie de patrimônio de todos que ali moravam. Os alunos mostraram
tristeza ao revelar que este homem foi assassinado.
Em um segundo momento, foi realizado o questionário final com os participantes,
enquanto a entrevista estava sendo feita com um deles, o restante terminava a confecção dos
tabuleiros de mancala e alguns utilizavam os jogos que tinham produzidos no decorrer dos
encontros. A exemplo do jogo da memória.
72
Ao fim da realização da entrevista, os participantes puderam utilizar todos os
jogos confeccionados por estes em um clima de descontração e dialogo a cerca dos encontros,
muitos demonstraram a insatisfação com o termino dos encontros. Ao final do dia, foi
solicitado que estes registrassem no caderno as suas motivações. Alguns registros:
“Gostei da aula, porque teve que pintar, aprendi que a matemática tá em tudo que
é lugar...” – Tulipa
“Eu acho que a aula foi ao porque eu aprendi sobre coisas africanas e pintei um
jogo de memória africano. Depois eu acabei e pintei o tabuleiro do jogo semear: eu aprendi
várias coisas junto com os meus colegas e a professora ajudando ficou melhor ainda.”- Cacto
“... Eu aprendi sobre os negros, que as formas geométricas têm a ver com os
negros e que eles próprios fazem suas roupas e pintam suas casas.”- Jasmin
“Achei a aula muito importante porque a matemática está em tudo que é lugar.
Que até na arte existe matemática.”- Mato
“Bom, gostei, aprendi sobre a África, os vestidos. Gostei das falas de
matemáticas, as medidas dos vestidos...”- Rocha
FIGURA 14- Participantes e Coordenadora da oficina em momento de construção
Fonte: Própria, 2011.
73
FIGURA 15- Participantes exibindo suas produções
Fonte: Própria, 2011.
Podemos considerar que a realização das oficinas de forma questionadora e
reflexiva disponibilizou o acesso coletivo ás informações sobre como os participantes
pensavam nas temáticas dos encontros. Interessante foi perceber a escuta e os discursos
apresentados e o debate em torno deste, para que o próprio participante pudesse refletir sobre
suas falas e coletivamente reconstruir-las, desfazendo-as de preconceitos e imagens
preconcebidas.
Assim, conforme Ponte J. P.; Brocardo, J.; Oliveira (2005, p. 125)
As apresentações orais permitem avaliar uma variedade de objetivos, incluindo as
atitudes e valores, a compreensão do processo de investigação, a pertinência das
estratégias, os processos de raciocínio e a capacidade de comunicação oral.
Assim, o andamento da discussão oral dado ao grupo favoreceu a análise dos
discursos utilizados como também favoreceu aos questionamentos sobre o que estaria por trás
destes discursos, no tocante a valores, comportamentos, influências e possíveis equívocos.
5.2 Análise dos Questionários
Antes de iniciarmos a análise dos questionários utilizados nesta pesquisa, é
preciso lembrar que foram utilizados dois tipos de questionários: o inicial, utilizado no
primeiro dia dos encontros e o final usado no último encontro da oficina. O questionário
inicial foi aplicado no grupo verbalmente, sendo anotados os principais comentários depois de
realizada cada questionamento.
No questionamento inicial foi dado ênfase a algumas questões:
74
GRÁFICO 1- Disciplina que tem mais dificuldade
Fonte: Própria, 2011
Podemos perceber que a disciplina Matemática se mostra campeã quando o
assunto é dificuldade de entendimento. Isto nos remete ao segundo capítulo desta pesquisa em
que levantamos quais seriam os principais desafios para a composição de novas linguagens
para a educação matemática, com o objetivo de desfazer este quadro apresentado pelo gráfico
1.
No decorrer do questionário, outra indagação realizada foi:
GRÁFICO 2- Sua relação com a Matemática é:
Fonte: Própria, 2011.
75
Podemos observar que a maioria dos alunos, 56% mantêm uma relação não
harmoniosa com a disciplina Matemática, sendo que os 22% que possuem uma relação
intermediária, ao serem somados com os primeiros representam 78% . Sendo um valor três
vezes maior do que os que possuem uma relação harmoniosa com a disciplina em questão.
Entre as justificativas para a dificuldade na disciplina Matemática, encontramos:
“Matemática é difícil, as contas que a professora passa.”- Ar
“Porque eu sinto dificuldade.”- Raiz
“Porque é difícil!”- Mar
Ao serem questionados sobre a imagem que o bairro de Itapuã tem para eles,
alguns registros merecem destaque:
“Bom, tem a praia, a Lagoa do Abaeté,. Gosto de morar aqui.”- Ar
“Um bairro bom.”- Raiz
“Lindo. Gosto de morar aqui.”- Mato
“Horrível, perigoso.”- Mar
“Ruim, muito lixo na rua, esgoto...”- Rocha
No caminhar dos pontos desenvolvidos no questionário, foi possível perceber que
as opiniões sobre a territorialidade de Itapuã se dividem entre comentários que ora favorecem
o bairro, ora levantam questões como segurança, cidadania e preservação do espaço.
Sobre a Associação Crianças Raízes do Abaeté, os participantes relacionaram a
instituição ao pé de cajarana encontrado dentro deste espaço, ao pé de manga, à quadra de
esportes, na qual muitos já jogaram futebol em horários recreativos. Alguns registros sobre a
ACRA:
“Projeto muito bom porque recolhem as pessoas da comunidade mais pobres...”Mato
“Projeto que dá oportunidades.”- Mar
“É o único lugar que a gente pode aprender. Não existe mais lugares assim...”Vento
“Uma oportunidade na minha vida.”- Jasmin
5.2.2. Questionário Final
No tocante à análise do questionário final, a maioria dos participantes mudou a
visão negativa referente à África. Aos que ainda continuam assimilando que o continente é
76
pobre, ainda assim conseguiram identificar cultura, história e arte neste continente, algo que
era impossível antes dos encontros. Ao serem questionados se a imgem que eles tinham do
continente continuava a mesma, alguns registros:
“Achava que tinha muitas pessoas comendo lixo, e agora vi que a situação deles
mudou.”- Rocha
“Mudou um pouquinho. Achava que era um país pobre,sem cultura. Um país
pobre, mas rico em arte, né?”- Mato
“Mudou, meu modo de falar, meu modo de pensar. Pensava que a era um país
pobre e que vivia na miséria. Penso que agora pode ser um país pobre, mas tem alguns lugares
que tem riqueza.”- Raiz
“Mudou. Não gostava. Agora gosto. Antes eu achava que só tinha pobre. Agora
acho mais bonito”- Vento
“Mudou. Achava que na África só dava pra falar dos negros. E agora sei que na
África também existe matemática.”- Jasmin
“Não parece ser o que eu achava.”- Mar
“Mudou, porque antigamente eu achava que era pobre, as pessoas passavam fome,
mas hoje vejo que não passam fome.”- Ar
“Mudou, quando eu penso na África eu não vejo mais da mesma forma. Agora eu
vejo que tem conhecimento, que existe arte e cultura.”- Tulipa
“A África também é um país bom.”- Cacto
Foi observado que apesar de ter sido discutido nos encontros que a África não era
um país e sim um continente riquissímo com inúmeras culturas, países, línguas e
conhecimentos diferentes, os particpantes ainda relacionavam a imagem da África a de um
país. Sempre repetiam tal concepção ao serem questionados sobre este.
77
GRÁFICO 3: E seu imaginário sobre o continente africano, mudou de alguma forma?.
Fonte: Própria, 2011.
Sobre este questionamento, podemos observar que houve uma mudança
significativa no imaginário destas crianças e jovens sobre o continente africano, visto que
antes dos encontros da oficina, quase que 100% destes viam a África negativamente, sendo
que após os encontros, 78% dos participantes apesar de continuarem achando o continente
pobre, conseguiram perceber que este era rico em cultura, conhecimento, história e arte e 22%
dos participantes passaram a achar o continente rico e não pobre como haviam declarado
anteriormente.
Outra questão observada foi a forma como esses lidavam com a Matemática, a
visão que estes tinham da referida área como difícil, complicada, cheia de contas se
modificou. Foi observado que eles puderam ampliar este olhar e observar a matemática em
outros pontos do cotidiano e reconhecer situações matemáticas em diversos contextos. Alguns
registros que merecem destaque:
“... Antes achava que era ruim e agora eu acho que é bom.”- Rocha
“Gosto mais, eu descobri que a matemática é mais fácil que eu pensava.”- Mato
“A matemática não é só matemática, é um monte de coisas, é arte, tem história
também.”- Jasmin
“Aprendi que a matemática não tá só no um mais um. Tá em todos os lugares.”Mar
“Observei que a matemática estava presente a muito tempo atrás e que era usada
nas construções.”- Tulipa.
78
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando toda a trajetória da presente pesquisa, podemos registrar que os
elementos traçados pelos estudos dos referenciais teóricos foram de induvidável preciosidade
para o andamento da pesquisa em questão, cominando na comprovação de posturas e
discursos encontrados na população da pesquisa no tocante às visões preconceituosas sobre o
continente e tudo o que tiver relacionado com a África. Esta continua se mostrando de forma
negativa aos educandos e isso vem se refletindo em como eles enxergam a sua própria cultura.
Por conta deste quadro, a população da pesquisa não conseguiu em um primeiro momento
perceber a ligação existente entre a cultura africana e a cultura a que eles pertencem. Portanto,
por uma lógica cruel, pudemos observar que os participantes afro descendentes não
conseguem se sentir pertencentes e nem mantenedores de nenhum laço com o continente
africano.
Foi perceptível também a grande dificuldade encontrada na compreensão da
matemática como esta tem se mostrado (coberta de valores europeus e positivistas). Porém,
vimos que através de novas linguagens matemáticas que respeitem e divulguem a cultura
africana, poderá ser possível modificar o quadro racista do setor educacional. O estudo das
referencias teóricas que sustentaram a pesquisa, juntamente com o planejamento das
atividades realizadas na oficina lúdica estética, trouxe estas novas possibilidades.
Após a realização dos encontros das oficinas, pudemos ver pontos positivos nas
posturas e pensamentos da população da pesquisa no tocante:
 Ao reconhecimento do continente africano como possuidor de conhecimentos
científicos, artísticos e matemáticos;
 À percepção de que a Matemática está presente em vários contextos;
 À noção de que os conhecimentos matemáticos não são de difícil acesso e de
entendimento;
 À percepção e ao desenvolvimento da capacidade de aprendizagem e de discussão da
temática matemática.
Assim, podemos salientar que alcançamos nossos objetivos no que se refere a
compor novas linguagens matemáticas que respeitem os valores milenares africanos
79
brasileiros e desenvolvemos em crianças e jovens a percepção de que o continente africano se
configura como a origem de nossa humanidade e civilização e que este merece respeito.
Então, basta lembrar que nós, enquanto educadores devemos sempre estar em
constante alerta para não aceitarmos as verdades impostas pelo quadro colonial que insiste em
vigorar.
Isto será possível desde que mostremos para nossos educandos que a Matemática
pode ser compreendida de forma prazerosa e podem encontrar nesta, significações para suas
vidas. E este ato será antes de mais nada, o mesmo que respeitá-los enquanto cidadãos que
precisam de raízes sólidas para seu desenvolvimento.
80
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Diversidade, 2005.p. 133- 166.
84
APÊNDICE A- Guia de Entrevista Inicial
Guia de Entrevista Inicial
1- Nome: _________________________________________________
2-Endereço:_______________________________________________
3-Data de Nasc.:_______
4-Escola/ Série Escolar:_________________________________________
5- Entre as disciplinas do currículo escolar, em qual você encontra maior dificuldade?
Por quê? ______________________________________________
6-Sua relação com a matemática é:
() boa
() intermediária
() ruim
7- Gostaria que os conteúdos matemáticos fossem relacionados mais com a sua vida?
8-O que acha do bairro de Itapuã?
9-Qual a imagem que a ACRA tem para você?
________________________________________________________________________
10-O que espera dos nossos encontros?
85
APÊNDICE B- Guia de Entrevista Final
Guia de Entrevista Final
1- Nome: _________________________________________________
2-Endereço:_______________________________________________
3-Data de Nasc.:_______
4-Escola/ Série Escolar:_________________________________________
5- O que achou dos nossos encontros? Foi o que esperava?
6- O que mais gostou de ter discutidos em nossos encontros?
___________________________________________________________________________
7- Sua relação com a matemática é:
() boa
() intermediária
() ruim
8- A sua visão sobre a matemática mudou?Como?
9- E seu imaginário sobre o continente africano se modificou de alguma forma?
86
APÊNDICE C- Oficina Compondo Linguagens Africanas Brasileiras para a Educação
Matemática
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO DO CAMPUS I
PEDAGOGIA HABILITAÇÃO EM ANOS INICIAIS
PRODESE
PROGRAMA DESCOLONIZAÇÃO
OFICINA:
COMPONDO LINGUAGENS AFRICANAS BRASILEIRAS PARA A EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA
COORDENAÇÃO: CAROLINE NEPOMUCENO DA SILVA
OBJETIVO GERAL: COMPOR LINGUAGENS AFRICANAS BRASILEIRAS PARA
A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
 Disseminar os conhecimentos científicos da civilização egípcia;
 Experienciar um jogo milenar africano;
 Confeccionar tabuleiros da Família de jogos Mancala;
 Identificar figuras geométricas na Estamparias Africana;
 Conhecer e refletir sobre a Cultura e a Arte Ndebele.
JUSTIFICATIVA:
A realização das oficinas lúdicas estéticas se justifica devido à emergente necessidade em se
87
discutir questões referentes á temática desta pesquisa com jovens e crianças de uma
territorialidade africana brasileira, na qual se encontram valores civilizatórios e
conhecimentos matemáticos que encontram raízes no legado africano.
PÚBLICO ALVO/ PARTICIPANTES: Crianças e adolescentes de 8 à 14 anos de idade
matriculadas devidamente em escolas públicas, estas devem residir na territorialidade de
Itapuã.
CARGA HORÁRIA: 10 horas
PERÍODO: MANHÃS DE TERÇAS E QUINTAS- FEIRAS DE 09 DE AGOSTO A 18 DE
AGOSTO
METODOLOGIA:
Os encontros serão bem diversificados, onde as vozes das crianças e adolescentes
serão sempre valorizadas e relativizadas com o seu contexto social e cultural que se
caracteriza com a população existente na comunalidade de Itapuã.
O começo dos encontros será sempre de 9 horas da manhã. A duração de encontro
será de duas horas e meia, sendo que os primeiros 30 minutos deverão ser reservados para que
os alunos tomem o lanche da manhã, em meio ao lanche, será feita uma roda de conversa e de
socialização entre eles e a coordenadora da oficina.
Das 9:00 até as 11:30 o horário será reservado para a discussão, esta que poderá
ser dentro do espaço da Acra ou nas imediações de Itapuã; Os 30 minutos finais serão
reservados para que os alunos falem, reflitam e repensem o encontro do dia e o registrem em
seu caderno. Os alunos poderão enumerar o que gostaram, o que não gostaram e propor
sugestões para os próximos encontros.
Dia 09/08/2011- Terça- feira:
09h00min Lanche da manhã/ Socialização
09h30min Diálogo aberto/Dinâmica de apresentação
10h00min I Encontro/Tema: África Conhecendo nossas raízes- Sistema de Numeração:
Civilização Egípcia
11h00min Registro do encontro em caderno
88
Dia 11/08/2011- Quinta –feira
09h00min Lanche da manhã/ Socialização
09h30min II Encontro/Tema: África Conhecendo nossas raízes- Jogos Mancala
Visitação à Lagoa do Abaeté
11h00min Registro do encontro em caderno
Dia 16 /08/2011- Terça –feira
09h00min Lanche da manhã/ Socialização
09h30min III Encontro/ Tema: África Conhecendo nossas raízes- Jogos Mancala/ Cultura
e Arte Ndebele
Estamparias Africanas: Figuras Geométricas Planas
11h00min Registro do encontro em caderno
Dia 18/08/2011- Quinta –feira
09h00min Lanche da manhã/ Socialização
09h30min IV Encontro/ Encerramento
11h00min Registro do encontro em caderno
MATERIAIS/EQUIPAMENTOS
Materiais:
1 relógio grande de parede
15 cadernos pequenos
15 canetas
15 lápis
15 borrachas
15 classificadores
5 pacotes de cream cracker
40 unidades de polpas de frutas
5 pacotes de biscoito maisena
5 pacotes de biscoito recheado
10 unidades de pó para refresco
Frutas variadas
2 pacotes de guardanapos
89
2 pacotes de copos descartáveis
3 pacotes de massa para bolo
5 litros de refrigerantes
Equipamentos:
Notebook
Micro system
Quadro
Giz
Mapa- Mundí
Mapa do continente africano
I Encontro: Entrevista, Apresentação do Encontro e Diálogo
Tema: África: Conhecendo nossas raízes
Sub-Tema: Sistema de numeração: Civilização Egípcia
Objetivos Específicos: Disseminar os conhecimentos científicos da civilização egípcia.
Conteúdos:
Conceituais
Noção do sistema decimal egípcio
Atitudinais:
Refletir sobre a imagem preconcebida do continente africano;
Refletir sobre os diversos sistemas de numeração;
Repensar os aportes matemáticos e científicos da civilização egípcia
Procedimentais:
Localizar o continente africano, bem como o Egito no mapa-múndi;
Dialogar com mídias eletrônicas;
Resolver atividade xerocada sobre o assunto abordado;
Relacionar o sistema de numeração egípcio com o utilizado
Metodologia:
O encontro será iniciado com uma dinâmica: Todos deverão estar sentados em
roda, será solicitado que os alunos digam a primeira palavra quando pensam no continente
africano. Os nomes deverão ser anotados na primeira página de seus cadernos. Após disso,
90
será solicitado que os alunos pensem e registrem a primeira palavra que vem a sua mente
quanto estes pensam no Egito. Ao fim desta etapa os alunos deverão de três em três localizar
o Egito no mapa- múndi.
Após a dinâmica serão exibidos dois documentários: Antigo Egito Parte I e Parte
II. O objetivo será mencionar sobre a localização deste país, sobre sua rica cultura e sobre a
gama de conhecimentos técnicos científicos que este comporta. Para isto deverá ser exposto
em sala de aula um mapa-múndi para que os alunos percebam o pertencimento deste país no
continente africano.
Após disso haverá a repetição da dinâmica, os alunos deverão dizer novamente a
primeira palavra que vir à sua cabeça quando pensarem na África. Serão indagados sobre a
imagem do continente e sobre o país que foi apresentado para eles naquele momento.
Alguns questionamentos que poderão ser levantados:
- Vocês sabiam que o Egito era um país africano?
- Vocês achavam que este país era tão rico em cultura e em conhecimento assim?
- Vocês fazem alguma idéia do motivo que justifica o desconhecimento de vocês?
(outras indagações podem surgir no caminhar do diálogo)
Diante disto, matematicamente, falaremos no sistema decimal, e sobre as formas
de representações de números nas diversas culturas. Estes serão indagados sobre alguns
símbolos do sistema romano. Serão apresentados a este através de imagens, o sistema
numérico egípcio. Será entregue uma atividade xerocada para que estes a resolvam em classe.
O objetivo esperado com esta atividade é que os participantes percebam que existe outra
forma de comunicação matemática diferente daquela que eles usam (sistema de numeração
decimal).
Ao fim do encontro, os participantes deverão registrar em seus cadernos a
impressão que tiveram da dinâmica do dia, o que gostaram e o que esperam dos próximos
encontros.
Recursos
91
Mapa-Múndi
Quadro
Giz
Tv
Dvd
Atividade Xerocada
Vídeos
II Encontro
Tema: África: Conhecendo nossas raízes
Sub-Tema: Jogos Mancala
Objetivo Específico: Experienciar um jogo milenar africano
Conteúdos:
Conceituais
Desenvolvimento de estratégias
Noção de direção
Agilidade no raciocínio dedutivo
Resolução de Problemas
Atitudinais:
Refletir sobre a origem do jogo Mancala
Repensar os aportes matemáticos e científicos da civilização egípcia
Procedimentais:
Localizar o Egito no mapa-múndi
Elaborar estratégias para a execução do jogo em questão
Levantar histórias e lendas sobre a Lagoa do Abaeté
Metodologia:
92
Será avisado aos participantes que neste dia será apresentado a estes um jogo
africano muito antigo, datado de 2 mil anos, e há quem afirme que este tem até 7mil anos de
existência, estes pesquisadores o intitulam como o “pai dos jogos”. Este será apresentado
como pertencente ao conjunto de jogos chamado Mancala.
Será informado que este jogo encontra sua origem no Egito e seu nome carrega
um significado e encontra sua origem numa palavra árabe “nagaala” que quer dizer mover.
Alguns questionamentos:
-Vocês recordam dos vídeos apresentados no encontro anterior, este jogo tem algo
de específico com a cultura africana, o que será?
Será relembrado que esta noção de semear esteve presente no antigo Egito, como
foi visto no vídeo do encontro anterior, encontra semelhança com o significado do nome do
jogo. E significa exatamente o ato de semear a terra. Os participantes serão indagados sobre
esta afirmação.
Serão apresentadas as regras do jogo, os participantes serão convidados a irem
para a Lagoa do Abaeté, ao sentar-se à areia da Lagoa do Abaeté, os alunos serão indagados
sobre histórias e lendas que já ouviram sobre aquele lugar. Eles deverão ser instigados a falar,
comentar e repensar aquele local.
Após a conversa sobre a localidade em questão, será montado um tabuleiro na
areia e estes deverão jogar entre si, assimilando as regras do jogo.
Este encontro também servirá de base para o próximo, onde os participantes
deverão confeccionar os tabuleiros do jogo e jogá-lo em duplas.
Ao final do encontro, os participantes deverão realizar o registro diário em seus
cadernos sobre a atividade realizada no dia.
Recursos
Mapa-Múndi
Quadro
Giz
Tv
Espaço físico que contenha areia
III Encontro
Tema: África: Conhecendo nossas raízes
93
Sub-Tema: Mancala e Cultura e Arte Ndebele
Estamparias Africanas
Objetivo Específico: Confeccionar tabuleiros do Mancala e um jogo da memória com
estampas africanas
Conteúdos:
Conceituais
Estamparias Africanas;
Noção de figuras geométricas planas
Cultura e Arte Ndebele
Valores Éticos de produção
Atitudinais:
Refletir a cerca da cultura e da arte ndebele
Perceber a grandiosidade estampadas em tecidos africanos
Repensar o modo de produção da estamparias africanas
Procedimentais:
Confeccionar tabuleiros para o jogo Mancala;
Identificar figuras geométricas planas nas estamparias africanas
Identificar figuras geométricas planas
Localizar a cidade da cultura em questão no mapa do continente africano
Produzir um jogo da memória com as estampas africanas
Metodologia:
Alguns pontos a serem levantados:
- Antes dos nossos encontros vocês poderiam imaginar que no continente africano existissem
conhecimentos matemáticos e jogos?
No primeiro momentos, os participantes serão convidados a assistir uma
apresentação de slides, estes que trarão a cultura e a arte Ndebele e as Estamparias Africanas
94
como temática. Serão instigados a identificar as formas geométricas planas presentes nesta
última e a refletir sobre a cultura, a arte e o modo de produção do povo Ndebele.
No segundo momento, os participantes serão convidados a confeccionar um jogo
da memória com as estamparias observadas na estamparias e na pintura dos povos ndebeles.
Após disso, será a vez de confeccionar os tabuleiros. Cada um produzirá o seu. Será
estimulado que estes usem tinturas que tragam as estamparias africanas como temática.
Será demonstrado como poderá ser conduzida a confecção dos tabuleiros, mas os
participantes deverão dar sugestões de outras formas.
Para subsidiar tal momento, será apresentado um slide onde estarão expostas
lindas estamparias africanas que demonstraram figuras geométricas planas, como quadrados,
círculos, retângulos e triângulos. Os participantes deverão refletir a cerca das denominações
de cada uma das figuras expostas.
Algumas questões a serem levantadas:
 Será que podemos continuar dizendo que na África só existe pessoas que passam
fome?
 A arte dos Ndebeles é rica? Por que o restante do mundo fica encantado com esta?
 As pinturas das mulheres-girafas possuem formas matemáticas, quais foram as
observadas por vocês?
 Vocês encontraram estas figuras nas estamparias dos tecidos também?
 Será que esta produção pode ser considerada primitiva? Por quê?
 Uma produção em massa, como é a nossa, no caso, em grandes empresas possuem os
mesmos valores?
 As pessoas que nelas trabalham e compram, compartilham da mesma forma que os
povos ndebeles na sua produção?
 Essa forma de pintura e de estamparia registra a história e o conhecimento dessa
comunidade?
 Aqui no Abaeté a gente consegue perceber algum símbolo que guarde o conhecimento
e a história do nosso lugar? Qual?
Os participantes serão instigados a trazer no próximo encontro lendas sobre
Itapuã.
95
Ao fim do encontro, os participantes deverão registrar o que fizeram neste dia, o
que acharam do encontro e o que esperam pro próximo dia.
Recursos
Quadro
Giz
Tv
Caixa de ovos de codorna
Caixa de ovos
Tinta guache
Tesoura
Cola
Papel colorido
Pincéis
Notebook
Som
IVEncontro
Tema: África: Conhecendo nossas raízes
Sub-Tema: Jogos
Objetivo Específico: Jogar com o material confeccionado
Conteúdos: Jogo Mancala e Jogo da Memória Africano
Conceituais:
Histórias e Lendas
Produção
Atitudinais:
Refletir sobre os encontros da oficina
Procedimentais:
Experieciar os materiais confeccionados
96
Metodologia:
No primeiro momento do lanche será solicitado aos participantes que estes
apresentem algumas das lendas e histórias sobre Itapuã ou que eles já tenham vivido ou
ouvido.
No segundo momento estes deverão responder o questionário final da pesquisa.
No terceiro momento eles terminaram de confeccionar o material produzido até
aquele momento e após disso poderão jogar com estes.
Algumas questões a serem levantadas:
 Quais são as histórias mais interessantes que vocês já tiveram contato sobre
Itapuã?
 E sobre a Lagoa do Abaeté?
 Vocês acham que de alguma forma estas histórias, contos e lendas guardam a
história e a cultura deste lugar?
Recursos
Materiais produzidos pelos participantes até o momento
Tinta guache
Pincéis
Tesoura
Cola
Cartolina
Questionário Final
Cronograma/ conteúdos
I Encontro: Entrevista, diálogo aberto, dinâmica. Sistema de Numeração Egípcia
Conteúdo Matemático: Sistema de numeração
II Encontro: Família de jogos: Mancala
Conteúdo Matemático: Resolução de Problemas
III Encontro: Confecção do tabuleiro do jogo Mancala/Estamparias Africanas/ Cultura e Arte
Ndebele
Conteúdo Matemático: Formas Geométricas
IV Encontro: Encerramento
97
APÊNDICE D- Ofício ao Mercado
ACRA- Associação Crianças Raízes do Abaeté
Rua Parque Metropolitano do Abaeté, n° 20
Itapuã- Bahia- Brasil Cep:41610-525
CNPJ: 076644120001-75 Tel. (71) 91269084
Salvador, __/__/2011
Prezado Representante do Mercado __________________________,
Em nome da Associação Crianças Raízes do Abaeté - ACRA, situada no Parque
Metropolitano do Abaeté, n°20, Itapuã, Salvador, Bahia entramos em contato com Vossa
Senhoria através deste ofício, para solicitar auxílio através da doação de alguns produtos
alimentícios. A ACRA se preocupa com a construção de uma comunidade mais unida e
reflexiva, sabemos que é o caminho que devemos percorrer nesses 5 anos de empenho.
Hoje atendemos algumas crianças e adolescentes na territorialidade de Itapuã. Essa população
infanto-juvenil conta agora com a possibilidade de um Curso de Matemática gratuitamente,
com o objetivo de fortalecer a auto-estima e identidade dessa comunidade, dentre outros
aspectos relevantes. Nosso trabalho contempla também a valorização e a divulgação da
cultura e da história de matriz africana-brasileira e aborígene. Sabemos da relevância que o
trabalho social representa para os senhores e contamos com a vossa colaboração.
Os produtos alimentícios solicitados abaixo serão utilizados no lanche da manhã de 10
crianças nas instalações da ACRA. Esse lanche será servido diariamente, num período de 9
até 18 de agosto, nos dias de terça e quinta-feira, aos participantes do grupo focal responsável
pela pesquisa: Compondo Linguagens Matemáticas. O objetivo maior destes encontros será
trazer os principais conhecimentos da comunalidade de Itapuã numa linguagem matemática.
Como resultado disso, teremos mais crianças e jovens conhecedores do seu patrimônio
cultural e dos conhecimentos matemáticos que os cerca.
Convidamos a tempo para visitar o nosso blog (http://blogdoacra.blogspot.com) e conhecer
um pouco mais desse projeto. Gostaríamos de reforçar que sozinhos estamos lutando, mas que
98
com parceiras como a de vocês, teremos certeza de vitória. Como ressalva, gostaríamos de
comunicar que como agradecimento ao auxílio, colocaremos uma nota no Blog ressaltando o
estabelecimento em questão, como incentivo para que outras instituições corroborem com a
causa.
Para tanto, o que solicitamos:
 5 pacotes de cream cracker
 40 unidades de polpas de frutas
 5 pacotes de biscoito maisena
 10 pacotes de biscoito recheado
 10 unidades refresco em pó
 Frutas variadas
 2 pacotes de guardanapos
 200 unidades de copos descartáveis
 3 pacotes de massa para bolo
 5 litros de refrigerantes
Desde já, agradecemos.
José Narciso do Patrocínio
Caroline Nepomuceno da Silva
Diretor da Acra
Pedagoga da ACRA/ Coordenadora da
Oficina
99
APÊNDICE E- Ofício à papelaria
ACRA- Associação Crianças Raízes do Abaeté
Rua Parque Metropolitano do Abaeté, n° 20
Itapuã- Bahia- Brasil Cep:41610-525
CNPJ: 076644120001-75 Tel. (71) 91269084
Salvador, __/__/2011
Prezado Representante da Livraria e Papelaria______________________,
Em nome da Associação Crianças Raízes do Abaeté - ACRA, situada no Parque
Metropolitano do Abaeté, n°20, Itapuã, Salvador- Bahia, entramos em contato com Vossa
Senhoria através deste ofício, para solicitar auxílio através da doação de alguns produtos
alimentícios. A ACRA se preocupa com a construção de uma comunidade mais unida e
reflexiva, sabemos que é o caminho que devemos percorrer nesses cinco anos de empenho.
Hoje atendemos algumas crianças e adolescentes na territorialidade de Itapuã. Essa população
infanto-juvenil conta agora com a possibilidade de um Curso de Matemática gratuitamente,
com o objetivo de fortalecer a auto-estima e identidade dessa comunidade, dentre outros
aspectos relevantes. Nosso trabalho contempla também a valorização e a divulgação da
cultura e da história de matriz africano-brasileira e aborígene. Sabemos da relevância que o
trabalho social representa para os senhores e contamos com a vossa colaboração.
Os produtos solicitados abaixo serão utilizados no decorrer do curso de matemática que
atenderá 15 crianças nas instalações da ACRA. Esta oficina acontecerá num período de 4 até
29 de julho, nos dias de segunda, quarta e sexta-feira aos alunos antes do começo de cada aula
da oficina: Compondo Linguagens Matemáticas. O objetivo maior desta oficina será trazer os
principais conhecimentos da comunalidade de Itapuã numa linguagem matemática. Como
resultado disso, teremos mais crianças e jovens conhecedores do seu patrimônio cultural e dos
conhecimentos matemáticos que os cerca.
100
Convidamos a tempo para visitar o nosso blog (http://blogdoacra.blogspot.com) e conhecer
um pouco mais desse projeto. Gostaríamos de reforçar que sozinhos estamos lutando, mas que
com parceiras como a de vocês, teremos certeza de vitória. Como ressalva, gostaríamos de
comunicar que como agradecimento do auxílio, colocaremos uma nota no Blog, ressaltando o
estabelecimento em questão, como incentivo para que outras instituições corroborem com a
causa.
Para tanto, o que solicitamos:
1 relógio grande de parede
15 cadernos pequenos
15 canetas
15 lápis
15 borrachas
15 classificadores
Desde já, agradecemos.
José Narciso do Patrocínio
Caroline Nepomuceno da Silva
Diretor da Acra
Pedagoga da ACRA/ Coordenadora da
Oficina
101
ANEXO A- Lei 10.639/2003
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
o
LEI N 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.
o
Altera a Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996,
que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional, para incluir no currículo oficial da Rede
de Ensino a obrigatoriedade da temática "História
e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras
providências.
Mensagem de veto
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono
a seguinte Lei:
o
o
Art. 1 A Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts.
26-A, 79-A e 79-B:
"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se
obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
o
§ 1 O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da
África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação
da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e
política pertinentes à História do Brasil.
o
§ 2 Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo
o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
o
§ 3 (VETADO)"
"Art. 79-A. (VETADO)"
"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência
Negra’."
o
Art. 2 Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
o
o
Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182 da Independência e 115 da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 10.1.2003
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ANEXO B- Regras do Jogo Mancala
Fonte: SANTOS. Celso José dos. Jogos africanos e a educação matemática: semeando com a
família Mancala.
1. Iniciar o jogo, distribuindo 3 sementes em cada espaço, com exceção dos centrais que
deverão conter 4 sementes. Os kalahs, situados nas laterais, devem ficar vazios.
2. Os jogadores fazem suas jogadas alternadamente, procurando sempre acumular sementes
em seu kalah.
3. Cada jogador, na sua vez, escolhe uma casa do seu lado do tabuleiro, pega todas as
sementes dessa casa e as distribui uma a uma em cada casa localizada à sua direita, sem pular
nenhuma casa e nem colocar mais de uma semente em cada casa.
4. Cada vez que passar pelo seu kalah, o jogador deve deixar uma semente, continuando a
distribuição no lado do adversário e não colocando sementes no kalah do outro jogador (pula
este kalah).
5. O jogo termina se um dos jogadores, na sua vez, não tiver mais sementes para movimentar.
Os jogadores comparam seus kalahs para determinarem quem tem mais sementes sendo,
conseqüentemente, o vencedor. Quando as primeiras regras já assimiladas possibilitando o
desenvolvimento do jogo sem muitas dúvidas, deverá ser introduzida, uma de cada vez, duas
novas regras que exigem antecipação e planejamento das jogadas. São elas:
6. Sempre que a última semente colocada cair no kalah do próprio jogador, este tem o direito
a jogar novamente. Ou seja, deverá escolher uma nova casa, pegar as sementes nela existentes
e distribuí-las uma a uma nas casas seguintes. Essa regra pode se repetir várias vezes numa
mesma jogada, basta que a última semente colocada caia no kalah várias vezes seguidas.
7. Se a última semente colocada pelo jogador cair numa casa vazia, do seu lado do tabuleiro, o
jogador “captura” todas as sementes do adversário que estiverem na casa diretamente à frente
desta e coloca-as no seu próprio kalah. Neste caso o jogador não ganha será outra jogada.
Após se familiarizarem com as regras desse primeiro jogo, os alunos deverão jogar algumas
partidas. Durante esse tempo, solicitaremos que observem, os seguintes aspectos do jogo:
a. Quais movimentos “incorretos” que ocorreram nesse jogo?
b. Quais as estratégias para ganhar o jogo?
c. Quais jogadas não faria mais?
d. Qual a pior casa a ser escolhida para iniciar a distribuição das
sementes? Por quê?
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