OPiniÃO 26 | janeiro-fevereiro 2015 | VIDA JUDICIÁRIA Segurança Social em Moçambique – panorama geral E Wanda Honwana Advogada Wanda Honwana e Associados – Sociedade de Advogados (Moçambique) “Hodiernamente, o sistema de protecção social organiza-se em três níveis: segurança social básica, obrigatória e complementar” m Moçambique, o quadro legal que tutela a Protecção Social está previsto, designadamente, na Lei 4/2007, de 7 de Fevereiro, e respectivo Regulamento (Decreto 53/2007, de 3 de Dezembro). Neste dois diplomas estão definidas as suas bases e organização, tributando princípios fundamentais, como o da Universalidade (protecção de todos os cidadãos), da Igualdade (garantia de que os trabalhadores gozam do direito de taxa fixa e na mesma proporção, no âmbito do regime contributivo), da Solidariedade (compromisso da sociedade para com as pessoas que incorrerem numa situação de carência) e da Descentralização (realização da protecção social por instituições de direito público e de direito privado, contanto que, para estas últimas, haja a necessária autorização). Esta tem como escopo, designadamente, atenuar as situações de pobreza absoluta das populações; garantir as condições de subsistência dos trabalhadores, em caso de diminuição ou falta de capacidade para o trabalho, bem como de familiares sobreviventes, em caso de morte do trabalhador; e, bem assim, conferir condições suplementares de sobrevivência. Hodiernamente, o sistema de protecção social organiza-se em três níveis: segurança social básica, obrigatória e complementar. A segurança social básica abrange os cidadãos nacionais incapacitados para o trabalho, sem meios próprios para satisfazerem as suas necessidades básicas, sendo que o apoio é concedido através da atribuição de prestações de risco ou de prestações de apoio social (sendo que as primeiras podem ser prestações pecuniárias ou de espécie). O financiamento da segurança social básica provém das dotações ou subsídios do Orçamento do Estado, contribuições e donativos de entidades públicas ou privadas, sem embargo de, a título residual, se consignar a possibilidade de serem admitidas quaisquer outras fontes de receita, contanto que legalmente admitidas. Por seu turno, a segurança social obriga- tória visa fazer face a situações de doença, maternidade, invalidez, velhice e morte, prevendo, o primeiro dos referidos diplomas, outrossim, a possibilidade de indexar o alargamento do seu âmbito de aplicação à evolução e melhoria sócio-económica de Moçambique. A sua obrigatoriedade consubstancia-se no facto de nela se terem de inscrever os trabalhadores por conta de outrem e por conta própria, nacionais e estrangeiros residentes em território moçambicano – que aí estejam a trabalhar –, e correlativas entidades empregadoras. Esta obrigatoriedade poderá, ainda assim, ser excepcionada, no caso dos estrangeiros residentes em Moçambique, contanto que estes estejam abrangidos por um sistema de segurança social de outro país (sem embargo do que estiver previsto em Acordos Bilaterais, assinados com a República de Moçambique, ratificados e em vigor). O funcionamento da segurança social obrigatória é efectuado pelos empregadores e pelos trabalhadores, na proporção de 4% e 3%, sobre o valor das remunerações, respectivamente, ao invés do caso dos trabalhadores por conta própria, em regime livre ou de avença, porquanto, nestes casos, as contribuições deverão ser suportadas e prestadas, em absoluto, pelos mesmos. A segurança social complementar é facultativa, podendo ser por ela abrangidas as pessoas inscritas na segurança social obrigatória. A sua existência justifica-se, desde logo, com a possibilidade de os seus beneficiários reforçarem as prestações da segurança social obrigatória, sendo que as suas instituições e mecanismos particulares deverão ser licenciados pelo Ministro das Finanças, podendo revestir a natureza de fundos de pensões e outros, consubstanciados em patrimónios autónomos. São receitas desta segurança social as contribuições dos trabalhadores, ou destes e das respectivas entidades empregadoras, sem embargo de outras, em condições a definir, por acordo, com a entidade gestora ou que venham a ter assento em diploma legal. Ao nível dos órgãos e correlativas com- OPiniÃO petências, repisa-se a Comissão Consultiva de Trabalho, de cariz consultivo, já que o mesmo consulta e aconselha o Governo, em matéria de Protecção Social. Constituída por membros do Governo, representantes dos trabalhadores, representantes dos empregadores e da sociedade civil, as suas competências centram-se, por um lado, em articular e coordenar a informação dos poderes públicos, através de emissão de pareceres e recomendações, sobre matérias respeitantes à protecção social; e, por outro, no acompanhamento do funcionamento da sobredita protecção, através da sindicância dos objectos e finalidades alcançadas. Em matéria de gestão, ressalta-se o facto da segurança social básica estar sob a égide do Ministério que superintende a área da acção social, ainda que nela possam participar entidades não governamentais, com finalidades sociais, bem como outros serviços de administração do Estado. De outra sorte, a segurança social obrigatória é gerida pelo Instituto Nacional de Segurança Social, vulgo INSS, ao passo que a segurança social complementar é gerida por entidades de carácter privado ou público, cuja constituição e funcionamento são regulamentados pelo Conselho de Ministros. Por fim, tratando-se de um Estado de Direito Democrático, os actos (administrati- VIDA JUDICIÁRIA | janeiro-fevereiro 2015 | 27 vos) levados a cabo pela entidade gestora da segurança social obrigatória podem ser objecto de reclamação, queixa e recurso contencioso, pelo que, do ponto de vista dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, a legislação actualmente em vigor, com particular enfoque a acima mencionada e a adjectiva, oferecem as garantias necessárias, das quais o cidadão se poderá socorrer. Em suma, a segurança social em Moçambique compreende uma estrutura multifacetada, compreendida, grosso modo, em três diferentes categorias, no que tange à sua finalidade e âmbito de aplicação, especificidades que se traduzem, outrossim, ao nível da obtenção das respectivas receitas, por um lado, e, por outro, nos órgãos e correlativas competências, responsáveis pela sua gestão e funcionamento. “em matéria de gestão, ressaltase o facto da segurança social básica estar sob a égide do Ministério que superintende a área da acção social, ainda que nela possam participar entidades não governamentais, com finalidades sociai Este texto não segue o novo acordo ortográfico