UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ PAULO FERNANDO TEODORO MACHADO DE SOUZA O BEM DE FAMILIA E A IMPENHORABILIDADE: LEI Nº 8.009, DE 29 DE MARÇO DE 1990 CURITIBA 2015 PAULO FERNANDO TEODORO MACHADO DE SOUZA O BEM DE FAMILIA E A IMPENHORABILIDADE: LEI Nº 8.009, DE 29 DE MARÇO DE 1990 Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Profº. Dr. André Peixoto de Souza CURITIBA 2015 Agradeço a Deus, fonte de saber e luz. A todos que ajudaram a fazer do meu sonho, realidade, unindo forças para que eu não desistisse de ir atrás do que eu buscava como objetivo maior. Foram muitas as barreiras e inúmeros os obstáculos que superei durante esses anos, mas graças a Deus e a vocês, não fraquejei. Fiz deles escada para chegar até aqui. Obrigado por tudo, família, professores, amigos e colegas. Ao meu orientador, Dr. André Peixoto de Souza pelo incentivo, dedicação e paciência dispensada, possibilitando a conclusão desses estudos. Dedico à minha mãe, Maria Maura, meus irmãos Pedro, Rita e Andréa, que apesar de todas as dificuldades nunca deixaram de me incentivar. E em especial a minha esposa Icléa, meus filhos Maria Cristina, Marco Antônio e João Paulo, pela paciência e carinho, para entender minhas ausências. A espera rendeu fruto. Ei-lo aqui. Obrigado. Aceitar a dignidade de outra pessoa é axiomático. Não tem nada a ver com dominação, apoio, ou atos de caridade em relação aos outros. (Leon Tolstoi) RESUMO O processo de execução por quantia certa só terá êxito se existir bens do devedor para garantir a sua efetividade, pois na compreensão do Direito atual, não se admite mais execução civil em que o devedor pague de outra maneira, e que também deve ser garantido o mínimo de bens ao devedor para que este possa ter garantida a sua dignidade enquanto ser humano. Portanto, mesmo que este deva, existem certos bens que visto de regra, não poderão ser executados para pagamento de dívidas. Daí os bens impenhoráveis; alguns absolutamente, outros relativamente. Nesse contexto insere-se o imóvel residencial próprio da entidade familiar, posto que o direito pátrio vinculado ao princípio da dignidade da pessoa humana defende o direito à habitação dos indivíduos, impedindo que a penhora recaia sobre sua moradia. O bem de família foi introduzido em nosso ordenamento legal pelo Código Civil de 1916, e disciplinado também no Decreto-Lei n. 3.200, de 19 de abril de 1941 e pela Lei Federal n. 6.015, de 31 de dezembro de 1973, além do Código de Processo Civil. A Lei Federal n. 8.009, de 29 de março de 1990, regulamenta o bem de família legal e sofre a inclusão de alguns incisos através da Lei 8245/91, a Lei do Inquilinato. O principal efeito decorrente de ambos os tipos é a imputação da impenhorabilidade do bem de família, o bem assim considerado não pode sofrer nenhum tipo de constrição para ser usado como forma de pagamento aos credores, mas existem precedentes que impossibilitam este ato, demonstrados através dos julgados, da jurisprudência existente. Ainda se procura a melhor forma da lei e sua aplicação à sociedade brasileira. Palavras-Chave: Bem de Família. Impenhorabilidade. Fiador. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO........................................................................................................08 1.1 1.1 HISTÓRICO...........................................................................................................09 1.2 NO BRASIL.......................................................................................................11 2 A LEI 8.009/90.........................................................................................................14 2.1 AS QUESTÃO CONSTITUCIONAIS DA LEI 8.009/90.........................................15 2.2 A IMPENHORABILIDADE NO CÓDIGO CIVIL E NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL............................................................................................................................17 2.2.1 No Processo Civil...............................................................................................18 2.3 REQUISITOS PARA A PROPRIEDADE SER QUALIFICADA COMO BEM DE FAMÍLIA.......................................................................................................................19 2.4 A IMPENHORABILIDADE DO ÚNICO IMÓVEL DA FAMÍLIA..............................20 2.5 ALGUMAS EXCEÇÕES À REGRA DA IMPENHORABILIDADE..........................21 3 A (IM)PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR NOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO.....................................................................................25 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS.....................................................................................33 REFERÊNCIAS...........................................................................................................34 TERMO DE APROVAÇÃO PAULO FERNANDO TEODORO MACHADO DE SOUZA O BEM DE FAMILIA E A IMPENHORABILIDADE: LEI Nº 8.009, DE 29 DE MARÇO DE 1990 Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do titulo de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná. Curitiba,..................... de............................................................................2015. Bacharel em Direito Universidade Tuiuti do Paraná Orientador: ________________________________ Profº. Dr. André Peixoto de Souza Prof.Dr. __________________________ Prof.Dr.___________________________ 8 1 INTRODUÇÃO O tema proposto tem provocado grande repercussão social, um acalorado debate doutrinário e jurisprudencial: à Lei 8.009 de 29 de março de 1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família. Esta lei surge para ampliar o conjunto de normas que protege o devedor, bem como conservar as particularidades de cada um destes regramentos. O conteúdo da lei pode ser avaliado pelo seu art. 1º que prescreve: O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos seus pais ou filhos que seja proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei. Parágrafo único: a impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados. (BRASIL, 1990, p. Única). Não se discutindo se a cobrança é justa, injusta ou extorsiva, mas sendo direito até que se prove a sua eventual ilegalidade por parte do credor, mas uma ideia central que é de proteção do ente familiar, ligado a noção de lar, proteção da prole, segurança familiar, como sobreposto aos eventuais interesses de credores resistentes na função de garantia do patrimônio. Sahid Maluf debate o tema sob a perspectiva da isonomia : O principio da isonomia só pode ser entendido racionalmente, no sentido de promover, tanto quanto possível, uma igualização formal das desigualdades materiais. Cabe ao Estado levar em conta todas as desigualdades humanas e sociais e tratar desigualmente os seres desiguais, na proporção em que se desigualam para igualizá-los no plano jurídico. (2014, p. Única). As razões morais e sociológicas em geral, fundamentam tal proteção, “garantindo às famílias daqueles em dificuldades econômicas para saldar suas dívidas, condições mínimas de sobrevivência digna, como a continuidade de seu exercício profissional” (CZAJKOWSKI, 1997, p.11), procurando-se evitar que o credor, usando da lei e da estrutura judiciária para a satisfação de um crédito, um direito de simples expressão pecuniária, chegue ao extremo ético de condenar o devedor, sua família, à fome, ao desabrigo e à miséria. 9 A Lei surge comprometida em contextos históricos e culturais que também deverão ser levados em conta quando de sua avaliação, como o secular princípio do comprometimento patrimonial do devedor no pagamento de suas dívidas, visto que, alguns bens, por sua característica e propósito, encontram-se a salvo da espoliação para a satisfação coativa do crédito.(IBID). Necessário se faz também observar os costumes e ao caráter de nossa sociedade, historicamente condescendente com o descumprimento de deveres e obrigações, como também à atuação do Poder Judiciário na composição de um esforço executivo, mas também por levar em conta princípios de justiça social, observando dentre muitos aspectos, a nossa economia, sabidamente desequilibrada e imprevisível, que recai sobre os seus jurisdicionados, impedindo a caracterização da Lei como simples norma processual, caracterizando o interesse público e a finalidade social da lei, não sendo suficiente para excluí-la da subordinação à Constituição Federal e de suas garantias ao cidadão, nem tornando possível examiná-la como se fosse algo fora do restante do ordenamento jurídico e de seu contexto. 1.1 HISTÓRICO As origens do bem de família como instituto jurídico remontam aos princípios da Roma Antiga, onde deuses e antepassados eram cultuados também nas residências, onde comumente existiam espaços com a finalidade única de culto e orações pelos entes familiares, e ao se fazerem às vezes de santuário, se tornavam inalienáveis, por respeito à religião e à tradição decorrente dos antepassados que se caracterizavam como sagrados. Em seu sentido jurídico mais amplo, o bem de família tem raízes nos Estados Unidos da América, mais precisamente no estado do Texas, nos idos do século XIX. Com o final da colonização inglesa, os bancos europeus fixaram-se nos Estados Unidos, enxergando ali um grande potencial de desenvolvimento e a possibilidade de maiores lucros. Isso gerou uma enorme facilidade de crédito, sem exigência de garantias para o cumprimento dessa obrigação. Como nos expõe Ferreira, “atraídos pelo progresso vertiginoso da agricultura e do comércio e pelo enorme potencial do Novo Mundo, [...] oferecendo crédito 10 abundante, que por sua vez impulsionava o desenvolvimento ainda mais veloz da região”. (2015, p. 1). A facilidade de crédito, a ilusão do lucro fácil, levou os americanos a abusarem dos empréstimos gerando uma descomedida atividade especulativa que criando um enorme endividamento, não havendo alicerce para suportar a situação. (DUARTE, 2015). Surgiu então, conforme Duarte, “uma grande crise entre os anos de 1837 a 1839, acarretando o fechamento de aproximadamente 900 bancos, com 33.000 falências e uma perda estimada de US$ 440.000.000,00 no período de três anos.” (2015, p. 2). Segundo Silva (2015), por razões econômicas e financeiras, muitos fazendeiros acabaram por perder as suas terras, pois não tinham condições de arcar com suas dívidas, perdendo seus bens para as instituições financeiras, as grandes credoras a época. Essa crise atingiu não só os banqueiros imprudentes, mas, principalmente os devedores, que sofreram penhoras em seus bens, tendo que sofrer execução em suas terras, animais e instrumentos agrícolas, tornando as famílias texanas ameaçadas pela miséria. Isso provocou uma forte emigração do Estado, visto que as famílias que perdiam sua propriedade iam buscar novas condições de vida e trabalho em outras regiões. Para evitar essa migração, o governo isentou de penhora as propriedades que se destinassem tanto ao plantio para venda quanto de residência dos devedores, em 1839, “chamando o instituto de Homestead Exemptio Act, que poupava não apenas as terras e o imóvel da execução, como também os animais da propriedade e os bens necessários ao sustento da família dos devedores durante o período de um ano”. ( SILVA, 2015, p. 2). Em um de seus artigos a lei apresentava a seguinte redação: De e após a passagem desta lei, será reservado a todo cidadão ou chefe de uma família, nesta República, livre e independente do poder de um mandado de fieri facias ou outra execução, emitido por qualquer Corte de jurisdição competente, 50 acres de terra, ou um terreno na cidade, incluindo o bem de família dele ou dela, e melhorias que não excedam a 500 dólares, em valor, todo mobiliário e utensílios domésticos, provendo para que não excedam o valor de 200 dólares, todos os instrumentos (utensílios, ferramentas) de lavoura (providenciando para que não excedam a 50 11 dólares), todas as ferramentas, aparatos e livros pertencentes ao comércio ou profissão de qualquer cidadão, cinco vacas de leite, uma junta de bois para o trabalho ou um cavalo, vinte porcos e provisões para um ano; e todas as leis ou partes delas que contradigam ou se oponham aos preceitos deste ato, são ineficazes perante ele. Que seja providenciado que a edição deste ato não interfira com os contratos entre as partes, feitos até agora (Digest of the Laws of Texas § 3.798). (DUARTE, 2015, p. 3) O homestead traduz-se como “lar de família”, sendo home de casa e stead de lugar, e decorre da defesa à pequena propriedade, que passou a considerar a residência familiar para efeitos jurídicos como sendo “consagrada e limitada com relação às formas pelas quais pode ser perdida ou alienada, o que passou a conferir, desde então, uma maior proteção aos bens familiares”.(SILVA, 2015, p. 2). O instituto nasce com forte teor humanitário, revolucionário ao acolher não apenas o imóvel familiar, mas também os bens que emolduram o lar, por entenderse que é o conjunto que formam a residência, conquistando consequentemente, ser defendido da expropriação para conservação da dignidade humana e do direito social ao domicílio predito constitucionalmente à época e local. (IBID). Mais tarde, com a anexação do Texas ao território dos Estados Unidos da América, o instituto do bem de família espalhou-se aos demais estados e, de modo geral, foi adotado por todas as legislações do mundo ocidental, inclusive a do Brasil.(DUARTE, 2015). 1.2 NO BRASIL O instituto do bem de família tem suas origens no Regulamento 737 de 1850, que tornava isento de penhora determinados bens de propriedade do executado, não oferecendo à época proteção ao imóvel do devedor. No Código Cívil de 1916, este ganha regulamentação específica em decretos e leis promulgadas posteriormente, como a proteção aos bens de caráter familiar na hipótese de execução forçada de dívida exigível. (FERREIRA, 2015). O Código Civil de 1916 observava de forma precária apenas quatro artigos no Livro da Parte Geral, que foram inseridos Pelo Senador maranhense Fernando Mendes de Almeida, pois o projeto anterior elaborado por Clóvis Bevilacqua, não contemplava o bem de família. Na época para se obter a proteção conferida ao bem 12 de família era necessário registrá-lo por instrumento público e, além disso, havia necessidade de publicação.(DUARTE, 2015). Maria Helena Diniz apud Souza, arremata dizendo que a propriedade foi concebida ao homem por sua própria natureza para que esta pudesse satisfazer suas necessidades e as de sua família. Por todos estes motivos é que se justifica a existência da propriedade pela função que ela representa às sociedades civilizadas. (2007, p. 111) Inicialmente, de acordo com Duarte; era permitida a instituição do bem de família apenas ao chefe de família. A doutrina dominante na época afirmava que nesse conceito se enquadrava apenas o marido e, excepcionalmente, a mulher quando estivesse na chefia da família, como, por exemplo, quando fosse viúva. ( 2015, p. 4). Com o advento da Constituição de 1988, consagrou-se a igualdade entre homens e mulheres quanto aos direitos e deveres relativos à sociedade conjugal. A melhor doutrina já considerava que a chefia da família era exercida por ambos os cônjuges e, assim, ambos poderiam instituir o bem de família. Em um período de inflação desenfreada, essa proteção se revelava insuficiente, corroendo quase a totalidade do poder aquisitivo da população brasileira. Ao lançar diversos planos econômicos, o governo aprofundava a crise econômica, arruinando a economia e levando consigo a maioria da população, que não tinha como se defender.(IBID). Nesse cenário dispõe Duarte; foi editada, em 8 de março de 1990 a Medida Provisória n. 143, com o objetivo de regulamentar a impenhorabilidade do imóvel residencial do casal ou entidade familiar, bem como dos móveis quitados, colocando-os a salvo de execuções por dívidas, independente da vontade do seu titular. O Congresso Nacional rapidamente converteu essa Medida Provisória em lei, promulgando, no mesmo mês, a Lei 8.009/90. Essa lei regulamentou o bem de família automático, independente de ato solene, que passou a ser chamado de bem de família legal. ( 2015, p. 5). “Bem de família é um instituto que veio garantir às famílias o direito de reservar um imóvel seu que fique resguardado de execuções por parte de outrem, preservando a entidade familiar de qualquer tipo de violação quanto a seus bens”. (ARAÚJO, 2015, p. 3). Torna-se o nome dado ao imóvel do casal ou da entidade 13 familiar que goza de proteção legal, não podendo ser penhorado, ressalvada as dívidas de tributos relacionados ao prédio ou ao seu condomínio. Pode ser instituído através de um testamento ou escritura pública, devidamente registrada no Registro de Imóveis, chamada de Bem de Família Voluntário. Outra forma em que se apresenta é o Legal, estabelecido através da Lei 8009/90, que declara a impenhorabilidade de todas as moradias familiares próprias, uma para cada família, sendo que caso a família possua mais de um imóvel, o bem de família será aquele de menor valor, conforme o art. 5º, § único da Lei 8.009/90, (IBID), podendo ser penhorável por: “a) crédito de natureza trabalhista, previdenciário; b) créditos referentes a aquisição/ construção de bem; c) pensão alimentícia; d) taxas, imposto de imóvel; e) hipoteca do bem, dado em garantia; f) dívida de fiança concedida em contrato de locação; g) valores decorrentes da aquisição do imóvel com produto de crime”. (IBID, p. 2). Com isso, consagrou-se no Direito brasileiro a dualidade de regimes, admitindose duas modalidades de bem de família: o bem de família convencional e o bem de família legal. Dentro dos quadros de nossa civilização, a família constitui a base de toda a estrutura da sociedade. Nela se balizam não só as colunas econômicas, como suas raízes morais e sua organização social, sendo que o Estado, na preservação de sua própria sobrevivência, tem interesse fundamental em conservar a família, por meio de leis que lhe endossem o crescimento consistente e a intangibilidade de seus elementos institucionais. (DUARTE, 2015). Portanto, o instituto do bem de família encontra amparo no princípio da dignidade da pessoa humana, e do direito fundamental à moradia, insculpidos respectivamente nos artigos 1º, III e art. 6º da Constituição da República, o qual designa que toda pessoa possua o mínimo necessário para viver decentemente. A moradia, sem dúvida, faz parte desse mínimo, sendo este instituto considerável proteção constitucional. 14 2 A LEI 8.009/90 Abaixo transcrevemos a LEI Nº 8.009, de 29 de Março de 1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, em seu texto original: Faço saber que o PRESIDENTE DA REPÚBLICA adotou a Medida Provisória nº 143, de 1990, que o Congresso Nacional aprovou, e eu, NELSON CARNEIRO, Presidente do Senado Federal, para os efeitos do disposto no parágrafo único do art. 62 da Constituição Federal, promulga a seguinte lei: Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei. Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados. Art. 2º Excluem-se da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos. Parágrafo único. No caso de imóvel locado, a impenhorabilidade aplica-se aos bens móveis quitados que guarneçam a residência e que sejam de propriedade do locatário, observado o disposto neste artigo. Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias; II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; III -- pelo credor de pensão alimentícia; IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens. VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. (Incluído pela Lei nº 8.245, de 1991) Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga. § 1º Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese. § 2º Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural. 15 Art. 5º Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente. Parágrafo único. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil. Art. 6º São canceladas as execuções suspensas pela Medida Provisória nº 143, de 8 de março de 1990, que deu origem a esta lei. Art. 7º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 8º Revogam-se as disposições em contrário. Senado Federal, 29 de março de 1990; 169º da Independência e 102º da República. NELSON CARNEIRO. (BRASIL, 2014, p. Única). 2.1 AS QUESTÃO CONSTITUCIONAIS DA LEI 8.009/90 Considerando os efeitos sociais e o impacto da lei nas relações jurídicas negociais, não é difícil compreender a viva controvérsia que se estabeleceu quanto à sua constitucionalidade. Neste sentido Czajkowski aduz que: A lei não visou proteger a má-fé. Procurou sim, em última instância proteger a família do devedor e, por esta via, a própria pessoa do devedor, garantindo as condições mínimas de sobrevivência digna, a salvo das execuções por dívidas, avolumadas, em grande porte, não pela voracidade consumista do devedor, mas pelos tormentos e desacertos de uma economia cronicamente conturbada como é a do nosso país.(1998, p. 23). Diante dos efeitos sociais da Lei 8.009/90, impactando nas relações jurídicas, estabeleceu contradições quanto a sua constitucionalidade. A primeira indagação a qualquer cidadão conforme Czajkowski (1998), é a sua amplitude ética. Para alguns a lei encoraja ao calote e a inadimplência, afetando a normalidade das relações jurídicas, sendo obvio que não foi este o efeito desejado, mas sim, a proteção da família do devedor, com a garantia mínima de sobrevivência digna. O mesmo autor nos apresenta também outro ponto de vista puramente ético: Em princípio, que a lei seja contraria aos postulados básicos da moralidade que informam as condutas dos indivíduos e as relações sociais, muito embora o seu texto, altamente inadequado, leve muitas vezes a resultados ofensivos ao respeito e à dignidade do cidadão e, especialmente, à sua noção de responsabilidade. (1997, p. 16). Analisa ainda Czajkowski que: 16 A inconstitucionalidade integral da lei não deve ser a melhor conclusão. Mesmo tendo em conta a técnica deplorável com que foi feita, não é possível afirmar que criou uma impenhorabilidade geral do patrimônio do devedor. Estabeleceu de forma atabalhoada um benefício bastante amplo, mas que, na essência, há o patrimônio do devedor ao pagamento coativo das dívidas. Nesta ótica, a impenhorabilidade instituída pela lei continua sendo exceção, e não regra.[...]. (IBID, p. 27). Podemos observar um aspecto que seria a total inconstitucionalidade da lei, de todo o conteúdo de seu texto ou a eventual inconstitucionalidade de alguns de seus artigos, sem detrimento da validade e da efetividade dos demais. (CZAJKOWSKI, 1998). A impenhorabilidade da Lei 8.009/90 é instituto essencialmente semelhante à impenhorabilidade voluntária do bem de família, regulada nos arts. 70 e 73 do Código Civil Brasileiro. Ora, se lei preexistente, cuja constitucionalidade não é posta em dúvida, permite por convenção das partes a formação de uma situação jurídica, uma nova lei que imponha a mesma situação, independente de manifestação de vontade, 27 em benefício dos que de outro modo teriam condições de emiti-la, não poderá ser inconstitucional. (IBID, p. 26). Em análise de Souza e Lira sobre o texto; A lei referida foi promulgada no dia 29/03/90, entrando em vigor na mesma data, foi originada através da Medida Provisória nº. 143 08/03/1990. Nesse sentido, temos algumas críticas ao surgimento da referida lei por meio de medida provisória, tendo por base que o conteúdo da lei não atende aos requisitos de relevância e urgência que exige a elaboração de uma medida provisória, conforme expressa determinação do art. 62 da CF/88; existem muitos outros temas que até hoje não foram analisados pelo legislativo. Sendo esse um dos motivos que revela a inconstitucionalidade formal da Lei 8009/90. (2008, p. Única). A Constituição Brasileira nos apresenta em seu art. 62; “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional, que, estando em recesso, será convocado extraordinariamente para se reunir no prazo de cinco dias”. (VADEMECUM, 2015, p. 31). Em contraponto, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, sobre o mesmo assunto observa a constitucionalidade da referida lei em um de seus despachos quando de um embargo à penhora e a execução: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS À PENHORA E À EXECUÇÃO. LEI 8.009/90. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. MP. REQUISITOS DE URGÊNCIA. IMPENHORABILIDADE. 1. Não é inconstitucional a MP 143/90, que foi convertida na Lei 8.009/90, pois 17 o requisito de urgência restou avaliado pelo Presidente da República, confirmado pelo Congresso Nacional, sem impugnação consistente em sede judicial, capaz de elidir a presunção de constitucionalidade do ato. TRF, 3ª R., Ap. 259051, rel. Carlos Muta, p. 10.03.2004.(SOUZA, LIRA, 2008, p. Única). Também na corrente desta tese, o Ministro Carlos Velloso pronunciou-se em um recurso extraordinário em curso no Supremo Tribunal Federal, fazendo uso de citação efetuada em sua palestra nas dependências da Universidade Carlos III, em Madri, em data de 10 de Março de 2003, onde registrou que o direito à moradia, estabelecido no art. 6º, Constituição Federal, é um direito fundamental de 2ª geração, direito social que veio a ser reconhecido pela Ementa Constitucional No. 26, de 2000. (SOUZA, LIRA, 2008). Embora existam argumentos a favor da inconstitucionalidade, a jurisprudência brasileira está praticamente pacificada em considerar constitucional a penhora sobre o bem de família nos casos em que se é dado como garantia na fiança locatícia. Os julgados atuais consideram válida a penhora que recai sobre o único bem do fiador, pois a lei de locações prevê expressamente que assim será, conforme se verifica no artigo 3°, inciso VII, da Lei n° 8.009/909 ( WOLFF, 2013, p. 13). A Lei N. 8245, de 18.10.1991, a Lei do Inquilinato, acresce a Lei 8009/90, em seu art. III, o inciso VII: “por obrigação decorrente de fiança concedido em contrato de locação”. (VADEMECUM, 2015, p. 1323). 2.2 A IMPENHORABILIDADE NO CÓDIGO CIVIL E NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL O Código Civil de 1916 atentava a possibilidade de instituição do bem de família, não sendo passível a sua execução judicial. Já o mesmo código de 2002, torna possível aos conjugues a destinação de parte de seu patrimônio líquido para a sua constituição. [...] consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família. (CÓDIGO CIVIL, 2002, p. 1711). 18 Em obra de Gonçalves é observado que: O Código Civil de 1916 dedicou um capítulo, com um único artigo, às “coisas fora do comércio as insuscetíveis de apropriação, e as legalmente inalienáveis”. [...] O vocábulo comércio era empregado no sentido jurídico, significando “ a possibilidade de compra e venda, a liberdade de circulação, o poder de movimentação dos bens. Coisas do comércio são, por conseguinte, as que se podem comprar, vender, trocar, dar, alugar, emprestar etc.: fora do comércio são aquelas que não podem ser objeto de relações jurídicas, como o bem de família inalienável. [...] O bem de família foi deslocado, no novo Código Civil, para o direito de família, estando regulamentado nos arts. 1.711 a 1.722. ( 2014, p. 312-313). Duarte (2015), revela que a nomeação de uma residência ainda é abrangente em relação as dívidas, pois permite a penhora decorrente de tributos e despesas de condomínio sobre este, e esta isenção durará enquanto viver um dos cônjuges ou companheiros ou, na falta destes, até que os filhos completem a maioridade. (FERREIRA, 2015). O Código Civil de 2002, estabelece: Manteve a dualidade de regimes, disciplinando o bem de família convencional, inserindo-o adequadamente no livro do direito de família, e deixando a disciplina do bem de família legal a cargo da lei específica (Lei 8.009/90). Várias distorções foram corrigidas, tais como a possibilidade de se instituir bem de família por testamento, a extensão do direito a terceiros e a atribuição de legitimidade aos integrantes da entidade familiar, além de limitar o valor do bem a um terço do patrimônio líquido dos instituidores. A maior novidade, no entanto, foi à criação da possibilidade do bem de família abranger valores mobiliários, com a renda destinada à conservação do imóvel e sustento da família, desde que não excedentes ao valor do próprio imóvel. (FERREIRA, 2015, p. Única). 2.2.1 No Processo Civil O Código de Processo Civil, em seu artigo 620, aponta a impenhorabilidade decorrente de lei, sendo que na Consolidação das Leis Trabalhista (CLT), conforme Willian Rosa Ferreira (2015), em seu art. 769, estabelece "quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor". (2015, p. Única), e em seus artigos 648 e 649, estipula que os bens são absolutamente impenhoráveis, colocando o Bem de Família como bem não sujeito a execução. 19 Nos termos do art. 649, do Código de Processo Civil: São absolutamente impenhoráveis: I – os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução; II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida; (veja: LEI 11.382/2006) III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor; IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo; V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; VI - o seguro de vida; VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas; VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social; 19 X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança. XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político. (Lei nº 11.694, de 2008) § 1° A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem. § 2° O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia. § 3° (VETADO).( VADEMECUM, 2015, p. 407) As súmulas no Direito Brasileiro são criadas por um Tribunal que registra sua interpretação. Nesse sentido, condiciona Prussak; após vários casos de Execução por Dívidas de devedores solteiros, viúvos ou divorciados, do qual os embargos à execução foram 24 fundamentados na impenhorabilidade de bens, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 364, dispondo a seguinte redação: “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas”. (2014, p. 23). 2.3 REQUISITOS PARA A PROPRIEDADE SER QUALIFICADA COMO BEM DE FAMÍLIA Inicialmente terá de ser propriedade da família, esta constituída pelo provedor chefe, homem ou a mulher, sendo o imóvel rural ou urbano, devidamente registrado mediante escritura publica, a servir para domicilio da sociedade familiar, com a cláusula de impenhorabilidade. A instituição do bem de família é pertinente tanto aos cônjuges casados, quanto aos com união estável. (FERREIRA, 2015). A Constituição Federal, em seu art. 226, § 3º e § 4º, reconhece união estável, além de estender o conceito à comunidade formada por qualquer dos pais e 20 seus descendentes. Nesta hipótese prescinde avocarmos, pela improcedência da taxatividade das formas familiares, e pela admissibilidade de se estender a proteção a solteiros e homossexuais. O autor destaca o manifesto da Egrégia Câmara e suas célebres decisões em Recurso Especial submetido ao STJ, confirmada em Embargos de Divergência, o qual transcrevemos: RESP - CIVIL - IMÓVEL - IMPENHORABILIDADE -A Lei nº 8.009/90, o art. 1º precisa ser interpretada consoante o sentido social do texto. Estabelece limitação à regra draconiana de o patrimônio do devedor responder por suas obrigações patrimoniais. O incentivo à casa própria busca proteger as pessoas, garantindo-lhes o lugar para morar. Família, no contexto, significa instituição social de pessoas que se agrupam, normalmente por laços de casamento, união estável, ou descendência. Não se olvidem ainda os ascendentes. Seja o parentesco civil, ou natural. Compreende ainda a família substitutiva. Nessa linha, conservada a teleologia da norma, o solteiro deve receber o mesmo tratamento. Também o celibatário é digno dessa proteção. E mais. Também o viúvo, ainda que seus descendentes hajam constituído outras famílias, e como, normalmente acontece, passam a residir em outras casas. "Data vênia", a Lei nº 8.009/90 não está dirigida a número de pessoas. Ao contrário - à pessoa. Solteira, casada, viúva, desquitada, divorciada, pouco importa. O sentido social da norma busca garantir um teto para cada pessoa. Só essa finalidade, "data vênia", põe sobre a mesa a exata extensão da lei. Caso contrário, sacrificar-se-á a interpretação teleológica para prevalecer a insuficiente interpretação literal. (FERREIRA, 2015, p. Única). Venosa em sua obra Direito de Família leciona que: Sobre o bem de família em seu sentido global e social: de nada adianta para a família ter seu prédio residencial imune a execuções se não há possibilidade de mantê-lo e de manter ali os integrantes da família. Neste sentido, permite o código de 2002, que o instituidor destine recursos para essa manutenção que poderá consistir em aplicações financeiras, alugueres etc. (2004, p. 395). No ordenamento descrito no Código Civil, art. 1722 “Extingue-se, igualmente, o bem de família com a morte de ambos os cônjuges e a maioridade dos filhos, desde que não sujeitos à curatela” ( 2015, p. 269). 2.4 A IMPENHORABILIDADE DO ÚNICO IMÓVEL DA FAMÍLIA Não podemos misturar o bem de família, prenunciado nos arts. 70 a 73 do Código Civil, com a impenhorabilidade do único imóvel da família, urbano ou rural, concebido pela Lei n° 8.009/90 art. 1° 2°, 4°, inciso 2°. Os bens móveis que 21 emolduram o imóvel, também não podem ser empenhorados. Estes devem estar devidamente quitados, e a entidade familiar nele tenha fixado residência permanente. Incluem as plantações, construções, benfeitorias, equipamentos, bem como aos de uso profissional, de qualquer natureza. (FERREIRA, 2015). Quando da presença de menores no processo, pode-se solicitar a intervenção do Ministério Público, para certificar que os interesses dos mesmos estão sendo amparados. Sempre que o casal ou um dos cônjuges, casados ou amasiados, destina imóvel próprio para residência da família, com cláusula de não poder ser alienado e de ficar isento de execução por dívidas (impenhorável). (IBID). Abaixo exemplificamos com o julgado de uma apelação cível: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO - PENHORA DE BENSMÓVEIS QUE GUARNECEM A RESIDÊNCIA DA EMBARGANTE - IMPOSSIBILIDADE - PROVA DE PROPRIEDADE - BEM DE FAMÍLIA IMPENHORABILIDADE - VERBA FIXADA A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - OBEDIÊNCIA AO CRITÉRIO EQÜITATIVO DO ART. 20, § 4º, DO CPC - RECURSO IMPROVIDO. Não podem ser penhorados bens móveis se comprovados que todos os bens que guarnecem o imóvel onde ocorreu a penhora são de propriedade exclusiva da embargante que não figura no polo passivo do processo de execução, e por serem impenhoráveis, conforme art. 1°, parágrafo único, da lei 8.099/90. Nos embargos de terceiro, os honorários advocatícios devem ser fixados conforme art. 20, § 4°, do Código de Processo Civil, por não haver condenação neste tipo de ação. (FERREIRA, 2015, p. Única). O autor levanta a questão em relação ao imóvel residencial de uma pessoa solteira também estaria incluída na proteção da Lei 8.009/90, e nos oferece a resposta através da interpretação do seu art. 1º, onde ninguém tem o direito de despejar quem quer que seja na rua para satisfazer um crédito. O imóvel residencial foi considerado impenhorável, sob a compreensão do princípio da dignidade da pessoa humana. O valor “personalidade” tem predomínio neste caso, devendo imperar em face de um direito de crédito inadimplido. A questão se resolve também através do art. 1º, III, da Constituição Brasileira, que eleva a dignidade humana ao patamar de fundamento da República. (IBID). 2.5 ALGUMAS EXCEÇÕES À REGRA DA IMPENHORABILIDADE 22 Segundo Prussak, o bem de família convencional ou voluntário está disciplinado no Código Civil e o bem de família legal e involuntário está disciplinado pela Lei 8.009/90. O bem de família voluntário de acordo com o Código Civil em seu artigo 1.711 deverá ser formalizado por escritura pública ou testamento, considerando-se constituído a partir do registro do respectivo título no Registro de Imóveis. Após o registro, o imóvel passa a ser impenhorável por dívidas futuras, com as ressalvas do art. 1.715 do Código Civil de 2002 o qual dispõe que o bem de família voluntário é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio. (2014, p. 12). A norma jurídica estabelecida pela lei 8009/90, prevê, todavia algumas exceções à regra da Impenhorabilidade, pois aqui temos alguns conflitos aparentes de direitos, “onde e quando casos desta natureza se confrontarem, a cautela, e a prudência deve ser o principal elemento, pois o interesse publico é veementemente superior ao do particular”.(FERREIRA, 2015, p. ÚNICA). Silva nos aponta as hipóteses em que não se mantém a condição de impenhorabilidade: nas ações movidas em razão de créditos trabalhistas. restringese aos “trabalhadores da própria residência, tratados como domésticos, desde funcionários encarregados da limpeza, como babás e mesmo motoristas, bem como às suas respectivas contribuições de natureza previdenciárias”.( 2015, p. Única). Da mesma forma é o entendimento de Fabrizio Rodrigues Ferreira, no artigo Da Penhorabilidade do Bem de Família: Ao permitir a penhora em bem de família quando em choque com “créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias” sofre clara influência do direito social laboral e previdenciário. Visa-se afastar lesão a crédito trabalhista e previdenciário daquele trabalhador que laborou em prol da própria família a princípio beneficiada; não se olvidando que ele trabalhador também possui família.( 2015, p. Única). A doutrinadora Rita de Cássia Corrêa de Vasconcelos apud Salata, nos ajuda a interpretar o dispositivo em questão: Os trabalhadores que a Lei se refere são aqueles que exercem atividade profissional na residência do devedor, incluídos nessa categoria os considerados empregados domésticos – empregadas mensalistas, governantas, copeiros, mordomos, cozinheiros, jardineiros e mesmo faxineiros diaristas se caracterizando vinculo empregatício, bem como os motoristas particulares dos membros da família. Não se enquadram nessa categoria pessoas que, embora realizem atividade profissional na residência 23 do devedor, não são seus empregados, exercendo trabalho autônomo ou vinculado a outro empregador. Nesse contexto estão os pedreiros, pintores, marceneiros, eletricistas, encanadores, e outros profissionais que trabalham no âmbito da residência apenas em caráter eventual. (2015, p. 61) Credor de Financiamento destinado à construção ou à aquisição do próprio imóvel que serve como residência familiar: “entendeu o legislador por bem limitar os créditos àqueles constituídos em função apenas do contrato estabelecido entre ambas às partes, promovendo, assim, equidade entre elas”.(FERREIRA, 2015, p. Única). Credor de pensão alimentícia de qualquer natureza: “esta restrição face ao caráter alimentar da prestação devida, que em conflito de princípios e garantias, entendeu o legislador por bem beneficiar o devedor”.(IBID, p. Única). Ferreira opina que neste caso novamente ocorre um conflito de normas; Onde o interesse do alimentado entra em confronto com o do alimentante, novamente o direito de alimento, no sentido rústico, choca-se com o direito de propriedade. Por analogia o dispêndio tem dado guarita ao alimentado, ate mesmo pela necessidade de continuação da espécie, a livre iniciativa de desenvolvimento do ser humano.(2015, p. Única). Cobrança de impostos: prediais ou territoriais, bem como taxas e contribuições: “essa restrição diz respeito unicamente quando o tributo cobrado advém exclusivamente do imóvel que é objeto da execução”.(SILVA, 2015, p. Única). Execução de hipoteca sobre o imóvel da família; “desde que oferecido este bem como garantia real pela entidade familiar detentora do imóvel”.(IBID). Aquisição de imóvel como produto de crime, ou quando este bem é utilizado em execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens: “a impenhorabilidade do imóvel não pode ser alegada, uma vez que provém de atividade ilegal, ou visa ressarcir dano causado por ação ilícita”.(IBID, p. Única). Conforme Ferreira (2015), A lei penal admite nos crimes de tóxicos e contrabando a perda dos bens adquiridos por ilícito, no mesmo diapasão a referida lei, não oferece abrigo para aqueles que adquirem produtos oriundos de ilegalidade sendo portanto, insuscetível de impenhorabilidade. Contratos de Locação: “o legislador previu a exceção de reconhecimento do caráter de impenhorabilidade dos imóveis concedidos em fiança”. (IBID, p. Única). 24 Essa exceção aos bens impenhoráveis conforme Sousa e Lira (2015), surgiu através do art. 82 da Lei 8.245/91, da Lei do Inquilinato. 25 3 A (IM)PENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR NOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO Para podermos analisar a impenhorabilidade do bem de família do fiador, necessitamos tomar ciência das leis que revestem esta questão. Preconiza o Código Civil, em seu art. 818, o conceito deste tipo de contrato: “Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra”. (VADEMECUM, 2015, p. 202). Para Souza (2015), o contrato de fiança nada mais é do que um contrato de garantia, objetivando assegurar obrigação de outrem, caso este não a cumpra. A fiança é obrigação acessória, que pressupõe outra obrigação principal de que é garantia. É também um contrato um contrato unilateral, obrigando-se com o credor, mas este nada assumindo em relação ao fiador. Também é um contrato bilateral imperfeito, pois se o fiador vier a pagar poderá mover ação contra o afiançado para ressarcimento. Qualquer pessoa com bens livres pode vir a ser um fiador, porém é dedado aos cônjuges, sem a autorização do outro, para que a fiança seja válida, necessário a sua outorga, com exceção no regime de separação absoluta. Segundo Souza tal entendimento é pacifico no Superior Tribunal de Justiça que editou a Súmula 332, que dispõe o seguinte: “a fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia”. (2015, p. Única). Caso o inquilino venha a não pagar os alugueis ou demais encargos, e não tiver como pagar, o fiador será responsabilizado, e seu imóvel residencial poderá ser penhorado. Na interpretação de Ferreira: A regra é absurda ao olhar do autor, sendo legítima e inconstitucional. Esta aqui veementemente confrontado o sistema de valores onde, o direito constitucional, fulcrado na dignidade da pessoa humana, sobrepõem o direito material da lei do inquilinato. Por ser uma lei infraconstitucional não tem o condão de sobressair ao direito constitucional razão por qual, tal vertente encontra-se engramado na esfera da inconstitucionalidade. O imóvel do próprio inquilino, caso tenha um, é impenhorável, enquanto o do fiador responderá pela dívida, que, diga-se de passagem, não lhe é própria, Vê-se, aqui, atentado contra o principio da justiça material, corolário de nossa Constituição e, via de consequência, de nosso ordenamento jurídico. Para eliminar a cláusula de bem de família os instituidores deverão requerer ao juiz, que expedirá o mandado de liberação, desde que haja consentimento dos interessados. Tratando-se de imóvel rural, fica incluída na cláusula, com as mesmas regras de inalienabilidade e, principalmente, impenhorabilidade; a mobília e utensílios domésticos, gado e instrumentos 26 de trabalho, desde que mencionados minuciosamente na escritura de instituição do bem de família.(2015, p. única). O mesmo autor nos expõe que nos imóveis alugados, a regra mantém-se intacta, apenas os bens do interior da residência serão havidos como impenhoráveis, restando, claro o despropósito do inequívoco, ou seja, livre da má fé. Segundo Sousa e Lira, a Lei do Inquilinato determina que: se o inquilino que não pagar os aluguéis ou demais encargos, e não tiver como pagar, o fiador será responsabilizado, e seu bem de família poderá ser penhorado; essa regra enseja diversas discussões confrontando o sistema de valores onde os direitos constitucionais baseado na dignidade da pessoa humana sobrepõem o direito material da lei do inquilinato, alguns até afirmam que a Constituição Federal não recepcionou o inciso VII por confrontar diretamente com o art. 6º da CF/88, que através da EC nº 26 acrescentou o direito à moradia. Por ser uma lei infraconstitucional não tem o condão de sobressair ao direito constitucional razão por qual, tal vertente encontra-se na esfera da inconstitucionalidade.( 2015, p. Única). Sabatovski e Fontoura apontam em julgado de 19991: Penhora. Execução. Imóvel residencial do avalista. Hermenêutica. Superveniência da lei de impenhorabilidade no curso da execução. Constrição de reforço efetuada já na vigência da nova lei. Avalista que não reside no imóvel mas promove, há quase um ano, ação de despejo para uso próprio. Inexistência de ato jurídico perfeito ou direito adquirido do exequente. Penhora insubsistente. Lei 8.009/90, arts. 1º. CF/88, art. 5º, XXXVI. “Sobrevindo a Lei 8009/90 na dependência da execução, não há o que se falar em ato jurídico perfeito ou direito adquirido do exequente sobre o único bem residencial do avalista, quando a penhora é realizada na vigência da nova lei, ainda que o avalista não resida no imóvel, mas esteja promovendo ação de despejo para uso próprio.” (1º TACSP – Agravo de Instrumento 491.831 – Rel.: Juiz Antônio de Pádua Ferraz Nogueira – J. em 12/11/1991). (2004, p. 27). Souza apud Rizzardo contempla: Que o direito a um crédito não pode, na sua satisfação, acarretar consequências ou efeitos tão drásticos que ferem a dignidade e o próprio direito de viver. Evidente que, entre o direito ao pagamento de uma dívida e o de morar, este fica numa escala imensamente superior, merecendo privilégios na proteção. (2005, p.855). Por se tratar o contrato de fiança meramente acessório, Souza questiona: Seria justo ou razoável o fiador ser responsabilizado com seu único imóvel residencial, seu único bem de família? Até onde é coerente ser o fiador responsabilizado com seu único bem de família, conquanto a mesma regra não ser aplicada ao imóvel do locatário. ( 2015, p. Única). 27 A lei ao anunciar que há ressalvas, nega a impenhorabilidade absoluta, e cria a impenhorabilidade relativa. Observando o disposto no art. 595 do Código de Processo Civil: O fiador, quando executado, poderá nomear a penhora bens livres e desembargados do devedor. Os bens do fiador ficarão, porém, sujeitos à execução, se os do devedor forem insuficientes à satisfação do direito do credor. Parágrafo único. O fiador, que pagar a dívida, poderá executar o afiançado nos autos do mesmo processo. (VADEMECUM, 2015, p. 404). Atentamos que ajusta-se com o art. 818 do Código Civil, o qual define que “pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra”.(IBID, p. 202). Expõe Souza (2015), que existem duas Súmulas do Superior Tribunal de Justiça que visam revestir de proteção jurídica o fiador nos contratos de locação, uma vez que este não pode ficar completamente desamparado, Responde o fiador com seu patrimônio pessoal, e com relação à penhorabilidade do bem de família do fiador por dívidas do locatário, o inciso VII, art. 3º da lei 8.009/90 permite a penhora. Tal dispositivo afronta ou não o art. 6º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Ao ser levada esta matéria ao Supremo Tribunal Federal percebesse a não existência de unanimidade nos pareceres, apontando que ainda teremos muito que avançar na questão; Este decidiu com sete votos a favor e três contras, que “o único imóvel (bem de família) de uma pessoa que assume a condição de fiador em contrato de aluguel pode ser penhorado, em caso de inadimplência do locatário”, e como visto, não viola o direito de moradia enquanto direito fundamental. Houve votos desfavoráveis a penhora do bem de família, sob o argumento de que a mesma regra não é aplicada ao afiançado, ou seja, esta diante de um forte indício de que há a violação ao princípio da isonomia, ainda que o fiador tenha conhecimento do risco que esta assumindo, não pode o contrato acessório da fiança trazer mais obrigações do que o contrato principal. (SOUZA, 2015, p. Única). Examinaremos um julgado a favor da corrente minoritária, onde o bem de família do fiador não responde pelas dívidas decorrentes do contrato de locação, reafirmando a tese de afronta ao direito fundamental de moradia. APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - CONTRATO DE LOCAÇÃO - FIADOR - PENHORA RECAÍDA SOBRE O ÚNICO IMÓVEL RESIDENCIAL - IMPENHORABILIDADE - BEM DE FAMÍLIA - PROTEÇÃO 28 AO DIREITO FUNDAMENTAL DA MORADIA - EXEGESE DO ARTIGO 1º DA LEI N. 8.009/90 E ARTIGO 6º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Estando a moradia erigida a um direito fundamental a ser protegido, conforme preconizado no artigo 6º da Constituição Federal, deve ser reconhecida a impenhorabilidade do imóvel pertencente ao fiador de contrato locatício quando único e utilizado pela entidade familiar para fim residencial. (SANTA CATARINA. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 2008.069706-5 da Capital. Relator Desembargador Fernando Carioni. Julgado em 16/12/2008. Disponível em <http://www.tj.sc.gov.br>. Acesso em 25/10/2013). (SOUZA, 2015, p. Única). Verificaremos também outra ação tramitada e julgada (JURISWAY, 2015), que apresenta a arguição de impenhorabilidade do bem de família, sendo sujeita a sua validade mesmo que ocorra no momento da apelação, por tratar-se de matéria de ordem pública, passível de ser conhecida pelo julgador a qualquer momento até a sua arrematação, não existindo decisão final no processo. Com base nesse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento unânime, rejeitou recurso especial interposto por um espólio (ação contra o avalista de uma nota promissória no TJRJ, alegando tratar-se de fiança de aluguel), que havia reconhecido um imóvel como bem de família e declarado sua impenhorabilidade. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), reconheceu tratar-se de imóvel residencial utilizado como moradia familiar, e afastou a penhora. Entre outras arguições, em recurso especial, que a questão da impenhorabilidade com base na Lei 8.009 estaria preclusa, por não ter sido levantada no momento oportuno, nos embargos apresentados, mas apenas na apelação, como também que a proteção dada pela Lei 8.009, ao bem de família, deveria ser afastada no caso, pois o artigo 3º da lei admite a penhora quando se tratar de dívida oriunda de fiança prestada em contrato de locação. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, observou: não haver violação de lei por parte do TJRJ; a inexistência de provas sobre a alegada origem da dívida em fiança de locação foi afirmada pelo tribunal estadual e não poderia ser revista pelo STJ; que a jurisprudência entende que o magistrado não pode reformar decisão em que já foi definida a questão da impenhorabilidade do bem de família à luz da Lei 8.009, porque a matéria estaria preclusa. Sobre o ônus da prova essa questão é irrelevante no caso, pois o TJRJ concluiu pela caracterização do bem de família com base em elementos probatórios existentes no processo, não no uso da técnica do ônus da prova. Um desses elementos foi a indicação do imóvel como endereço do devedor, feita pelo próprio autor da 29 execução. Diante dessas observações, o colegiado negou provimento ao recurso do credor.(JURISWAY, 2015, p. Única). Abaixo alguns julgados demonstrando as tendências das cortes e a não existência de unanimidade sobre a forma de proceder sobre a questão de impenhorabilidade do bem de família como também da situação do fiador de imóvel. PROCESSO: AgRg no AREsp 46775/SP AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2011/0127042-5 RELATOR: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI (1145) Orgão Julgador: T4 - QUARTA TURMA Data de Julgamento: 26/06/2012 Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA. LEI 8.009/90. EMPRÉSTIMO. SOCIEDADE. EXECUÇÃO. FIADORES. OMISSÃO. ARTIGO 535, DO CPC. VIOLAÇÃO. NÃO PROVIMENTO. 1. É omisso o acórdão que não se manifesta sobre questão essencial à solução da lide. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. Acórdão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi, Luis Felipe Salomão (Presidente) e Raul Araújo votaram com a Sra. Ministra Relatora. Outras Informações: É impenhorável o bem que serve de moradia, ainda que haja outros imóveis em nome do casal ou de um dos consortes, uma vez que a lei protege, antes de mais nada, a moradia, cabendo ao credor buscar a satisfação do crédito por meio dos demais bens existentes. [...] PROCESSO: AgRg no REsp 1061373 / SP AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2008/0114456-0 RELATOR: Ministro OG FERNANDES (1139) Orgão Julgador: T6 - SEXTA TURMA Data de Julgamento: 07/02/2012 Ementa: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FIANÇA. CONTRATO DE LOCAÇÃO. AUSÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA. IRRELEVÂNCIA NO CASO, EM FACE DE A GARANTIA TER BENEFICIADO O CASAL. DISSIDÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDA. SÚMULA 83/STJ. NULIDADE DO ACÓRDÃO NÃO CONFIGURADA. 1. Não ocorre contrariedade ao art. 535 do Código de Processo Civil quando o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, todas as questões postas ao seu exame, assim como não há que se confundir entre decisão contrária ao interesse da parte e inexistência de prestação jurisdicional. 2. Peculiaridades do caso concreto que afastam o entendimento da Súmula 332/STJ. Além de o recorrente ter conhecimento da garantia, obteve proveito da locação, utilizando-se do imóvel para administrar a sua própria empresa. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. A orientação predominante nesta Corte é no sentido de que a impenhorabilidade prevista na Lei n.º 8.009/90 não se estende ao imóvel do fiador, em razão da obrigação decorrente de pacto locatício. 4. Nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC, e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ, é atribuição do recorrente demonstrar a dissidência, mencionando as 30 circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. Dissídio de que não se conhece por aplicação da Súmula 83/STJ. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. [...] PROCESSO: AgRg nos EDcl no REsp 911321 / RS AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2006/0110333-9 RELATOR: Ministra LAURITA VAZ (1120) Orgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA Data de Julgamento: 05/10/2010 Ementa: LOCAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. DÍVIDA DE FIADOR EM CONTRATO LOCATÍCIO. PENHORA. ALEGADA AFRONTA AO ART. 535 DO DIPLOMA PROCESSUAL. NÃO OCORRÊNCIA. SUPOSTA AFRONTA AO ART. 463 DO CODEX PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INDIVISIBILIDADE DO BEM IMÓVEL DADO EM GARANTIA. POSSIBILIDADE DE PENHORA DE 50% DA FRAÇÃO IDEAL. ALEGAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA. ASSINATURA DO CONTRATO APÓS A VIGÊNCIA DA LEI N.º 8.245/91. ADMISSIBILIDADE DE PENHORA. 1. O acórdão hostilizado solucionou todas as questões de maneira clara e coerente, apresentando as razões que firmaram o seu convencimento. 2. A matéria tratada no art. 463, incisos I e II, Código de Processo Civil não restou debatida pelo Tribunal de origem, a despeito da oposição dos embargos declaratórios, razão pela qual incide, na espécie, o óbice da Súmula n.o 211 deste Tribunal. 3. Com o advento da Lei n.º 8.245/91 – que introduziu uma nova hipótese de exclusão da impenhorabilidade do bem de família – restou autorizada a penhora do bem destinado à moradia do fiador, em razão da obrigação decorrente de pacto locatício, aplicando-se também aos contratos firmados antes da sua vigência. Precedentes. 4. O entendimento pacifico desta Corte é no sentido de que é possível a penhora de fração ideal de imóvel. Precedentes. 5. Agravo regimental desprovido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) e Gilson Dipp votaram com a Sra. Ministra Relatora. [...] PROCESSO: AgRg no Ag 1074247 / SP AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2008/0143716-3 RELATOR: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO (1133) Orgão Julgador: T5 - QUINTA TURMA Data de Julgamento: 19/02/2009 Ementa: LOCAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENHORA DO IMÓVEL DO FIADOR EM CONTRATO DE LOCAÇÃO. DÍVIDAS ANTERIORES À INSTITUIÇÃO DO IMÓVEL COMO BEM DE FAMÍLIA. ART. 1.715 DO CÓDIGO CIVIL/2002. IMPENHORABILIDADE AFASTADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 31 1. O egrégio Tribunal a quo assentou ser inaplicável ao fiador do contrato de locação a impenhorabilidade de que trata o art. 3o. da Lei 8.009/90, mesmo após a instituição do imóvel como bem de família, uma vez que a obrigação do fiador fora contraída anteriormente à referida instituição, estando, ainda, no curso do contrato. 2. Tal entendimento coaduna-se com a letra do art. 1.715 do Código Civil/2002, segundo o qual o bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio. Assim, não há como se isentar as dívidas postuladas pelo ora agravado, como pretendido, haja vista que tais débitos são anteriores à instituição do imóvel como bem de família, o que afasta a alegada impenhorabilidade. 3. A desconstituição da assertiva lançada pelo juízo ordinário referente à anterioridade da dívida em relação à instituição do imóvel como bem de família esbarraria na Súmula 7 do STJ, por demandar o vedado revolvimento do suporte fático-probatório. 4. As demais questões ora suscitadas pelos agravantes, atinentes à existência de outros bens a serem penhorados ou à ocorrência de novação, não podem ser examinadas em Recurso Especial, pois, além de não prequestionadas, demandam reexame de prova (Súmulas 7/STJ e 282 e 356/STF). 5. Agravo Regimental desprovido. Acórdão: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao Agravo Regimental. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer. (BRASIL, 2015, p. Única). Nos autos das ações tramitadas e julgadas, observamos a proteção incontestável do bem de família e a demonstrando primordial da função social da Lei 8009/90. Porém, este não é o entendimento majoritário na jurisprudência, ou seja, a penhora do bem de família do fiador decorrente de contrato de locação é plenamente legal, os juristas que a defendem afirmam que o Princípio da Isonomia não é atingido, pois não há nem mesmo igualdade entre fiador e locatário, pois suas naturezas jurídicas são diversas. Veremos a decisão que o Ministro Cezar Peluso, relator do Recurso Extraordinário n.º 407.688, STF, decidido em 08 de fevereiro de 2006: RECURSO EXTRAORDINÁRIO 407.688-8 SÃO PAULO RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO EMENTA: FIADOR. Locação. Ação de despejo. Sentença de procedência. Execução. Responsabilidade solidária pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel residencial. Bem de família. Admissibilidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6º da CF. Constitucionalidade do art.3º, inc. VII, da Lei nº 8.009/90, com a redação da Lei nº 8.245/91. Recurso extraordinário desprovido. Votos vencidos. A penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação, objeto do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009, de 23 de março de 1990, com a redação da Lei nº 8.245, de 15 32 de outubro de 1991, não ofende o art. 6º da Constituição da República. (BRASIL, 2015, p. Única). O Ministro Cezar Peluso defende a constitucionalidade da referida exceção e afirma que eliminar tal técnica seria como romper o equilíbrio do mercado e sendo assim outras garantias teriam que existir e poderiam ser mais custos as quando no ato de locar. Consideraremos que o conteúdo da Lei 8009/90, enseja ainda muita discussão quanto à constitucionalidade devido à confrontação de alguns princípios que são à base do nosso ordenamento. 33 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Entendemos, que não se trata apenas em legislar o direito formal, mas a própria essência da família humana, como elemento inexequível de ser calculado, reconhecendo que a impenhorabilidade do bem de família esta condicionada ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, elementos intrínsecos da própria norma constitucional. A proteção conferida ao bem de família harmoniza-se com os princípios da dignidade humana, da solidariedade social, da igualdade substancial, da erradicação da pobreza, da função social da propriedade, além do direito social à moradia. Portanto, essa proteção revela-se um instrumento que pretende privar a prevalência dos interesses particulares dos credores, em favor da preservação da dignidade do indivíduo e da sua família. A corrente majoritária do Supremo Tribunal Federal, esclarece que a penhorabilidade do bem de família do fiador por dívidas do locatário, não fere o direito fundamental de moradia, sendo a maioria dos julgados. Mas existe entendimento divergente conforme podemos verificar nas ações apontadas e analisadas acerca do assunto. Acreditamos que com a evolução do Direito, a corrente minoritária ganhe corpo, proteja a família do fiador, fazendo valer o direito fundamental à moradia, bem como torne-se pacífico o entendimento de que é impenhorável o único bem de família do fiador, reconhecendo que esta não afronta o princípio da isonomia, mais sim, obedecendo a função social que o direito e a justiça devem resguardar para todos. 34 REFERÊNCIAS ARAUJO, Thicianna da Costa Porto. Bem de Família e a Impenhorabilidade. Disponível em: http//www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_749. Acesso em: 26 Mar. 2015. BRASIL. Lei nº 8009/90. Impenhorabilidade do bem de família. 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