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VOZ DOS MARÍTIMOS
SÁBADO, 19 DE MARÇO DE 2011
COORDENAÇÃO LIBERATO FERNANDES, LUIS CARLOS BRUM, JOANA MEDEIROS E CÁTIA BENEDETTI
Segurança Social: novos problemas
EDUARDO RESENDES
Código Contributivo
da Segurança Social,
que repercussões
para o sector da pesca?
Impõe-se a revogação
desta lei para
o sector piscatório!
JOAQUIM PILÓ
PRESIDENTE DO SINDICATO LIVRE DE PESCADORES
C
om a entrada em vigor,
no dia 1 de Janeiro da
L ei 110 / 2 0 0 9, e
com o D ecre to
R egula m e ntar n º 1-A /2011,
criaram-se novos
e acrescidos problemas para a pequena pesca local e costeira até aos 12 m, nomeadamente os proprietários
embarcados e suas mulheres desde que matriculadas.
O G ove r nodo do Pa r t i do
Soci a l ist a e l aborou a le i e
ap rovou, se m d iscu t i r co m o
sector, erro gravíssimo, ou arrogância, eu quero posso e mando!
O sector só se apercebeu da gravidade desta lei, quando já estava e m vigor, e a i, toca a i r à
d iscussão co m o gove r no q ue
te m si do i nse nsive l n a m aor i a
das coisas.
Vamos aos factos da lei. A qui
ENTREVISTA
NOME MANUEL PALRÃO
PESCADOR REFORMADO
“A reforma
do pescador
não é suficiente
para se viver
com dignidade”
Código Contributivo da Segurança Social, que repercussões para o sector da pesca?
destacamos alguns
dos artigos.
O ar tigo
34º diz que, a
par te ou as
par tes que o
proprietário
gan ha, deve ser
retirado do monta n te dos 10 % e
entregue. O artigo
134º passa a enquadrar no regi me dos
trabalhadores independentes os proprietários das embarcações
da pesca local e costeira,
“ai nda que enteguem o
rol de tripulação”. *
Consequências desta
lei? Mais fuga de pescado à
lota, d ividas à Segurança
Social, que até Dezembro de
2010 não havia pelo regime
de 10%.
A nalise mos o te m a. Acho
que este problema o governo
deveria ter discutido com o sector, este assunto é muito importante para os trabalhadores da
pesca, ao não se fazer essa discussão, o governo criou um mau
estar na classe piscatória, confusão total.
O governo não teve em conta
as especificidades deste sector,
que não se compara com mais nenhum, qual é o sector de actividade que está sujeito aquilo que o
oceano dá? A inda está sujeito à
venda do pescado em lota, onde
quem manda são os Intermediários?
Q ual é o sector que distribui os
rendi mentos como os pescadores? Retira todas as despesas do
monte maior, Combustiveis , Seguros, isca, Segurança Social, alimentação, serviço lotas, só depois
será distribuido o dinheiro pelos
tripuilantes, porque em 98% da
pesca não há salário fixo.
Por isso, reclamamos a revogação desta lei para a peque na
pesca local e costeira embarcações até 12m, que se matenham
os desconto dos 10% do bruto do
pescado, que os trabalhadores
que a n da m a bordo, seja m eles
Portugueses ou Estrangeiros, ten ham todos os direitos dos que
estão matriculados, incluíndo a
Segurança Social.
Q ue as mulheres dos proprietários sejam consideradas trabalhadoras nor m ais. Q ue a pesca
que se rege pelo regime geral continue nesse regime e, os que estão
no regime especial que se mentenha m como estão se m prejuízo
de se iniciarem reformas visando
uniformizar o sistema.
A verdade é que o sector da
pesca só tem futuro se conseguirmos a valorização do pescado,
isso passa por muito melhor organização do sector. Vamos à luta
por melhores direitos.
*Ver texto n a i ntegr a em
www.pescas.net
DIREITOS RESERVADOS
M anuel A ndrade Palrão Júnior
( M A ) d e 77 a n os, n a t u r a l d e
Rabo de Peixe, pescador reformado fala a Voz dos M ar ti mos,
numa entrevista conduzida por
L uis Carlos Brum.
Com que idade se reformou?
Aos 55 anos.
Está satisfeito com o valor da sua
reforma?
N ão. É m u i to pouco p a r a
q u e m t r a ba l h ou no m a r u m a
vida i n teira. A refor ma do pes-
cador não é suficiente para se viver com dignidade.
Como resolveu este problema?
Trabalhei até a saúde permitir.
Sabe que os políticos com poucos
anos de trabalho usufruem de grandes reformas?
É t u do p a r a a lgu ns e n a d a
p a r a ou t ros, d evi a h ave r m a is
equilibrio e mais justiça.
Gostou de ser pescador? Acha que
o pescador vive melhor hoje?
Sempre gostei de ser pescador
e jamais tive outra profissão. Fa-
ria o mesmo se recomeçasse de
novo é a minha vocação. Nos nossos dias, os pescadores conseguem ter mais apoios do que no
meu tempo, vivendo muito melhor do que antigamente.
Pensa que se respeita os pescadores idosos com os montantes destas
pensões?
N i ngué m se le m bra da ge n t e. So m os u m a cl asse q u e n ão
t e m u m fi n a l d e v i d a bo m e
tranquilo, as necessidades conti nua m. 1
LUÍS CARLOS BRUM
Ode Marítima
[ ….] Os paquetes que entr a m de m a nhã n a ba rr a
Trazem aos meus olhos consigo
O m istér io alegre e tr iste de quem chega e pa rte.
Trazem memór i as de ca is afastados e doutros momentos
Doutro modo da mesm a hum a n idade noutros pontos.
[…]
Ah, todo o ca is é um a sa udade de pedra!
E qu a ndo o n av io la rga do ca is
E se repa ra de repente que se abr i u um espaço
E ntre o ca is e o n a v io,
Vem-me, n ão sei porquê, um a a ngústi a recente,
U m a névoa de senti mentos de tr isteza
Q ue br ilha ao sol das m i nhas a ngústi as relvadas
Como a pr i mei ra ja nela onde a m adrugada bate,
E me envolve como um a recordação dum a outr a pessoa
Q ue fosse m ister iosa mente m i nha.
Ah, quem sabe, quem sabe,
Se n ão pa rti outrora, a ntes de m i m,
D um ca is; se n ão dei xei, n a vio ao sol
Oblíquo da m adrugada,
U m a outr a espécie de porto?
Q uem sabe se n ão dei xei, a ntes de a hor a
Do mu ndo exter ior como eu o vejo
R a i a r-se pa ra m i m,
U m gr a nde ca is cheio de pouca gente [ … ]
Álva ro de Ca mpos,
heterón i mo de Fer n a ndo Pessoa,
i n “Poem as”
AÇORIANO ORIENTAL . SÁBADO, 19 DE MARÇO DE 2011
VOZ DOS MARÍTIMOS|21
Comercialização do pescado
nas Regiões Insulares...
ANÁLISE
LIBERATO
FERNANDES
COORDENAÇÃO
EDUARDO RESENDES
PEDRO MELO
SECRETÁRIO-GERAL DA ACPA
Reestruturar ou
liquidar a Pesca
A
A ssociação de Comercia n tes de Pescado dos
Açores (ACPA), é membro
do Conselho Consultivo Regional
do Sul (CC R-Sul) desde 20 08, e
única organização de comerciantes com represe n tação neste
CCR.
N a reunião do Grupo Insular,
que inclui os Açores, M adeira e
Canárias, foi por nós introduzido
o te m a “Proble m ática da Comercialização e seus desafios nas
Regiões Insulares – Rup ` s”, por
se ter verificado que nas diversas participações da A CPA neste
órgão n u nca o te m a ti n ha sido
abor dado e que os proble m as
desta área das pescas ti n ha m
m u ito e m com u m n as três R egiões em questão.
A discussão foi i niciada pela
ACPA, referindo alguns dos problemas que temos a nível interno,
tais como: a natureza e dimensão
do nosso mercado, que é m uito
reduzido e disperso; alguns constrangimentos de natureza legal
como a Por taria 50 / 9 0 de 11 de
Se te m bro, que regula me n ta a
venda de pescado em fresco nos
Açores e que é altamente restritiva para as empresas que se dedicam à comercialização no mercado local.
No entanto o mais importante
para nós nesta troca de realidades, diz respeito ao mercado da
expor tação, proble m a com u m
nas três R egiões. D estacou-se a
problemática das Importações de
países não Comunitários que colocam os seus produtos da pesca
a u m baixíssi mo preço, e se m o
devido controlo por parte da Com issão E uropeia, quer e m termos da sua qualidade como da
rotulagem e rastreabilidade do
produto, criando-se assim uma
concorrência desleal com os produtos da pesca europeia.
O
Procurar soluções para a comercialização do pescado nas regiões Insulares
Esta é uma questão de extrema importância porque estas importações representam cerca de
6 0% do consu mo dos produtos
da pesca na União E uropeia. Outro ponto que foi realçado por todos, tem a ver com os custos do
transporte aéreo, que no caso dos
Açores se torna ainda mais grave,
e m vir tu de de ser mos, das três
Regiões aquela que só é servida
por duas companhias Aéreas, que
entre elas não existe concorrên-
Compromisso
de apresentação
dos problemas
da comercialização
e possíveis soluções...
cia, e a natureza do seu serviço é
direccionada para o passageiro. A
disponibilidade de carga está directa m en te relacionada com a
taxa de ocupação de passageiros
nos seus voos, não have n do sequer um voo cargueiro.
Constata-se que mesmo com o
apoio dado através do POSE I M A,
(cerca de 45 Cênts / kg), torna-se
impossível sermos concorrenciais
com as empresas sedeadas no
Continente Europeu, dado que temos este custo adicional que se
torna muito pesado na formulação do preço final ao cliente.
Foi ainda referido na reunião
por parte de Associações de produtores presentes que o pescado
não tem a valorização que merece. O preço de primeira venda é
baixo e sofre muitas variações.
A A CPA referiu que enquanto tiver mos os constrangi men-
tos aci m a descritos será m uito
complicado que se verifique uma
melhoria de preços, pois não estamos sozinhos no mercado, nem
temos dimensão para impor preços neste mercado global.
Desta reunião, além da troca de
realidades por parte das três regiões, que foi em nosso entender
muito enriquecedora, saiu ainda o
compromisso de cada uma, enviar
ao CCR-Sul, no âmbito do Grupo
Insular um texto com a apresentação dos problemas da comercialização, assim como possíveis soluções para os mesmos.No caso dos
Açores a Associação de Comerciantes de Pescado dos Açores ficou com esta incumbência e assim
o fará para bem do sector das pescas Açorianas. 1
Texto n a i ntegra em
www.pescas.net
s dados da pesca polivalente açoreana relativos
a 2010 revelam um sector moribundo: os rendimentos
diminuem todos os anos. Apesar
da modernização da frota e do
aumento do esforço de pesca as
espécies que constituem a base
do rendimento dos pescadores
estão mais escassas, ou não têm
mercado. Em apenas 4 anos o
rendimento bruto diminuiu em
quase 8.900,000 euros (mais de
25%). Todos os custos de exploração, grande parte dos quais suportados pelos tripulantes, não
deixam de subir, particularmente o gasóleo. Resultado: soldadas
mensais inferiores a 300 euros.
Embarcações com combustíveis
cortados por estarem em dívida
para as finanças, por lucros inexistentes. Abonos às crianças
cortados. Estes mesmos governos “cegos e surdos” aos problemas da pesca fazem sair em 2
meses três leis punitivas para a
pesca, alterações ao Código Contributivo para a Segurança Social, a lei quadro da pesca Açoreana e a Lei sobre segurança a
bordo. Todas elas penalizam os
pescadores. Quase 40 anos após
o fim da ditadura o sector continua estruturado como antes do
25 de Abril. Pelos vistos, aos sucessivos governos tem interessado manter toda a pesca dependente e submissa. O sector não
aguenta mais este sistema. Ou o
governo apoia de facto a sua reestruturação, aproximando-a do
modelo europeu (que, apesar de
aflito tem níveis de rendimento
incomparávelmente superiores)
ou o agravar da situação social
das comunidades vai provocar situações explosivas.
* Ver www.pescas.net
Entrevista à jovem pescadora Jael Maria Paiva Raposo
DIREITOS RESERVADOS
Jael Raposo tem 17 anos e é natural da Ribeira Seca, concelho da
Ribeira G rande. É filha de Zilda
Silva u m a ar madora e gra n de
mulher da pesca
Inicialmente a família de Jael
Raposo não estavam muito ligada ao sector piscatório, a sua mãe
ti n ha u m a loja e o seu pai era
mergulhador. Porém há 10 anos
atrás decidira m com prar u m a
embarcação e fazer da pesca o seu
sustento de vida.
As ir mãs de Jael R aposo iam
para o m ar com a m ãe e o pai, e
ajudavam em todas as tarefas necessárias, enquanto ela ia para a
escola. E sta situação nunca lhe
agradou m uito, ela começava a
gostar cada vez mais da vida do
mar, porque como diz o ditado
“quem sai aos seus não degenera”.
Por esta razão aos 16 anos Jael
R aposo decidiu sair da escola e
Não sou discriminada,
até pelo contrário
muitas pessoas
elogiam-me pelo
meu trabalho...
Jael Raposo jovem pescadora natural da Ribeira Grande
dedicar-se à vida da pesca, como
o seu pai, mãe e irmãs.
Q uando questionada acerca
de questões relacionadas com a
d iscr i m i n ação Jae l m e ncion a
que nunca se sentiu discriminada, até pelo con trário e m algumas situações costu ma ser elogiada pelo seu trabalho na pesca
se m p re fe i to com m u i to orgulho, empenho e dedicação, razão
pela qual n u nca teve vergon ha
de ser pescadora.
Jae l R a poso é a m a is nova
mulher da pesca pertencente ao
núcleo da Ilhas em Rede, em São
M igu el, e é com m u i to gosto e
satisfação que par ticipa em todas as actividades que são dese nvolvi d as, com algu m a frequência, pela U M A R - Açores e
pela I lhas em Rede.
Relativamente à mais recente
actividade em que as mulheres da
pesca dos Açores estiveram presentes, a celebração do D ia Internacional da Mulher, Jael Raposo
refere que foi com muito prazer
que participou nas actividades no
Faial, uma vez que pôde demonstrar através da feira exposição algu m trabalho que dese nvolve
diariamente, como a preparação
das redes, para além de que, segundo ela, o convívio e a troca de
experiências é muito rico e gratificante. 1 JOANA MEDEIROS SOCIÓLOGA UMAR/AÇORES
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