25/11/2014
Vedação ao nepotismo: agentes políticos e a omissão do STF ­ Jus Navigandi
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Súmula vinculante nº 13 e os agentes políticos – a grande omissão do Supremo Tribunal
Federal
Marcio Gai Veiga
Publicado em 05/2014. Elaborado em 01/2014.
O STF omitiu­se a respeito da inclusão expressa dos agentes políticos no texto da súmula vinculante que
veda o nepotismo, causando insegurança jurídica e avalizando atos de improbidade por todo o país.
Resumo: Dentre as várias formas de provimento de cargos públicos no Brasil, está a nomeação para os cargos
classificados como “agentes políticos” que, em alguns casos, podem ser nomeados sem concurso público, desde que
essa nomeação não viole os princípios constitucionais administrativos. Vigem no Brasil as súmulas vinculantes, que,
com suporte constitucional, vinculam a administração pública em geral e visam a alcançar aos jurisdicionados a
segurança jurídica sobre posições pacíficas do STF. Há em nosso País a tradição de um parente, ocupante de cargo
político eletivo, nomear outro parente para a assunção de cargo político não eletivo, ato administrativo esse que
viola os princípios da administração pública e caracteriza o nepotismo. A súmula Vinculante n. 13 do Supremo
Tribunal Federal veda o nepotismo na administração pública brasileira. Os tribunais pátrios, firmados em um
suposto entendimento do Supremo, têm julgado que a Súmula Vinculante n. 13 não se aplicaria aos agentes
políticos, linha essa que, se bem vista, não representa a posição da Corte Maior Brasileira. O Supremo Tribunal
Federal omitiu­se, e vem se omitindo, a respeito da inclusão expressa dos agentes políticos no texto da súmula
vinculante, lacuna casual (ou seria casuística?) que tem causado enorme insegurança jurídica e tem avalizado atos
de improbidade por todo o país.
Palavras­chave: Súmula Vinculante n. 13; Agentes Políticos; Nepotismo; omissão; Supremo Tribunal Federal
INTRODUÇÃO
O presente trabalho é um exame contemporâneo sobre a Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal, voltado à análise
sobre aplicação deste enunciado aos chamados agentes políticos.
Os estudos que originaram o presente artigo foram realizados no segundo semestre do ano de 2013, de modo que o arrazoado retrata a
realidade do tema nessa época e, por consequência, tem suporte nas decisões dos Tribunais sobre a matéria publicados até o final desse
1
ano .
Por todo o Brasil têm se disseminado decisões que tomam a Súmula Vinculante nº 13 com não aplicável aos agentes políticos, sob o
argumento de que o Supremo Tribunal Federal assim tem entendido. Desse modo, o intuito do presente estudo é analisar se de fato esse é
o entendimento da Corte Maior sobre a matéria e, em um segundo momento, tecer uma análise crítica sobre o tema.
Não se trata de uma análise profunda doutrinária sobre os temas pertinentes. O foco principal, como dito, é a observância contextual das
principais decisões que dão suporte aos julgamentos sobre a não aplicação da Súmula e a realização de uma análise crítica sobre o
assunto.
O estudo está dividido em seis capítulos, tratando o primeiro sobre a forma de provimento dos servidores públicos (lato sensu); o segundo
das súmulas vinculantes; o terceiro da Súmula Vinculante nº 13 e decisões concernentes; o quarto do nepotismo e da violação aos
princípios da administração pública; o quinto da Súmula Vinculante nº 13 e os agentes políticos na visão do Supremo Tribunal Federal e
o sexto da Súmula Vinculante nº 13 ­ uma análise crítica.
Essas são as ponderações iniciais.
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1 DOS SERVIDORES PÚBLICOS (LATO SENSU) E DAS FORMAS DE PROVIMENTOS
Os servidores públicos (lato sensu) são tratados pela Constituição Federal no Título III, Capítulo VII, este que trata da Administração
Pública, com redação dada pela Emenda Constitucional 19/98.
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Nesse Capítulo, o art. 37, após fixar em seu caput os princípios basilares da Administração Pública , disciplina em seu inciso I que “os
cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos
estrangeiros, na forma da lei”. Logo em seguida, no inciso II, consta que:
a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia
em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a
natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre
nomeação e exoneração;
Essa distinção inicial já permite a diferenciação entre cargo, emprego e função pública, de modo que somente os dois primeiros é que
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são providos por meio de concurso público .
Adiante, ainda no mesmo art. 37, a Constituição estabelece como são providas as funções públicas, dividindo­as em funções de confiança
e os cargos em comissão ou de contratação por tempo determinado:
V ­ as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores
ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos
por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos
previstos em lei, destinam­se apenas às atribuições de direção, chefia e
assessoramento. (…) IX ­ a lei estabelecerá os casos de contratação por
tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional
interesse público.
Ainda nesse dispositivo, ao tratar da remuneração e do subsídio, em uma redação ali inserida pela Emenda 41/03, há na Constituição
Federal a menção a uma outra categoria, a dos agentes políticos:
XI ­ a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e
empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional,
dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e
dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie
remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens
pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio
mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal,
aplicando­se como li­mite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos
Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito
do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no
âmbito do Poder Legislativo e o sub­sídio dos Desembargadores do
Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos
por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tri­
bunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos
membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores
Públicos. (grifou­se)
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Então, em uma interpretação lógica do texto constitucional, afora outras categorias de menos importância para o presente trabalho ,
temos os cargos e empregos públicos, as funções de confiança e em comissão, os servidores temporários e os agentes políticos.
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Nessa classificação, no que ora interessa, Celso Antônio Bandeira de Mello traz uma respeitada concepção agentes políticos:
Agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização
política do país, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço
constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se
constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes
políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e
respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes do Executivo, isto é,
Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores,
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Deputados Federais e estaduais e os vereadores.
Ainda sobre o quem são os agentes políticos, a doutrina de Maria Sylvia Zanella Di Pietro é esclarecedora:
São, portanto, agentes políticos, no direito brasileiro, por que exercem
típicas atividades de governo e exercem mandato, para o qual são eleitos,
apenas os Chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e municipal, os
Ministros e Secretários de Estado, além de Senadores, Deputados e
Vereadores. A forma de investidura é a eleição, salvo para os Ministros e
Secretários, que são de livre escolha do Chefe do Executivo e providos em
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cargos públicos, mediante nomeação.
Dessa forma, quanto a forma de provimento, em suma: os cargos e empregos públicos são ocupados mediante concurso público; as
funções públicas podem ser preenchidas sem concurso público no caso de função em comissão; e os agentes políticos podem alcançar o
cargo por meio de eleição ou, em alguns casos, por livre nomeação do eleito.
2 SÚMULAS VINCULANTES
O Título IV da Constituição Federal trata “da organização dos poderes” no Brasil. No Capítulo III desse Título, onde é regulado o “Poder
Judiciário”, na sua Seção II, que estrutura o STF, foi acrescido no ano de 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45, o artigo 103­
A, que criou em nosso país a chamada Súmula do STF com efeito vinculante.
Uma vez criadas, as súmulas vinculantes ficaram adormecidas desde a sua criação, em 2004, até o ano de 2006, quando o instituto foi
regulado pela Lei Federal Ordinária nº 11.417, de 20 de dezembro daquele ano. Essa Lei, em onze artigos, regulamentou a matéria, fixou
os limites da edição das súmulas vinculantes e reafirmou a abrangência traçada pela Constituição Federal.
Após essa regulamentação ter passado a viger, a questão ainda ficou fora de cena por mais alguns meses, até que na sessão plenária do
Supremo Tribunal Federal realizada em 30 de maio de 2007 foram editadas as primeiras três súmulas vinculantes.
A Súmula Vinculante nº 13, objeto de estudo do presente trabalho, foi proposta na sessão de 20 de agosto de 2008 e aprovada no dia
seguinte, na sessão plenária que ocorreu em 21 de agosto de 2008.
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Nesses termos , havendo a regular tramitação, as súmulas vinculantes, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terão efeito
vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e
municipal, bem como podem ser revistas ou canceladas, na forma prevista nessa Lei.
Considerando esse pilar constitucional e legislativo, essa vinculação que passa a existir com a publicação da súmula vinculante somente
desaparece na hipótese de haver a revisão ou cancelamento de seu enunciado.
Outra observação necessária é no sentido de que o art. 103­A da Constituição dispõe que essas súmulas, após seu regular trâmite, tem
efeito vinculante “em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal,
estadual e municipal”, cabendo ao Supremo “proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”.
A interpretação desse ponto do caput leva nitidamente a não vinculação do próprio STF. Essa desvinculação, parece certo, está
vinculada ao fato de que como esse Tribunal Superior, por decisão tomada por 2/3 (dois terços) dos seus membros, tem o poder de
editar, revisar e cancelar o enunciado das súmulas vinculantes, em virtude de que não estaria vinculado ao texto em vigor.
Nada obstante a isso, em um raciocínio lógico, o STF não está autorizado a descumprir pura e simplesmente as suas súmulas vinculantes.
Como compete a esse Tribunal editar, revisar e cancelar essas súmula, caso haja alguma desconformidade no texto com o entendimento
predominante na Corte deveria, em tese, haver a revisão com o quorum necessário.
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3 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 E DECISÕES CONCERNENTES
Antes da edição da Súmula Vinculante em estudo, o nepotismo foi tratado em várias oportunidades pelo Supremo Tribunal Federal.
Dentre as decisões que antecederam a Súmula Vinculante nº 13, está o Mandado de Segurança ­ MS nº 23.780­5, impetrado por
Terezinha de Jesus Cunha Belfort contra o Plenário do Tribunal de Contas da União ­ TCU e o Juiz Presidente do Tribunal Regional do
Trabalho da 16ª Região. Por meio dessa ação constitucional, a autora visava a anular ato que a exonerou de cargo em comissão e,
consequentemente, objetivava a sua reintegração.
A impetrante, servidora pública da Secretaria Estadual da Educação do Estado do Maranhão, havia sido colocada a disposição do
Tribunal de Regional do Trabalho – TRF da 16ª Região em 1989 e, desde então, vinha exercendo cargos de confiança naquele TRF. A
última nomeação da aludida servidora ocorreu em 13.10.1994, e o ato que a nomeou foi tido como ilegal pelo TCU, já que Terezinha é
irmã do então vice­presidente do aludido Tribunal, Fernando José Cunha Belfort.
O MS teve como relator o Ministro Joaquim Barbosa e culminou na seguinte ementa, publicada em 3.3.2006:
MANDADO DE SEGURANÇA. NEPOTISMO. CARGO EM COMISSÃO.
IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA.
Servidora pública da Secretaria de Educação nomeada para o cargo em
comissão do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região à época em que o
vice­presidente do Tribunal era parente seu. Impossibilidade. A proibição
do preenchimento de cargos em comissão por cônjuges e parentes de
servidores públicos é medida que homenageia e concretiza o princípio da
moralidade administrativa, o qual deve nortear toda a Administração
Pública, em qualquer esfera de poder. Mandado de Segurança denegado.
(STF – MS 23.780­5 ­ Maranhão)
O foco das discussões do Supremo nesse caso foi no rumo de que as orientações do Tribunal de Contas da União – TCU que obstavam as
nomeações em órgãos da justiça trabalhista para “cargos em comissão, de cônjuges ou parentes consanguíneos ou afins, até o terceiro
grau, de juízes em atividade ou aposentados há menos de cinco anos, exceto em se tratando de servidor titular de cargo público de
provimento efetivo de juízo ou tribunal” eram legítimas, de modo que o mandamus foi denegado.
Nesses casos específicos, dos TRTs, as leis ordinárias que criaram esses tribunais previam a vedação dessas nomeações. Havia dispositivo
legal vendando essa prática. O foco do STF, na oportunidade, foi então o de afastar os argumentos de que o TCU não seria apto a
considerar ilegal nomeações de servidores a cargos comissionados e de confiança nos TRFs que caracterizassem nepotismo.
Porém, em outros casos não havia legislação própria vedando a nomeação de parentes. É o caso da nomeação de parentes para funções
em comissão e para agentes políticos empossados por livre nomeação (cargos não eletivos).
Em virtude disso, veio a tona a linha de que seria necessária a edição de lei ordinária que tratasse e regulasse esse tema, de modo que,
segundo essas teses, somente após a edição de uma lei nesse sentido é que se poderia, eventualmente, considerar ilegal essas nomeações.
Nesse contexto, chegou ao STF Ação Direta de Constitucionalidade ­ ADC nº 12, que teve como relator o então Ministro Carlos Ayres
Britto. Essa causa foi proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil ­ AMB, em prol da Resolução nº 07/2005, do Conselho
Nacional de Justiça. Tal resolução, por sua vez, "disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e
companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder
8
Judiciário e dá outras providências”. O julgamento desta Ação ocorreu na Sessão Plenária de 20.8.2008 e foi no sentido de o Supremo,
por unanimidade, julgar procedente a ação declaratória de constitucionalidade e, por maioria, emprestar interpretação conforme a
Constituição para deduzir a função de chefia do substantivo “direção”, constante dos incisos II, III, IV e V do artigo 2º da Resolução nº
9
07, de 18/10/2005, do Conselho Nacional de Justiça .
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Na mesma sessão, foi julgado o RE nº 579.951, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte o qual,
confirmando decisão de primeiro grau proferida em ação civil pública declaratória de nulidade de ato administrativo, entendeu não
existir inconstitucionalidade ou ilegalidade na nomeação de Elias Raimundo de Souza e Francisco Souza do Nascimento para o
exercício, respectivamente, dos cargos em comissão de secretário municipal da saúde e de motorista, embora fossem há época,
respectivamente, o primeiro, irmão de vereador, e, o segundo, do Vice­Prefeito do Município de Água Nova/RN.
Nesse caso, divergindo do primeiro e segundo graus do Rio Grande do Norte, o STF afastou a tese de que seria necessária legislação
ordinária que regulasse a matéria, estabelecendo que a vedação de tais nomeações violavam diretamente o caput do art. 37 da
Constituição Federal, que é autoaplicável.
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O julgamento, que, como dito, ocorreu em 20.8.2008 , teve a seguinte ementa:
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ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VEDAÇÃO NEPOTISMO. NECESSIDADE
DE LEI FORMAL. INEXIGIBILIDADE. PROIBIÇÃO QUE DECORRE DO
ART. 37, CAPUT, DA CF. RE PROVIDO EM PARTE. I ­ Embora restrita ao
âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça,
a prática do nepotismo nos demais Poderes é ilícita. II ­ A vedação do
nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática. III ­
Proibição que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37,
caput, da Constituição Federal. IV ­ Precedentes. V ­ RE conhecido e
parcialmente provido para anular a nomeação do servidor, aparentado com
agente político, ocupante, de cargo em comissão. (STF ­ RE nº 579.951)
Assim, o STF nesse caso espancou a tese de que haveria a necessidade de edição legislativa que vedasse o nepotismo.
Porém, o Supremo, nesse Recurso, decidiu também que seria o caso de afastar tão­somente Francisco Souza do Nascimento do exercício
motorista, mantendo no cargo de secretário municipal da saúde a pessoa de Elias Raimundo de Souza.
Tal deslinde teve origem no voto do Ministro Marco Aurélio, que divergindo inicialmente do relator Ricardo Lewandowski, trouxe ao
plenário a discussão sobre aplicar­se ou não a vedação do nepotismo aos cargos políticos de livre nomeação.
Em virtude disso, a corte traçou uma distinção entre cargos e funções singelamente administrativas e cargos políticos:
Então, quando o artigo 37 refere­se a cargo em comissão e função de
confiança, está tratando de cargos e funções singelamente administrativos,
não de cargos políticos. Portanto, os cargos políticos estariam fora do
alcance da decisão que tomamos na ADC 12, porque o próprio Capítulo VII
é Da Administração Pública enquanto segmento do Poder Executivo. E
sabemos que os cargos políticos, como, por exemplo, os de Secretário
Municipal, são de agentes de Poder, fazem parte do Poder Executivo. O
cargo não é em comissão, no sentido do artigo 37. Somente os cargos e
funções singelamente administrativos – é como penso – são alcançados
plea imperiosidade do artigo 37, com seus lapidares princípios. Então, essa
distinção me parece importante para, no caso, excluir do âmbito da nossa
decisão anterior os Secretários Municipais, que correspondem a Secretários
de Estado, no âmbito dos Estados, e Ministros de Estados no âmbito
federal. (Ministro Carlos Britto, inteiro teor do RE 579.951/RN, pg. 11)
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Essa distinção foi consensual na Corte e resultou na exoneração somente do irmão motorista, que ocuparia cargo não político .
Dessa forma, em uma única sessão, o STF julgou a ADC nº 12 e o RE 579.951/RN, que são dois dos parâmetros para a formulação da
Súmula em estudo.
Foi ainda mais além o Supremo. Na mesma sessão plenária ordinária de 20.8.2008, em um momento histórico em que a Súmula
13
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Vinculante já existia em nosso País , o Ministro Ricardo Lewandowski, baseado, dentre outras decisões a respeito , no Mandado de
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Segurança – MS nº 23.780­5 , na Ação Declaratória de Constitucionalidade ­ ADC nº 12 e no Recurso Extraordinário ­ RE nº 579.951,
encaminhou proposta inicial de súmula vinculante ao plenário do STF, com o seguinte enunciado:
A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade até o terceiro grau, inclusive, da autoridade
nomeante ou de servidor do mesmo Órgão investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em
comissão ou de confiança ou ainda de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendendo ajuste mediante designações recíprocas, viola o art. 37, caput, da
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Constituição Federal.
Na sessão do dia seguinte, de 21.8.2008, o texto foi discutido e aprovado, nesses moldes:
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A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral
ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou
de servidor da mesma Pessoa Jurídica investido em cargo de direção, chefia
ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança
ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta
em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola
a Constituição Federal.
Como se percebe da comparação entre a proposta e a redação aprovada, o debate entre os ministros cingiu­se a substituição dos termos
“mesmo Órgão” e “viola o art. 37, caput, da Constituição Federal”, por, respectivamente, “mesma Pessoa Jurídica” e “viola a Constituição
Federal”, além de realizar alguns ajustes quanto a pontuação.
Assim, em dois dias seguidos de trabalho, o STF, na sequência, analisou a ADC nº 12, o RE 579.951/RN e o texto da Súmula Vinculante
nº 13.
Tal análise cronológica e contextual leva a uma conclusão inafastável a respeito da redação da Súmula Vinculante em pauta. A não
inclusão expressa dos “agentes políticos” no corpo da súmula não passou desapercebida pelo crivo dos ministros.
Partindo desse ponto, cabe se tentar chegar a uma segunda premissa, bem mais difícil. Observar se o fato de não haver a expressão
“agentes políticos” no corpo da Súmula significa que: seu texto aplica­se a todos os cargos de provimento sem concurso público, sem
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qualquer exceção; não se aplica aos agentes políticos de uma maneira geral ou se, em uma terceira hipótese, houve uma intencional
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omissão para que cada caso concreto pudesse ser analisado .
Essa análise se torna bastante dificultosa porque as discussões que, propriamente ditas, culminaram na aprovação da Súmula
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Vinculante nº 13 não trataram da inclusão ou não do termo “agente político” no texto da súmula .
Em face disso, a interpretação do intuito do Supremo em relação à matéria pauta­se basicamente análise das discussões ocorridas no
julgamento do RE 579.951/RN e em decisões posteriores à vigência da súmula.
Essa matéria ainda é nebulosa no STF.
Atualmente o Supremo vem interpretando sua própria súmula, ora em um sentido ora em outro.
No julgamento do RE 579.951/RN não houve consenso entre os Ministros sobre se, objetivamente, o nepotismo não se aplica aos cargos
políticos ou se, no entender da corte não se aplicaria de plano, mas seria necessária a análise caso de cada caso concreto.
Após, foi julgada pelo STF em 2008 a Reclamação 6.650­9/PR, proposta por Eduardo Requião de Melo e Silva contra decisão do juiz da
1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, que, nos autos de uma ação popular, suspendeu sua nomeação para o cargo de secretário
estadual de transportes.
O fundamento do juízo de primeira instância para o afastamento foi no sentido de que dita nomeação iria de encontro à Súmula
Vinculante nº 13, pois Eduardo é irmão do então governador do Paraná, Roberto Requião de Mello e Silva.
O Ministro Cesar Peluso deferiu a liminar pleiteada, determinando a suspensão da decisão impugnada, fazendo menção genérica ao
julgamento do RE 579.951/RN, referindo­se que nesse decisum a Corte teria se posicionado no sentido de que a Súmula não se aplica aos
agentes políticos de livre nomeação.
Da decisão liminar, foi interposto Agravo Regimental, que teve como relatora a então Ministra Ellen Gracie. O agravo foi improvido, por
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maioria , sob o argumento de que a súmula não se aplicaria ao agente político secretário de estado:
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AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR EM RECLAMAÇÃO.
NOMEAÇÃO DE IRMÃO DE GOVERNADOR DE ESTADO. CARGO DE
SECRETÁRIO DE ESTADO. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE Nº 13.
INAPLICABILIDADE AO CASO. CARGO DE NATUREZA POLÍTICA.
AGENTE POLÍTICO. ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO
DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 579.951/RN. OCORRÊNCIA DA
FUMAÇA~DO BOM DIREITO. 1. Impossibilidade de submissão do
reclamente Secretário Estadual de Transporte, agente político, às hipóteses
expressamente elencadas na Súmula Vinculante nº 13, por se tratar de
cargo de natureza política. 2. Existência de precedente do Plenário do
Tribunal: RE 579.951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 12.9.2008.
3. Ocorrência de fumaça do bom direito. 4. Ausência de sentido em relação
às alegações externadas pelo agravante quanto à conduta do prolator da
decisão agravada. 5. Existência de equívoco lamentável, ante a
impossibilidade lógica de uma decisão devidamente assinada por Ministro
desta Casa ter sido enviada, por fac­simile, ao advogado do reclamante, em
data anterior à sua própria assinatura. 6. Agravo regimental improvido.
(STF – Ag.Reg.6.650­9/PR)
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O mérito da reclamação ainda não foi julgado .
Na sequência, ainda no ano de 2008, outra Reclamação chegou ao Supremo, a de número 6.702­5/PR.
Essa reclamação também foi ajuizada contra ato decisório do Juiz de Direito da 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, atacando
decisão deste, em sede de ação popular, que manteve, no início daquela ação, a posse de Maurício Requião de Mello e Silva, também
irmão do então Governador Roberto Requião de Mello e Silva, no cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná, para o qual foi
nomeado por decreto firmado pelo próprio Governador.
O pedido liminar foi indeferido pelo Ministro Relator Ricardo Lewandowski, que, na fundamentação fez menção genérica ao julgamento
do RE 579.951/RN, referindo que naquele foi formada a distinção entre cargo estritamente administrativo e cargo político, não chegando
a afirmar expressamente que a súmula pura e simplesmente não se aplicaria aos agentes políticos.
Dessa decisão que indeferiu a liminar, também foi interposto no Supremo Agravo Regimental, que foi provido sob o argumento, também
do relator Ricardo Lewandowski, de que os conselheiros do Tribunal de Contas não são agentes políticos e que, naquele caso concreto, “o
processo de nomeação de Maurício Requião de Mello e Silva, ao menos em primeira análise dos autos, sugere a ocorrência de vícios que
maculam a sua escolha por parte da Assembleia Legislativa do Estado” (Rcl 6.702­MC­AgR/PR – inteiro teor – pg. 8).
Na sequência o Juízo curitibano reclamado prolatou decisão de mérito e julgou parcialmente procedente a ação popular para declarar a
nulidade do Decreto Estadual 3.044/2008 “pelo qual o segundo requerido foi nomeado antes mesmo da existência de vaga para o cargo
de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado”, fato esse que culminou na perda superveniente de objeto da reclamação.
Adiante, já no ano de 2011, foi proposta no STF a Reclamação 12.478/RJ, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro
contra nomeação de Lenine Rodrigues de Lima, para o cargo de Secretário de Educação daquela municipalidade, já que este é irmão do
então Prefeito do Município de Queimados/RJ, Max Rodrigues Lemos. O reclamante sustentou que “a redação atual da Súmula
Vinculante 13 não reconhece exceções relacionadas à nomeação de parentes para cargos de natureza política”. O relator, Ministro
Joaquim Barbosa, deferiu a cautelar para determinar o afastamento do irmão do Prefeito do cargo de Secretário da Educação daquele
Município, asseverando que:
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Assim, em linha com o afirmado pelo reclamante, tenho que os acórdãos
proferidos por este Supremo Tribunal Federal no RE 579.951 e na medida
cautelar na Rcl 6.650 não podem ser considerados representativos da
jurisprudência desta Corte e tampouco podem ser tomados como
reconhecimento definitivo da exceção à Súmula Vinculante 13 pretendida
pelo município reclamado. Bem vistas as coisas, o fato é que a
redação do verbete não prevê a exceção mencionada e esta, se
vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da
situação concreta descrita nos autos, (…) (o grifo não consta no
original)
Essas são as principais decisões que circundam a súmula vinculante e sua aplicação aos agentes políticos.
4 DO NEPOTISMO E DA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Traçado o caminho até a Súmula Vinculante nº 13, necessárias algumas colocações sobre nepotismo e suas consequências no âmbito
constitucional.
O nepotismo foi muito bem definido pelo Ministro Ricardo Lewandowski no seu voto de relatoria do RE 579.951, antes mencionado.
Segundo ele:
do ponto de vista etimológico, a palavra nepostismo tem origem no latim,
derivando da conjugação do termo nepote, significando sobrinho ou
protegido, com o sufixo “ismo”, que remete à ideia de ato, prática ou
resultado. A utilização desse termo, historicamente, advém da autoridade
exercida pelos sobrinhos e outros aparentado dos Papas na administração
eclesiástica, nos séculos XV e XVI de nossa era, ganhando, atualmente, o
significado pejorativo do favorecimento de parentes por parte de alguém
que exerce o poder na esfera pública ou privada.
Essa conceituação, sucinta, reflete com precisão o que é o nepotismo.
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, em seu dicionário, confirma o significado desse vocábulo: S. m. [Substantivo masculino] 1.
22
Autoridade que os sobrinhos e outros parentes do Papa exerciam na administração eclesiástica. 2. Favoritismo, patronato”
Então, em poucas palavras, nepotismo no setor público é o favorecimento, por meio de contratação sem concurso público, de parentes
por parte de alguém que exerce o poder.
A administração pública é exercida por pessoas físicas que, a frente de entes governamentais em diferentes esferas estatais, tomam as
decisões sobre qual rumo os negócios públicos tomarão, qual caminho será dado ao dinheiro público administrado e quais setores da
comunidade receberão mais ou menos recursos.
Como essas pessoas físicas não manejam recursos próprios, mas valores alheios/públicos, a Constituição Federal traçou rumos a serem
perseguidos pelos administradores.
Os princípios basilares a serem seguidos pelo administrador público são os da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade
e eficiência e, também, ao seguinte: (…) (Constituição Federal) (o grifo
não consta no original)
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Esse suporte principiológico não é exaustivo, mas representa o principal pilar para uma administração honesta e de qualidade.
O intuito do constituinte com essas determinações foi apenas positivar orientações que já devem (ou deveriam) estar no intelecto do
administrador público, de modo que as decisões, em atos administrativos vinculados, e principalmente nos discricionários, têm sempre
que visar ao melhor para a administração.
Em palavras de Affonso Ghizzo Neto:
(…), a atuação do administrador público em todas as searas publicas, deve
se pautar pelo fiel cumprimento dos princípios constitucionais, concedendo
especial atenção a eficiência, transparência e moralidade, absolutamente
necessárias para adequação do Estado Contemporâneo a complexidade
23
social. 24
Nesse contexto, a prática do nepotismo fere principalmente três desses princípios, quais sejam, o princípio da impessoalidade, de
legalidade e o da moralidade.
A doutrina de Odete Medauar esclarece o que é o princípio da impessoalidade:
Com o principio da impessoalidade a Constituição visa obstaculizar
atuações geradas por antipatias, simpatias, objetivos de vingança,
represálias, nepotismo, favorecimentos diversos, muito comuns em
licitações, concursos públicos, exercício do Poder de polícia. Busca, desse
modo, que predomine o sentido de função, isto é, a idéia de que o poderes
atribuídos finalizam­se ao interesse de toda coletividade ou difusos, a
impessoalidade significa a exigência de ponderação equilibrada de todos os
interesses envolvidos, para que não se editem decisões movidas por
25
preconceitos ou radicalismos de qualquer tipo. Em uma outra linha, o doutrinador constitucionalista José Afonso da Silva coloca que:
O princípio ou regra da impessoalidade da Administração Pública significa
que os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao
funcionário que os pratica mas ao órgão ou entidade administrativa em
nome do qual age o funcionário. Este é um mero agente da Administração
Pública, de sorte que não é ele o autor institucional do ato. Ele é apenas o
órgão que formalmente manifesta a vontade estatal. Por conseguinte, o
administrado não se confronta com o funcionário x ou y que expediu o ato,
mas com a entidade cuja vontade foi manifestada por ele. É que a 'primeira
regra do estilo administrativo é a objetividade', que está em estreita relação
com a impessoalidade. Logo, as realizações administrativo­governamentais
não são do funcionário ou autoridade, mas da entidade pública em nome de
26
quem as produzira. (...) Assim, em suma, os atos praticados pelos administradores têm que estar vinculados aos interesses da Pessoa Jurídica de Direito Público a
qual estão vinculados e não aos objetivos pessoais do administrador.
Já o princípio da moralidade está intimamente ligado ao da legalidade.
Hely Lopes Meirelles traça um clássico conceito sobre a legalidade administrativa:
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A legalidade, como princípio da administração (CF, art. 37, caput), significa
que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito
aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode
afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor­se a
responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. (…) Na
administração pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na
administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na
Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o
particular significa 'pode fazer assim'; para o administrador público
27
significa 'deve fazer assim'. Esse autor bem sintetizou em sua obra o que se deve entender pelo princípio da moralidade administrativa. No seu entender o agente
administrativo:
[...] não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto,
o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também
sobre o honesto e o desonesto. Por considerações de Direito e de Moral, o
ato administrativo não terá que obedecer somente a lei jurídica, mas
também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é
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honesto, […] Nesse aspecto, os atos administrativos devem seguir os ditames legais e morais.
Da conciliação desse três princípios é possível afirmar que as decisões e o rumo dado aos negócios da administração nunca devem visar a
beneficiar de qualquer forma o patrimônio ou a pessoa do administrador, ou de qualquer outra pessoa física ou jurídica ligada a este.
O beneficiamento pessoal indireto proporcionado pelo nepotismo atenta no mínimo contra três dos princípios da administração pública.
Essas colocações objetivas a respeito dos princípios feridos pelos atos que caracterizam nepotismo são suficientes para o entendimento do
tema. Em suma, o ato do administrador público, titular de cargo político eletivo, que nomeia parentes para ocupar cargos de provimento
sem concurso público, nitidamente viola esse tripé de princípios.
5 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 E OS AGENTES POLÍTICOS NA VISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL
O Supremo criou jurisprudência que polemizou a Súmula Vinculante nº 13 antes mesmo de criá­la.
Como visto, no julgamento do RE 579.951/RN o Supremo Tribunal Federal trouxe à baila a distinção entre cargos singelamente
administrativas e cargos políticos, e, firmado nessa classificação, decidiu que, naquele caso, não haveria nepotismo na nomeação ao
cargo de secretário, e haveria em relação ao cargo de motorista.
Na sequência, após a vigência da Súmula, o Supremo analisou as Reclamações 6.650­9/PR e 6.702­5/PR, nas quais decidiu que a
súmula não se aplicaria aos agentes políticos.
Tais decisões, levaram os Tribunais de nosso país a passarem a decidir que simplesmente que a Súmula Vinculante não se aplica aos
agentes políticos.
Como exemplo, tem­se essa recente decisão do Tribunal de Justiça Catarinense:
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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL ­ NEPOTISMO
NO ÂMBITO DO MUNICÍPIO DE SANGÃO ­ EXISTÊNCIA DE
OBSCURIDADE NO CONTEÚDO DO JULGADO ­ EIVA SANADA NO
TOCANTE À OBRIGAÇÃO DE FAZER NEGATIVA PLEITEADA ­
ADEQUAÇÃO DA PROIBIÇÃO DE CONTRATAÇÕES FUTURAS AO
INTEIRO TEOR DA SÚMULA VINCULANTE N. 13 DO STF ­
EXCEPCIONADA A SUBSUNÇÃO AOS CARGOS DE AGENTES
POLÍTICOS E CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS COM REALIZAÇÃO
PRÉVIA DE TESTE SELETIVO ­ RESSALVA QUE SE COADUNA COM A
ESSÊNCIA DO ACÓRDÃO E DA ORIENTAÇÃO PRETORIANA ASSENTE ­
RECURSO PROVIDO NESTES TERMOS. À luz de precedentes da Suprema
Corte e deste Sodalício, a nomeação de parentes até o terceiro grau, como,
no caso, de companheira, para o cargo de Secretária Municipal, por ser de
natureza axialmente política, não ofende a Súmula Vinculante n. 13,razão
pela qual não se há de conjecturar de nepotismo". (Apelação Cível n.
2009.073524­1, de Campos Novos, rel. Des. João Henrique Blasi, j.
22.08.2011). "Os princípios da impessoalidade e da moralidade
administrativa (CR, art. 37, caput), que servem de fundamento à vedação
do 'nepotismo', não impedem a contratação por prazo temporário de
candidato aprovado em teste seletivo". (Apelação Cível em Mandado de
Segurança n. 2008.059691­4, de São José, rel. Des. Newton Trisotto, j.
17.02.2009). Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos de
Declaração em Apelação Cível n. 2008.072798­0/0001.00, da comarca de
Jaguaruna (Vara Única), em que é embargante Representante do
Ministério Público, e embargado Município de Sangão: A Segunda Câmara
de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar provimento aos
embargos declaratórios, apenas para extirpar a obscuridade apontada no
julgado, adequando a obrigação de fazer negativa pretendida pelo Parquet
ao teor da Súmula Vinculante n. 13 do STF. Custas na forma da lei. O
julgamento, realizado no dia 15 de outubro de 2013, foi presidido pelo
Excelentíssimo Senhor Desembargador Nelson Schaefer Martins, com voto,
e dele participou o Excelentíssimo Senhor Desembargador João Henrique
Blasi.(Embargos de Declaração em Apelação Cível n. 2008.072798­
0/0001.00, de Jaguaruna. Rel.: Des. Cid Goulart. J. 15.10.2013 ­ o grifo não
consta no original)
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tem decido da mesma maneira:
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AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. LIMINAR.
NOMEAÇÃO DA ESPOSA DO PREFEITO PARA O CARGO DE
SECRETÁRIA MUNICIPAL. AGENTEPOLÍTICO. INSUBMISSÃO A
SÚMULA VINCULANTE 13 DO STF. Não se submete às hipóteses da
Súmula Vinculante 13, a nomeação de agente político, assim entendido o
cargo de Secretário de Estado, segundo compreensão conferida pelo
próprio Supremo Tribunal Federal. Entendimento seguido pelo STJ e por
este Tribunal. Inexistência de ilegalidade na nomeação da esposa do
Prefeito para o desempenho do cargo de Secretária da Mulher, tendo em
vista se tratar de cargo político. Agravo provido. (TJPR ­ Agravo de
Instrumento Nº 70056422900, Rel.: Marco Aurélio Heinz. J. 30/10/2013)
O Tribunal de Justiça do Paraná, também tem seguido o mesmo caminho:
APELAÇÃO CÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO
DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ADMINISTRATIVA.
PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR OFENSA
AO PRINCÍPIO DA AFASTADA. ESPOSA DIALETICIDADE AFASTADA.
NOMEAÇÃO DE ESPOSA DE PREFEITO MUNICIPAL PARA A
OCUPAÇÃO DE CARGO DE RIA SECRETÁRI SECRETÁRIA. EPOTISMO.
NEPOTISMO. INOCORRÊNCIA. INOCORRÊNCIA. CARGO DE
POLÍTICA. NATUREZA POLÍTICA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 13
DO ADMINISTRATIVA. STF E DA LEI DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. PRECENTES REFORMADA. RECURSO
JURISPRUDENCIAIS. DECISÃO REFORMADA. RECURSO DE
APELAÇÃO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO. (TJPR ­
APELAÇÃO CÍVEL Nº 878.646, Rel: DES.ª MARIA APARECIDA BLANCO
DE LIMA. J. 09/04/2013)
Assim, tomando­se como exemplo apenas três decisões, uma de cada Estado da região sul do País, é possível o entendimento do rumo
tomado pela jurisprudência em decorrência das decisões pautadas que estão diretamente vinculadas à Súmula Vinculante nº 13.
Como dito, é de se observar que todas essas decisões fazem menção que a Súmula Vinculante não se aplica aos agentes políticos, sob o
argumento de que assim o STF, interpretando sua própria súmula, teria já se posicionado.
Porém, ao contrário do que foi disseminado, esse “entendimento” do STF sobre sua Súmula não é simplesmente de que esta não se
aplicaria aos agentes políticos.
Não há consenso entre os ministros sobre a aplicação ou não desta aos agentes políticos.
Há manifestação do Ministro Marco Aurélio, em um primeiro momento, no sentido de que, simplesmente, não existiria nepotismo na
nomeação de agentes políticos não eletivos:
Desprovejo­o quanto ao secretário de saúde. Entendo que não podemos, a
partir do disposto na cabeça do art. 37 da Constituição Federal, glosar a
escolha. (…) Não adentro o que seria a promiscuidade
Executivo/Legislativo. Fico apenas na tese segundo a qual não cabe a glosa,
o provimento quanto ao agente político. (RE 579.951/RN, inteiro teor, pg.
10)
Esse mesmo Ministro, em outra oportunidade, após a edição da Súmula, manifestou­se no sentido de que não há exceção à súmula:
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Indago: o Verbete vinculante nº 13 prevê – não cabe interpretar verbete,
muito menos a contrario senso e vou esquecer aqui o precedente, a
ocupação de cargo público anterior – a possibilidade de nomeação de
parente consangüíneo, no segundo grau, para secretaria de Estado? A
resposta é negativa. Não se tem, no teor do verbete, qualquer referência a
agente político. Aliás versa proibição e não autorização. (Rcl 6.650­MC­
AgR/PR, inteiro teor, pg. 296)
Logo adiante, ainda no mesmo voto, Marco Aurélio afirma que a decisão de primeiro grau que determinou o afastamento do irmão do
então governador do Paraná não pode ser considerada como violadora da Súmula Vinculante, pois o RE 579.951/RN não pode ser
tomado como precedente que permite a nomeação de agente político, pois julgou aquele caso concreto, não tendo efeito vinculante.
Nesse sentido, após transcrever a Súmula Vinculante nº 13, o Ministro teceu as seguintes considerações:
Posso entender que o Juízo da ação popular, ao deferir – penso
que foi uma ação popular – a liminar que implicou o
afastamento, inobservou o teor desse verbete [da Súmula
Vinculante]? Não posso, porque cogitou de algo totalmente diverso e,
quem sabe, tenha até mesmo considerado o pano de fundo ao que me referi
e que não estou aqui a analisar. Não posso julgar simplemente, com a
queima de etapas, o ato do juízo. O que me cabe perquirir é se houve
desrespeito. Dir­se­á que essa matéria foi versada no julgamento do
Recurso Extraordinário nº 579.951, com acórdão pendente de publicação.
Mas caberia reclamação, considerando esse precedente? Não caberia,
porque o precedente foi formalizado em processo subjetivo, com muros
subjetivos próprios, e um terceiro não poderia evocar desrespeito à decisão,
nesse processo, para pretender, com isso, fulminar ato de órgão investido
no ofício judicante. De duas, uma: ou admitimos – e não sei qual será a
consequência – uma flexibilização sob o ângulo da adequação da
reclamação ou não admitimos e concluímos, cotejando o Verbete nº 13 com
a decisão que diz desrespeitosa desse mesmo verbete, que não houve
menosprezo. Presidente, porque não posso empolgar o que assentado no
Recurso Extraordinário nº 579.951 visando a ter base para a
reclamação, já que se trata de processo subjetivo e porque o
Verbete nº 13 não versa – e teria que versar expressamente – a
possibilidade da nomeação verificada, peço vênia à relatora e àqueles
que a acompanharam para provar o agravo interposto. (Rcl 6.650­MC­
AgR/PR, inteiro teor, pg. 296­297) (o grifo não consta no original)
No final, como se percebe do grifo, o Ministro novamente reforça que não há previsão expressa no sentido de que a nomeação de agente
político estaria autorizada pelo verbete da súmula em evidência, e por isso, entende que a nomeação do agente político em questão fere a
súmula, de modo que, em seu voto vencido, deu provimento ao agravo no sentido de determinar o afastamento do agente político de livre
nomeação, irmão do então Governador.
Constam ainda manifestações do Ministro Ricardo Lewandowski no sentido de que o RE 579.951/RN estabeleceu que a nomeação para
um cargo político pode caracterizar nepotismo, a depender da análise de cada caso concreto:
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“Essa questão [aplicabilidade da súmula aos agentes políticos] há que ser
apreciada em cada caso concreto, (…). Quer dizer, o Ministério
Público atuará em cada caso concreto e verificará se houve, ou não, ofensa
aos princípios do art. 37” (Ricardo Lewandowski, inteiro teor do RE
579.951/RN, pg. 1911) (o grifo não consta no original).
No mesmo sentido, após a vigência da súmula:
Eu me permitiria fazer uma pequena observação. Por ocasião do
julgamento do leading case que levou à edição da Súmula 13
estabeleceu­se que o fato de a nomeação ser para um cargo
político nem sempre, pelo menos a meu ver, descaracteriza o
nepotismo. É preciso examinar caso a caso para verificar se houve fraude
à lei ou nepotismo cruzado, que poderia ensejar a anulação do ato. (Rcl
6.650­MC­AgR/PR, inteiro teor, pg. 292) (o grifo não consta no original)
A então ministra Ellen Gracie manifestou­se, no ano de 2008, no sentido de que o julgamento RE 579.951/RN teria sedimentado
entendimento da Suprema Corte que “a nomeação de parentes para cargos políticos não configuraria afronta aos princípios
constitucionais que regem a administração pública, tendo em vista a natureza eminentemente política” (Rcl 6.650­MC­AgR/PR, inteiro
teor, pg. 286).
29
E há posicionamento do Ministro Joaquim Barbosa dando conta de que: “Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não
prevê a exceção mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da situação concreta descrita nos autos,
(...)”.
Isso é o que se tem dos Ministros mais antigos naquela corte.
Atualmente, há uma nova composição do Supremo, na qual muitos ministros ainda não se manifestaram sobre a matéria.
Assim, ao contrário do que se disseminou na jurisprudência, não existe posição do STF de que a Súmula Vinculante simplesmente não
se aplica aos agentes políticos.
6 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 ­ UMA ANÁLISE CRÍTICA
De plano, chama a atenção a insegurança jurídica oriunda da edição da Súmula Vinculante nº 13.
Em consequência, é gritante a falta de técnica por parte do STF na edição desse enunciado jurisprudencial tão importante.
No julgamento do RE 579.951/RN, o Supremo discutiu demoradamente a existência de nepotismo na nomeação de parentes para cargos
políticos não eletivos e, por incrível que pareça, na edição da Súmula, que iniciou seu trâmite no mesmo dia do julgamento deste
Recurso, e foi aprovada no dia seguinte, a Corte não fez menção expressa sobre a aplicação, ou não, da Súmula Vinculante nº 13 aos
agentes políticos.
Não constou da Súmula o ponto principal, já que a matéria havia sido trazida à baila no dia em que a súmula foi proposta, antes das
discussões que culminaram na aprovação do enunciado.
A técnica utilizada para a edição da Súmula em estudo deixou de considerar necessidade da segurança jurídica, diretamente
relacionada à própria existência da Súmula Vinculante. Justamente ao contrário do preceituado, os Ministros do STF – que discutiram
30
com vagar a troca de termos contidos na proposta inicial – desfocaram do nó górdio principal, deixando de enfrentar o tema derradeiro,
qual seja, a aplicação, ou não, do “normativo” aos agentes políticos.
A má técnica jurídica/normativa culminou no firmamento da jurisprudência dos demais tribunais no sentido de que a súmula
simplesmente não se aplica aos agentes políticos, considerando ser essa a posição do STF.
Porém, como firmado alhures, a análise mais detalhada leva a conclusão de que a matéria, em nível dos demais tribunais pátrios, tomou
um rumo que não condiz com o entendimento do STF. Não existe uma uniformidade de entendimento da Corte Maior a respeito da
matéria. Não há posição vinculante do Supremo a respeito da eventual não aplicação. Não é possível afirmar que o Supremo entende
que não é aplicável pura e simplesmente aos agentes políticos a Súmula Vinculante.
A omissão em relação ao termo “agentes políticos” não passou desapercebida, pois os Ministros analisaram essa matéria demoradamente
momentos antes das discussões sobre o enunciado da Súmula. Essa realidade traz a tona uma dúvida sem solução, qual seja: Os Ministros
omitiram o termo “agentes políticos” do texto da súmula a fim de que esses não fossem abrangidos pelo seu manto? Ou o fizeram visando a
que o texto não tivesse exceções de modo a ser aplicado a todos os cargos providos sem concurso público, inclusive aos agentes políticos?
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Infelizmente essa insegurança, beneficiou os interessados nas lotações de parentes em suas administrações.
No Brasil, infelizmente, se tem como costume imoralidade na administração pública. Lamentavelmente, no imaginário popular, o
político ímprobo não sofre consequências. A população, lamentavelmente, já se conformou com essa dura realidade.
A corrupção no Brasil é inclusive conhecida internacionalmente, a ponto de, em uma pesquisa realizada pela ONG Transparência
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32
33
Internacional, divulgada em novembro de 2013 , o País ter ficado com pontuação 42 e na posição número 72 , onde quando mais alta
a classificação mais alta é a corrupção medida.
Nesse cenário, o nepotismo estimula esse quadro de corrupção admitida socialmente, na medida em que as nomeações de parentes para
cargos públicos que prescindem concurso público viola os princípios constitucionais norteadores da administração pública.
Ainda nesse contexto brasileiro, uma das decisões antecederam a Súmula Vinculante nº 13, o RE 579.951/RN, trata situação nas qual
nitidamente administrador público “puxou” ao ente administrado seu parente, nomeando­o como secretário, a fim de, indo de encontro
aos princípios da administração pública, agraciá­lo com a assunção de cargo público.
Decisão posterior à Súmula, que sedimentou esse suposto entendimento do STF de que a súmula não se aplica aos agentes políticos, é no
mesmo norte. Com a decisão favorável na Reclamação 6.650­9/PR, o então Governador do Paraná Roberto Requião de Mello e Silva
legitimou a permanecer no cargo de Secretário Estadual de Transportes seu irmão Eduardo Requião de Mello.
Nitidamente, um irmão foi eleito pela população. O outro não o foi. Quando o irmão com maior poder político (que foi eleito) adentrou
nos quadros do poder público, levou junto outro de sua família, a fim de engordar os cofres daquela prole e esvaziar os cofres públicos,
tudo com aval do STF, que nesse caso permitiu tamanho ato de improbidade violador dos princípios basilares da administração pública.
Não bastasse, essa insegurança tem se estendido no tempo, já que desde o ano de 2008 a matéria vem sendo ventilada em vários casos
concretos e o Supremo não mais de manifestou sobre uma possível mudança na Súmula que deitasse pá de cal sobre seu entendimento a
respeito.
A exclusão dos agentes políticos do manto da Súmula Vinculante nº 13 ofende o comando normativo principiológico previsto no art. 37,
caput, da Constituição Federal e deve, de uma vez por todas ser enfrentada pelo STF, a fim de que os interessados deixem de se
beneficiar dessa lacuna casual (ou seria casuística?).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluídas as colocações possíveis sobre o tema, é de se ver que a matéria é controvertida no próprio Supremo Tribunal Federal, sendo
possível ainda afirmar que há uma omissão da Corte Maior do nosso País com a aplicação ou não da Súmula Vinculante aos agentes
políticos.
No início do trabalho, a impressão inicial era de que não haveria exceção à aplicação da súmula aos agentes políticos, já que não há
expressamente essa anotação no enunciado.
Já agora, em fase de conclusão, ainda não é possível a afirmação segura sobre a aplicação ou não da Súmula aos agentes políticos.
O que foi possível concluir com a segurança necessária é que a jurisprudência dos tribunais brasileiros que consideram que pura e
simplesmente a Súmula Vinculante nº 13 não se aplica aos agentes políticos tomaram rumo que, se visto a fundo, não pode ser tido como
posição do Supremo a respeito da matéria.
A insegurança jurídica tem que acabar. Já é hora de o Supremo Tribunal Federal revisar o texto da Súmula Vinculante nº 13 a fim de
fazer constar os agentes políticos no texto, incluindo­os nas restrições ou, de uma vez por todas, excluí­los expressamente da sua
aplicação.
Nessa última hipótese, já é possível antever que caso haja a revisão da Súmula no sentido de excluir expressamente os agentes políticos
do manto da Súmula essa passará a ser inconstitucional nesse ponto, já que ferirá frontalmente o autoaplicável art. 37 da Constituição
Federal.
REFERÊNCIAS
BANDEIRA DE MELO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 29. ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2012.
Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26. ed. ­ São Paulo: Atlas, 2013.
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 8ª ed. São Paulo: RT, 2004.
AFONSO DA SILVA, JOSÉ. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35 ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2012.
MEIRELES, hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 36. ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2010.
Ghizzo Neto, Affonso. Corrupcao, estado democratico de direito e educação. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
NOTAS
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Vedação ao nepotismo: agentes políticos e a omissão do STF ­ Jus Navigandi
1A futura revisão da Súmula Vinculante nº 13, por exemplo, pode eventualmente tornar sem relevância algumas colocações inseridas no
presente trabalho.
2Que serão analisados oportunamente.
3A distinção básica entre cargo público e emprego público assenta­se no fato de que o primeiro é regido por estatuto e o último é regido
pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
4Militares e os chamados por Celso Antônio Bandeira de Mello e Maria Sylvia Zanella Di Pietro de “particulares em colaboração com o
Poder Público”.
5BANDEIRA DE MELO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 29. ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2012, pg. 251­252.
6Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26. ed. ­ São Paulo: Atlas, 2013, pg.587.
7Optou­se por não se adentrar na discussão sobre eventual decisões com caráter “legislativo” que possam ser emanadas pelo Supremo
Tribunal Federal em sede de Súmula Vinculante.
8publicado em 18/12/2009
9 http://www.stf.jus.br/portal/geral/verPdfPaginado.asp?id=606840&tipo=AC&descricao=Inteir%20 Teor%20ADC%20/%2012 –
acesso em 30/10/2013, as 23h51min.
10 CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO
ADMINISTRATIVO. PRÁTICA DE NEPOTISMO NO EXECUTIVO E LEGISLATIVO MUNICIPAL. AUSÊNCIA DE DISPOSIÇÃO
CONSTITUCIONAL OU LEGAL VEDANDO TAL PRÁTICA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE RESOLUÇÃO DO CONSELHO
NACIONAL DE JUSTIÇA. NECESSIDADE DE LEI EXPRESSA. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS INSCULPIDOS NO
ART. 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE LESÃO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. RECURSO CONHECIDO E
IMPROVIDO. (TJRN ­ Apelação Cível n° 2007.006909­8)
11 publicado em 24/10/2008.
12 O estudo mais detalhado desse precedente será realizado no capítulo 5
13 Conforme capítulo 2
14 Dentre elas as ADI 1521­4 (DJ de 17/8/2002).
15 http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJE_11.11.2008.pdf ­
acesso em 30/10/2013, as 23h51min.
16 Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/ DJE_11.11.2008.pdf – acesso em
4/11/2013, 20h34min.
17 já que o texto da súmula faz menção unicamente em “cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em
comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em qualquer dos poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.
18 Hipótese que não advém da análise textual da súmula.
19 cf. http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJE_11.11.2008. pdf – acesso em 30/10/2013, as
23h51min
20 Vencido o ministro Marco Aurélio
21 Conforme consulta processual: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento .asp?incidente= 2639705 – acesso em
19/11/2013, as 21h40min.
22 Dicionário Aurélio Eletrônico – Século XXI – Versão 3.0 – novembro de 1999.
23 Ghizzo Neto, Affonso. Corrupcão, estado democratico de direito e educação. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, pg. 122;
24 Viola outros princípios como igualdade e eficiência: “a vedação do nepostimo é regra constitucional que decorre dos princípios da
impessoalidade, igualdade, da moralidade e da eficiência” (ADC 12­DF, fl. 5, voto relator Carlos Ayres Britto).
25 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 8ª ed. São Paulo: RT, 2004
26 AFONSO DA SILVA, JOSÉ. Curso de Direito Constitucional Positivo. 35 ed. São Paulo: Ed. Malheiros.
27 MEIRELES, hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 36. ed. São Paulo: Ed. Malheiros, 2010, pg. 89.
28 Ob. Cit. pg. 90
29 Reclamação 12.478/RJ
http://jus.com.br/imprimir/28142/sumula­vinculante­n­13­e­os­agentes­politicos­a­grande­omissao­do­supremo­tribunal­federal
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Vedação ao nepotismo: agentes políticos e a omissão do STF ­ Jus Navigandi
30 O debate entre os ministros cingiu­se a substituição de os termos “mesmo Órgão” e “viola o art. 37, caput, da Constituição Federal”,
contidos na proposta original, por, respectivamente, “mesma Pessoa Jurídica” e “viola a Constituição Federal”, além de realizar alguns
ajustes quanto a pontuação.
31 Disponível em: http://www.transparency.org/cpi2013/results. Consulta em 3/12/2013, as 22h26min.
32 Em uma escala de 0 ­ 100, onde 0 significa que um país é visto como altamente corrupto e 100 significa que ele é percebido como
muito limpo.
33 Trata­se de uma péssima posição. Foram 177 países pesquisados e, quando mais longe da primeira posição estiver o país, maior o
índice de corrupção medida.
Autor
Marcio Gai Veiga
advogado
Informações sobre o texto
Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT)
VEIGA, Marcio Gai. Súmula vinculante nº 13 e os agentes políticos – a grande omissão do Supremo Tribunal Federal. Jus Navigandi,
Teresina, ano 19, n. 3966, 11 maio 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/28142>. Acesso em: 25 nov. 2014.
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