UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FACULDADE DE EDUCAÇÃO LETÍCIA SANTOS DA CRUZ ESCRITA DOCENTE: MONOGRAFIAS DO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO SABERES E PRÁTICAS – ALFABETIZAÇÃO, LEITURA E ESCRITA EM FOCO Rio de Janeiro 2014 LETÍCIA SANTOS DA CRUZ ESCRITA DOCENTE: MONOGRAFIAS DO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO SABERES E PRÁTICAS – ALFABETIZAÇÃO, LEITURA E ESCRITA EM FOCO Dissertação apresentada à Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Profa. Dr. Ludmila Thomé de Andrade Rio de Janeiro 2014 LETÍCIA SANTOS DA CRUZ ESCRITA DOCENTE: MONOGRAFIAS DO CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO SABERES E PRÁTICAS – ALFABETIZAÇÃO, LEITURA E ESCRITA EM FOCO Dissertação apresentada à Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Profa. Dr. Ludmila Thomé de Andrade Aprovada em:___________de ____________________de 2014. Banca Examinadora Prof. Dra. Ludmila Thomé de Andrade Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro. Assinatura:_________________ Prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado Instituição: Universidade Estadual de Campinas. Assinatura: ___________________ Prof. Dra. Ana Maria Ferreira da Costa Monteiro Instituição: Universidade Federal do Rio de Janeiro. Assinatura:_________________ Rio de Janeiro 2014 A Paulo Roberto e Maria Celeste, Meus Pais. Trago dentro de meu coração, Como num cofre que se não pode fechar de cheio, Todos os lugares onde estive, Todos os portos a que cheguei, Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias, Ou de tombadilhos, sonhando, E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que eu quero. Fernando Pessoa Poesia de Álvaro de Campos. 1916. 3 AGRADECIENTOS Primeiramente a Deus por me permitir vivenciar essa experiência. Aos meus pais, pela paciência e tolerância ao entenderem minha ausência tão presente no cotidiano que nossas vidas se tornou. Obrigada pelo abrigo e cuidado. Aos meus irmãos Ânderson e Mayara. Nossas diferenças me fazem cada vez mais consciente de mim e do quanto ainda preciso aprender. Nossas igualdades mostram-me o meu lugar de pertencimento. Não posso deixar de mencionar a Débora, minha cunhada, e Gabriel, o sobrinho do coração. Obrigada por fazerem parte da minha vida, me compreenderem e apoiarem todas as minhas escolhas. Ao meu gato Positivo, companhia fiel que me ajudava na descontração nos momentos de escrita. Ao Paulo Lucio, amor não concretizado, mas tão fortalecedor. Você faz parte desse processo também. À Lud, que me conquistou desde a graduação, caminhou comigo na monitoria e iniciação científica, sempre me incentivando ao mestrado. Obrigada pelo carinho, pela vida compartilhada, pela orientação cuidadosa e pelo respeito. A Dra. Sonia Amat pela escuta atenta há tantos anos. Às amigas, Cristina, Luciana, Luiza, Bruna, Fernanda, Renata e Beth. Obrigada pela a ponderação, conselhos, acolhimento de mãe, risos e gargalhadas, lágrimas e abraços, pela loucura nossa de cada dia, pelo trabalho, lanches, almoços e sanduíche da janta também, pelo jeito mulherzinha de cada uma ser. Sem vocês teria sido muito mais difícil passar por essa etapa. A todos do Grupo de Pesquisa do LEDUC. Seus enunciados também me formaram. 4 Aos meus companheiros de trabalho Raquel Moraes e Rodrigo Merat, amigos sempre atentos e ajudadores. Nossas gargalhadas me impulsionaram para que essa escrita acontecesse. Não posso esquecer da Ingrid, chuchu do Rodrigo, obrigada pelo auxílio técnico com as representações e por compartilhar esse momento tão singular. À banca examinadora pelo olhar responsivo e responsável sobre a minha escrita. À Solange e toda a equipe da Secretaria do PPGE. Muito obrigada por organizarem tão bem minha vida acadêmica. À Marcela e a Luciana da Secretaria do CESPEB. Muito obrigada por abrirem as porta para que eu pudesse colher as informações que precisava e por toda ajuda durante esse tempo de pesquisa. Às alunas professoras do CESPEB, sem suas escritas esse trabalho não existiria da forma que é. A todos os professores que contribuíram para minha formação. Às minhas crianças da Educação Infantil que a cada dia me ensinam coisas novas e me fazem uma pessoa mais feliz. 5 RESUMO CRUZ, Letícia S.Escrita docente: monografias do curso de especialização Saberes e Práticas – alfabetização, leitura e escrita em foco. Rio de Janeiro, 2014. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. A pesquisa objetivou pensar a escrita docente como um caminho que possibilite o professor a repensar suas práticas, levando-o a se perceber como autor de seus próprios textos e como sujeito histórico de saberes que reverberam em sua trajetória e profissional. Essa pesquisa fundamentou-se no princípio de que a formação continuada pode ser um espaço em que o professor pense suas práticas e suas relações cotidianas como possibilidade de ver-se inserido em um processo formativo do qual ele é realmente parte fundamental. Assim como seus alunos que estão no dia a dia da escola, podendo criar recursos para enxergar as várias formas de falar sobre sua prática e levar outros, as crianças, a também falarem de si e de seus saberes a partir da aquisição da linguagem escrita. A pesquisa se originada análise documental das monografias elaboradas por professoras alfabetizadoras, alunas de duas turmas do curso CESPEB - Curso de Especialização Saberes e Práticas da Educação Básica – oferecidos respectivamente em 2008-2/2009 e 2010/2011-1 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Esse trabalho propõe-se a analisar as monografias produzidas no CESPEB- Alfabetização a partir das leituras de Bakhtin e de autores pesquisadores, tomando o conceito de que o professor incorpora diferentes vozes sociais, constituindo-se assim autor de seus próprios textos. Foram observadas nas monografias as marcas do gênero acadêmico na escrita das alunas-professoras, as reverberações que apontam as influências das professoras formadoras no discurso das alunas-professoras e por fim, como o olhar sobre a criança tem importância na constituição do discurso das alunas-professoras sobre a sua prática. Palavras-chave: Escrita Docente, Formação de Professores Alfabetizadores, Formação Continuada. 6 ABSTRACT CRUZ, Leticia S. Teaching Writing: monographs of the specialization course Knowledge and Practices - literacy, reading and writing in focus. Rio de Janeiro, 2014. Dissertation (Master of Education) - Faculty of Education, Federal University of Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. The research aimed think teaching writing as a way that enables the teacher to rethink their practices, leading him to realize as the author of his own texts as historical subject and the knowledge that reverberate in your career and professional. This research was based on the principle that continuing education can be a space in which teachers think their practices and their daily life as a possibility to be seen embedded in a formative process of which it is really crucial part. Like their students are in school every day and can create resources to see the various ways to talk about their practice and lead others, children, also talk about themselves and their knowledge from the acquisition of written language. The research stems from the documentary analysis of monographs prepared for literacy teachers, students from two classes of travel CESPEB - Specialization Course Knowledge and Practice of Basic Education - offered respectively in 2008-2/2009 2010/2011-1 and the Federal University of Rio de Janeiro - UFRJ. This study aims to examine the monographs produced in-CESPEB Literacy from the readings of Bakhtin authors and researchers, taking the concept of the teacher incorporates different social voices, becoming well authored their own texts. Marks the academic genre were observed in monographs written the students-teachers, the reverberations that link the influences of training teachers in the speech of students-teachers, and finally, as the vision of the child is important in the formation of the discourse of students-teachers about their practice. Keywords: Writing Teacher, Teacher Education Literacy, Continuing Education. 7 SUMÁRIO 1.INTRODUÇÃO........................................................................................................08 2.REFERENCIAL TEÓRICO......................................................................................22 2.1 A lente para olhar a Escrita Docente...................................................................22 2.2 Uma questão de Linguagem................................................................................28 2.3 Formação Continuada e o professor desse contexto...........................................35 2.4 A escrita docente como uma possibilidade de um dizer sobre a prática.........................................................................................................................41 3. UM POUCO DE HISTÓRIA....................................................................................52 3.1O CESPEB...........................................................................................................54 3.2 O CESPEB de Alfabetização, Leitura e Escrita...................................................60 4.ESCOLHA DO CAMINHO METODOLÓGICO......................................................68 5.ANÁLISE DOS DADOS– O encontro com o texto das Alunas- Professoras................................................................................................................74 5.1 As marcas do acadêmico na escrita das alunas-professoras..............................75 5.2 Reverberação apontando as interações entre as professoras formadoras e as alunas professoras.....................................................................................................86 5.3 A voz do aluno no percurso profissional como apoio para às prática pedagógicas...............................................................................................................91 6.CONCLUSÕES INACABADAS..............................................................................98 Referências Bibliográficas........................................................................................104 Anexos......................................................................................................................109 8 1. INTRODUÇÃO A partir da minha vivência no curso de Pedagogia da UFRJ, nas disciplinas de práticas de ensino, observei que o espaço da sala de aula pode ser um lugar para o professor pensar sua condição de também aprendiz do processo de aquisição da leitura e da escrita e de repensar suas práticas. A experiência como monitora da disciplina de Didática da Língua Portuguesa permitiu-me ver alunos de períodos já avançados argumentando que entendiam que a proposta da disciplina deveria se pautar em propor um meio de lhes ensinar a como ensinar o aluno dos anos iniciais do Ensino Fundamental a escrever uma palavra “certa”, a usar os sinais de pontuação e as regras gramaticais. As representações da maioria dos futuros professores em formação inicial estavam engessadas pela formação escolar que estes haviam tido. Concebiam a disciplina como um espaço de ensinar a fazer, a como seguir certos passos, talvez um reflexo de como os seus conhecimentos haviam sido aplicados a eles mesmos, quando alunos. Como bolsista de Iniciação Científica, pude construir um olhar distanciado sobre a formação inicial, durante o período de imersão na graduação, e percebi o espaço da sala de aula como um momento para que os futuros docentes reflitam sobre suas práticas como docentes, também futuras. No grupo de pesquisa ao qual essa pesquisa está integrada, temos explorado a noção de homologia de processos, pela qual concebemos que na formação os interlocutores hibridizam diversas identidades - aluno, professor em formação, gestor, mãe/pai, mulher/homem, etc. – nos espaços de interação e interlocução a partir das diversas experiências de formação, sejam essas na universidade, nas Secretarias de Educação, nas formações oferecidas pelo Governo entre outras, produzindo, “possibilidade de compreender que os processos de ensino e aprendizagem ocorridos no chão da escola da Educação Básica podem ser situados num paralelo, articulado aos processos de formação docente.” (Andrade 2011, p. 88) Considereias possibilidades discursivas que se apresentam aos sujeitos como tensionadas pelas alteridades constitutivas dos discursos enunciados. Sendo assim, desde esse momento de minha própria formação inicial, convivendo com as questões do grupo de pesquisa como estudante de Iniciação Científica, passei a 9 apostar numa homologia de processos1. Concebia que a constituição de sujeitos professores, durante o tempo de graduação/formação inicial, os faria se verem projetados nos discursos produzidos em sala de aula, problematizando a escrita e leitura das produções de seus alunos a partir de sua mediação. Durante esse percurso, fui levada a pensar como se daria o mesmo processo para aqueles que já estão na prática. Nesse lugar, ela seria, então, o espaço de pensar os processos de mediação, a qualidade do ensino, as possíveis projeções, etc. Dessa forma, a formação continuada permitiria a estes sujeitos se projetarem para seu lugar de mediadores junto a seus alunos, sobretudo no que se refere às aprendizagens sobre a linguagem. Tornou-se então relevante para mim a discussão do processo de formação dos professores no âmbito da formação continuada, seus conceitos e prioridades como educadores, enquanto espaço para que sujeitos reflitam sobre suas práticas na própria prática. Em meu trabalho monográfico, orientado pela Prof.ª D.ra Ludmila Thomé de Andrade, analisei a escrita das professoras em formação continuada, participantes do Curso de Extensão Alfabetização, Leitura e Escrita em 2007.2, na UFRJ. Neste trabalho, baseada em uma concepção bakhtiniana de linguagem, segundo a qual “pertence ainda ao domínio individual e ao domínio social; ela não se deixa classificar em nenhuma categoria dos fatos humanos, porque não se sabe como isolar sua unidade” (Bakhtin 2009, p.88), constatei que a escrita das professoras pode refletir e refratar vários enunciados, simultaneamente, relativos à sua prática, à teoria apresentada no curso e a uma relação com a formação profissional, dentre outras. Pude concluir que suas escritas revelam traços do diálogo instaurado entre as professoras formadoras e as alunas professoras. Trouxe, para tanto, a essa discussão, a noção de reverberação. Fazendo uma analogia com esse conceito acústico, concebi as vozes das professoras formadoras como as ondas sonoras propagadas (o som inicial) e as alunas professoras como as superfícies refletoras e suas escritas as reverberações dessas ondas sonoras. Essa pesquisa fundamentou-se no princípio de que a formação continuada pode ser um momento em que o professor pense suas práticas e suas relações cotidianas como possibilidade de ver-se inserido em um processo do qual ele é 1 Esse conceito vem sendo utilizado pelo grupo de pesquisa . 10 realmente parte fundamental, assim como seus alunos que estão no dia a dia da escola, podendo criar recursos para enxergar as várias formas de falar sobre sua prática e levar outros, as crianças, a também falarem de si e de seus saberes a partir da aquisição da linguagem escrita. Concebo a escrita docente como um processo de reflexão da própria prática docente, na qual podem ser reverberadas o cotidiano escolar. Concordo com Miller, segundo quem: (...) o processo de construção do texto escrito exige que seu autor ajuste o seu dizer a um determinado interlocutor, às finalidades e intenções que caracterizam esse dizer e que adote uma estratégia de conjunto que realize adequadamente o jogo entre os diferentes planos de construção textual (... ) (MILLER, 2003, p. 2) Entendendo o processo de escrita como um momento significativo de interlocução entre usuários da língua materna, se deve levar em conta os vários tipos de escrita possíveis com suas formas específicas de organização e a funcionalidade das mesmas, para a realização dessa comunicação de acordo com a necessidade do meio do qual se fala e para o qual se fala. Para o sujeito que é posto diante de situações de escrita, é através dessa reflexão, na situação de produção textual, que o domínio da língua vai sendo ampliado, juntamente com a consciência sobre a utilização dos recursos da língua. Tomo como objeto de pesquisa para uma análise documental as monografias elaboradas por professoras alfabetizadoras, alunasde dois cursos CESPEB - Curso de Especialização Saberes e Práticas da Educação Básica – oferecidos respectivamente em 2008-2/2009 e 2010/2011-1 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ. Segundo o Projeto de Implantação do curso, ele faz parte de uma série de ações da UFRJ através do CFCH (Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFRJ) tendo como ações centrais a formação inicial e continuada dos professores da educação básica. A formação inicial está ligada diretamente à Faculdade de Educação e ao Colégio de Aplicação que recebe para seus estágios grande parte dos alunos das licenciaturas, em relação a Formação Continuada de Professores refere-se às ações voltadas para refletir, complementar e atualizar a formação de professores em exercício. 11 Várias são as iniciativas do CFCH que evidenciam, ao longo das últimas décadas, sua participação em programas e /ou projetos de extensão - em parcerias com outros Centros. Entre 1991 e 1994, a UFRJ participou do PAPRE (Programa de Atualização de Professores da Rede Estadual / RJ), um programa de formação continuada para professores do 2º grau, atual Ensino Médio, coordenado pelo Fórum de Reitores e pela Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro.Outra ação foi a criação em 1994 do Núcleo de Consultoria e Atendimento Psicopedagógico (NUCAP) em parceria com a Secretaria Municipal do Rio de Janeiro, a Fundação José Bonifácio/UFRJ e escolas federais, a fim de estabelecer práticas de Orientação Educacional para as comunidades e desenvolver oficinas com os professores do ensino fundamental. A CAPES, dos anos 90, em parceria com as Fundações de Amparo à Pesquisa, reiniciou o financiamento de programas de formação continuada de professores através do Programa Pró-Ciências. A UFRJ, desenvolveu, então, através de diversas unidades CCMN, CFCH e CCS Cursos de extensão e de pósgraduação lato sensu, em diversos formatos destinados à formação permanete de professores. Destacam-se como experiência da Faculdade de Educação na promoção desse tipo de curso o Curso de Especialização em Administração Escolar, aprovado na CEPG em 26/04/1996, ministrado pelo Departamento de Administração Educacional da Faculdade de educação da UFRJ. Destaca-se ainda, a participação da Faculdade de Educação na coordenação e execução do Programa Escola de Gestoresem parceria com o MEC com a implementação do Curso de Especialização em gestão na Educação Básica aprovado na CEPG/UFRJ em dezembro de 2007. A UFRJ reconhece assim a importância dos diversos saberes que circulam entre os diferentes sujeitos que estão envolvidos na esfera educacional, demonstrando empenho e responsabilidade na construção de uma escola e de uma sociedade mais justa, menos dogmática e de qualidade. No mestrado, lanço-me à realização de uma pesquisa que dê continuidade à minha pesquisa monográfica, pois esta é pertinente com o Projeto de Pesquisa “As (im)possíveis alfabetizações de alunos de classe popular pela visão de docentes na escola pública”, no qual estou inserida. O Projeto de Pesquisa tem como uma de suas propostas “afirmar certos modos de concepção da formação docente já testados/experimentados que resultam em mudanças de suas práticas e em 12 resultados positivos de aprendizagem de seus alunos” (Andrade 2010, p.12). Estas ações de formação referem-se aos cursos oferecidos na UFRJ desde 2006 – Curso de Extensão Alfabetização, Leitura e Escrita e, a partir de 2008.2 – Curso de Especialização Saberes e Práticas da Educação Básica (CESPEB), cursos gratuitos destinados a professores do município carioca e outros municípios do Estado do Rio de Janeiro, como Mesquita, Nova Iguaçu e Caxias. Um dos objetivos da pesquisa, no qual ancoro meu trabalho, refere-se à: Exploração do paradigma do professor reflexivo que distancia-se de sua própria prática e assume a tarefa de sobre ela conscientizar-se de alguns aspectos e como o professor pesquisador encontrar soluções para os impasses identificados. (ANDRADE,2010a, p. 8) Diante dessa premissa, tornou-se relevante em minha pesquisa discutir a escrita docente no processo de formação continuada de professores enquanto uma ação na qual os docentes possam refletir sobre suas práticas e venham a se constituir produtores de linguagem. Nessa perspectiva, proponho-me, então, a analisar as monografias produzidas no CESPEB alfabetização a partir das leituras de Bakhtin e de autores pesquisadores que pude considerar como relevantes, tomando o conceito de que o professor incorpora diferentes vozes sociais, constituindo-se assim autor de seus próprios textos. Entre essas vozes, estão as vozes das formadoras, docentes da universidade responsáveis pelas discussões teóricas, o que em meu ponto de vista influencia a prática docente da Educação Básica. No campo da educação,é encontrada com muita freqüência a tensão entre o discurso da teoria e o da prática. De um lado, professores que estão em seu cotidiano, sem saber como dar conta dos processos pedagógicos – no nosso caso, especificamente o processo de alfabetização - de seus alunos e, de outro, o discurso teórico da universidade, buscando uma forma de dar conta de argumentos que façam esses profissionais sentirem-se mais seguros em suas tarefas. Assim, percebo a relevância das vozes das formadoras enquanto a expressão de um saber que está posto na Universidade que toma outras dimensões quando as professoras alfabetizadoras se apropriam dele. Não me refiro às vozes das formadoras como sendo específicas de cada uma, mas remete-me às vozes que 13 estão produzindo enunciados de um determinado lugar, nesse caso, a universidade. Essas vozes irão se corporificar como sentidos nas professoras alfabetizadoras que as ressignificarão dando a elas um acabamento, produzindo a partir dos mesmos, novas vozes que se tornarão outros acabamentos. O saber da universidade produzido e reproduzido pelas formadoras agrega outros sentidos produzidos pelas professoras alfabetizadoras em seus contextos, constituindo, assim, uma rede de enunciados e acabamentos provisórios, inscritos numa temporalidade de duração das memórias que sempre serão inacabados. As pesquisas, de um modo geral, têm por finalidade alterar uma determinada realidade/consciência. Nesse sentido, revela-se a intenção dessa pesquisa em estimular de forma reflexiva a percepção dos professores, em verem-se como autores e personagens de seus próprios textos. Consideramos que vale identificar quais movimentos estão sendo realizados por eles, pela observação do processo de escrita sobre sua prática, que pode levá-los a assumir suas próprias posições e escolhas. Gostaríamos de escapar da posição de defesa de uma verdade, não se tem a pretensão de pela via da pesquisa dizer o que é certo ou errado na prática docente das alunas professoras do CESPEB. Para Bakhtin, “No homem sempre há algo, algo que só ele mesmo pode descobrir no ato da autoconsciência e do discurso, algo que não está sujeito a uma definição à revelia, exteriorizante” (2010, p.66). Se buscássemos dizer às professoras o que elas devem fazer, estaríamos buscando dar um acabamento a essas profissionais, indo completamente no caminho inverso ao que o autor teórico sobre o discurso nos propõe. Na formação continuada, tem-se a oportunidade de uma formação na própria prática, diferentemente da formação inicial dos professores em que esse momento da prática é um vir a ser, uma perspectiva. “O conhecimento é sempre uma relação que se estabelece entre a prática e as nossas interpretações da mesma; é a isso que chamamos de teoria, isto é, um modo de ver e interpretar o nosso modo de agir no mundo” (GHEDIN, 2012, p.152). Refletir sobre a Formação Continuada a partir da Escrita Docente pressupões entender que o professor tem uma reflexão sobre sua prática mas que é preciso que ele produza uma reflexão sobre sua própria reflexão. Estabeleci um levantamento bibliográfico, que foi focalizado entre o período de 2007 a 2011 no portal da CAPES, com as palavras-chave “escrita docente” e 14 “formação continuada de professores alfabetizadores”. Foi possível encontrar os seguintes dados: ANO 2007 2008 2009 2010 2011 Total Demonstrativo do Levantamento Bibliográfico Palavra-chave: Escrita Docente DISSERTAÇÕES TESES Total 8 1 9 6 2 8 12 3 15 6 2 8 5 2 7 37 10 47 Demonstrativo do Levantamento Bibliográfico Palavra-chave: Formação Continuada de Professores ANO DISSERTAÇÕES TESES Total 2007 6 1 7 2008 3 0 3 2009 5 1 6 2010 5 2 7 2011 4 3 7 Total 23 7 30 A partir dos quadros demonstrativos, fica evidente que são pouco numerosas as produções no período especificado, no entanto, vale ressaltar que para a seleção foi usado como critério de escolha o fato de nos títulos e nos resumos haver os termos que fizessem referência a “escrita de professores” e “formação continuada de professores alfabetizadores”, o que de certa forma filtrou as produções, totalizando um quantitativo de 77 trabalhos entre dissertações e teses. Com a palavra-chave “Escrita Docente” foram 37 dissertações e 10 teses, totalizando 47 produções. Com a palavra-chave “Formação Continuada de Professores Alfabetizadores” foram 23 dissertações e 7 teses totalizando 30 produções. Nos 77 resumos lidos, foi possível perceber que muitas dessas pesquisas são perpassadas pela discussão da escrita na formação continuada de professores, no entanto, ficou evidente a ênfase em uma escrita docente voltada para a escrita de memoriais. Esse dado também é evidenciado por Alves (2011) que em sua análise pontua que as pesquisas têm privilegiado as histórias de vida, tendo como um de seus referenciais teórico-metodológico autores como Marie-Christine Josso que nos 15 últimos anos vem defendendo a necessidade investir nas narrativas (auto)biográficas como método de pesquisa e formação. Ainda segundo Alves (2011) as produções escritas tem sido analisadas como instrumento metodológico para investigar os efeitos de propostas de formação inicial ou continuada na trajetória docente. Ressalta que poucos foram os trabalhos que pesquisaram as escritas produzidas no âmbito do trabalho docente ou que a analisaram com o objetivo de compreender as práticas e os saberes profissionais dos professores. Como parte do levantamento bibliográfico, relacionei as instituições ao quantitativo de dissertações e teses, podendo assim, ter um panorama das instituiçõesque estão produzindo pesquisas relacionadas à formação continuada de professores alfabetizadores e a escrita docente. Seguem abaixo os quadros demonstrativos. Demonstrativo das instituições relacionadas às dissertações e teses no período de 2007 a 2011 Palavra-chave: Escrita Docente INSTITUIÇÕES DISSERTAÇÕES TESES Total UFPI 2 0 2 PUC/PR 1 0 1 PUC/RJ 1 1 2 PUC/RS 2 0 2 UNICAP 1 0 1 UNISANTOS 1 0 1 UCS 1 0 1 UPF 1 0 1 USP 1 0 1 UNISO 1 0 1 UERJ 1 0 1 UNOESC 1 0 1 UNICAMP 4 3 7 UNIOESTE 1 0 1 UNESP/ARARAQUARA 0 2 2 UFPB 3 0 3 UFMT 2 0 2 UFMG 1 0 1 UFSM 2 0 2 UFSCar 1 0 1 UFSJ 1 0 1 UFAM 1 0 1 UFMA 1 0 1 16 UFMS UFRJ UFRG UFRN UFRGS UFF UFBA Total 1 1 1 1 1 1 0 37 1 2 0 0 0 0 1 10 2 3 1 1 1 1 1 47 Demonstrativo das instituições relacionadas àsdissertações e teses no período de 2007 a 2011 Palavra-chave: Formação Continuada de Professores Alfabetizadores INSTITUIÇÕES DISSERTAÇÕES TESES Total CENTRO UNIVERSITÁRIO 1 0 1 MOURA LACERDA PUC/SP 2 0 2 PUC/PR 1 0 1 UCP 1 0 1 USP 1 2 3 UNESP 2 1 3 ARARAQUARA UNICAMP 2 0 2 UEL 2 0 2 UNESP 0 2 2 MARILIA UFMG 1 0 1 UFPE 1 0 1 UFSJ 1 0 1 UFC 1 0 1 UNIRIO 1 0 1 UFMA 1 0 1 UFPR 0 1 1 UFRJ 3 1 4 UMESP 1 0 1 FURB 1 0 1 Total 23 7 30 A partir das Universidades levantadas, foi possível verificar quais dentre elas tiveram o maior número de produções relacionadas às palavras-chave “escrita docente” e “formação de professores alfabetizadores” assim como as respectivas linhas de pesquisa. Segue abaixo os quadros demonstrativos. 17 Demonstrativo do quantitativo por Universidades e Linhas de pesquisas Período de 2007 a 2011 Palavra-chave: Escrita Docente LINHA DE DISSERTAÇÕES TESES UNIVERSIDADE PESQUISA Ensino e Aprendizagem 1 0 2 de Línguas UFPB História da 1 0 Educação Currículo e UFRJ 1 2 Linguagem Demonstrativo do quantitativo por Universidades e Linhas de pesquisas Período de 2007 a 2011 Palavra-chave: Formação de Professores Alfabetizadores LINHA DE UNIVERSIDADE TESES DISSERTAÇÕES PESQUISA Didática, Teorias de Ensino e 1 1 Práticas USP Escolares Estado, Sociedade e 0 1 Educação Formação do professor, trabalho 1 1 docente e práticas UNESP pedagógicas ARARAQUARA Teorias Pedagógicas, Trabalho 1 0 Educativo e Sociedade Currículo e UFRJ 3 1 Linguagem Segundo o demonstrativo, a UFRJ foi a Universidade que, a partir da Linha de Pesquisa de Currículo e Linguagem, mais especificamente por via do Laboratório de Estudos de Linguagem, Leitura, Escrita e Educação (LEDUC), apresentou o maior 2 No quando demonstrativo das instituições relacionadas às dissertações e teses, a UFPB aparece com 3 produções. No Demonstrativo do quantitativo por Universidades e Linhas de pesquisas aparecem somente 2 produções porque no Portal da Capes um dos trabalhos está sem indicação da linha de pesquisa. 18 número de produções relacionadas à escrita docente e a formação de professores alfabetizadores. São ao todo 7 produções entre dissertações e teses, sendo que duas dessas produções se inserem em ambas categorias de palavras-chave. De certa forma, esses dados nos apontam o caminho que o LEDUC vem trilhando no âmbito da formação continuada de professores no sentido de propor uma nova forma de abordar a formação continuada de professores, enfatizando a escrita docente como forma de refletir e dizer sobre a própria prática. Por outro lado, vê-se no campo uma discussão homogeneizada sobre a formação continuada de professores que tende a valorizar somente as memórias profissionais e pessoais que influenciam na ação docente. Esse fenômeno poderia fazer-nos ler como uma característica endógena para os investimentos do LEDUC, que produz discussões apenas por e para seus próprios membros, como se não houvesse diálogo com outras universidades. No entanto, a preocupação com o contraponto com uma escrita que não seja memorialística, a preocupação com o memorial como o início de uma escrita sobre a prática e a ênfase em uma perspectiva discursiva, articulada com os novos estudos do letramento, tem nos permitido analisar a escrita docente em sintonia com a identidade do professor, inserido na sociedade, entendendo que a formação continuada pode ser o lugar do professor fazer outros textos que não sejam os escolarizados, nem os acadêmicos. O LEDUC é um laboratório da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, também ligada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da mesma universidade que teve seu início em 2005 a partir da participação das Professoras Ludmila Thomé de Andrade e Patrícia Corsino no Programa Nacional Biblioteca da Escola - PNBE. Desde então, o laboratório vem exercendo várias ações no âmbito das pesquisas no campo da Formação de Professores Alfabetizadores, orientadas pelas duas professoras coordenadoras e por novos membros que vêm se integrando às ações em curso, como Daniela Guimarães, Marta Lima de Souza e Antonio Francisco Andrade, por exemplo. Sob a coordenação da Professora Ludmila, participou da Olimpíada da Língua Portuguesa, Pró-Letramento, PNAIC – Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, sendo responsável pela coordenação Pedagógica do Programa no Estado do os professores Manoel Corrêa (Grupo de pesquisa Práticas de leitura e escrita em português língua materna – PPG. Filologia e Língua Portuguesa – FFLCH – USP) e 19 Raquel Fiad (Grupo de pesquisa Escrita: ensino, práticas, representações, concepções – PPG. Linguística Aplicada – IEL – UNICAMP). Os Seminários realizados em 2012 e 2013 voltaram-se para o tema da escrita escolar, com foco específico na escrita de alunos e professores, propondo-se a investigar as contribuições das pesquisas em Educação e Linguagem que produzem estudos sobre a escrita escolar considerando as relações constitutivas entre as identidades docentes e discentes nas pesquisas sobre escrita. Além dessas ações, desenvolve por via da pesquisa “As (im)possíveis alfabetizações de alunos de classe popular pela visão de docentes na escola pública” o EPELLE(Encontro de Professores de Estudos sobre Letramento, Leitura e Escrita), que assume a tarefa de uma formação pela prática com um grupo integral de professores de uma escola pequena, responsáveis pelos anos inicias do Ensino Fundamental. As discussões dos encontros giram em torno de quatros eixos: 1) teorias de alfabetização; 2) crianças de classes populares e seus letramentos; 3) formação de professores e 4) escrita docente.Caracteriza-se como análise de práticas inscrevendo-se no paradigma de pesquisa do professor reflexivo a partir de uma proposta de “formação pela prática” que envolve professores que atuam nos anos iniciais da educação básica (educação infantil e 1º ao 3º ano do ensino fundamental) em escolas públicas do Rio de Janeiro (ANDRADE,2010a). Dentre os trabalhos encontrados que tratam da formação de professores alfabetizadores e escrita docente como tema central da discussão, trago a seguir, de forma sintetizada, as que acessei na íntegra. A dissertação de SCARAMUSSA(2008) que, em sua metodologia, optou por uma análise discursiva, para “compreender o sentido da riqueza de enunciações presentes na escrita, caracterizadas por apresentar marcas identitárias da profissão docente durante a formação continuada e representadas por embates discursivos e dialógicos”. Ela fez uma análise profunda da escrita docente, a partir das categorias a) Trajetórias de vida/profissão; b) O curso de extensão e a produção de meta-reflexões sobre a teoria e a prática; c) Estrutura composicional do trabalho; d) Interlocução direta com as formadoras. A tese de FERNANDES (2011) buscou conhecer o processo de autoria de professores em processo de formação continuada, fazendo uma análise da escrita docente, tratando-a como uma escrita heterogênea. A autora considera ainda o 20 espaço em que o discurso é produzido e as esferas de produção e circulação dos mesmos. RIBEIRO (2011), em sua tese, faz uma análise da escrita docente a partir dos Registros de Classe. Em sua análise verifica-se que a escrita de Registros de Classe “suplantou a escrita pessoal dos professores, que se encontra apagada no cotidiano do fazer docente.” ALMEIDA (2007), em sua tese, traz como metodologia um tipo de pesquisa denominado como “pesquisa colaborativa”. Nesse tipo de pesquisa, as intenções de investigação, de intervenção e de formação estão unidas e implicam um esforço dos participantes – professores e pesquisadores - na criação da mudança para o desenvolvimento profissional. É um estudo qualitativo que buscou, durante o ano de 2005, “pelas vivências desencadeadas, pelas reflexões estabelecidas e análise das escritas realizadas, elementos para a compressão e explicitação das questões iniciais da pesquisa (...)”. Nas demais pesquisas, a partir da leitura de seus resumos, a escrita foi usada como metodologia para levantar informações sobre saberes docentes e suas memórias de formação. A partir desse levantamento bibliográfico, tornou-se relevante em minha pesquisa discutir a escrita docente no processo de formação continuada de professores, enquanto uma ação na qual os docentes possam refletir sobre suas práticas pedagógicas como professores e sobre as práticas escolares dos seus alunos reverberadas nessas práticas dos professores. Apoiei-me em CHARLOT(2012), em suas colocações sobre as relações entre as práticas, a pesquisa e a política, em que considera como a questão central a prática escolar do aluno, e assim me proponho a fazer uma pesquisa que não discuta somente a prática do professor e suas relações com a aquisição dos saberes docentes e os saberes da prática, mas que evidencie a prática imersa, imantada por uma prática discente(ANDRADE, 2010b). Segundo Charlot “A eficácia das práticas do professor depende dos efeitos destas sobre as práticas do aluno” (p. 111). Para ele, ensinar não significa necessariamente a mesma coisa que fazer aprender, mesmo que muitas vezes para que a criança aprenda seja preciso ensinar. Tomo como objetivo geral pensar a escrita docente como um caminho de pesquisa e de formação que possibilite ao professor repensar suas práticas, levando-o a se perceber como autor de seus próprios textos e como sujeito histórico 21 de saberes que reverberam em sua trajetória e profissional. Para alcançar os objetivos específicos me deterei a: a) Analisar as interações estabelecidas no processo de Formação, percebendo como os sujeitos – alunas professoras– se inscrevem nesse tipo de escrita obrigatória, como no caso da monografia; b) Conhecer e analisar as representações trazidas pelas professoras sobre as práticas de seus alunos por via de suas escritas; c) Analisar como os saberes docentes são mobilizados pelos professores em sua prática cotidiana; d) Conhecer as concepções que sustentam a prática docente. Trago, para nortear meu trabalho, as seguintes questões: 1) A escrita monográfica evidencia a tentativa de formar um professor pesquisador, abrindo a possibilidade do professor falar sobre sua prática? 2) Como são percebidas pelas alunas professoras do CEPEB em suas práticas cotidianas na escola, as contribuições das vozes das formadoras e o discurso acadêmico? 3) Como o aluno aparece representado na prática do professor por via do discurso? 22 2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 A lente para olhar a Escrita Docente Ao refletirmos sobre a escrita docente, somos naturalmente levados a pensar em uma escrita estritamente profissional; em seu cotidiano, o professor escreve, em vários momentos: no quadro, nos diários de classe, nas agendas dos alunos e outras funções semelhantes. O professor se restringe a uma escrita com funções comunicativas na rotina cotidiana escolar e em sala de aula, mas essa escrita também está carregada de significados, pois o que está em questão na formação não é somente pôr o professor em contato com situações que possibilitem a ele escrever de forma reflexiva, mas o fato de se perceber a sua escrita de professor como momentos em que ele pode dizer, sobre seu cotidiano em sala de aula, sobre o que pensa a respeito da sua própria prática, de outros temas e sobre como os problematiza. Outras vozes devem se articular à voz escolar, para que o professor, percebendo-se inserido em um sistema do qual realmente faz parte, movimente-se em busca de um acabamento. PRADO (2008. p. 1) pontua que “é preciso que haja uma intencionalidade explícita provocada também por algum elemento externo ao contexto das ações repetitivas do dia a dia da vida escolar para colocar em marcha esse processo”. Pensando a linguagem como um instrumento de interação entre as pessoas e os interlocutores se constituírem como sujeitos de um processo, em que as pessoas que dele participam estão realizando trocas verbais e construindo sentidos, posso também afirmar que esta é marcada pelo contexto sócio-histórico. O resultado dessas interações, sejam textos orais ou escritos, cumprem então uma função social e se organizam conforme as exigências que são próprias do contexto em que o sujeito está inserido. Inscrevemo-nos na discussão da relação estabelecida entre prática e teoria, inesgotável no âmbito educacional. Pensar o professor como produtor de reflexões, enunciados e autor de suas palavras traz uma grande contribuição para o campo dessa discussão. Articulo com o que Bakhtin nos propõe em relação à constituição do gênero discursivo. Segundo o filósofo da linguagem, utilizamo-nos de enunciados 23 tanto escritos quanto orais, para comunicar finalidades específicas de determinados campos das relações humanas. Para ele, o gênero discursivo é a elaboração de tipos relativamente estáveis de enunciados (2003, p.262) que são produzidos de acordo com cada campo de utilização salvando-se as particularidades individuais de quem produz os mesmos. Pensar a partir da contribuição de Bakhtin, relacionada à constituição do gênero discursivo como enunciados, nos possibilita entrar em contato com as inúmeras possibilidades de criação do ser humano. Posiciono-me diante da concepção de enunciado, pensando-o como um núcleo problemático de importância excepcional (Bakhtin 2003, p.265). Essa concepção está relacionada a uma unidade de comunicação contextualizada, não é uma conclusão final, visto que para cada contexto pode-se tomar significados diferentes. Seu sentido está posto no acabamento dado por parte de quem está recebendo, ouvindo ou lendo o mesmo assim como quem o produz está sendo afetado por outros, aos quais também atribui sentidos e acabamentos. O enunciado não é uma unidade convencional, mas uma unidade real, precisamente delimitada da alternância dos sujeitos do discurso, a qual termina com a transmissão da palavra ao outro, por mais silencioso que seja o “dixi” percebido pelos ouvintes [como sinal] de que o falante terminou. (BAKHTIN, 2003, p.275) O enunciado, nessa perspectiva, pode ser tomado como uma forma de se dizer, a partir do momento que é visto não como o pronunciamento de palavras ou expressões, mas também como as vozes de muitos que o constituem. O sentido de uma obra está sempre sendo construído a partir de outras concepções também construídas anteriormente. A voz de quem o produz está sempre ligada às outras vozes. Segundo Bakhtin (2003, p.274), todo discurso sempre está fundido em forma de enunciado pertencente a um determinado sujeito do discurso, e fora dessa forma não pode existir. O sujeito se constitui no espaço de interação, seu conhecimento é fundamentado no discurso e em efeitos de sentidos produzidos. Todo enunciado é um elo na cadeia da comunicação discursiva. É a posição ativa de falante nesse ou naquele campo do objeto e do sentido. Por isso, cada enunciado se caracteriza, antes de tudo, por um determinado conteúdo semântico-objetal. A escolha dos meios linguísticos e dos gêneros de discurso é determinada, antes de tudo, pelas tarefas (pela ideia) do sujeito do discurso (o autor) centrada no 24 objeto e no sentido. É o primeiro momento do enunciado que determina as suas peculiaridades estilístico-composicional (BAKHTIN, 2003, p. 289) Outro fator de suma importância para a produção de enunciados é o estilo. Este caracteriza-se pelo valor subjetivo dado ao objeto do discurso pelo sujeito. Como nenhum enunciado é desprovido de intencionalidade, a relação que o sujeito estabelece com o seu objeto influenciará diretamente na escolha dos recursos a serem utilizados e esses diretamente ligados à expressividade do estilo individual do próprio enunciado. Vale ressaltar que quando se fala de expressividade, não estamos querendo dar margem para se relevar todas as possibilidades de um dizer sobre algo desvinculado dos próprios recursos da língua. Bakhtin (2003, p. 289) nos adverte que a língua como sistema possui um rico arsenal de recursos linguísticos para exprimir a posição emocional valorativa do falante. Todos os recursos da língua são absolutamente neutros em princípio, pois as palavras não são de ninguém. As palavras por si nada valorizam. Elas podem abastecer qualquer falante e os juízos de valor mais diversos opostos aos falantes (2003, p.290). O estilo, portanto, abarca em si o modo de compor e dizer, relacionando-se diretamente aos próprios suportes que a língua dá. Uma expressão, frase ou oração passa a compor sentido no momento que é colocada em um contexto, em que é pronunciada com entoação de expressividade no mesmo, o que lhe atribui um sentido concreto, um acabamento. A expressividade está relacionada ao sujeito e ao sentido que ele quer atribuir a palavra e não a palavra como nos aponta Bakhtin: Porque se pode pensar que quando escolhemos as palavras para o enunciado é como se nos guiássemos pelo tom emocional próprio de uma palavra isolada: selecionamos aquelas que pelo tom corresponde à expressão do nosso enunciado e rejeitamos as outras. É precisamente dessa maneira que os poetas representam o seu trabalho com as palavras e é precisamente assim que o estilista (por exemplo, a “experiência estilística” de Pechkovski) interpreta esse processo. (p. 291) As palavras, às quais atribuímos emoções e com que compomos enunciados, em geral são tomadas emprestadas de outros enunciados que por sua vez também se apossaram de outros enunciados. 25 Assim sendo, outra característica também muito importante à compreensão do gênero é o tema como elemento constitutivo do enunciado. O conteúdo temático é avaliado individualmente e marcado ideologicamente. A relação de valor estabelecida entre o autor e suas escolhas dos objetos semânticos dizem dele e de seu contexto, por ser o enunciado uma cadeia de comunicação discursiva entre campos variados. Cada enunciado é composto pelos ecos de outros campos, de outras realidades que comporão o campo onde está situado o falante e seu dizer sobre algo. Cada escolha, por mais marcas de emoção próprias e uma forma de dizer característica de determinado campo, está sempre ligada a esses ecos de outros falantes. O tema necessariamente não traz em si a novidade, o diferencial está na relação estabelecida entre o falante e as articulações entre os ecos que o influenciam e sua capacidade de articulá-los de forma a dizer deixando suas marcas identitárias, suas linhas de expressão e suas estruturas. Também articulamos essas ideias importantes de Bakhtin à Análise do Discurso, e com Brandão aprendemos que para Foucault (apud Brandão p. 33) “um discurso é um conjunto de enunciados que tem seus princípios de regularidade em uma mesma formação discursiva”. Ele enumera quatro características do enunciado. A primeira está relacionada ao Referencial - a condição de possibilidade do aparecimento, diferenciação e desaparecimento dos objetos e relações que são designados pela frase. A segunda refere-se à relação do enunciado com o sujeito – ele critica a ideia do sujeito enquanto instancia fundadora da linguagem, para ele o discurso não é atravessado pelo sujeito e sim pela sua dispersão que decorre de várias posições possíveis de serem assumidas por ele no discurso. A terceira abrange o Campo adjacente ou espaço colateral – integra-o a um conjunto de enunciados, ao contrário de uma frase ou proposição. Nenhum enunciado é livre ou neutro e a quarta está relacionada à sua condição material – O enunciado pode ser repetido, mas a situação de enunciação não. Entendendo o sujeito a partir de uma perspectiva histórica, marcado temporal e espacialmente, toma-se sua fala – e aqui especificamente sua escrita – como sendo produzida a partir de um determinado tempo e espaço, sua fala/escrita é a representação de um espaço social e de um determinado tempo histórico, nessa perspectiva incorpora-se a noção do outro como constituinte do sujeito. 26 Todo membro de uma coletividade falante não encontra palavras neutras, ‘linguísticas’, livre de apreciações e orientações de outrem, mas sim palavras habitadas por vozes outras. Ele as recebe pela voz de outrem, plenos da voz de outrem. Todas palavras de seu próprio contexto provém de outro contexto, já marcado pela interpretação de outrem. Seu pensamento só encontra palavras já ocupadas. (AMORIM, 2004, p. 133) Segundo Bakhtin, é a partir do fenômeno social da interação verbal realizada através da enunciação e das enunciações (BRANDÃO, 2004) que a língua se constitui, o que faz com que o dialogismo passe a ser uma condição para a constituição de sentido. Segundo Brandão (2004, p. 62), Bakhtin postula uma concepção de sujeito na qual o outro desempenha um papel fundamental: “para ele, o ser humano é inconcebível fora das relações que o ligam ao outro”. Cada um se constitui como sujeito na relação com o outro se tornando consciente de si a partir e através do outro em um território socialmente organizado. “A dialogia é o confronto das entoações e dos sistemas de valores que posicionam as mais variadas visões de mundo dentro de um campo de visão” (GEGe 2009, p. 29). A dialogia está, portanto, nas mais variadas formas de visão do mundo, no interrogar, responder, questionar; nos atos de fala ou escrita, na apropriação da palavra como corpo social de um singular coletivo. Para Bakhtin (2003), o autor não pode viver seu próprio acabamento nem agir sobre ele, por isso ele diz que se faz necessário o acabamento inacabado mencionado anteriormente. O acabamento do todo está no excedente de visão (Bakhtin 2003), a capacidade que o sujeito tem de ver mais de outro sujeito do que o próprio sujeito vê de si mesmo (GEGe 2009, p. 44) devido a sua posição exotópica. O outro sempre tem uma visão sobre “mim” que eu mesmo nunca teria, mas que posso ter consciência a partir desse outro que me completa e me constitui e é na esfera do excedente de visão que as ações são iniciadas. Olhar para a escrita docente a partir desse viés teórico coloca diante do professor a possibilidade da elaboração de um trabalho autoral. Faz com que ele, em um movimento exotópico, saia de sua posição, para se olhar de fora e retornar modificado por esse olhar, podendo assim fazer as escolhas do que deve ser escrito ou não, podendo incluir inúmeras evidências de sua prática e de seu aprendizado, 27 trazendo à tona todo um processo de reflexão que o faz ser responsável por suas escolhas, mostrando-se não somente como aluno de um curso de especialização, mas também como sujeito constituído pelas várias vozes sociais que o compõem como aluno, professor, cidadão, e outras tantas funções sociais que exercem. Segundo SOUZA(2008. p.2), escrever podendo expressar as histórias da própria vida é: (...) possibilitar uma formação ao longo da vida, ao tomar as narrativas de formação de professores e de leitores como eixos estruturantes para o trabalho, no sentido de compreender dispositivos da profissão docente na interface entre dimensões da memória e lembranças do cotidiano escolar e dos saberes. A escrita nos possibilita ver os traços das histórias pessoais e profissionais como trajetórias que também compõem o arcabouço que se utiliza como suporte das práticas pedagógicas. Favorecendo a reflexão sobre a experiência da formação, levando a pessoa a pensar sobre a forma como se conhece como percebe e conhece o outro, torna possível dar novos significados às práticas pedagógicas. Através da escrita, é dado ao professor/aluno um caminho em que ele possa trilhar de forma diferente do que é posto pelo discurso da universidade. Um caminho com uma possibilidade de encontrar sua própria forma de dizer, escolhendo o estilo, os conteúdos e o que é mais significativo para ele naquela escrita que representa a realidade vivida por ele. A pensar no sentido de busca por uma interlocução entre o discurso acadêmico – que muitas vezes parece não fazer sentido para o professor – e as práticas do cotidiano escolar, no sentido de que o professor tome decisões éticas e estéticas na elaboração de sua fala, escrita e prática. Segundo Bakhtin (2003, p.11) faz-se necessário o acabamento inacabado para viver, nos antepormos a nós mesmos sem coincidências com a nossa existência presente, percebendo que a prática será sempre um caminho contínuo de construção junto à teoria de forma inesgotável. Se pensarmos na formação continuada como esse acabamento inacabado, daremos a ela um caráter diferente das discussões comuns que temos visto. O inacabamento nos possibilita estar sempre em um movimento de busca por novos 28 significados e novas possibilidades. Ele nos insere no outro e o outro em nós a partir do momento em que sentidos ainda são produzido posteriormente às enunciações. Nesse sentido do inacabamento, está no movimento do professor em busca de novas formas, a partir também da teoria, de fazer o que ele já sabe fazer, produzindo outros sentidos. Mas para ele perceber o que ele já sabe faz-se necessário que ele se desloque de seu lugar de professor, olhe para essa prática e retorne a ela transformado por esse olhar. O único que pode vivenciar essa experiência é o próprio professor, ninguém pode viver essa experiência que é dele da mesma forma que ele não pode viver a vida e a experiência de outro. 2.2 Uma questão de linguagem O domínio da linguagem está apoiado no uso e não no conhecimento de suas regras, o que nos orienta a pensar que para considerar a linguagem é preciso conhecer os falantes e os contextos de fala, isto é, os sujeitos ao contarem de si se localizam e posicionam-se historicamente. Tomada como um todo, a linguagem é multiforme e heteróclita; participando de diversos domínios, tanto do físico, quanto do fisiológico e do psíquico, ela pertence ainda ao domínio individual e ao domínio social; ela não se deixa classificar em nenhuma categoria dos fatos humanos, porque não se sabe como isolar sua unidade. (BAKHTIN,2009, p. 88) A linguagem não está presa somente a uma convenção de regras gramaticais, mas estas precisam estar em disposição de uso para as atividades de linguagem como forma de comunicação e interação. Para GERALDI (1997),a aprendizagem da linguagem já é uma reflexão sobre a própria linguagem “ações linguísticas que praticamos nas interações em que nos envolvemos demandam esta reflexão, pois compreender a fala do outro e se fazer compreender pelo outro tem a forma de diálogo” (p. 17). Ele pontua que se entendemos a linguagem somente como código e a compreensão como uma decodificação meramente mecânica desse código, podemos dispensar a reflexão. Mas se entendemos a linguagem como uma sistematização ampla de recursos expressivos no qual a significação acontece na singularidade de cada acontecimento de interação, nesse caso a 29 compreensão não é somente uma decodificação, sendo assim a reflexão sobre os próprios recursos utilizados é constante no processo. Geraldi expõe que para compreender as ações que fazemos com a linguagem, sobre a linguagem e as ações da linguagem, faz-se necessário a distinção entre atividades linguísticas, epilinguísticas e metalingüísticas. Para ele, atividades linguísticas “são aquelas que praticadas nos processos interacionais, referem-se ao assunto em pauta, “vão de si”, permitindo a progressão do assunto” (p. 20). Nessa atividade linguística, quando se fala, a ação de pensar na organização da estrutura da língua, na estrutura gramatical, não se faz de uma forma consciente, usa-se a língua porque já se está imersa nela, ela faz parte do cotidiano. O linguístico está relacionado às atividades em que o sujeito tem a oportunidade de fazer uma ligação entre o que está sendo produzido enquanto texto e os elementos lingüísticos que compõem essa produção. As atividades epilinguísticas “são aquelas, que também presentes nos processos interacionais, e neles detectáveis, resultam de uma reflexão que toma os próprios recursos expressivos como seu objeto” (p.23). Nessas atividades desenvolve-se a capacidade de comentar sobre um determinado comentário, dá-se conta das informações presentes nas trocas nos diálogos com outras pessoas. Dizse a mesma coisa de forma diferente de acordo com o interlocutor, o contexto, os objetivos, etc. As atividades metalingüísticas são aquelas que “analisam a linguagem com a construção de conceitos, classificações, etc.” (p. 25). Nesse caso, a linguagem é o próprio objeto para se constituir conhecimentos sobre a língua. Nessa atividade, é possível perceber que o sujeito faz algum tipo de julgamento sobre o que é certo ou errado em relação ao uso das palavras ou expressões. O metalingüístico é a sistematização das possíveis regras, dos conhecimentos teóricos conceituados sobre a língua e outros aspectos da estrutura de funcionamento da mesma. O que Geraldi aponta com isso é o fato de que a reflexão sobre a língua não é exclusiva dos especialistas. Esses três tipos de atividades linguísticas estão presentes nas ações de diálogos dos sujeitos. São produções de discurso, que se tornam ações “sobre a linguagem e ações da linguagem”. Ao levar o professor a exercer a escrita de forma reflexiva, é preciso antes pensar na linguagem escrita e perceber que um texto escrito pressupõe um 30 enunciador, que está distanciado de seu leitor presumido. Sendo assim, a escrita exigirá sempre de seu autor uma organização do texto de forma coerente e coesa. Para que esta se dê, o movimento reflexivo epilinguístico, que vai por cima do linguístico, pode ser ativado. Geraldi (2008, p. 21) coloca que “elege-se, portanto, o fluxo do movimento como território. Lugar de passagem e na passagem, a interação do homem com os outros homens no desafio de construir compreensões do mundo vivido.” No movimento linguístico puro, não há consciência. Nos enunciados de cunho epilinguístico, se encontram ensaios de consciência linguística que podem até levar ao metalinguístico, mas essencialmente uma reflexão espontânea, sobre o linguístico, que os enriquece. As atividades epilinguísticas proporcionam ao falante/escritor a oportunidade para refletir sobre os recursos que demonstram a expressividade que utiliza ao falar/escrever. Assim sendo, ele está refletindo sobre o domínio funcional das regras atreladas ao uso da língua. A linguagem, enquanto atividade, implica que até mesmo as línguas (no sentido sociolingüístico do termo) não estão de antemão prontas, dadas como um sistema de que o sujeito se apropria para usá-las segundo suas necessidades. (GERALDI, 2008, p. 20) Para o sujeito que é posto diante de situações de escrita, como é o caso dos professores do curso de especialização, é através dessa reflexão, na situação de produção textual, que o domínio da língua vai sendo ampliado, juntamente com a consciência sobre a utilização dos recursos da língua. Essa consciência já faz parte dele em seu dia a dia como usuário, mesmo que não pare para pensar como está sendo desenvolvida essa prática. A essa consciência Miller (2003, p. 3) denomina consciência implícita de uso, como sendo aquela que é desenvolvida intuitivamente, que está vinculada às experiências vivenciadas, ao conhecimento que ele tem da língua como seu usuário, no momento em que reflete sobre as ações de falar, ler e escrever. Ela ainda aponta que essa consciência é a base necessária para o desenvolvimento da consciência explicita de análise, pela qual torna-se a língua como objeto de estudo, objetivando-se sua descrição e categorização. 31 REFLEXÃO CONSCIÊNCIA IMPLICITA CONSCIÊNCIA EXPLÍCITA DE ANÁLISE Afirmo, dessa forma, que o domínio epilinguístico está entre o lingüístico e o metalingüístico. É o elemento que une as características linguísticas ao conhecimento das regras de forma reflexiva. Segue abaixo um quadro3 elaborado para representar minha reflexão sobre o tema. Todo sistema de normas sociais encontra-se numa posição análoga; somente existe relacionado à consciência subjetiva dos indivíduos que participam da coletividade regida por essas normas. São assim os sistemas de normas morais, jurídicas, estéticas (tais normas realmente existem), etc. Certamente, essas normas variam. Diferem pelo grau de coerção que exercem, pela extensão de sua escala social, pelo grau de significação social, que é função de sua relação mais ou menos próxima com a infra-estrutura, etc. (BAKHTIN,2009, p. 94) 3 Esse quadro foi elaborado a partir das discussões suscitadas pela professora Ludmila Thomé de Andrade, na disciplina Didática da Língua Portuguesa do curso de Pedagogia da FE/UFRJ da qual eu era monitora. 32 Assim, posso afirmar que para entender e explicar a utilização das regras gramaticais faz-se necessário construir esses conhecimentos, no processo da própria escrita e dos usos dessas regras, inseridos no domínio que o sujeito já tem dos seus usos. A partir da escrita docente - o que se escreve e porque se escreve - podemos propor que o professor que escreve sobre suas práticas em sala de aula, está se aproximando de suas representações sociais. Neste sentido, ao escrever o que a escola lhe propõe ou lhe permite, ou no caso, as monografias do CESPEB, está na tentativa de atender a uma expectativa de um grupo social. O professor já escreve e há ainda muito a ser dito/escrito por ele. O que me parece necessário é atribuir sentidos e visibilidade a essa escrita, situando-a em contextos sociais marcados por atividades de negociação ou por processos de inferências. Segundo Marcuschi (2010, p. 35), “Podemos observar que a construção de categorias para a reflexão teórica ou para a classificação são tanto um reflexo da linguagem como se refletem na linguagem e são sempre construídas inteiramente dentro de uma sociedade.”. Para Bakhtin (2009, p.72), a linguagem tomada nas instâncias física, fisiológica e psicológica é privada de alma e, para se tornar um fato linguístico, precisa ser atribuída-lhe alma. Assim como no processo de reverberação, é preciso que haja condições ambientais para que o mesmo aconteça, para que a linguagem tome vida “é preciso situar os sujeitos – emissor e receptor do som – bem como o próprio som, no meio social” (Bakhtin 2009, p.72). Segundo ele, é necessário que locutor e ouvinte pertençam à mesma comunidade linguística, que tenham uma relação sobre o espaço bem definido. Entendendo que a escrita das professoras reflete - no sentido de espelhar - e refrata - no sentido de desviar - vários enunciados, foi possível trazer ainda a essa discussão a noção de reverberação4. Para propor esta noção, aproprio-me do campo da acústica, visto que minha experiência como musicista coloca-me constantemente em contato com esse campo da linguagem, descreve-o como um processo que ocorre quando duas ondas sonoras são propagadas sob uma superfície refletora, guardando entre si uma pequena diferença de tempo no trajeto. 4 Essa noção foi elaborada por mim na monografia de conclusão do curso de Pedagogia da UFRJ em 2011. 33 Essas ondas sonoras ao estabelecerem impacto com a superfície refletora retornam, também em tempos de mínima diferença, preenchendo o ambiente com várias reproduções de som emitido originalmente. Dentre as características da reverberação, destaco como também de importância para esse contexto o fato de que um som refletido se espalha por todo o ambiente. O sujeito que estiver nesse ambiente será atingido primeiramente pelo som que vem direto da fonte sonora, ao mesmo tempo, o som continua se espalhando pelo ambiente, refletindo-se nas demais superfícies existentes no local indo também ao encontro desse sujeito, chegando com intensidades diferentes, umas chegam mais rápido enquanto outras percorrem um caminho maior para chegar até ele. Vejamos no esquema a seguir: Fazendo uma analogia com esse conceito acústico, pensarei as vozes das professoras formadoras como as ondas sonoras propagadas, as alunas professoras como as superfícies refletoras e suas escritas como as reverberações dessas ondas sonoras. Essas, ainda dentro dessa perspectiva, comparadas às demais ondas sonoras que circulam pelo ambiente e retornam às professoras formadoras, são constituídas por suas memórias, as vozes do ambiente de trabalho, a convivência em família, o dia a dia nas ruas de seus bairros, em fim, do cotidiano, do que as constituem como pessoas, profissionais, estudantes, mães, mulheres e tantas outras identidades que assumem. O ambiente é o contexto em que elas estão inseridas, nesse caso, a sala de aula tanto como alunas e enquanto professoras. O sujeito em questão que recebe essa demanda de reverberações é o aluno, seja ele de que instância for, o que justifica a nomeação de alunas-professoras. No âmbito da sala 34 de aula da Faculdade de Educação da UFRJ, elas são alunas, na sala de aula com seus alunos, as professoras. Assim, como as alunas-professoras do curso de especialização estão sendo alcançadas por todo esse processo que também constitui as professoras formadoras, seus alunos também podem ser alcançados por tudo o que através delas for refletido, reverberado. Dessa forma, torna-se possível perceber como as vozes das professoras formadoras são reverberadas e como as alunas-professoras se apropriam dessas vozes assim como essa fala é transformada em um discurso autoral. A preferência pela opção de reverberação e não a de eco, como nos aponta Bakhtin (2003, p 297), quando diz que “cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os quais está ligado pela identidade da esfera de comunicação discursiva”, está pautada em uma questão puramente vivencial. O eco, em minha experiência como musicista, está relacionado a um som que é propagado, dissipado, mas que não tem um retorno, o que o ouvido percebe é o som real, além do que, o eco para acontecer ele tem uma distância limite para que esse fenômeno sonoro aconteça, não é em todo ambiente que o eco acontece. Assim sendo, dentro de minha perspectiva, o conceito de eco não se faz tão aplicável. Não tenho a pretensão de ir contra o que Bakhtin propõe, mas sim de contextualizar de forma mais adequada a minha pesquisa. Além do mais, seria preciso explorar esta dimensão semântica da escolha do tradutor a partir da língua original, o russo, o que não nos é possível fazer, por falta de conhecimentos desta língua. Foucault (2011, p. 49) diz que “o discurso nada mais é do que a reverberação5 de uma verdade nascendo diante de seus próprios olhos; e, quando tudo pode, enfim, tomar a forma do discurso, quando tudo pode ser dito e o discurso, quando tudo pode ser dito a propósito de tudo, isso se dá porque todas as coisas tendo manifestado e intercambiado seu sentido, podem voltar à interioridade silenciosa da consciência de si.” Nessa perspectiva de linguagem, aponto a formação continuada de professores como um meio social organizado que possibilita trocas lingüísticas, a partir do 5 Grifo meu. 35 momento em que todos que ali estão comungam do saber docente, do cotidiano escolar e principalmente de uma vontade explícita em participar de um contexto de aprendizagem de novos saberes. 2.3 Formação continuada e o professor desse contexto Atualmente, vivemos em um contexto educacional repleto de ações políticas voltadas para a Formação Continuada de Professores, principalmente no campo da Língua Portuguesa nas Séries Inicias, tendo em vista o grande avanço tecnológico e repercussões no meio social (GATTI e BARRETO, 2009). O professor cada vez mais precisa estar habilitado a lidar com diversos conhecimentos. De um lado, temos a visão do professor como especialista técnico (CONTRERAS,2002) que imputa ao mesmo um conhecimento das formas do fazer, como elaborar bem seus objetivos principais e gerais, o domínio dos conteúdos a serem “transmitidos” assim como a responsabilidade de tentar dar conta de todas as situações do cotidiano escolar, sejam elas de cunho pessoal, teórico, prático e social de forma eficaz e aplicável. Por outro lado, vê-se o professor reflexivo que tenta dar conta de um cotidiano escolar a partir de conceitos teóricos, para solucionar problemas do dia a dia, baseando-se me reflexões e estudos que lhe tragam à luz nova possibilidade. Dickel (1998) faz uma breve retrospectiva das necessidades e conflitos vividos na escola pública desde o seu período de expansão. Apoiando-se em uma das conclusões de Connel (1996) - sobre as fragilidades dos programas compensatórios e excludentes, amplamente expandidos nas décadas de 60 e 70 nos Estados Unidos – na qual reivindica que “ensinar bem em escolas em desvantagem requer uma mudança na maneira como o conteúdo é determinado e na pedagogia” (apud Connel 1996, p. 27). A partir disso, ela pontua que esse “diagnóstico nos leva a uma complexidade de determinações que constituem a produção social e econômica dessa exclusão” (p.39). E é através da escola que muitas vezes essa exclusão se dá, pela forma de organização da escola e seus conteúdos, que muitas vezes são descontextualizados em relação às necessidades sociais das camadas populares. Essa exclusão muitas 36 vezes acaba recaindo, aparentemente, como responsabilidade do professor. Esse, por sua vez, para dar conta de uma mudança nessa perspectiva, precisar criar estratégias que intervenham nessa realidade tanto para estudantes quanto para ele enquanto profissional. “Podemos dizer que, trabalhando nas zonas fluidas produzidas pelas contradições que a escola carrega em sua tradição, à medida que é, ao mesmo tempo, acesso ao que a humanidade produziu e espaço de preparação para um trabalho que, cada vez mais, está destinado a um menor número de pessoas, muitos professores produzem estratégias de intervenção que suspendem provisoriamente os traços de exclusão.” (DICKEL, 1998, p. 40) A partir dessa constatação, ela traz para sua discussão a concepção do professor reflexivo de Stenhouse, segundo a qual o professor não pode ser visto somente como um executor de tarefas elaboradas por outros sujeitos que estão fora do processo de ensino aprendizagem, pois os mesmos produzem em suas práticas conhecimentos significativos que podem contribuir para mudanças individuais na vida dos estudantes assim como na dinâmica da escola. Reivindica: Uma formação do professor-pesquisador como aquele profissional que, ao optar pela luta (que é fundamentalmente) coletiva por alternativas viáveis e comprometidas com a especificidade e o valor do trabalho docente e com uma educação que fomente nas crianças a potencialidade de inventar e lançar as bases de um mundo diferente daquele anteriormente esboçado, seja capaz de se engajar na busca de uma pedagogia e de uma escola que consigam trabalhar nesse meio adverso.” (DICKEL, 1998, p.41) Segundo ela, a situação dos professores vem sendo agravada historicamente porque muitos estão “enclausurados”, pois são formados para trabalhar em escolas homogeneizadas, evitando muitas vezes trabalhar em escolas com crianças de classe popular e em periferias, nas quais o trabalho muitas vezes exige do professor vários desdobramentos, investimentos de tempo e recursos, criatividade e preparo. Dickel, citando Casanova (1996), aponta a emancipação como “chave” que abre o pensamento de Stenhouse. Para Stenhouse, a emancipação significa autonomia e é a arma de luta contra o paternalismo e autoridade. 37 “Para o professor, o caminho para a emancipação passa necessariamente pela adoção da perspectiva do pesquisador e pelo respeito aos seguintes princípios: 1) a pesquisa do professor deve se vincular ao fortalecimento de suas capacidades e ao aperfeiçoamento autogestionado de sua prática; 2) o foco mais importante da pesquisa é o currículo, o meio através do qual se transmite o conhecimento na escola (Cf.Casanova, 1996, p. 24)” (DICKEL, 1998, p. 46) Partindo de pesquisas realizadas por Andrade (2004, p.83), atualmente a tendência é considerar o professor como “prático reflexivo”. Nessa concepção, as aprendizagens da prática e da vivência tomam legitimidade, o professor passa a ter espaço para falar de suas experiências e a apropriar-se de sua voz. Por essa perspectiva, é possível ao professor vivenciar sua prática, reconhecendo em suas escolhas os caminhos teóricos que fundamentam suas decisões diante das situações que surgem . (...) ao articular uma concepção de formação de professores que leve em conta a experiência docente a partir de uma concepção discursiva de linguagem,ou seja, que se proponha a pensar a linguagem da formação, torna-se possível perceber que o saber docente não se produz espontaneamente a partir do professor – praticante. A autoria de um saber próprio ao professor é determinada também pelo que é produzido externamente, à sua volta. Não há um saber que nasce espontaneamente do sujeito, pois este último não é fonte exclusiva de seu próprio saber. (ANDRADE,2004, p. 86) Posso concluir, a partir dessa premissa, que o conhecimento do professor pode ser tratado como “conhecimentos” formados por outros saberes constituídos de outras vozes sociais, nos quais se inclui os da universidade. O ponto chave do binômio prática e teoria estaria, portanto, na busca pelo equilíbrio nessa relação, em que cada um precisa ter marcadas as suas características. Nesse processo, não são os saberes que lhes são próprios, mas a reorganização destes, efetuada de forma singular. Esse movimento ativo é o que de mais próprio de cada sujeito poderemos encontrar, embora haja recorrência entre sujeitos. Não há portanto, propriedade desses saberes, mas há diferentes processos de apropriação. (ANDRADE, 2004, p. 86) 38 Esse ponto de equilíbrio está, de certa forma, posto no próprio trabalho exercido pelo professor em sala de aula, lugar em que prática e teoria caminham juntas (ou deveriam caminhar), de forma nem sempre perceptível. O estar em sala de aula - tanto na universidade enquanto aprendente quanto na sala de aula enquanto ensinante, na prática cotidiana - possibilitará ao professor a apropriação de sua própria voz, a partir do momento em que esse se perceba também como ensinante na universidade e como aprendente na sala de aula com seus alunos. Os professores pesquisadores da universidade têm um modelo do que seja pesquisa (ANDRADE,2004, p. 89). O professor em sala de aula tem também seus referenciais do que seja a prática, portanto, assumir sua voz docente requer contextualizar o discurso acadêmico à prática de sala de aula, para que o professor da educação básica se veja também em uma ação de pesquisa. É ir contra um sistema que lhe impõe o que dizer e como dizer. Muitos professores escrevem e falam aquilo que a instituição lhes encaminha a escrever/falar, eles escrevem em seus diários de classe o conteúdo, dizem no conselho de classe as dificuldades e problemas, nos intervalos entre uma aula e outra ele diz de seu alívio em poder naquele momento descansar da pressão do cotidiano escolar. A escola não lhe abre espaço para um dizer autoral e transformador, para que ele se coloque de forma crítica diante de uma realidade, como nos expõe Andrade (2004). O efeito da formação sobre os docentes restringe-se ao âmbito discursivo, não transformando as práticas dos professores. Chegam a aprender a dizer, mas não chegam a modificar o seu fazer como efeito dessa primeira aprendizagem. Entre discursos, práticas e conhecimentos, as articulações parecem padecer de muitas defasagens. Os professores dizem o que sabem, mas não fazem. Fazem outras coisas sobre as quais não chegam a ter um discurso produzido. (...) Constatamos, assim, a supressão dos modos de enunciação próprios do professor, que seriam inerentes à profissão, o que o deixa sem poder dispor de espaços institucionais ligados a situações concretas de trabalho, que poderiam estar previstas na organização escolar. (p. 95-96) O professor está sem saber o que dizer, pois o lugar que se encontra na escola não está lhe dando espaço para que sua voz possa ser ouvida. Isso o leva a apropriar-se do discurso universitário, que está muito distante do discurso da prática 39 de dentro da sala de aula por conta de currículos descontextualizados das reais necessidades daqueles que trabalham nas salas de aula. O docente, em contraponto, escuda-se contra as formas como é tratado nestas medidas impostas, não é identificado com nenhuma destas políticas, exigências, avaliações feitas a sua revelia, alheiamente assume as formas de ser orientado às quais não quer ceder, ser conduzido. Por força destas intermitentes imposições que saturam o ambiente escolar de medidas que são vazias de um sentido concordante, sintonizado na identidade docente, o professor se encontra anestesiado e também se encontra impermeabilizado a este tipo de discurso. (ANDRADE, 2013) Cada vez mais essa situação causa um vácuo entre as vozes da escola. Segundo Gatti e Nunes 2008 (apud Gatti e Barreto 2009, p. 201) Verifica-se que os currículos desses cursos são pouco atentos à necessidade de uma formação que forneça os instrumentos indispensáveis a um fazer docente consciente de seus fundamentos, com boa iniciação em práticas, e aberto a revisões e aperfeiçoamentos constantes. Concordo com Scaramussa (2008, p.47), quando esta autora coloca que o primeiro contato do aluno dos programas de formação de professores se dá através de matérias teóricas das disciplinas pedagógicas e, posteriormente, em alguns casos, de monitoria. Segundo Libâneo e Pimenta (2006, p. 51) citados por ela: O caminho deve ser outro. Desde o ingresso dos alunos no curso, é preciso integrar os conteúdos das disciplinas em situações da prática que coloquem problemas aos futuros professores e lhes possibilite experimentar soluções. Isso significa ter a prática, ao longo do curso, como referente direto para contrastar seu estudo e formar seus próprios conhecimentos e convicções a respeito. Isso quer dizer que os alunos precisam conhecer o mais cedo possível os sujeitos e as situações com que irão trabalhar. Significa tomar a prática profissional como instância permanente e sistemática na aprendizagem do futuro professor e como referência para a organização curricular. Diante dessa realidade, descortina-se a possibilidade de observar a formação continuada como um processo de crescimento profissional para o professor de forma a levá-lo a perceber que ele já possui conhecimentos significativos que constituem a sua prática e como um dos caminhos a serem seguidos enquanto 40 professor-aluno-pesquisador em busca de novas práticas e de novas formas de dizer o seu fazer. A atual concepção de Formação Continuada rompe com a ideia de uma formação que segue a lógica de ignorar a trajetória do professor, e considera,portanto, o desenvolvimento profissional do professor, suas escolhas, seu espaço de atuação, o seu fazer cotidiano. Considero ser relevante compreender o que leva o professor a buscar a formação continuada, tomarei como base os dados levantados por Gitsos (2008) em sua monografia de conclusão de curso de Pedagogia, citados também por Scaramussa. Em seus estudos, estão apontados como razões para o retorno ao estudo da formação de professores duas categorias denominadas como: Aprofundamento e/ou atualização do tema Alfabetização e Aperfeiçoamento profissional. Ainda segundo ela, há uma relação de causa e efeito entre essas categorias observadas no discurso das professoras, devido às dificuldades que são encontradas no dia a dia da sala de aula. Ou seja, nas formulações dos professores, a hierarquia ou a articulação lógica freqüente para apresentar estas razões particulares para procurarem o curso apresenta-se assim: a atualização do tema leva ao aperfeiçoamento profissional e o aperfeiçoamento profissional implica na atualização do tema. (GITSOS2008apud SCARAMUSSA,p. 78) Percebe-se que no discurso das professoras está marcada a questão do aperfeiçoamento profissional e que o mesmo o levará ao aperfeiçoamento do tema, no sentido de dominarem uma determinada área do conhecimento. Sendo assim, há a preocupação do professor em buscar uma formação que o leve a refletir e buscar, de forma autônoma, soluções das problemáticas que surgem em sala de aula. Significa dizer com isso que não é necessário descartar de todo os fundamentos aprendidos, mas sim ocupar-se de aprender conceitos teóricos para criar e recriar suas próprias práticas. Gatti e Barreto (2009) apontam que atualmente existem dois modelos de formação continuada aceitos e defendidos: 1) as oficinas de reflexão sobre a prática. 2) formação centrada no fortalecimento institucional. Segundo elas, esses dois modelos são discutidos por Rego e Mello (2002) que apontam que o modelo de 41 formação em pequenos grupos tem um grande valor formativo, pois permite uma maior proximidade à realidade do professor e da sua prática a fim de legitimá-la ou ressignificá-la, no entanto não responde às necessidades de todo o corpo docente e as urgências sociais. O modelo do fortalecimento institucional imbricado de uma responsabilidade social por seu lado implica um envolvimento, um trabalho coletivo, recursos pedagógicos e uma gestão participativa. Esses modelos de formação vão além das questões que envolvem somente o interesse do professor, envolvem condições institucionais facilitadoras para a reflexão e ação docente. A formação continuada para além de uma ação em que o professor muitas vezes é encaminhado, indicado a participar, vai de encontro às necessidades reais que emergem da prática, por isso são de fato necessidades da própria demanda do professor, de uma busca por aprimorar e agregar saberes à prática. Para Kemmis (1987), refletir criticamente significa colocar-se no contexto de uma ação, na história d asituação, participar de uma atividade social e ter uma determinada postura diante dos problemas. Significa explorar a natureza social e histórica, tanto de nossa relação como atores nas práticas institucionalizadas d aeducação, quanto da relação entre nosso pensamento e ação educativos. (CONTRERAS,2002, p. 163) A partir de Contreras (2002) ao abordar a reflexão crítica, aponta-se a reflexão sobre a prática não somente como uma forma de mediação de saberes da prática mas como uma vivencia da prática. 2.4 A escrita docente como uma possibilidade de um dizer sobre a prática Para abordar a formação continuada como um espaço propício para o professor refletir sobre a sua prática, tomamos como nossa perspectiva de estudo a reflexão sobre a escrita docente. Esta escrita profissional tematiza o fazer pedagógico, podendo se tornar para nós um instrumento que traz a cena da sala de aula, elevando-a como espaço sobre o qual discute, reflete e produz conhecimentos. Num processo de escrita assim concebido, gostaríamos de contribuir para a constituição dos sujeitos dessa ação pedagógica. 42 Vale ressaltar que os textos orais e escritos e, em nosso caso específico, os últimos, vão em direção a um leitor presumido, que nenhuma escolha é neutra, a escolha do suporte, o gênero, a forma gramatical e ortográfica levam isso em consideração. Segundo PRADO e SOLIGO (2007, p. 34), nenhum texto é “fruto apenas do que o escritor quer dizer, mas também do que ele supõe ser de interesse dos leitores”, segundo eles, há um “contrato” implícito entre autor e leitor. Apoiando-me em PINO e ZULAR (2007), tomo a escrita docente elaborada nas monografias do CESPEB como manuscritos da prática. Segundo eles, pode-se entender por manuscrito “qualquer documento no qual seja possível encontrar um traço do processo de criação, e não necessariamente os manuscritos autógrafos (do próprio punho do escritor)” (Pino e Zular 2007, p.18). Falo das monografias como manuscritos, pois entendo que elas podem trazer traços da prática, sendo a prática o próprio ato de criação (o que dá certo, o que dá errado, as hipóteses de trabalho, os desafios, a orientação teórica para o desenvolvimento do trabalho, a forma para olhar esse fazer, etc.) Não abordarei nessa discussão o processo, suas defesas e críticas, pois meu interesse é especificamente a escrita. O manuscrito apresenta-se como um espaço heterogêneo “no qual diversos tempos convivem e dialogam entre si.” (p. 28). Escrever sobre a prática possibilita refletir sobre o que se fez, o que se faz e o que se pretende fazer. Ao escrever, o professor traz um discurso de seu processo de criação – a prática. Relaciona permanentemente as experiências do passado e do presente para constituir um futuro. É possível, a partir dessa perspectiva, fazer uma relação com o paradigma do professor reflexivo, no qual o professor elabora suas compreensões no próprio processo de atuação. Trata-se de um processo que inclui: a) a deliberação sobre o sentido e valor educativo das situações; b) a mediação sobre as finalidades; c) a realização de ações práticas consistentes com as finalidades e valores educativos; e d) a valorização argumentada de processos e conseqüências. Isto conduziria: a) a construção de um conhecimento profissional específico; e b) a capacidade para desenvolver-se nessas situações de conflito e incertezas que constituem uma parte importante do exercício de sua profissão. (CONTRERAS, 2002, p. 137) 43 Escrever seria também um processo de atuação no qual são construídos conhecimentos sobre a profissão e a capacidade para lidar com as situações do cotidiano da profissão. Segundo SCHÖN (1983:270 apud Contreras 2002, p. 139) na reflexão da ação, os profissionais costumam agir sob alguns referenciais relativamente estáveis: 1) as linguagens – meios e repertórios que usam para descrever a realidade e realizar suas experiências; 2) seu sistema de valores – serve para identificação de situações problemáticas, diálogos reflexivos e avaliação dos seus questionamentos; 3) sistema de compreensão – pelo qual percebem e dão sentido aos fenômenos e 4) a forma como definem seu papel – pela qual suas ações são propostas e por meio da qual fixam seu cenário institucional. Assim, produz-se uma consciência sobre suas ações e sobre os efeitos do que foi realizado, do que não foi realizado e sobre o que poderia ter sido realizado. CORRÊA (2004, p.10) apresenta três eixos que orientam a circulação do escrevente pelo processo da escrita. No primeiro, a escrita é vista como representação termo a termo da oralidade. No segundo, a apropriação da escrita se dá em seu estatuto de código institucionalizado – fixação metalingüística pelas instituições e pelos sujeitos – dos movimentos históricos da sociedade. No terceiro, o escrevente põe-se em contato não só com tudo quanto teve de experiência oral, mas também com toda a produção escrita. Para ele, esses três eixos, como abordagem metodológica, deslocam o sujeito da relação oralidade/escrita para uma relação entre sujeito e linguagem. ingênua entre A ideia que o escrevente faz de seu texto passa por esses três eixos, o que faz com que essa escrita não seja nunca de todo pura. Assumimos essa perspectiva para compreendermos a formação continuada, sobretudo no que diz respeito aos dois últimos eixos definidos pelo autor. Assim, a formação docente se constituiria como parte importante do processo docente de reflexão na ação, quando possibilita uma escrita voltada para o aperfeiçoamento do trabalho do professor. No caso do gênero monografia, é considerado todo um rigor metodológico, o que nos aproximaria do segundo eixo de Corrêa (2004) no qual, “ligado à expectativa do escrevente de alçar-se aos discursos estabilizados das instituições”, o professor escreve sobre a prática pedagógica - fundamentando, argumentando e problematizando – enfrentando os saberes docentes no cotidiano. Quanto ao terceiro eixo, poderíamos considerar que o docente é colocado num 44 contexto, optando por algumas práticas sociais e rejeitando outras no momento em que percebe “lugares específicos” (Corrêa 2004) para sua própria escrita. A escrita, desta forma, se revela para o autor um entrelace de possibilidades, relações, descobertas, informações, memórias e vivências, que o vão constituindo a cada produção, a cada registro e a cada releitura. A partir do exercício de se tornar autor, a escrita se compõe numa releitura do mundo. (SCARAMUSSA,2008, p. 54) Juntamo-nos ainda a TARDIF (2011), que aponta define o saber do professor em íntima relação com o trabalho dele na escola e na sala de aula. O professor tem vários saberes, mas o que se destaca dentre todos é o que se impulsiona pela vivência. Para este autor, o saber está a serviço do trabalho, pois é a partir de uma releitura de mundo que a escrita, por via da formação continuada, abre espaço para um movimento dos saberes docentes. Para além dos saberes que emergem da vivência, estão os saberes propiciados pelas interações constituídas no campo da formação continuada, segundo Andrade (2011, p. 325): As interações permitem situar os momentos de troca discursiva para se observar e apontar as faces dos interactantes em pleno processo de constituição. Porém apenas podem ser compreendidas numa dimensão discursiva pela tensão entre posições que ali se realizam, na enunciação da formação, em pleno ato de discurso. A autora traz uma metáfora da concepção de pesquisa que produz uma rede, não como as de dormir, mas sim uma rede de segurança, como as de pesca, com nós tensionados que formam uma trama, para enfatizar as “tensões localizadas entre os atores, com distanciamentos variáveis, mediados por outros atores ou estabelecidos em relação mais direta, de um nó ao outro. Assim, a escrita docente no campo da formação continuada de professores é produzida como resposta ao tensionamento do próprio contexto, como no processo de reverberação, em que um som propagado vai de encontro a uma superfície que o devolve após o impacto. A escrita docente é a resposta a uma demanda em que são produzidos deslocamentos dos sujeitos visto que, “Não há posição solitária, identidade isoladamente constituída, mas apenas podemos conceber discursos, que se dão em eventos 45 concretamente enunciados, entre dois, pelo menos”. (BAKHTIN apud ANDRADE,2004). Corrêa (2004) defende que o processo de escrita está regulado pela circulação dialógica de quem escreve em função dos lugares da representação da escrita. Segundo ele, esse movimento dialógico é guiado pela “dialogia com o já falado/escrito, que, além da representação sobre o oral/falado e o letrado/escrito, é também o móvel de toda a circulação, uma vez que não se refere apenas ao modo de enunciação escrito, mas à presença do dialogismo em toda a linguagem” (p.14). A produção escrita marca, portanto, a resposta de uma voz inicial que, caracteriza ainda segundo Corrêa (2004) o processo de individuação. Para ele, a individuação do sujeito está relacionada ao modo como cada sujeito deixa “pistas linguística locais”, é o modo como ele se constitui. A escrita docente, então, pode ser vista como uma marca da prática docente e da representação de uma real formação. Uma formação em que não está em questão somente um vir a ser professor, mas sim a formação de alguém que conseguem problematizar seu fazer, que se depara com o que faz e com o que outros entendem que ele faz. Apoiando-me em Le Goff (1996) pensarei as monografias como uma produção escrita das alunas professoras, tomando-as como documentos. O autor traz nesse texto uma importante discussão que me permitiu pensar sobre como se dá a constituição de um documento. Ele aponta para dois tipos de materiais - os documentos e os monumentos. Segundo ele, o monumento é tudo aquilo que pode evocar o passado perpetuando as recordações das sociedades históricas, um “legado à memória coletiva”, ele cita como exemplo os atos escritos. No século XIX o termo monumento ainda teria sido usado relacionado as grandes coleções de documentos de maneira a fazer vir à tona as mais profundas raízes da sociedade. Entretanto destacando-se das provas, instrumentos, testemunhos, etc. que buscavam reunir novos métodos da memória coletiva e da história e por outro o desejo de provar cientificamente os fatos, o termo documento colocou-se em primeiro plano. Os documentos, de acordo com a escola positivista, no século XX foram os fundamentos do fato histórico, mesmo que resultassem da escolha do historiador. A leitura dos documentos não serviria para nada se fosse feita com ideias 46 preconcebidas, a habilidade do historiador estaria em retirar dos documentos somente o que eles realmente teriam e não acrescentar nada além. Com o passar do tempo, a concepção de conteúdo de um documento se ampliou, o documento era sobretudo um texto. Devia-se atentar para as fábulas, os mitos, os sonhos, lugares e momentos pelos quais o homem deixou suas marcas. Essa evolução foi ao mesmo tempo qualitativa e quantitativa, a história não estava mais cristalizada exclusivamente sobre os grandes homens, mas sim interessava-se por todos os homens. Altera-se o estatuto do documento. O documento não existe mais por si mesmo, mas em uma relação com os que o antecedem e os seguem, o seu valor relativo se torna objetivo e não sua relação com uma inapreensível substância real. O documento não é qualquer coisa que fica no âmbito do passado, ele é produzido por uma sociedade a partir de suas relações de forças e poder. A partir dessa concepção, acredito que é preciso contextualizar o documento não como verdade única, porque nenhum documento é inocente e neutro, mas sim matizar as suas nuances. É o olhar do historiador – e aqui acrescento o olhar do pesquisador - que escolhe o documento e tira dele os dados, preferindo-os em relação a outros e dando-lhes um valor de acordo com sua própria posição na sociedade em que está inserido, essa por sua vez, não é neutra. O documento é o resultado de uma montagem consciente de uma época, de uma sociedade e de um olhar. É constituído de várias vozes. Não existe documento verdade, cabe ao historiador/pesquisador não ser ingênuo diante de um monumento, entendendo que o mesmo é uma montagem, uma capa, uma aparência montada. Para desmontar essa aparência é preciso analisar as condições de produção desses documentos/monumentos. Desmontar esse documento não significa isolar os documentos do conjunto de monumentos, pois todo monumento é também um documento porque expressa uma relação de sentidos a que pertencem, mas elaborar uma nova erudição capaz de transferir este documento/monumento do campo da memória para o da ciência histórica. Nesse sentido de elaborar uma nova erudição – uma réplica – CORRÊA (no prelo) constata que “a proximidade/distância de um dizer com força motivadora de réplica depende, em grande parte, das representações que cada sujeito faz sobre os dizeres que lhes fazem sentido, não importando que tais dizeres lhes tenham sido 47 dirigidos de modo direto ou indireto.” (p. 6). O autor conclui a partir disso que não há uma primazia previamente fixada que é invariavelmente tomada como ponto de partida na relação de quem escreve com seu interlocutor, tampouco a possibilidade de se buscar no passado as referências textuais, que como origens de outras formas de dizer, pudessem ser descritas, datadas e classificadas como fundadoras de um dizer. Para ele, essa impossibilidade está ligada ao “tipo de material analisado e ao modo pelo qual os vestígios de gêneros discursivos – enunciados genéricos tomados como réplicas – aparecem” (p. 7) a esse fenômeno ele vai nomear de ruínas de gêneros discursivos6. O autor não usa a terminologia ruínas para se referir a gêneros discursivos em estado de destruição mas sim: como partes informes de gêneros discursivos, que, quando presentes em outro gênero, ganham o estatuto de fontes históricas – retrospectivas ou prospectivas – da constituição de uma fala ou de uma escrita. Quando consideradas como fragmentos de enunciados genéricos, elas podem ser vistas, também, como o resultado de uma “regeneração, pensada esta última como o processo pelo qual os sinais de um conjunto de saberes (as ruínas de uma civilização!) podem assumir o papel de elementos fundadores de novos saberes. Ainda segundo o autor, essas atividades nunca cessam de colocar lado a lado as diferentes representações de tempos/espaços em novas composições genéricas e que o reconhecimento da existência dessas ruínas é o de possibilitar novas perspectivas de leitura, eu acrescentaria ainda, novas perspectivas de escrita. Nessa perspectiva, eu me proponho a olhar para as monografias do CESPEB não como um monumento intocável ao qual não cabe uma problematização a ser discutida, mas sim como um documento no qual eu, como pesquisadora, lanço meu olhar entendendo que todo texto (documento) tem relação com o já-dito (CORRÊA, 2004, p. 68). O meu olhar para as monografias parte de um contexto, de um referencial, de um recorte. Se daqui há algum tempo outro pesquisador olhar para esses mesmos texto irá encontrar outras evidências, outras conclusões. Pino e Zular (2007) chegam a mencionar que inúmeras versões coexistem. As autoras ainda apontam que a intertextualidade “é levada a tal ponto que se pode até falar em uma 6 Grifo meu 48 enunciação plural, seja pelos recursos reiterados de colagem, plágio, seja pela experiência de textos escritos em conjunto, ou on-line, com participação direta dos leitores.” (p. 57). Entendendo o documento como texto produzido em um contexto social que leva em consideração os sujeitos, baseio-me em Bakhtin (2003) para me apoiar na Análise do Discurso também como uma forma de olhar para o texto das alunas professoras. Segundo ele o texto, seja ele oral ou escrito, representa uma realidade imediata, “são pensamentos sobre pensamentos, vivências das vivências, palavras sobre palavras, textos sobre textos.” O texto como enunciado, segundo ele, é determinado por dois elementos, “a ideia (intenção) e a realização dessa intenção”. (...) todo texto (seja ele oral ou escrito) compreende um número considerável de elementos naturais diversos, desprovidos de qualquer configuração semiótica, que vão além dos limites da investigação humanística (linguística, filológica, etc.) mas são por estas levados em conta (a deterioração de um manuscrito, uma dicção ruim, etc.). Não há nem pode haver textos puros. Além disso, em cada texto existe uma série de elementos que podem ser chamados de técnicos (aspecto técnico do gráfico, da obra, etc.) (BAKHTIN, 2003, p. 309) Bazerman (2009) também aponta que cada texto estabelece condições e cria realidades nas quais os sujeitos afirmam e reafirma estruturas e relações comunicativas. Cada texto bem sucedido cria para seus leitores um fato social. Os fatos sociais consistem em ações sociais significativas realizadas pela linguagem, ou atos de fala. Esses atos são realizados através de formas textuais padronizadas, típicas e, portanto, inteligíveis, ou gêneros, que estão relacionadas a outros textos e gêneros que ocorrem em circunstâncias relacionadas. (p.22) Os fatos sociais são todas as coisas nas quais as pessoas acreditam como verdade e que norteiam a forma como elas orientam-se em determinadas situações. Têm relação como à forma como compreendemos o mundo. Bazerman diz que “os fatos sociais afetam as palavras que as pessoas falam ou escrevem, bem como a força que tais enunciados possuem.” (p. 24). 49 A monografia, enquanto requisito de fim de curso, relaciona-se a uma instância acadêmica que tem suas diretrizes e orientações. Ela expressa uma forma de discurso no qual o sujeito/autor insere seu próprio discurso. Foucault (2011), ao falar sobre a “sociedade de discurso”, define-a com a função de conservar ou produzir discurso em um espaço fechado, distribuindo-o somente de acordo com regras estritas, apresenta-nos o ponto de vistas das “doutrinas”- contrário ao ponto de vista da “sociedade de discurso” – que procura partilhar de um só e mesmo conjunto de discurso em um número de indivíduos não determinado no qual definem sua noção de pertencimento. Esse pertencimento doutrinário “questiona ao mesmo tempo o enunciado e o sujeito que fala, e um através do outro.” (2011, p. 42). A doutrina liga os indivíduos a certos tipos de enunciados e lhes proíbe, consequentemente, todos os outros; mas ela se serve, em contrapartida, de certos tipos de enunciação para ligar indivíduos entre si e diferenciá-los, por isso mesmo, de todos os outros. Ele aponta que todo sistema de educação é uma forma política de manutenção ou modificação. As escolhas que são feitas em relação ao que se escreve, a forma como se escreve e a quem se escreve representam escolhas, posicionamentos políticos. O que é afinal um sistema de ensino senão uma ritualização da palavra; senão uma qualificação e uma fixação dos papéis para os sujeitos que falam; senão a constituição de um grupo doutrinário ao menos difuso; senão uma distribuição e uma apropriação do discurso com seus poderes e seus saberes? Que é uma “escritura” (a dos “escritores”) senão um sistema semelhante de sujeição, que toma forma um pouco diferente, mas cujos grandes planos são análogos? (FOUCAULT, 2011, p. 44) Esse apontamento de Foucault nos ajuda a refletir sobre a escrita monográfica como uma escrita que está inserida em um contexto institucional com regras pré-estabelecidas de formatação, organização e procedimentos. Uma pessoa só escreve uma monografia estando nesse contexto, fora dele, esse gênero é de difícil circulação e execução. O contexto de formação – espaço doutrinário - tem em comum sujeitos (alunas-professoras) de várias realidades institucionais e profissionais, mas que têm em comum a docência. educacionais, 50 A escrita docente aqui em questão, a monografia, exigência para a conclusão de um curso abarca em si a possibilidade da elaboração de um trabalho autoral, visto que possibilita ao sujeito fazer as escolhas do que deve ser colocado ou não, trazendo à tona todo um processo de reflexão que o faz ser responsável por suas escolhas. Portanto, considero a monografia como um gênero discursivo que abre possibilidades para a autoria das alunas professoras falarem de sua própria formação a partir de temas diversos que permeiam essa formação, falarem de suas verdades, experiências e cotidianos. Bakhtin aponta que: O gênero do discurso não é uma forma da língua mas uma forma típica do enunciado; como tal forma, o gênero inclui certa expressão típica a ele inerente. No gênero a palavra ganha certa expressão típica. O gênero corresponde a situações típicas da comunicação discursiva, a temas típicos, por conseguinte, a alguns contatos típicos dos significados das palavras com a realidade concreta em circunstâncias típicas. (2003, p. 293) Baseada nesse apontamento de Bakhtin, a escolha da análise do discurso como metodologia para essa pesquisa reflete o interesse em compreender como as enunciações presentes na escrita das alunas professoras trazem as marcas de suas formações, memórias e práticas em sala de aula. Também abarca um olhar dialógico, em que a dialogia está no embate das entoações, nas mais variadas formas de visão do mundo, no questionar, responder; nos atos de escrita, na apropriação da palavra como corpo social de um singular coletivo. Para Bakhtin, “o Outro é imprescindível para sua constituição” (Gege 2009, p. 29), o diálogo é tido como essencial para a atividade da linguagem assim como a alteridade caracteriza o sujeito. Ainda segundo Bakhtin (2003, p. 293) a expressividade típica do gênero não pertence à palavra como unidade da língua, não faz parte de seu significado, reflete a relação da palavra e do seu significado com o gênero, isto é, o enunciado típico. Dessa forma, uma palavra que em um contexto carrega em si traços de tristeza, pode assumir, em outro, o valor de algo bom e agradável, levando ao surgimento de uma nova situação. 51 Esse poder criativo não está na palavra, mas na funcionalidade dessa palavra no gênero, no enunciado. Portanto, a emoção, o juízo de valor, a expressão são estranhos à palavra de língua e surgem unicamente no processo do seu emprego vivo em um enunciado concreto. Em si mesmo, o significado de uma palavra (sem referência à realidade concreta) é extra-emocional. Há palavras que significam especialmente emoções, juízos de valor: “alegria”, “sofrimento”, “belo”, “alegre”, “triste”, etc. Mas também esses significados são igualmente neutros como todos os demais. O colorido expressivo só se obtém no enunciado, e esse colorido independe do significado de tais palavras, isoladamente tomado de forma abstrata. (BAKHTIN, 2003, p. 292) 52 3. UM POUCO DE HISTÓRIA Nesse capítulo, descrevo o que encontrei em documentos7 internos da UFRJ, no processo de minha pesquisa, em relação à participação da mesma nos debates político-acadêmicos. Em seguida apresento o Curso de Especialização Saberes e Práticas na Educação Básica. Entre as mudanças consideradas pela UFRJ, apontadas tanto pelo PDE /REUNI como pelo PDI da UFRJ, está a necessidade de buscar formas de articular a graduação com a pós-graduação,assim como da educação superior com a educaçãobásica, de forma a evidenciar a importância do papel que essas instituições desempenham na produção de políticas públicas para a formação docente nos vários níveis. O CFCH (Centro de Filosofia e Ciências Humanas) da UFRJ, tem assumido por meio de sua gestão política e acadêmica, através da sua configuração que englobaa Faculdade de Educação (FE) e o Colégio de Aplicação (CAp), esse papel, enfrentando os desafios da responsabilidade da formação inicial e continuada dos docentes de diferentes áreas disciplinares.Na formação inicial,o CFCH engloba a Faculdade de Educação e o Colégio de Aplicação, cujas atividades acadêmicas são voltadas para essas ações de formação. Atualmente, a Faculdade de Educação tem sob a sua responsabilidade cursos de licenciatura que se desenvolvem de forma articulada ao CAp,cuja finalidade é propiciar oportunidades de estágio para os alunos das licenciaturas, como também dos demais centros da universidade. No campo da formação continuada,as ações do CFCH podem ser evidenciadas pela sua participação em projetos ou programas de extensão - em parceria com outros centros - que têm como foco ações voltadas para refletir, complementar e atualizar a formação de docentes em exercício. Destaca-se, entre esses programas, o Projeto Fundão - primeiro programa a agregar unidades de vários Centros da UFRJ: o CCMN (que inclui os Institutos de Física, Matemática, Química e Geografia), o CCS (Instituto de Biologia) e o CFCH (Faculdade de Educação e Colégio de Aplicação) - com financiamento do SPEC/CAPES/PADCT de 7 Documento elaborado para implementação do curso. Foi conseguido através da secretaria do CESPEB 53 1983 até 1987, que se mantém até hoje, independentemente de novos financiamentos governamentais. No início dos anos 90, destaca-se a participação das unidades do CFCH no PAPRE–(Programa de Atualização de Professores da Rede Estadual / RJ) um programa de formação continuada para professores do 2º grau (hoje Ensino Médio) que reunia instituições de ensino superior federais, estaduais e privadas. O programa estava sob a coordenação do Fórum de Reitores e da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro. Destaca-se também a criação em 1994 do NUCAP (Núcleo de Consultoria e Atendimento Psicopedagógico) em parceria com a SME/RJ (Secretaria Municipal de Educação do RJ), a Fundação José Bonifácio/UFRJ e escolas federais. Em meados da década de 90, a CAPES reiniciou o financiamento de programas de formação continuada de professores através do Programa PróCiênciasem parceria com as Fundações de Amparo à Pesquisa dos diversos estados. A UFRJ desenvolveu em diversas unidades do CCMN, do CFCH e do CCS cursos de extensão e de pós-graduação lato sensu, com formatos variados e destinados à formação permanente de professores. Atualmente, vale ressaltar a participação do CFCH, através da FE e do CAp, no Programa Nacional de Incentivo à Formação Continuada de Professores do Ensino Médio (PRO-IFEM),que contou com os recursos do Subprograma das Unidades Federadas do Programa de Melhoria e Expansão do Ensino Médio (PROMED ) Destaca-se ainda como experiência da FE, em relação à formação continuada na modalidade de cursos de Especialização o Curso de Administração Escolar, aprovado na CEPG em 26/04/1996, ministrado pelo Departamento de Administração Educacional da FE da UFRJ. O objetivo desse curso foi proporcionar ao magistério do Rio de Janeiro elementos fundamentais para a análise da escola como organização/instituição, tanto no seu funcionamento interno como nas relações com o exterior para a construção de uma escola projetada para atender aos princípios de uma sociedade democrática. O curso oferecia fundamentação teórica para se estudar a cultura das organizações escolares, analisar o seu funcionamento e propor estratégias capazes de superar os problemas e proporcionar o desenvolvimento da escola como organização. Tinha um total de 480 horas e 30vagas anuais. 54 Cabe destaque também para a participação da FE na coordenação e execução do Programa Escola de Gestores,em parceria com o MECcom a implementação do Curso de Especialização em gestão na Educação Básica aprovado na CEPG/UFRJ em dezembro de 2007. Seu público-alvo era diretores e vice-diretores. Tinha como objetivo geral formar gestores escolares das escolas públicas de educação básica do Rio de Janeiro na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do direito à educação escolar com qualidade social. A carga horária era de 400 horas e com uma oferta de 400 vagas. As ações explicitadas legitimam esse centro como um espaço de formação docente por excelência que reafirma o papel da universidade pública como produtora de políticas de formação de professores como uma forma de melhorar a qualidade da educação básica. O curso de pós-graduação lato-sensuSaberes e Práticas na Educação Básica (CESPEB) vem se somar às ações já existentes de formação continuada nas últimas décadas na Faculdade de Educação. A seguir, apresento o CESPEB como proposta de formação continuada para os professores das redes públicas federal, estadual e municipal na modalidade de especialização que abrange diferentes áreas com questões importantes a serem discutidas com os docentes que atuam nas redes públicas de ensino no nível fundamental e médio. 3.1 O CESPEB O Curso de Especialização Saberes e Prática na Educação Básica – CESPEB foi organizado em 2007, tendo início em 2008, abrangendo as Áreas/ênfases de Alfabetização e Letramento; História, Geografia; Educação de Jovens e Adultos; Sociologia; Políticas Públicas e Projetos Educacionais; Língua Portuguesa e Ciências Biológicas. O curso é sem custos para os professores em exercício nas redes públicas do Rio de Janeiro. É composto por turmas de até trinta alunos. Segundo a Professora Ana Maria Monteiro, em entrevista concedida para essa pesquisa, o curso veio atender um projeto de seu plano de gestão e também um projeto da Faculdade de Educação de ter uma especialização para a formação continuada de professores que fosse voltada mais especificamente para as questões do ensino de, nas várias áreas disciplinares do currículo da Educação Básica e um 55 curso voltado prioritariamente para os professores de escolas públicas do Rio de Janeiro, principalmente os que recebem os alunos da Universidade para seus estágios obrigatórios da universidade. Os que se interessam pelo CESPEB inscrevem-se, e após essa etapa ocorre uma seleção composta por uma entrevista, a escrita de um texto justificando o seu interesse em fazer o curso, análise do currículo, e o fato de ser professor que está ativo atuando em escola básica. As aulas teórico-práticas acontecem nas salas de aula da Praia Vermelha e/ou no CAp, nos horários noturnos, durante a semana, podendo até mesmo ocorrer aos sábados de acordo com a demanda de cada curso específico, desde que não haja prejuízo para as demais atividades relacionadas à graduação e a pósgraduação stricto sensu. As bibliotecas do CFCH e do CAp, assim como as das unidades acadêmicas envolvidas, no que diz respeito aos recursos didáticos, disponibilizam os recursos a Faculdade de Educação e do Cap e das demais unidades envolvidas (ESS; ECO. IP, IFCS, NEPP-DH). No que se refere às atividades complementares previstas na grade curricular, são desenvolvidas na própria escola onde os professores/alunos atuam. Destaca-se ainda que o CESPEB compõe a ação – Diálogos entre diferentes espaços de formação – que é a resposta do Centro Filosofia de Ciências Humanas à chamada PRO-INFRA 01/2007, intitulado Novas tecnologias de formação em Humanidades De acordo com Regimento Interno do CESPEB, o curso tem como finalidade qualificar os docentes da educação básica que atuam na rede de ensino do Rio de Janeiro e estimular parcerias entre a UFRJ e as escolas públicas (federais, estaduais e municipais), de forma a constituir um espaço de articulação entre a formação inicial e a formação continuada através de estratégias políticas e pedagógicas que envolvam as instituições e os sujeitos das práticas de estágio. Tem como objetivos: • Promover reflexões sobre os aspectos políticos e éticos da atividade profissional; • Contribuir para que o professor reflita sobre as suas possibilidades de ação sobre a realidade, por meio do desenvolvimento de uma perspectiva crítica dos processos sociais, de suas limitações e de seus condicionantes; 56 • Contribuir para a reflexão sobre as questões de ordem político-artísticocientífico–tecnológicas do mundo contemporâneo; • Aprofundar os conhecimentos dos professores sobre as pesquisas atuais no campo da Educação, abordando aspectos referentes ao currículo e à constituição do conhecimento escolar, às teorias sobre os processos de ensino-aprendizagem e à avaliação; • Contribuir para o aprimoramento na formação conceitual na disciplina específica em que o professor atua e nos aspectos metodológicos e pedagógicos correlatos; • Promover reflexões em torno do significado da interdisciplinaridade, vista aqui como uma noção que supõe a existência de diálogos e interações entre os professores das diversas áreas do conhecimento; • Fomentar a discussão sobre a importância do estágio na formação inicial dos professores e do papel de protagonismoda escola e dos professores da rede pública nesse processo. O curso tem um total de 470horas, sendo 360 horas de encontros presenciais, as outras 110 horas são distribuídas entre atividades nas escolas (20 horas) e 90 horas para elaboração do trabalho final de curso. As 360 horas de encontros presenciais são distribuídas em seis módulos,conforme quadro abaixo: Quadro sintético da Estrutura Modular do CESPEB8 Módulos I II 8 Carga horária presencial Carga horária não presencial Área disciplinar específica 15 h 45 h Perfil da turma 5h Diferentes áreas disciplinares Número de encontros /aulas 3 9 Centros, unidades envolvidas CAP e Faculdade de Educação Diferentes unidades do CFCH Quadro retirado do documento elaborado para implementação do curso. Foi conseguido através da secretaria do CESPEB. 57 45h III IV e V VI Total 225 h 5h 10h 30h 90h 360 110 Diferentes áreas disciplinares 9 Área disciplinar específica 45 Área disciplinar específica 6 CAP e Faculdade de Educação Faculdade de Educação, CAP e Unidade/ Instituto correspondentes FE e demais unidades envolvidas 72 Cada módulo é composto de uma ou mais disciplinas. Os módulos I, IV, V e VI são disciplinares e constituem o eixo central do curso. Os módulos II e III são de ordem interdisciplinar, sendo os momentos onde os professores dos diferentes cursos de especialização se encontram no processo de formação. Cabe aos coordenadores de cada curso específico e em função das discussões do módulo Ielaborar a grade curricular dos módulos II e III de seus cursos a partir da oferta de disciplinas que compõem esses dois módulos comuns a todas as áreas disciplinares de forma a garantir as 45 horas previstas para cada um desses dois módulos.O primeiro módulo discute questões de formação de professores, formação continuada; o segundo discute questões contemporâneas da educação tais como violência na escola,sexualidade, cinema e educação, etc. O terceiro abrange discussões da pedagogia em geral - avaliação, currículo da escola, planejamento, entre outros. Esses três módulos abrangem questões comuns às várias ênfases. Os módulos quatro e cinco são mais específicos da área e o sexto destina-se ao seminário de monografia que reúne todos por ênfase para discutir o foco da pesquisa que cada um fará. Além dessa carga horária, há também um período de 30 58 horas de atividades na escola que vão gerar um portifólio com elaborações de reflexões e comentários sobre materiais significativos na observação e participação. Os encontros dos seis módulos estão organizados de forma que favoreça um trabalho reflexivo entre as experiências vividas pelos docentes no seu cotidiano profissional e as propostas teóricas presentes no curso que proporcionam algumas pistas para essa reflexão, questões e desafios que surgem na/da prática docente. 9 O corpo docente é formado por professores da UFRJ e do CAp assim como outros de instituições de Ensino Superior e Pesquisa que tenham título de Doutor, Mestre ou Especialista, conforme a porcentagem exigida pela Resolução do CEPG nº 01/07 de 9 de novembro de 2007. Além dos professores formadores haverá, para cada aluno dos cursos específicos, um orientador. A ele compete definir, junto com o orientando, o tema da monografia, orientar e acompanhar a elaboração da monografia, encaminhar a monografia à Coordenação do Curso específico para avaliação final. A forma de avaliação fica a critério dos docentes de cada disciplina desde que os mesmos observem o Regimento Interno da Faculdade de Educação do CEPG nº 01/07, de 09/11/07. Para a emissão do certificado de especialista é exigida a elaboração de monografia para todos os alunos no final do curso, com conteúdo significativo e coerente com sua área de atuação, sendo o grau obtido na monografia considerado a nota final do curso. Todas as monografias de conclusão deverão ser submetidas a uma Banca Examinadora composta por dois professores do setor de especialidade mais o orientador. A proposta do curso incorpora contribuições de estudo e pesquisa sobre a docência que apontam: 9 • O professor como sujeito que desenvolve e mobiliza saberes plurais relacionados ao seu ofício - os saberes docentes em suas práticas cotidianas; • A importância da realização pelo professor de reflexão na e sobre a ação docente, utilizando as contribuições teóricas das pesquisas educacionais e de suas áreas disciplinares específicas; • Os professores como sujeitos socioculturais e políticos que interagem com as questões e desafios da sociedade contemporânea; • A importância do reconhecimento da especificidade pedagógica das áreas Anexo 1 - Dinâmica de funcionamento dos módulos. 59 disciplinares, o que exige tanto uma atualização dos conteúdos específicos, como uma formação sobre os processos de produção dos saberes a serem ensinados e aprendidos no âmbito de uma epistemologia escolar • A necessidade de se incorporar as contribuições oriundas das teorias críticas e pós-críticas do campo do currículo para pensar a instituição escola e a cultura escolar. Entendendo que a construção de uma rede de formação docente que articule a universidade, escola e comunidade, o tempo de formação e das vivências pessoais e os sujeitos envolvidos, professores regentes, licenciandos, professores formadores, alunos, funcionário, etc., como um caminho para a profissionalização de docentes que expresse: • Sólida formação teórica nos conteúdos de sua área de atuação de forma a garantir segurança em seu trabalho e viabilizar o estabelecimento de parcerias com vistas ao desenvolvimento de ações e à produção interdisciplinar; • Sólida formação sobre educação e sobre os princípios políticos e éticos pertinentes à profissão docente; • Compromisso ético e político com a promoção e fortalecimento da cidadania; • Formação que permita entender a gestão democrática como instrumento para a mudança das relações de poder nas diversas instâncias do sistema educacional; • Domínio das tecnologias de comunicação e de informação; • Frequente comunicação com pares e com instituições de ensino e de pesquisa; • Capacidade de gerir suas demandas de formação de forma a manter-se permanentemente atualizado tanto em questões educativas como de sua área de conhecimento e da produção científica e cultural; • Reconhecimento do outro/aluno e do espaço cultural em que se encontram alunos e escola; • Capacidade e segurança para migrar do papel de re-produtor de conhecimento produzido por terceiros para o de produtor de conhecimento,autor de seu projeto profissional e produtor de bens culturais (incluindo propostas pedagógicas e materiais de apoio à educação). O documento de elaboração do CESPEB traz como resultados esperados da implementação do curso os seguintes itens: 1. Atender a demanda dos professores da rede pública de ensino por 60 cursos/oficinas/atividades nas quais se continue refletindo e discutindo sobre a realidade cotidiana de sala de aula na educação básica, em conjunto com a universidade; 2. Interferir na redefinição do perfil de professores da rede pública de ensino, em função de sua procura, oferecendo meios possíveis de execução das propostas pedagógicas emergentes; 3. Ampliar gradativamente o número de vagas oferecidas às redes municipais de ensino do Estado do Rio de Janeiro, segundoPlano Trienal idealizado pela UFRJ e firmado em convênio; 4. Melhoria da qualidade do estagio realizado nas escolas da rede pública em função da criação de um espaço onde se articulam as formações inicial e continuada dos docentes da educação básica. 5. Dinamizar a relação Universidade e Escola da educação básica com vistas a melhorias da rede pública de ensino no Estado do Rio de Janeiro. 6. Ampliar a utilização dos espaços e recursos da Universidade Pública no fim de semana para a formação continuada de professores. A seguir, segue o detalhamento do Curso de Especialização em Alfabetização, Leitura e Escrita, que é o objeto central dessa pesquisa. 3.2 O CESPEB de Alfabetização, Leitura e Escrita O Curso de Especialização em Alfabetização, Leitura e Escrita tem como coordenadoras as Professoras Dras. Ludmila Thomé de Andrade e Patrícia Corsino. O público alvo do curso são professores graduados em Pedagogia que atuam como alfabetizadores nas redes públicas (federal, estadual e municipal) e que, de preferência, recebam alunos da UFRJ para estágio. Vale ressaltar que 10% das vagas destinam-se a graduados em Pedagogia, não necessariamente formados na UFRJ, que atuem como professores alfabetizadores em outros tipos de escolas. Como já foi citado anteriormente, o curso se organiza em seis módulos, sendo os módulos IV e V os específicos de cada ênfase. Segue abaixo a organização curricular dos da ênfase em Alfabetização, Leitura e Escrita dos respectivos módulos. 61 Quadros da Disciplinas dos Módulos IV e V do Curso de Especialização em Alfabetização, Leitura e Escrita Disciplina Concepções de Linguagem Carga Horária 30 horas Concepções de linguagem. A linguagem como constitutiva do sujeito: Mikhail Bakhtin e Lev Vigotski.Linguagem, história e Ementa experiência: Walter Benjamin. Articulações de diferentes concepções de linguagem e o ensino de língua materna. BAKHTIN, Mikhail (Volochinov).Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992. BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora, 1992a. BAKHTIN, Mikhail. Questões de Literatura e de Estética. São Paulo: UNESP,1998. BENJAMIN, W. Obras escolhidas, volume 1. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993. Bibliografia BENJAMIN, W. Obras escolhidas, volume 2. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993. VIGOTSKI, L. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, VIGOTSKI, L. Pensamento e Linguagem São Paulo, Martins Fontes, KRAMER, Sonia. Por entre as pedras, arma e sonho na escola. Ática. FREITAS, Maria Teresa. Bakhtin no Brasil. Papirus. Disciplina Oralidade e Cultura Escrita Carga Horária 45 horas Letramentos e Gêneros discursivos. Gêneros da oralidade e da escrita. Variedade dialetal e interações orais. Ementa Interferências de práticas da modalidade oral da linguagem na aquisição da escrita e conseqüências no processo de produção escrita do aprendiz escrevente. BAGNO, Língua e preconceito linguístico. São Paulo: Parábola, 2006 BORTONI-Ricardo, S. M. Nós cheguemu na escola, e agora? Sociolingüística e educação São Paulo: parábola editorial, 2005. GARCIA, Pedro Benjamim. Oralidade, memória e formação. In: Boletim Salto para o futuro. Rio de Janeiro: TVE- Brasil, Bibliografia 2006 (Publicação eletrônica) MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, A.P.; et allii (orgs.) Gêneros textuais e ensino. Rio de Janeiro: Ed. Lucerna, 2002. ONG, W. Oralidade e cultura escrita São Paulo: Papirus, 1999 SIGNORINI, I. (org.). Investigando a relação oral/escrito. 62 Campinas: Mercado de Letras, 2001 Disciplina História e Políticas de Alfabetização no Brasil Carga Horária 30 horas Concepções de alfabetização ao longo da história educação brasileira. Campanhas e Programas de alfabetização popular: Paulo Freire e os movimentos de alfabetização, Mobral, Alfabetização Solidária e Brasil Alfabetizado. O ensino Ementa fundamental de 9 anos. A alfabetização e as avaliações dos sistemas educacionais. Antigas e novas questões sobre métodos de alfabetização, o construtivismo ferrereano e o letramento. Bibliografia BRASIL/ MEC. O ensino Fundamental de 9 anos. CARDOSO, C. J. e AMÂNCIO, L. N. de B. (orgs.) Memória da alfabetização mato-grossense: o caminho das cartilhas Rondonópolis, MT: EDUFMT, 2006 CARVALHO, M. Alfabetizar e Letrar - Um Diálogo Entre a Teoria e a Prática. Petrópolis, Vozes FRADE, I. C. e MACIEL, F. (orgs.) história da alfabetização: produção, difusão e circulação de livros (MG/RS/MT séc XIX e XX) Belo Horizonte: UFMG?FAE, 2006. GOULART, C. M. A. et al.(orgs.) O ensino inicial da leitura e Bibliografia da escrita na rede escolar de Niterói/Rio de Janeiro (19592000) Niterói: PROALE/UFF, Faperj, 2007 MONTENEGR.; RIBEIRO, V. M.; NUNES, C. M. Indicador Nacional de alfabetismo funcional – Inaf: um diagnóstico para a inclusão social pela educação. São Paulo: Instituto Montenegro, Ação Educativa, Ibope Opinião, 2001. MORTATTI, M.R.L. Os sentidos da alfabetização São Paulo 1876/1994 São Paulo: Editora UNESP 2000. RIBEIRO, Vera Masagão (Org.). Letramento no Brasil. São Paulo: Global, 2003 SOARES, M. Alfabetização e letramento: um tema em 3 gêneros. Disciplina Práticas Pedagógicas de Leitura e de Escrita na Escola Carga Horária 45 horas A leitura e a escrita na Educação infantil e no ensino fundamental. Práticas, estratégias e procedimentos de leitura e de escrita na escola: crítica e propostas inovadoras. Ementa Propostas curriculares para ensino de leitura e escrita de textos. Livros didáticos de alfabetização e de português: análise e escolha. Jogos de linguagem. Diagnóstico, planejamento e avaliação da leitura e da escrita. BATISTA, Antônio Augusto Gomes e VAL, Maria da Graça Bibliografia Ferreira da Costa (Orgs.) Livros de alfabetização e de 63 português: os professores e suas escolha Belo Horizonte: Autêntica, 2004 GERALDI, J. W. Portos de Passagem São Paulo: Martins Fontes, 1992 MARINHO, M e SILVA, C. (org) Leitura do Professor. São Paulo: Mercado das Letras,1998. MORTATTI, M. R. L. Cartilha de alfabetização e cultura escolar: Um pacto. secular. Caderno CEDES v.20 n.52 Campinas, nov.2000. PEREZ, F. C. Ensinar ou Aprender a Ler e a Escrever. Porto Alegre: ArtMed. SOLÉ, Izabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: ArtMed. TERZI, S. B. A oralidade e a construção da leitura por crianças de meios iletrados in KLEIMAN, A. (org.) Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas, S.P.: Mercado de letras, 1995. VAL, M. da G. C. Reflexões sobre prática escolares de produção de texto – o sujeito autor.Belo Horizonte, Autêntica, 2003 ZACCUR, Edwiges. A magia da linguagem Rio de Janeiro, DP& A, Disciplina PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE ALFABETIZAÇÃO NA ESCOLA Carga Horária 45 horas O processo de desenvolvimento da lecto-escrita. A alfabetização e o ensino da língua portuguesa. A aquisição do sistema alfabético: fonemas e sílabas. Padrões silábicos da Ementa língua portuguesa. O tratamento pedagógico da ortografia. Segmentação da escrita de palavras e grupos tonais. Ensino da morfologia. Escolhas lexicais. ABAURRE, B. ET al. (Orgs.) Cenas de aquisição da escrita Campinas, S.P. Mercado de letras, 1999. CHARTIER, A. M. Alfabetização e formação dos professores da escola primária. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, n. 8, p.4-12, maio/ago.,1998. LEAL, T.F.; ALBUQUERQUE, E.B e MORAIS, A.G. Alfabetização: apropriação do sistema alfabético de escrita. BH: Autêntica. Bibliografia MORAIS, A.G. Ortografia: ensinar e aprender. São Paulo: Ática, 2005. MORTATTI, M. R. L. Cartilha de alfabetização e cultura escolar: Um pacto. secular. Caderno CEDES v.20 n.52. Sâo Paulo: Campinas, nov.2000. SILVA, A. da A escrita espontânea São Paulo: Contexto, 2000 TEBEROSKY, A; Gallart, M.S e colaboradores. Contextos de 64 alfabetização inicial, Porto Alegre: ArtMed. ZACCUR, Edwiges. A magia da linguagem Rio de Janeiro, DP& A, Disciplina Literatura Infantil Carga Horária 30 horas Letramento literário. História da literatura para a infância no Ocidente e no Brasil. Literatura infantil: da produção à Ementa recepção do leitor. A qualidade do livro de literatura infantil. A escolarização da literatura. Espaços e práticas de leitura literária na escola. CHARTIER, Roger. A História Cultural entre práticas e representações. Memória e Sociedade. Lisboa: Difel, 1990. CHARTIER, Roger(org). Práticas da leitura. São Paulo: Estação Liberdade, 1996. CORSINO, P. e ANDRADE, L. Critérios para a constituição de um acervo literário para as séries iniciais do ensino fundamental de avaliação do PNBE-2005. In: PAIVA, A. e MARTINS, A. (org.). Literatura: saberes em movimento. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2007. FRAISSE, Emmanuel e outros. Representações e imagens da leitura. São Paulo: Ática, 1997. GOULART, Cecília. Processos de letramento na infância: modos de letrar e ser letrado na família e no espaço educativo formal. In: RELATÓRIO FINAL DA PESQUISA. Niterói: PPGE- FE. UFF. Dez, 2005. LAJOLO, Marisa. Do mundo da leitura à leitura do mundo. São Paulo: Ática, 1993. LAJOLO, Marisa e ZILBERMAN. 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Belo Horizonte: Autêntica, 1999, p.71-88.ZILBERMAN, R. Literatura e escola. São Paulo: Global, 2003. Na ocasião da implementação do CESPEB, que tinha como coordenadoras as professoras Carmen Teresa Gabriel (CFCH), Ana Maria Monteiro (FE) e Maria Luiza M. da Rocha (CAp UFRJ), as professoras Ludmila Thomé de Andrade e Patrícia Corsino foram convidadas para coordenar o CESPEB Alfabetização, Leitura e Escrita devido à experiência na coordenação do curso de Extensão,também denominado Alfabetização, Leitura e Escrita, que foi oferecido pela UFRJ de 2005 a 2007. Assim como o curso de especialização, ele era também oferecido aos professores dasredes públicas (federal, estadual e municipal) e tinha muita procura por parte dos professores da rede por conta da relevância de suas discussões. Em entrevista, a professora Ludmila Thomé de Andrade relata que o curso de extensão se constituía de 15 encontros com 3 horas de duração para cada, nos quais seincluíam discussões de literatura infantil, leitura e escrita, gênero, planejamento, avaliação. Sentiam a necessidade que essa proposta se expandisse, pois consideravam ser pouco tempo para abordagens tão significativas. Diante da possibilidade de ampliação da discussão que já vinham desenvolvendo, abraçaram o CESPEB Alfa como uma ação geradora de um espaço de reflexão sobre a prática docente. Segundo ela, elaborar o curso de Alfabetização, Leitura, Escrita do CESPEB foi um trabalho de ampliação do que já se vinha fazendo, agregando um maior aprofundamento nos temas. Na sua visão, no que diz respeito a à concepção de linguagem, à estrutura, às especificidades da alfabetização, o curso está bem estruturado, embora, no entanto,ela tenha algumas ressalvas em relação àestrutura comum, hoje, depois da terceira edição de CESPEB Alfa. Em sua concepção, esse atravessamento na estrutura curricular, que reúne as ênfases de Educação Física, Língua Portuguesa, EJA, entre outras, acaba por prejudicar alguns aprofundamentos temáticos mais disciplinares, de caráter central deste curso de especialização. A ideia de se inserir a integração entre públicos docentes (na posição de discentes), em princípio, segundo ela, tem um efeito benéfico, mas o que se viu acontecer, em algumas edições destas integrações, foi uma estruturação curricular onde se tem disciplinas muito gerais, que foram se tornando tão menores, a ponto de se ter uma disciplina com somente com três 66 aulas, nas quais muitas vezes os professores, embora compromissados e capazes, não chegam evidentemente a criar vínculos com a turma, por conta da duração da disciplina. Esse elemento pontualmente interfere e dá um caráter de pós-graduação mais ligeira, em que os aprofundamentos se pulverizam demais e não deixam ao professor discente a oportunidade de se deterem em temas fundamentais, selecionados pela equipe coordenadora responsável pelo currículo. Do ponto de vista da avaliação da linguagem, ela acredita que valha a pena haver um aprofundamento ainda maior, embora ache que os módulos de linguagem sejam muitos bons. O Primeiro módulo - Concepções de Linguagem - introduz Vygotsky, Benjamin e Bakhtin como base para das discussões. O segundo módulo – História e Política da Alfabetização no Brasil – trata das questões políticas que envolvem a alfabetização tais como o sistema de avaliação, os índices educacionais. O terceiro módulo - Oralidade e Cultura Escrita - é um ponto de partida para pensar a linguagem na concepção apresentada, no sentido de se propiciar em desembaraçamento de concepções arraigadas; o de Literatura Infantil tem como princípio discutir o que se tem lido como literatura na escola, os acervos da escola, o que é literatura e a formação do sujeito leitor. Posterior a esse módulo, seguem os módulos chamados de Práticas (Práticas Pedagógicas de Alfabetização e Práticas Pedagógicas de Leitura, Escrita). Para a professora Ludmila, esses dois últimos são o coração do curso. Ele se desdobram em 9 aulas respectivamente, um número maior que os demais módulos. O módulo que aborda as Práticas Pedagógicas de Alfabetização revisita os métodos, faz uma primeira aula sobre memória levantando como elas (professoras alfabetizadoras)foram alfabetizadas, retoma os métodos tradicionais e as concepções que embasam os mesmos, passa pelo construtivismo, letramento, gêneros discursivos, trabalha com análise de escritas de crianças e apresentação da própria prática das professoras alfabetizadoras, relacionada a algum tema abordado nas disciplinas específicas do curso. O módulo Práticas Pedagógicas de Leitura e Escritaagrega ao referencial teórico do módulo de Práticas Pedagógicas de Alfabetização, discussões de uma concepção cognitivista de leitura, coesão e coerência, estratégias de leitura, no intuito de pensar junto o que vem a ser leitura. Em alguns momentos, trabalhou-se 67 com as avaliações nacionais a partir de provas anteriormente aplicadas e os descritores das avaliações. Em relação à escrita, muitas vezes o fio condutor teórico das discussões, teve como referência o livro “Reflexões sobre Práticas escolares de Produção de texto – O sujeito-autor”10 que traz muitas análises de escritas infantis. Ainda em relação aos módulos de CESPEB Alfa, a professora esclarece que existe um que “costura” todos. Tem como ênfase a construção do memorial de formação que antecede a escrita da monografia. No CESPEB Alfa o memorial é escrito no início do curso e quando elas terminam o CESPEB, escrevem a última parte do memorial, tendo passado pela experiência de formação. Ela aponta que em muitas monografias o memorial constituiu a primeira parte do trabalho. Em relação às orientações para a escrita do trabalho final do curso, a monografia, é importante ressaltar que não havia um formato estabelecido que impusesse conteúdo ou tom memorialístico. Ela esclarece que a proposta era que cada professor orientador acompanhasse sua orientanda dentro do tema escolhido pela mesma, mas que tivesse decorrido das discussões do curso. A proposta previa que as professoras alfabetizadoras pudessem escolher, construir o tema da sua pesquisa, por ter ocasião de falar de alguma coisa que lhe tivesse chamado atenção para um aprofundamento na monografia. Esse aspecto ressalta o sentido do curso em propor que elas abram o olhar para uma perspectiva mais crítica, no sentido de também perceberem o que elas já fazem e o que pode aprimorar nesse fazer a partir de um refinamento teórico. A seguir, trago a metodologia que me conduziu no percurso de olhar para a escrita das professoras alfabetizadoras, tendo as monografias do CESPEB Alfabetização, Leitura e Escrita meu corpus de pesquisa. 10 VAL, Maria da Graça Costa. ROCHA, Gladys. Autêntica/CEALE/FaE/UFMG, 2008. 68 4. A ESCOLHA DO CAMINHO METODOLÓGICO De forma geral, essa pesquisa adota como metodologias integradamente a “Análise Documental” e a “Análise do Discurso” - especificadas anteriormente no capítulo sobre o referencial teórico na página p.22 - como seus eixos norteadores. Neste capítulo descreverei a metodologia utilizada para o desenvolvimento dessa pesquisa com as alunas-professoras do CESPEB alfabetização, leitura e escrita. Para atingir os objetivos pretendidos em minha pesquisa de mestrado, acessei, na secretaria do curso, as monografias produzidas pelas duas turmas do CESPEB – Curso de Especialização Saberes e Práticas da Educação Básica da UFRJ. A primeira turma teve início em 2008 e a segunda em 2010. Ao todo, reunindo os trabalhos elaborados pelas duas turmas, encontrei um total de 39 monografias. Inicialmente, foram lidos os 39 resumos, das duas turmas,como contato inicial exploratório, para me situar em relação aos temas abordados e delinear a metodologia de trabalho. A primeira turma, que nomeei de Turma A, apresentou 20 monografias no total, porém dessas 20, duas não possuíam resumo. A segunda turma, que nomeei de Turma B, apresentou 19 monografias, todas com resumo. A partir da leitura dos resumos, pude identificar nas 39 monografias os temas abordados e suas respectivas quantidades. As duas monografias que não apresentaram resumo foram lidas transversalmente, a fim de buscar os objetivos, as questões e o foco da discussão, para fazer a identificação dos temas abordados. Vale ressaltar que houve monografias que abordaram mais de um tema, conforme é possível verificar no quadro abaixo: Quadro Demonstrativo dos Temas Abordados nas Monografias do CESPEB Alfabetização, Leitura e Escrita TEMAS ABORDADOS NAS MONOGRAFIAS Literatura Infantil Formação de Professores Leitura e Escrita Quantidade por Turma A (2008) 4 6 - B (2010) 3 2 5 69 Leitura e Escrita Docente Leitura e Escrita Discente Prática Docente Avaliação Infância Educação Infantil 2 3 8 1 1 1 4 5 2 - Posterior ao processo de leitura dos resumos e levantamento dos temas abordados em todas, fiz uma seleção das monografias a serem lidas na íntegra, visto a grande quantidade trabalhos. Decidi então selecionar cinco monografias de cada turma para leitura, levando em consideração os objetivos expostos nos resumos. Abaixo segue um quadro com os nomes fictícios das alunas professoras e os objetivos expostos nos resumos das monografias escolhidas para análise. Procurei eleger as monografias que tivessem relação com a trajetória profissional de cada aluna professora, que tratassem de alfabetização e as que, de certa forma, falassem sobre a criança. Quadro demonstrativo dos objetivos das monografias Turma A Autor 01 02 03 Do que tratam Sofia “O trabalho traça a memória e história da minha trajetória de formação a partir do recorte do projeto que teve como viés a Literatura infantil com as diferentes versões e releitura para o conto tradicional “Chapeuzinho Vermelho”. Ana Paula A pesquisa traz um panorama da história das infâncias das pesquisas com crianças e dos grupamentos e reagrupamentos originados dos Ciclos de Formação. Amanda “A pesquisa busca discutir de que maneira os professores contribuem para a formação de um individuo critico e ativo. O objetivo consiste na seguinte interrogativa: Por diferentes caminhos teórico-metodológicos os professores alfabetizadores possibilitam o percurso da alfabetização e letramento dos alunos de classes populares?” 70 04 05 Claudia Objetivo: O desenvolvimento e a produção da linguagem numa escola de educação infantil do município do Rio de janeiro. A questão primordial deste trabalho é fazer uma reflexão sobre o desenvolvimento da linguagem das crianças, na escola de educação infantil da qual faço parte. Sonia “A presente pesquisa constituiu-se na análise de uma situação real, em que a parceria entre duas professoras diante de um fator alarmante em muitas escolas brasileiras, a alfabetização dos alunos das classes populares, resultou numa experiência bem sucedida com alunos em distorção idade série. Estas crianças foram alfabetizadas através de uma proposta focada no uso social da língua, num trabalho contínuo de significação da escrita.” Quadro demonstrativo dos objetivos das monografias Turma B Autor 01 02 Do que tratam Suzana Esta pesquisa tratará da aquisição da leitura e da escrita dos alunos dos 1º e 2º anos do ensino fundamental da E.M. X, situada no bairro de Y (RJ) buscando investigar a influência da oralidade nas construções dos textos infantis e como o professor pode auxiliar na construção da escrita para que o educando supere as primeiras hipóteses que são calcadas na linguagem oral. Lilian Este trabalho relata uma experiência em uma escola pública federal do Rio de Janeiro, com turmas do 4º ano do Ensino Fundamental, sobre práticas de narrativas através do relato de acontecimentos do cotidiano, notícias de jornais, televisão e internet, dramatizados em formato de telejornal semanal denominado de TV Criativa. O objetivo foi criar um ambiente lúdico, que oportunizasse a discussão de assuntos da escola e da atualidade, favorecendo a escuta e o debate de diferentes 71 pontos de vista, além do acesso a diferentes gêneros textuais e conquista da autoria através da construção de textos individuais e coletivos. 03 04 05 Júlia O objetivo do trabalho é acompanhar a evolução da escrita e analisar as atividades sobre a linguagem escrita de três alunos que frequentaram esta turma numa escola no terceiro distrito do Município de Duque de Caxias no ano de 2010, então cursando o segundo ano de escolaridade. Karina O objetivo deste trabalho é analisar as trajetórias de três alunos de uma turma de alfabetização ao longo do ano letivo de 2010, a partir de uma perspectiva construtivista. Tratase de um estudo qualitativo, em que são descritas algumas intervenções didáticas da alfabetizadora, analisados os trabalhos escolares dos sujeitos da pesquisa e destacados os progressos e/ou dificuldades de cada um, em diferentes momentos do ano letivo. Célia Tem como objetivo refletir sobre a leitura e a contribuição da literatura infantil no processo de alfabetização e letramento da criança nos seus anos iniciais de escolarização. Abaixo segue um quadrocom o quantitativo dos temas abordados nas monografias escolhidas para análise. Quadro dos Temas abordados nas Monografias Escolhidas TEMAS ABORDADOS NAS MONOGRAFIAS Literatura Infantil Formação de Professores Leitura e Escrita Leitura e Escrita Docente Leitura e Escrita Discente Prática Docente Quantidade por Turma A 1 1 2 B 1 3 1 - 72 Avaliação Infância Educação Infantil 1 1 - A partir dessa primeira parte de estudos, pude eleger os procedimentos para a pesquisa. Apoiada na afirmação de Minayo de que a Entrevista é acima de tudo uma conversa a dois, ou entre vários interlocutores, realizada por iniciativa do entrevistador, destinada a construir informações pertinentes para um objeto de pesquisa, e abordagem pelo entrevistador, de temas igualmente pertinentes tendo em vista este objetivo.” (1992, p. 261) Tomei-a como um procedimento de minha pesquisa, optando pela entrevista “aberta ou em profundidade” (Minayo 1992, p. 262) que tem como característica o fato de que o entrevistado é convidado a falar de forma livre sobre um determinado assunto e as perguntas do entrevistador, quando são feitas, buscam dar uma maior profundidade nas reflexões estabelecidas. Seguindo essa perspectiva, realizei duas entrevistas a fim de levantar dados que orientassem minha caminhada em direção ao meu objeto de pesquisa. A primeira entrevista realizada foi com a Professora Ana Maria Monteiro, diretora da Faculdade de Educação, que participou de todo o processo de implementação do CESPEB. Teve como pontos norteadores: i) a demanda que impulsionou a criação do Curso de Especialização Saberes e Práticas da educação Básica e ii) a(s) concepção(ões) que nortearam a organização curricular do curso. A partir desses pontos,estabelecemos uma conversa muito produtiva da qual, pude levantar as informações sobre o CESPEB que constam nesse trabalho. Também foi realizada uma entrevista com a Professora Ludmila Thomé de Andrade, que coordena do CESPEB Alfabetização, Leitura e Escrita. O objetivo dessa conversa foi levantar as especificidades do CESPEB Alfa, para tanto tivemos como roteiro os seguintes pontos: i) de que princípios partiram para a concepção do CESPEB Alfa, ii) como foram organizadas as disciplinas que compunham os módulos curso e iii) quais as especificidades dessas disciplinas. Ainda relacionado ao levantamento de informações sobre o CESPEB, pude junto à Secretaria do curso ter acesso ao Projeto Geral do CESPEB, do qual também pude obter informações relacionadas à estrutura e características, justificativa, gestão acadêmico- 73 pedagógica, corpo docente, infra-estrutura, acompanhamento, monitoramento e avaliação, resultados esperados e custos. A partir dessa trajetória, pude trazer como categorias de análise, para compreender como o processo de escrita pode ser revelador de um percurso significativo, os seguintes pontos: 1. As marcas do acadêmico na escrita das alunas professoras; 2. A reverberação apontando as interações entre as professoras formadoras e as alunas professoras; 3. A voz do aluno no percurso profissional como apoio para as práticas pedagógicas. 74 5. ANÁLISE DOS DADOS – O ENCONTRO COM O TEXTO DAS PROFESSORAS De forma geral, todos os trabalhos lidos apresentaram traços dos módulos abordados no curso: 1. Concepções de linguagem; 2. História e Política da Alfabetização no Brasil; 3. Oralidade e Cultura escrita; 4. Literatura Infantil; 5. Práticas (Práticas Pedagógicas de Alfabetização e Práticas de Leitura e Escrita). Em cada um dos trabalhos lidos, foi possível identificar marcas de suas autoras, mesmo com a utilização dos padrões da escrita universitáriacom citações, referenciais teóricos, análise de dados, talvez por uma tradição histórica em relação à forma como os trabalhos acadêmicos devam ser feitos. Nesse sentido, há o dizer sobre um determinado conhecimento, ancorado em uma forma pré-determinada de se dizer. Elas puderam chegar às suas próprias conclusões em relação às práticas, ao que o curso trouxe de novo e em relação ao resgate de suas formações acadêmicas. Cada escolha do que quiseram dizer foi também a escolha do que não dizer, escolha do que colocar, passou por reflexões e processos de tomadas de consciência que as levaram a escolher aquelas formas, suasopções de escrita. Comparando a escrita das alunas professoras com o processo de criação artística, posso dizer que cada escrita traz em si, como processo de autoconsciência, uma nova posição de autor em relação ao indivíduo representado. Escrever sobre a prática não está posto em nenhum lugar. O que é para ser dito só pode ser dito por quem está na prática, nesse caso, as alunas professoras. Elas falam de si, na prática, e da prática, em si. Descrevem suas atividades, como relatos de práticas, mas estão evidentemente retratando-se, ao falar destas ações docentes escolares. Dizem como se percebem enquanto professoras,no movimento do cotidiano escolar e ao mesmo tempo como esse cotidiano as está alterando. 75 A seguir, abordo cada uma das categorias evidenciando, através de fragmentos das monografias, as experiências das alunas professoras por via da escrita. 5.1 As marcas do acadêmico na escrita das alunas professoras A escrita acadêmica, especificamente usada no âmbito da universidade, tem como características certos padrões de organização, focada sempre no tema do conhecimento. Minayo (2007) aponta que o trabalho científico caminha em duas direções, uma que elabora as teorias, os métodos, seus princípios e estabelece resultados, e uma outra, que inventa, ratifica seu caminho, abandonando certas vias, caminhando em outras direções. Essa primeira categoria de análise teve como propósito ajudar a identificar nas monografias apresentadas pelas alunas professoras as marcas do gênero acadêmico. Trato como gênero acadêmico o tipo de escrita obrigatória, como conclusão dos cursos universitários em seus vários segmentos (graduação, pósgraduação), que tem como estrutura básica: introdução, um capítulo de referencial teórico, um de metodologia e um de análise dos dados, conclusão ou considerações finais, referências bibliográficas e anexos, se houver. Baseada nesse entendimento, pude perceber que nas monografias escritas no CESPEB Alfa, apresentaram essas estrutura composicional, com pouquíssimas ressalvas como mostra o quadro abaixo. Quadro demonstrativo das marcas acadêmicas Turma A Especificações Sofia Capa X Folha de Rosto Ficha Catalográfica X Ana Paula Amanda Claudia Sonia X X X X X X X 76 Agradecimentos X X X Dedicatória X X X Epígrafe X X X Resumo X X X Palavras-chave X X X Abstract Sumário Citações diretas e indiretas X X X X X X X X X X X X X X X X Introdução X X X X Capítulos Referencial Teórico X X X X X X X X X X Metodologia X X X Análise de dados X X Considerações Finais/ Conclusão X X Anexos X X Referências Bibliográficas X X X X X X X X X X X Quadro demonstrativo das marcas acadêmicas Turma B Especificações Suzana Capa X Lilian Júlia X Karina Célia X 77 Folha de Rosto X X Ficha Catalográfica X Agradecimentos X Dedicatória X Epígrafe X X Resumo X X X Palavras-chave X X X X X X X X X X X X X X X X Lista de Imagens X X Abstract Sumário Citações diretas e indiretas X X X X X X X X X X Introdução X X X X Capítulos Referencial Teórico Metodologia X X X X X X X X X X X X X X X Análise de dados X X X X Considerações Finais /Conclusão X X X X X X X X X X X Anexos Referências Bibliográficas X Olhar para esses dados evidencia o exercício e investimento dessas professoras em se aproximar da realidade vivenciada na universidade, visto que uma monografia só é escrita quando solicitada com algum fim, que normalmente tem como princípio um momento de avaliação de fim de curso; ninguém opta por escrever uma monografia por ser o melhor gênero para se falar sobre um 78 determinado tema, como por exemplo, a prática docente. Ela é exclusivamente um gênero que explicita, ou tenta explicitar, a cientificidade de uma forma de enxergar a realidade. E essa cientificidade guarda em si um grande embate entre as ciências sociais em comparação com as ciências da natureza. Existem aqueles que tentam uniformizar os procedimentos para compreender o social e o natural e os que desejam uma completa diferença do campo humano. Independentemente da vertente adotada como perspectiva de pesquisa que atribua o estatuto de ciência a uma produção, a universidade é o espaço de circulação e reconhecimento desse gênero. Ela, ao longo da história, é detentora da formação dos acadêmicos e pela propagação do conhecimento científico, comprometendo-se com a pesquisa, além do ensino e a extensão. Estar na universidade implica assumir o compromisso com uma escrita que cumpra com as exigências desse campo, o que torna o sujeito desse contexto um pesquisador, seja os alunos da graduação com suas produções voltadas para a Iniciação Científica, as pesquisas para os Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC),os trabalhos nos níveis mais avançados como as monografias dos cursos de Pós-Graduação lato sensu, as dissertações e teses da pós-graduação stricto sensu. Nessa perspectiva, é possível afirmar que a escrita monográfica propõe situar seu autor no campo científico. Em relação às alunas professoras, isso não é diferente, pois elas fazem parte desse contexto no qual a todo o momento estão sendo estimuladas a pesquisar, sobre temas que apóiam suas práticas. Minayo aponta que “A cientificidade, portanto, tem que ser pensada como uma ideia reguladora de alta abstração e não como sinônimo de modelos e normas a serem seguidos. A história da ciência revela não um “a priori”, mas o que foi produzido em determinado momento histórico com toda a relatividade do processo de conhecimento.” (2007p. 11). Isso não quer dizer que o professor da educação básica, que está distante da universidade em seu dia a dia, quando cursa uma especialização proposta por uma universidade e faz parte desse contexto,incorporará isso como parte de sua vida profissional. Cabe a cada um posicionar-se como um professor pesquisador ao longo da docência. Ao analisar as monografias, percebo como as alunas professoras puderam falar de suas práticas, mesmo tendo como suporte para suas escritas o gênero monografia, foi possível verificar como elas conseguiram imprimir suas marcas. 79 Oespaço destinadoà metodologia foi a parte mais utilizada para falar do trabalho realizado em sala de aula, a forma como elaboravam esse trabalho e como o colocaram em prática. Assim, mostra a criatividade das mesmas, visto que a metodologia é a parte de um trabalho científico no qual “inclui simultaneamente a teoria da abordagem (o método), os instrumentos de operacionalização do conhecimento (as técnicas) e a criatividade do pesquisar (sua experiência, sua capacidade pessoal e sua sensibilidade). (Minayo 2007, p14). Diante disso,posso concluir que a escrita monográfica coloca o professor em um lugar de pesquisador. Não coincidente com o pesquisador da universidade, que está produzindo pesquisas, políticas públicas, programas, materiais, etc., mas sim com o pesquisador que reflete sobre sua prática cotidiana, que busca conhecimentos que fundamentem sua prática. Destaquei de algumas monografias analisadastraços do comprometimento que essas professoras têm com a sua pesquisa. A maioria delas, três de cada turma, ao escrever a monografia, incluiu o memorial de formação em seu trabalho, e nele, foi possível achar referências em relação à preocupação de investir no aprimoramento, de conhecer mais, para que pudessem articular melhor seu trabalho junto a seus alunos. Abaixo, seguem fragmentos das monografias em que as alunas professoras fazem referências sobre a necessidade de busca por um aprofundamento dos conhecimentos docentes. Percebi a necessidade que tinha de continuar minha formação, retomar meus estudos sistemáticos, vivenciar momentos de troca, e comecei a buscar por um curso que desse conta desses anseios.Foi quando me deparei, na página eletrônica da Faculdade de Educação da UFRJ, com o Curso de Especialização do CESPEB – Alfabetização, Leitura e Escrita, que vinha ao encontro do que eu procurava.(Sofia - Turma A) Acredito no que faço e por isso continuo fazendo e estudando. (...)E é acreditando nessa continuidade de aprendizagem que, após alguns cursos de pós-graduação, aqui estou eu, por influencia da X, que também está fazendo este mesmo curso comigo, e de algumas amigas, que infelizmente não conseguiram estar aqui presentes, mas também dividem e trocam experiências comigo, sempre me incentivando a desempenhar esta tarefa tão difícil que é alfabetizar.(Amanda – Turma A) 80 Venho trabalhando como professora regente da Rede do Rio de Janeiro desde o ano de 2002. Neste período pude presenciar muitas mudanças nas práticas de trabalho adotadas em sala de aula, assim como as correntes teóricas que embasam estas práticas. Sendo assim, procurei adotar uma postura receptiva a estas mudanças, mantendo-me disposta a aprender, sempre. Daí a necessidade de buscar estudos mais aprofundados, seja em curso de atualização e capacitação oferecidas pela Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro e finalmente este curso de Pós-Graduação que vem me permitindo (re)pensar a minha atuação profissional e a minha prática docente.(Claudia – Turma A) A intenção de me inscrever para o Curso Saberes e Práticas na Educação Básica com enfoque em alfabetização, leitura e escrita, advém, em primeiro lugar, da constante necessidade de atualização, e também da eterna busca de formas de ajudar os alunos no processo de ensino-aprendizagem. Acredito assim, trocar experiências com meus colegas de turma, enriquecer minha prática e aplicar o que aprendi na teoria em minhas aulas. (...) Todo o conhecimento adquirido ao longo do curso será aproveitado de alguma forma e terá seu calor na minha vida acadêmica, pois não pretendo parar por aqui. Sempre almejei o mestrado e com certeza os ensinamentos do CESPEB serão de grande aproveitamento para alcançar este objetivo. Termino o curso com a sensação de dever cumprido, pois doei-me de corpo e alma para aulas, os trabalhos, os debates. (Júlia - Turma B) Meus estudos de pós-graduação levaram-me a compreender a necessidade de mudança na prática pedagógica que contribuam para o desenvolvimento do processo de leitura e escrita como meio de inserção social e cultural. Embasando a prática pedagógica, houve a importante a contribuição dos estudos e teorias construtivista e sociointeracionista que revelaram aspectos como ocorrer a compreensão da leitura e escrita sob a lógica infantil e quais fatores favorecem a sua aquisição. (...)Realizar o presente trabalho foi excelente exercício de reflexão, em que pude perceber que os resultados alcançados são as respostas para meus questionamentos. (Karina – Turma B) Retorno à sala de aula para estudar, depois de cinco anos para poder me apropriar das ideia dos autores de uma forma não fragmentada e crítica, discutindo alcances e limites de suas posições, entendendo melhor a conveniência e os riscos de adotá-los. Busco o enriquecimento através da compreensão e do confronto entre teoria e prática educacionais. Não adianta o estudo teórico sem a conseqüente discussão sobre sua relação com a prática, e de nada adianta a discussão sobre a prática sem a conseqüente discussão sobre seus fundamentos e suas bases teóricas. Meu objetivo é conseguir, através do aprendizado adquirido durante meus estudos, elaborar e apoiar meu projeto pedagógico articulando teoriaprática. (Célia – Turma B) 81 Na metodologia desenvolvida nas monografias, foi possível perceber como as alunas-professoras trouxeram a cena de sala de aula, ao falarem de suas práticas. Nota-se a necessidade de falar do que fazem, como fazem e para quem fazem. Diferentemente das metodologias que vemos nas pesquisas, que descrevem como as mesmas foram feitas, quais os procedimentos foram utilizados, as etapas para se alcançar os objetivos, as entradas metodológicas que pudemos identificar nas monografias do CESPEB,buscam trazer o que elas produziram em sua prática, reelaborados a partir dos estudos teóricos feitos ede seus investimentos na produção de práticas em que acreditam. Abaixo seguem fragmentos que trazem à luz esse contexto. Sendo assim, indo na contramão, eu procurava incluir no planejamento: idas semanais à sala de leitura, mesmo que sem a presença do professor específico, momentos diários para a contação de histórias, manutenção de alguns títulos no acervo da sala para que as crianças pudessem manusear e procurava sempre renová-lo, formando um espaço de livros dentro da sala de aula.” (...)Após lermos e relermos, a pedido da turma, a história “Chapeuzinho Amarelo”, oralmente as próprias crianças foram traçando as aproximações com o conto tradicional e, a partir do que foi surgindo em seus relatos, sugeri que fossem recontando “Chapeuzinho Vermelho” tal qual se recordavam. Esta proposta “deu pano para manga11” e enquanto uma criança contava de uma maneira as outras iam interferindo, primeiro de foram desordenada, mas com a minha interferência, foram se dando de maneira mais organizada. Com isso, fomos percebendo diferentes versões para uma mesma história. Elaboramos então, uma tabela com as diferenças e semelhanças entre elas. (Sofia – Turma A) Trago para esta reflexão textos de algumas crianças de mesma idade e “segmentação escolar”, porém com professoras com perfil bem diferentes, tanto no que diz respeito as suas características pessoais quanto nas suas concepções de alfabetização e letramento. (...) Os textos de X e Y12, apesar de apresentarem mais erros ortográficos, demonstram o quanto lhes é prazeroso escrever, pois ambos refletem em seus textos suas experiências vividas dentro e fora da escola, deixando amostra suas particulares. (Amanda – Turma A) 11 Grifo da aluna professora Os nomes das crianças foram omitidos por questão de preservar suas identidades, sendo alterados pelas variáveis X e Y. 12 82 Cheguei à conclusão de que minha turma gostava muito de todo tipo de música, e assim, comecei a explorar este interesse de forma lúdica e criativa, tentando mostrar ao grupo diversos tipos musicais, semelhantes ou diferentes daquelas que eles estavam acostumados a ouvir em casa, na igreja, etc. (...)Continuei minha tentativa de implementar um projeto de trabalho que partiria dos interesses e necessidades dos próprios alunos. Apresentei diferentes tipos de músicas, trabalhos com diversos ritmos, brinquedos cantados e lembrando sempre que a música está presente em diversas situações da vida humana, merecendo lugar de destaque em nosso projeto. (Claudia – Turma A) Em busca dessa nova perspectiva de leitura elaborei um novo planejamento visando não apenas a alfabetização – no seu sentido restrito, mas também o letramento tendo como um dos recursos a literatura infantil.” (..)Minha intenção foi oferecer outras possibilidades para a aquisição da leitura e da escrita, fazer com que o aluno esteja motivado a melhorar seu desempenho, aproximar os alunos de livros e autores da literatura infantil, a apreciação pelo texto literário e consequentemente o avanço no conhecimento da linguagem. O livro escolhido foi Guilherme Augusto Araújo Fernandes, de Mem Fox. O tempo previsto para esse projeto seria de cinco aulas. Mas acabou durando mais algumas aulas. (Célia - Turma B) A ampliação do vocabulário ocorria no momento da brincadeira de “adedanha”. Nesta brincadeira os participantes deveriam escrever um nome para cada referencial de categoria. A brincadeira da “adedanha” favoreceu a momentos de interações verbais e de reflexão coletiva considerando a identificação da relação fonema e grafema, a identificação das sílabas ouvidas e lidas, o seu posicionamento nas palavras (vc, consoante vogal, cvc, consoantevogal – consoante e ccv, consoante-consoante – vogal) e assim ajudaram-nas as perceber as diversas estruturas silábicas.As atividades começavam com a brincadeira ou dramatização do texto escolhido, as tentativas individuais de escrita, a escrita e a leitura coletiva, completar lacunas com palavras contidas no texto ou ordenar as frases da música. (Karina – Turma B) Escolhi o caderno como um dos instrumentos de pesquisa por considerá-lo um documento contendo tudo o que foi desenvolvido pelo aluno durante aquele ano. É um meio de registrar as atividades e os avanços principalmente em relação à escrita. É um objeto do qual posso acompanhar todo o processo de construção e evolução da escrita, além de ser um objeto concreto que está facilmente ao alcance das mãos. (...)O trabalho era sobre as eleições presidenciais do 2º turno de 2010. Os alunos anotaram a campanha de cada um dos candidatos para debatermos as propostas em aula. Ao final do debate montamos um cartaz com as promessas dos dois candidatos e colocamos na exposição da escola sobre eleições. A aluna escreveu o seguinte: “Tudo sobre a Dilma e Serra vão fazer para o Brasil quem vai ganhar para presidente Dilma ou Serra crexi e 83 escolas muntas obras creches escolas casas e muntomas. (Júlia – Turma B) Segundo Minayo (2007), a metodologia requer dedicação e cuidado do pesquisador. Para cada objetivo descrito, apresentam-se métodos e técnicas correspondentes e adequados,procedimentos voltados para a produção de dados e explicações. As professoras autoras, ao elaborarem a metodologia para tratar sobre o seu fazer pedagógico, tentam se aproximar de um modelo pré-determinado pela academia de uma “metodologia científica de pesquisa”. No entanto, fica marcada uma metodologia do fazer pedagógico que condiz com o que lhes é tão comum, a prática diária e a relação com o processo de ensino e aprendizagem. O que as constitui como professoras, a forma que sabem falar do que fazem, mescla-se à sua intenção de enquadramento de pesquisa com traços universitários. Pensando que elas estão inseridas em um contexto que embora acadêmico lhes incentivou durante todo o processo de formação a tomarem a sua palavra docente, deu-lhes espaço para que refletissem sobre o seu fazer, fica evidente o quanto se tornou relevante dar visibilidade ao que elas foram capazes de organizar enquanto conhecimento. Elas se apropriam da forma de escrever preconizada da academia, aprendem a proferir um discurso aceito, porque querem ser aceitas/aprovadas nesse campo. Mas é preciso se pensar também que este formato é o que lhes vem como possibilidade de enquadramento de sua vontade de dizer, para falar de sua realidade escolar, por outro lado, também,porque fica evidente o quanto o espaço escolar não lhes abre espaço para falar dessa prática de forma organizada, contextualizada e articulada com uma fundamentação teórica, o que faz com que se reforce cada vez mais que o lugar do professor pesquisador é na universidade, um espaço ondese dá legitimação a formas de organização discursiva que possam tratar de práticas pedagógicas. Como última marca acadêmica elencada para essa seção do trabalho, abordo as considerações finais escritas pelas alunas professoras. As mesmas trazem em si conclusões, tentam responder a seus próprios questionamentos, colocam perspectivas futuras, deixando o caminho aberto para novas pesquisas. Percebo como é importante para elas falarem sobre onde elas chegam, percebendo que é possível escrever sobre o que fazem. Podemos verificar isso nos trechos abaixo. 84 Estabelecemos como grande desafio deste trabalho provocar discussões entre os leitores sobre os possíveis caminhos que se constroem como uma prática pedagógica efetiva, quando trabalhamos com os alunos das classes populares inseridos em escolas onde práticas educacionais excludentes e preconceituosas permeiam o trabalho e o fazer de muitos professores.” Alcançou-se, portanto, o fim deste estudo com o seguinte resultado: é possível respeitar o território de cada campo do saber, trabalhar as especificidades do processo de aquisição da escrita e da leitura através da coletividade, conexões recíprocas, selecionando como eixo unificador, uma proposta que valorize o sujeito, estruturando ações pertinentes a processo de letramento. (Sonia – Turma A) Muitos obstáculos foram encontrado pelo grupo, mas ao final nosrestou a certeza de que estávamos no caminho certo, dando real importância ao desenvolvimento da linguagem na educação infantil, visto que, essa modalidade é peça fundamental para a sistematização da alfabetização. (Claudia – Turma A) Acredito que nossos alunos sejam capazes de descobrir novos sabores na cozinha da vida. E é como quem aprende a cozinhar, seguindo passa a passo uma receita e aos poucos dando seu toque pessoal, que hoje acredito que eles um dia chegarão a “Chefs de cozinha”.13 Lendo e interagindo com as diversas formas de linguagens, produzindo textos onde suas razões e vivências fiquem explicitas e quem sabe lutando para modificar ou melhorar a realidade em que estão inseridos. Eu acredito nisso e estou tentando e fazendo por onde, e você? (Amanda – Turma A) Trabalhando com unidades temáticas os alunos desenvolveram escrita a partir de assuntos trazidos por eles. Além de utilizar assuntos atuais como meio ambiente, eleições, Copa do Mundo propostos pela unidade escolar, a possibilidade de deixar-los escolherem favoreceu a aprendizagem, pois os assuntos eram do interesse deles. (...) Este trabalho continuará em andamento com outros alunos em outras turmas, iniciando no primeiro ano de escolaridade quando os alunos ingressarem na escola, acompanhando todo o processo de aquisição da língua escrita no segundo ano de escolaridade. (Júlia – Turma B) Realizar o presente trabalho foi excelente exercício de reflexão, em que pude perceber que os resultados alcançados são as respostas para meus questionamentos.(...)O caminho em busca do equilíbrio é complexo e é para o professor que se coloca no lugar de aprendiz e tem a ousadia de experimentar, questionar, analisar e reestruturar sua prática.” (Karina - Turma B) 13 Nesse ponto, a aluna professora coloca uma nota de roda pé, explicando que usa a mesma técnica utilizada por Rubens Alves, em seu artigo. Utilizando a figura de linguagem metonímia, para comparar seus alunos ao grau de instrução que deseja que eles alcancem. 85 Após este estudo, percebo que algumas práticas literárias estão sendo modificadas em minha prática e que a leitura nos dias de hoje, deve tomar um rumo diferente, não se restringindo ao mínino de aspectos mecânicos, de fluência e boa dicção, que mesmo sendo necessários, não são suficientes.Assim cabe a nós professores preocupados com as prática docente, buscarmos caminhos para melhorarmos a nossa prática de ensino, levando os alunos a receberem condições adequadas para se tornarem leitores críticos e conscientes. (Célia – Turma B) Essas marcas acadêmicas costuramdialogicamente a escrita das alunas professoras. Tomo aqui o dialogismo como a “costura” que produz novas dialéticas. Penso a dialética a partir de Bakhtin, segundo o qual o eu necessita estética e eticamente do Outro, sendo que a interação é variável de acordo com a situação (GEGe 2009, p. 28). A estética é uma das principais concepções bakhtinianas em diálogo com a ética, a estética surge como acabamento do agir do sujeito, um ato estético é a valorização, a reflexão elaborada, portanto, com acabamento acerca da ação ética. A ética refere-se ao processo, ao agir no mundo. A ética bakhtiniana corresponde ao espaço de decisões, é um conjunto de obrigações e deveres concretos, corresponde ao ato de viver uma vida singular, de arriscar, de ousar, de comprometer-se, de assinar responsavelmente seu ponto de vista e responsividade imediata do sujeito. (GEGe 20909) Pensando a dialogia como uma forma vivencial através da autoconsciência e sua relação com as várias consciências que a foram, vejo a escrita das alunas professoras como o espaço para que elas se coloquem como professoras/autoras/personagens, pois elas, melhor do que ninguém, podem escrever sobre si, de forma que essa escrita gere um processo de auto reflexão. Nesse sentido, escrever uma monografia, não só evidencia a necessidade de se produzir um conhecimento, mas também a oportunidade para que elas escrevam sobre sua prática de forma ética, isto é, com responsabilidade e em resposta a todos os momentos que constituem suas vidas. O único que pode vivenciar essa experiência é o próprio professor, ninguém pode viver essa experiência que é dele, da mesma forma que ele não pode viver a vida e a experiência de outro. O professor tornar-se criador ratifica os vivenciamentos criadores ativos de Bakhtin (2009, p. 5), “nestes vivencia-se o trabalho criador, mas o vivenciamento não escuta nem vê a si mesmo, escuta e vê tão somente o produto que está sendo 86 criado ou o objeto a que ela visa”, percebo então que o fazer pedagógico é dar visibilidade a imaginação ampliando experiências para atividades criativas. BENJAMIN (2002) diz que existem pedagogos sisudos e cruéis que nos empurram para a “escravidão da vida” que imputam uma desvalorização da própria vida com a arrogância da desesperança utilizando-se de um discurso baseado em experiência sobre a própria vida. No entanto “a experiência é carente de sentido e espírito apenas para aquele já desprovido de espírito” (p. 23). Para ele cada uma de nossas experiências possui conteúdos. São esses conteúdos que nos constituem, que trazem em si um espírito de coragem, ousadia, criatividade. Ela nos leva a ver o erro como uma possibilidade de acerto, como a busca da verdade. A partir da leitura das monografias, analiso que o espaço acadêmico é também (ou deveria ser na maioria dos casos) esse caminho criativo, no qual vivenciamos o processo de desenvolver através de enunciados as ideias, desejos, reflexões, sentimentos e visões de mundo. Mesmo que aparentemente o gênero monografia não seja o mais adequado para se escrever sobre a prática docente, ele possibilitou um espaço em que as professoras pesquisadoras se colocassem. Através de todos esses enunciados lidos e extraídos das escritas das alunas professoras, foi possível perceber o cuidado em comunicar ao outro, um leitor presumido, aquilo que elas vivenciaram, ao mesmo tempo em que “conversavam consigo mesmas’. Ao escrever, elas também traziam para sua reflexão o que estavam dizendo ao outro, formando uma consciência de si a partir do que esperavam ser entendido por esse outro e por aquilo que elas mesmas entendiam de si em suas práticas e de suas práticas nelas. 5.2 Reverberação apontando as interações entre as professoras formadoras e as alunas professoras A segunda categoria de minha análise propõe-se a perceber quais as reverberações evidenciadas nas monografias. Veremos se foi possível perceber a influência das professoras formadoras no discurso das alunas professoras e se na prática das alunas professoras com seus alunos também é possível perceber traços desse aprendizado. Para tanto, selecionei trechos que evidenciem essas reverberações. 87 Longe de propor um retorno das atividades de prontidão, marcávamos a necessidade de proporcionarmos experiências de letramento, ampliando as práticas sociais de leitura e escrita no caminho do que Soares (2004) vem discutindo, e um dos recursos possíveis era a utilização do s livros de literatura, que trazem consigo múltiplos gêneros discursivos e a visão da linguagem como atividade social, histórica, cognitiva, dando a visão de literatura como arte, produto cultural que circula na sociedade, tal qual propunha Benjamim(1994, p. 205) ao afirmar que contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo, e ela se perde quando as histórias não são mais conservadas. Ela se perde porque ninguém mais fia ou tece enquanto ouve a história.Bakhtin, Vygotsky e, especialmente, Benjamin trouxeram suas contribuições desde o princípio, através do livro Por Entre as Pedras: Arma e Sonho na Escola de Kramer(2007), que norteou nossos estudos nesta especialização, e também ajudou a ressignificar meu cotidiano de educadora com as crianças em processo de alfabetização. (Sofia – Turma A) Numa reflexão acerca dos movimentos de apropriação da língua escrita no interior de uma referida sala de aula pelo aluno X14, iremos focalizar a relação que o aluno estabelece com a linguagem escrita. A relação estabelecida entre ele e seu texto, revela significados e sentidos da prática docente, tendo contribuído para que esse tecido fosse produzido.Ao pensarmos no entrelaçamento de ideias presentes no texto do aluno e na ação de nós enquanto professoras, estamos tecendo fios que produzem informações diferenciadas que nos possibilitam compreender a sala de aula como lócus onde o aprender e o ensinar são ações diárias. Ao começar a juntar os fios, a alinhavar, buscamos formas de compreender o papel da linguagem na relação entre o aluno e as professoras e suas formas de concebêlas no interior da sala de aula. Como forma de organizar os pontos que serão discutidos,dialogamos com Bakhtin, Benjamin e Vygotsky. (...)(Sonia – Turma A) Em sua obra, Benjamin traz uma importante contribuição para se pensar a infância, dando voz a um menino. E fala de um momento histórico de uma sociedade, de uma forma de ver o mundo com os olhos de uma crianças. Benjamin apresenta reflexões sobre infância e linguagem, o encontro da infância do homem que se constitui como sujeito da linguagem. (...)Muitas foram as discussões, embasadas em diferentes teóricos da educação, tais como Emília Ferreiro, Vygotsky, Paulo Freire, Magda Soares, etc. (...) Após longas discussões, chegamos a conclusão de que primeiramente deveríamos repensar a questão da linguagem, em dar voz a criança, saber aproveitar toda a leitura de mundo, a cultura e todo aparato linguístico que essa criança traz para a escola. (...) Tentamos então, além de melhorar o nosso trabalho em sala de aula, dar um enfoque 14 Na monografia a aluna professora cita o nome da criança que aqui preferi substituir pela variável X para preservar a identidade da criança. 88 maior à nossa sala de leitura, que até então, assumia papel coadjuvante na escola. (Claudia – Turma A) Com os estudos que tenho feito, percebi que a leitura não se resume a mera decodificação, mas dever ser compreensão daquilo que é lido, deve ter sentido para quem lê/ouve naquele momento, e não apenas futuramente. Estou aplicando os conhecimentos adquiridos durante a especialização em sala de aula com os meus alunos, vou aos poucos ressignificando o que já sabia e que utilizava por desconhecimento, de forma instintiva. Confesso que, anteriormente minha preocupação maior era fazer com que meus alunos se apropriassem do código escrito, e mais tarde o gosto pela leitura/literatura viriam naturalmente, hoje entendo que este é um trabalho que precisa ser planejado, tendo como intencionalidade o ‘ensino’ desta aproximação com a literatura.Aprendi que alfabetizar/letrar por meio das histórias pode ser um caminho possível e significativo para crianças e professores envolvidos no processo de aprender/ensinar.” (Célia – Turma B) No microcosmo da sala de aula, os autores estudados e a minha prática pedagógica têm confirmado nas minhas observações a importância da valorização da criança como alguém que observa, sente, pensa, aprende e se desenvolve enquanto interage com seu entorno em meio a contextos significativos e que, mesmo estando no espaço coletivo da sala de aula, ela é única e possui uma compreensão particular das informações recebidas, (...)O caminho em busca do equilíbrio é complexo e é para o professor que se coloca no lugar de aprendiz e tem a ousadia de experimentar, questionar, analisar e reestruturar sua prática. (Karina – Turma B) Desde o primeiro dia de aula, fui tocada pelo desafio de conquistar a confiança dos alunos para assim, poder restaurar o prazer pela busca do conhecimento, estreitar os laços de convivência e despertar o gosto pela leitura e escrita. Este desafio me levou a refletir sobre a realidade em que vivemos, a infância e as práticas que a escola adota, muitas vezes, distantes dos interesses e anseios da criança. Muitas questões surgiram: O que ensinar? Como ensinar? Qual a função da escola hoje? E muitas outras, sem resposta. Segundo Corsino, “sua função hoje não deveria se pautar na transmissão do conhecimento, pois as máquinas fazem melhor, mas sim na possibilidade de socialização, de discussão e digestão das informações, no resgate da historicidade, na troca, na interlocução [...] (2009, p. 239). Pensando nas palavras da autora e nos estudos que desenvolvi sobre Benjamin e Bakhtin, rompi os muros culturalmente construídos, e me juntei às crianças, fazendo da prática da “narrativa” nosso elo, nossa possibilidade de trocas de olhares em relação ao mundo, nossa redescoberta de ensinar e aprender. (Lilian – Turma B) Observei nos fragmentos extraídos das monografias, assim como na leitura dos demais que também apresentam traços semelhantes, que as alunas professoras 89 procuraram expressar os conhecimentos adquiridos no curso em si e através da convivência com as professoras formadoras e as colegas de turma. Os enunciados trouxeram evidências de atividades que elas planejaram para realizar com seus alunos em seus respectivos ambientes de sala de aula, baseadas nas experiências que vivenciaram no curso. Foi possível perceber nas escritas que as alunas professoras fazem menção a autores, tais como Bakhtin, Vygotsky e Benjamin, que estão na referência bibliográfica do curso e que perpassam, principalmente, as disciplinas voltadas para a linguagem. Usam como citações diretas ou indiretas ou tecendo comentários baseados em seus apontamentos. Também foi possível identificar que surgem temas em suas escritas que estão elencados nas ementas do curso, já mencionados no capítulo que aborda o curso. Isso leva-me a perceber como houve o movimento de passagem do lugar de aluna-professora que adquire um conhecimento e procura adequá-lo à sua realidade para o lugar da professora que junto com o aluno constrói, reconstrói e ressignifica esses saberes em outros saberes. Esse movimento exotópico delas se permitirem um estranhamento de suas práticas e se deslocarem dos lugares de professoras para os de alunas e perceberem a prática docente a partir dessa visão, as coloca em similaridade de situação com seus alunos. Dessa forma, ao retornarem aos seus lugares de professoras, têm recursos internos e intelectuais para buscar a transformação dessa prática disponibilizando subsídios à seus alunos para que os mesmos também o façam. Em algumas colocações delas em relação aos seus alunos, percebe-se o movimento de instigação a eles (alunos) para que pensem e criem. Elas estão propiciando, assim como as professoras formadoras, um espaço para que seus alunos também se permitam a esse estranhamento a fim de também transformar e ressignificar o conhecimento, Partindo da analogia com o princípio da reverberação, proposta nessa pesquisa, percebemos que a intencionalidade com que elas procuraram planejar as atividades para seus alunos reflete, como em uma reação em cadeia, muito do que foi tratado na especialização pelas vozes das formadoras. Essas vozes reverberaram então através das alunas professoras alcançando os alunos que por elas são alfabetizados, gerando outras vozes que dão origem a novas questões 90 tanto para os alunos das séries iniciais e para as alunas professoras quanto para as professoras formadoras. Analisar as interações estabelecidas no CESPEB Alfa a partir da perspectivas da reverberação possibilita-nos entender que quando tratamos de formação de professores não é válido aceitar a ideia de que o professor devolve qualquer coisa, uma miscelânea de conceitos, atividades e jargões educacionais. Foi possível identificar até aqui, a partir da primeira categoria em conjunto com a segunda, que o professor é capaz, sim, de trazer conhecimentos adquiridos na formação acadêmica, mesmo em um gênero acadêmico, aquilo que ele apreende e transforma em um conhecimento prático e que esse é compartilhado com seus alunos. Ao trazerem referenciais teóricos para pensarem junto com eles sobre suas práticas e o quanto isso é significativo para elas enquanto professoras e para iluminar o trabalho junto as crianças, entendo que isso significa dizer que a voz das formadoras e da universidade também está chegando ao espaço escolar.Esses conceitos teóricos e suas referências bibliográficas não são adquiridos em uma conversa de bar, em um show, na igreja ou em algum outro espaço diferente da universidade. Eles foram planejados pelas formadoras, que de alguma forma pensaram o que seria mais adequado ser discutido de forma a tornar mais significativa a prática das alunas professoras. As alunas professoras compreendem o valor desse conhecimento quando se referem as mudanças ocorridas por conta das reflexões e da influencia desses autores. Cada vez mais aposto nesse conceito como uma possibilidade de perceber as interações estabelecidas. Quando realizei a pesquisa para minha monografia de graduação,também observei as interações estabelecidas entre as formadoras e as alunas professoras. Nela foi possível identificar a retomada que elas fizeram dos conteúdos abordados no curso de extensão e como os mesmos puderam contribuir para o desenvolvimento de suas práticas, as alunas professoras puderam perceber a importância de um planejamento bem elaborado, que leva em consideração uma reflexão sobre um fazer e a flexibilidade necessária à sua execução, tem para a formação de seus alunos assim como também a escolha de um livro para a leitura literária e a sua compreensão dos letramentos tem para a formação de tantas outras interfaces que permeiam a relação de dentro da sala de aula como componentes fundamentais para o processo de aprendizagem da criança. 91 Assim como no curso de extensão, o CESPEB também contribuiu para que as alunas professoras pudessem, a partir de todo o arcabouço teórico, refletir sobre sua prática. Isso fica evidenciado nos fragmentos trazidos, que demonstram a relevância das discussões dos autores adotados pelas formadoras, a importância da valorização da criança, da leitura e da escrita, do letrar e do alfabetizar. Algumas vezes não nos damos conta do quanto o discurso acadêmico perpassa a prática docente e de que na realidade, teoria e prática sempre caminham juntos. Identifico com isso que o professor não tem a oportunidade para escrever sobre essa prática articulada à teoria, esses momentos acontecem quando ele se dispõe a investir em uma formação que exige dele a escrita, como nesse caso, de uma monografia. O professor comprometido consigo mesmo busca novas possibilidades, ele tem um outro olhar sobre seu processo de aprendizado. Propõe desafios, novas possibilidades, abre espaço para conquistas grandiosas, mostra novos horizontes, liberta pensamentos em seus alunos e nesse processo também liberta seus pensamentos, reflete, expõe. O inacabamento nos remete à ideia de incompletude pois sentidos sempre estão sendo dados sobre nós por outros. Nesse sentido do inacabamento, está o movimento do professor em busca de novas formas, a partir também da teoria, de fazer o que ele já sabe fazer, produzindo outros sentidos. Mas para ele perceber o que ele já sabe, faz-se necessário que ele se desloque de seu lugar de professor, olhe para essa prática e retorne a ela transformado por esse olhar, e nesse aspecto, tem-se a importância das formadoras. São elas que também libertam pensamentos, orientam as reflexões, expõem novas possibilidades. 5.3 A voz do aluno no percurso profissional como apoio para as práticas pedagógicas. Nessa terceira e última categoria de análise, me proponho a olhar para as monografias das alunas professoras e entender como o olhar sobre a criança tem influência em seu discurso escrito sobre a sua prática. O cotidiano escolar traz em si muitas vezes para o professor um espaço de não reflexão sobre o que o mesmo faz, pois ele se acomoda em um lugar, a escola, que não lhe abre espaço para escrever sobre o seu próprio fazer. Os professores 92 estão cada vez mais presos à rotinas de produção do que a um espaço que lhes propicie uma liberdade de reflexão e criação. Muitos já se acostumaram a fazer de uma tal forma que nem se dão conta que podem fazer diferente. No entanto, fazer diferente implica um comprometimento consigo mesmo no sentido de não querer somente reproduzir. É ir contra um sistema que lhe impões formas de avaliação, resultados, conteúdos, rotinas, etc. Bondía (2002, p. 25) diz que : do ponto de vista da experiência o importante não é nem a posição (nossa maneira de pormos), nem a “o-posição” (nossa maneira de opormos), nem a “im-posição” (nossa maneira de impormos), nem a “pro-posição” (nossa maneira de propormos), mas a “ex-posição”, nossa maneira de “ex-pormos”, com tudo o que isso tem de vulnerabilidade e de risco. Ao escrever, tem-se a possibilidade de tematizar o fazer pedagógico. Escrever sobre a prática possibilita refletir sobre o que se fez, o que se faz e o que se pretende fazer. Ao escrever, o professor traz um discurso de seu próprio processo de criação – a prática. Relaciona permanentemente as experiências do passado e do presente para constituir um futuro. Uma boa bússola para esse caminho criativo é pensar a relação estética e ética e como essas se inserem no trabalho com crianças pequenas. A estética (GEGe, 2009) é uma das principais concepções bakhtinianas em diálogo com a ética, a estética surge como acabamento do agir do sujeito, um ato estético é a valorização, a reflexão elaborada, portanto, com acabamento acerca da ação ética. A ética (GEGe, 2009) refere-se ao processo, ao agir no mundo. A ética bakhtiniana corresponde ao espaço de decisões, é um conjunto de obrigações e deveres concretos, corresponde ao ato de viver uma vida singular, de arriscar, de ousar, de comprometer-se, de assinar responsavelmente seu ponto de vista e responsividade imediata do sujeito. Ao pensar, apoiada em Bakhtin, sobre a produção das crianças, a partir de um conceito estético faz-se necessário a ética para olhar e dar visibilidade a essas produções. Se a ética bakhtiniana é um espaço de decisões responsáveis e responsivas, o professor comprometido com essa perspectiva tem como possibilidades fazer de suas ações momentos de reflexão tanto para ele quanto para as crianças. Ética no sentido de compromisso com a produção da criança e com o 93 próprio fazer docente. Não se trata simplesmente de aplicar técnicas eficazes que levem as crianças a produzir satisfatoriamente, mas sim um trabalho de produção de sentidos para ambos. Trago trechos das monografias das alunas professoras nos quais estão evidenciados a relação com o conhecimento da criança e como esses mobilizam as alunas professoras em seu cotidiano. Começamos a ser mais criteriosos com a escolha dos livros a serem lidos para os nossos alunos, pois se queremos formar leitores críticos, que repensem o mundo no qual vivemos, precisamos escolher histórias que abram espaço pra o imaginário, para a troca, para o contato com a diversidade do mundo e não histórias que já trazem uma mensagem fechada. Começamos dar maior importância ao momento da contação, quando ocorre o encontro entre o contador, a história e o ouvinte, momento este que já representa muito para a criança. Passamos a nos preocupar menos com as atividades que uma história pode suscitar, porém aprendemos a aproveitar o texto da história, saborear as palavras e assim, fazer com que os ouvintes mergulhem naquele imaginário, reconte, dramatize, mergulhe num universo desconhecido e saia dele com novas experiências.” (...)No ano de 2007, conseguimos deslanchar em nossos projetos. Finalizamos o Projeto Político e demos início ao que seria o maior desafio para nós educadoras: esquecer a listagem de conteúdos bimestrais, as datas comemorativas e construir nossos próprios projetos de trabalho embasados nos temas geradores e visando o centro de interesse de cada turma, bem como as particularidades de cada indivíduo, levando-se em consideração o contexto sócio-histórico onde estes estão inseridos. (Claudia – Turma A) A história foi escrita a vinte e seis mãos, vinte e quatro das crianças, e uma da professora da sala de leitura e mais a minha. Mas, escrevendo assim pode parecer que foi muito fácil, as ideias iam brotando, os estudantes falando, nenhum conflito, nada a ser negociado... Pois é, foi preciso sim, garantir a fala de cada um, para que todos tomassem parte do todo, o que nem sempre é simples, em se tratando de crianças. (...)Precisamos também negociar, pois volta e meia surgiam sugestões que se sobrepunham e era preciso decidir de uma maneira democrática que se encaixaria melhor no projeto coletivo, imprimindo sentido e autenticidade e, nessas horas, havia a defesa das opiniões seguida de votação. (...)A história foi dividida em tantas partes quantos eram os estudantes, que ilustraram cuidadosamente o trecho que escolheram. Em seguida essas ilustrações foram recortadas e montadas nas respectivas páginas e estas ganharam foram de um livro, com capa de papel cartonado e ilustração de abertura(...)Depois, as crianças sugeriram que transformássemos o livro em peça teatral: escolheram quais personagens queriam dramatizar, confeccionaram juntamente com 94 os pais o figurino, fizeram o cenário e ensaiamos bastante. (Sofia – Turma A) A cabeça de uma criança que aprende (em particular, a ler e a escrever) é como um grande caldeirão em que borbulham muitas ideia. (...) É no espaço da sala de aula que a criança diz a sua palavra e nós temos que garantir esse direito. Quando nos distanciamos deste procedimento alimentamos o saber da experiência alheia, aquela que não nos passa, mas nos repassa o que devemos fazer.(...)Neste caminho, um projeto para o trabalho foi sendo delineado discutido, compartilhado com os alunos e com os demais profissionais da escola. Esse saber construído na experiência foi determinante para o sucesso do trabalho que decorremos ao longo dessa construção.(Sonia – Turma A) Percebo em minha prática que meus alunos não estão presos a literatura “infantil”. Eles são seres humanos sedentos de novidades, são curiosos, instigadores, precisam de diferentes tipos de textos – infantis ou não, que despertem de verdade o seu desejo, textos significativos. Quando apresento uma leitura e eles não demostram entusiasmo, mudo para outra, sei que não adiantará insistir, pois nossos alunos, hoje são críticos, buscam qualidade, por isso, tenho que estar preparada para ‘sacar’ e permitir que façam suas leituras. (Célia – Turma B) Em uma aula em setembro, exploramos o livro Bicho que te quero livre de Elias José e Ana Raquel, depois conversamos sobre o livro, pois ele tratava sobre poesias de animais. Em meio ao debate e as várias interpretações sobre o livro apresentada pelos alunos, um discente comentou de forma espontânea que se fosse um bicho gostaria de ser um cachorro. Percebi que havia uma grande motivação em torno da temática apresentada pelo livro. Como forma de desdobramento, fizemos uma lista coletiva sobre que animais gostaríamos de ser e depois registramos individualmente em uma atividade do caderno. Era mais uma atividade em que a oralidade acompanhava a necessidade de escrita e vice-versa. (Suzana – Turma B) As “falas” e escritas das crianças revelam, apesar da pouca idade, sabedoria e força na busca de soluções para os problemas da vida, (...) Assim, este jeito de propor soluções simples para os problemas, me trouxe a ideia de criar um espaço de discussão semanal, a partir das notícias do cotidiano e assim começamos uma nova etapa. Todas as crianças eram muito ligadas em televisão e sabiam tudo que acontecia na cidade. Aproveitei o fato, criei a “hora da notícia”. Um momento semanal em que um grupo de crianças, apresentava cada uma, uma notícia interessante, dramatizando um telejornal, que chamamos de TV CRIATIVA. (...)Tal atividade ampliou muito os conhecimentos das crianças em relação a diversos assuntos,(...) contribuindo para que as crianças compreendessem e relacionasse os problemas com o nosso passado (...). (Lilian – Turma B) 95 Foi possível observar nas monografias que as alunas professoras tiveram o cuidado em trazer as crianças como sujeitos centrais de suas práticas, que ao longo do processo foram se constituindo como sujeitos do conhecimento. A forma como as alunas professoras se relacionam com os texto das crianças expressa um modo de se relacionar com a própria criança, o seu jeito de ser e agir no mundo. LEAL(2008) afirma que “Pensar o ensino de produção de texto requer pensar, em primeiro lugar, que um texto produzido por um aprendiz manifesta-se como o produto de um sujeito que, a seu modo, através das diversas possibilidades e formas de linguagem, busca estabelecer um determinado tipo de relação com o seu interlocutor.”(p. 54). As alunas professoras trazem, a partir do que percebem nas/das crianças, como é possível planejar suas ações incluindo as próprias crianças nesse processo. Segundo Bakhtin (2009), é nossa relação que define o objeto e sua estrutura e não o contrário; só onde a relação se torna aleatória de nossa parte, meio caprichosa, e nos afastamos da nossa relação de princípio com as coisas e com o mundo, a determinidade do objeto resiste a nós como algo estranho e independente e começa a desagregar-se, e nós mesmos ficamos sujeitos ao domínio do aleatório, perdemos a nós mesmos e perdemos também a determinidade estável do mundo.(BAKHTIN, 2009, p. 4) Baseada nessa perspectiva, percebo que as alunas-professoras saem do lugar historicamente construído da professora somente como mera transmissora de informações, e se colocam como pesquisadoras que questionam quais são as intenções de suas intervenções em relação as produções das crianças. Quando a professora Lilian diz que aproveitouum fato para criar uma proposta de atividade junto a seus alunos, traz a evidência da importância que atribui a participação das crianças no processo de ensino aprendizagem. Nos fragmentos destacados das monografias fica aparente a importância que as professoras dão às falas das crianças. Ao fazerem isso estão valorizando a criança não só como parte do processo, mas também como objeto e princípio das ações. De acordo com Kramer (2011) os estudos da infância fazem parte de vários campos do conhecimento. A partir do século XX a criança passou a ser entendida como sujeito e indivíduo em construção. Algumas concepções entenderam a criança a partir de uma concepção cognitiva, vendo-a como sujeito epistêmico, outros 96 entendem a criança do ponto de vista afetivo, motor, social ou intelectual, ou dicotomicamente separando corpo e mente. Independente das concepções, Kramer aponta que a ideia de que a criança tem especificidades é muito recente. Segundo ela “Os conceitos de Bakhtin (1988a, 1992, 1999) permitem entender que, na produção de discursos, práticas e interações, os lugares que as pessoas ocupam e os significados que circulam interferem no significado produzido: o contexto é importante para entender o texto. Na enunciação, os lugares e as condições de onde são proferidas as palavras e produzidas as interações produzem sentidos.” (p. 389) Ao produzir textos orais ou escritos, a criança produz discursos que correspondem a determinadas situações comunicativas que são atravessadas por um cotidiano, que enquanto acontecimento influencia os mesmo. Quando as crianças se percebem parte do processo, a lógica de que precisam escrever ou falar (produzir) para que alguém diga que está certo ou errado, torna-se desnecessária, pois o que se está produzindo são sentidos para a própria vida. Segundo LARROSA,“a experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca” (p.21). A experiência surge na construção de um caminho no qual, crianças e professores se constituem, no qual um altera o outro. Segundo Charlot (2012) existe uma relação de contra-dependência entre professor e aluno, o aluno é quem faz o trabalho intelectual para o aprendizado, cabe a eleagir sobre o meio, refletir sobre ações, intervir, questionar, propor, entre outros. Se ele não o faz, não aprende e esse fracasso acaba sendo tanto do aluno quanto do professor. Para aprender é necessário que a criança esteja inserida em um contexto que lhe proponha “atividades intelectuais” Charlot (2012). Essas atividades intelectuais por sua vez são planejadas pelos professores, que conscientes de sua função, propõem experiências para que as crianças vivenciem realidades nas quais seja possível refletir sobre o que e para que estão envolvidas naquele contexto. Isso significa afirmar que o professor que age consciente de sua função também propõe a sim mesmo experiências que contextualizam sua própria vivência. É, portanto um caminho que se constrói junto com a criança, propiciando o diálogo, em um movimento sempre de inacabamento, no qual ambos vão se constituindo, ética e esteticamente, na relação. Ao analisar, a partir dessa perspectiva, a escrita das alunas professoras do CESPEB, é possível entender que as mesmas tomam a criança como orientadora 97 de suas práticas que culminam em um envolvimento tanto teórico quanto vivencial em relação ao cotidiano escolar. As crianças as impulsionam, direcionam o olhar, instigam reflexões. As monografias do CESPEB Alfa trazem um grande ganho para os campos que discutem a inserção da criança como produtora de cultura, saberes e também de prática assim como demonstram professoras comprometidas com as mesmas, e com o processo de ensino aprendizagem. Refiro-me à importância do curso, como espaço de estudo, pesquisa e prática de professores, no qual a criança está no centro das discussões em todo o tempo, pois a prática docente não existe sem a criança, a prática das mesmas é mais importante pois ela dá movimento ao fazer pedagógico do professor, instiga-o, coloca desafios diante do professor. É no cotidiano de sala de aula que as teorias vão tomando forma e sendo validadas a medida que os sentidos vão sendo estabelecidos para a criança e em contra partida vão confirmando ou refutando as hipóteses do docente. 98 6.0 Conclusões Inacabadas Seria um tanto ousado, em meu ponto de vista, dizer que tenho alguma conclusãoem relação a tudo o que li nas monografias do CESPEB, visto queestamos sempre dando sentidos e ressignificando os acontecimentos, discursos e palavras. Permito-me então a dizer que tenho, sim, conclusões inacabadas que, aqui expostas, suscitarão em mim, e espero que em outros, demais pensamentos que propiciem reflexões agregadoras a cerca da nossa prática como docentes. A leitura das monografias desperta-me cada vez mais o desejo de trabalhar como pesquisadora na área da educação por entender que esse é um movimento contínuo, inesgotável e composto por várias vozes. Por entender que muitas questões me tocam e muito há ainda para ser refletido nesse campo. Depois desse árduo processo de leitura e escrita de minha dissertação percebo o quanto fui tocada/alterada pelo encontro, nas monografias, com as memórias de formação. Ao lê-las pensava em meu próprio caminho de formação. Nesse processo de escrita da dissertação fui me constituindo como pessoa, adequando-me as nuances da vida. Descobri-me professora, agora não mais de música, mas ainda agregando a música, na Educação Infantil. Achei-me pesquisadora, ao olhar para o meu próprio fazer e questioná-lo. Identifiquei-me com a escrita das alunas-professoras. É peculiar ler o que uma professora escreve e ir, ao mesmo tempo, criando a imagem na mente daquele ambiente porque se sabe como ele é. O som do falatório das crianças, a bagunça na sala de aula, a frustração de não ter uma resposta, mas a disposição de ir buscar uma outra forma para o entendimento de determinada questão, o cansaço, a vontade de aprender para aprimorar, o desejo de ver as crianças avançando, crescendo, amadurecendo. Ler a escrita das alunas-professoras foi compartilhar muitas vezes os mesmos anseios em relação ao que a prática espera de nós e sobre o que esperamos da prática. A partir de meu processo de escrita, tive a noção do que tenha sido o processo de escrita delas. Constato, a partir disso, o quanto a escrita nos forma e como ela pode ser realmente uma estratégia de formação, o registro da prática e a articulação entre teoria e prática. Escrever traz em si uma organização dos fatos, 99 dos saberes, das teorias que sustentam a prática, da avaliação, das relações. Nos ajuda a sair do lugar comum e olhar de fora quem somos e a pensar no interesse dos pares, porque, ao fazê-lo também o fazemos para o outro. Identificar professoras dizendo o quanto o cotidiano de sala de aula fez com elas tivessem vontade, ou precisassem voltar a estudar, anuncia o quanto a teoria se faz necessária para dar um direcionamento na prática. Foi possível perceber que o gênero monografia é a expressão de uma experiência acadêmica. Uma monografia não é escrita em qualquer ocasião, todos os que a ela se dedicam estão cumprindo uma exigência. Dar conta de construir um caminho teórico que fundamente todo um pensamento, elaborar uma metodologia de forma clara, analisar com um olhar o mais neutro possível, não são tarefas fáceis, mas que constroem o caminho para quem quer se dedicar à pesquisa. Diante disso, afirmo que a escrita da monografia em um curso de especialização também é um meio de formar um pesquisador, nesse caso, formar um professor pesquisador. Nas monografias fica claro o quanto as alunas professoras se empenharam para dar conta desse gênero tão distante de seu dia a dia escolar, tentando, cada uma a seu modo, organizar cada etapa que compõe uma monografia. Na leitura dos agradecimentos de cada monografia, o reconhecimento ao agradecer as orientadoras, explicita o quanto se faz necessário essa parceria que norteia a escrita. Pessoalmente, tinha minhas dúvidas se encontraria traços das práticas das alunas professoras, nesse gênero tão engessado em um formato. No entanto ao longo das leituras pude constatar o quanto elas foram abrindo esses espaços e constituindo os seus modos de escrever e expressar o que elas fazem, como fazem e para que fazem. Contrariando meu pensamento foi possível sim, perceber professoras que estão no cotidiano da escola se lançando ao desafio da escrita acadêmica, voltando à sala de aula, buscando mais delas mesmas. O professor, quando estimulado e orientado com credibilidade é capaz de colocar em evidência o que ele sabe. Infelizmente, vivenciamos um momento em que a prática do professor só tem visibilidade nos murais da escola, nos projetos propostos por alguns municípios que lhes rende algum tipo de benefício posterior caso o projeto de sua escola vença. O professor não escreve sobre sua prática porque ele não tem espaço que lhe exija tal coisa como forma de pensar a própria prática, a escola não tem sido esse espaço. Isso evidencia que a universidade é 100 oficialmente o espaço no qual o professor interessado em ressignificar sua prática busca agregar conhecimento e se constituir, de forma legitimada, como professor pesquisador. Nesse sentido, vale ressaltar a importância das ações da universidade, voltadas para a formação continuada de professores, na perspectiva de propiciar um espaço de discussão e fortalecimento dos saberes docentes para uma formação profissional. No entanto, ainda temos esse espaço de certo modo como cerceador, visto que a visibilidade dada a essa escrita limita-se ao espaço universitário. Tardif (2011) já apontou como questão se não seria mais lucrativo para os docentes se seus saberes da prática cotidiana e da experiência fossem reconhecidos por outros grupos produtores de saberes, também como produtores de saberes significativos e originados na própria prática, o que legitimaria profissionalmente a docência. Concluo portanto que produções de pesquisa docente existem de forma significativa no espaço da universidade, o que falta é a visibilidade para essas pesquisas enquanto forma legitimadora do fazer docente. Cabe repensar o que se tem feito com a produção da escrita docente como forma de atribuir um outro status à prática do professor que não seja o do professor que cuida, repassa saberes e é desvalorizado enquanto profissional, mas sim, daquele que tem um posicionamento político, responsabilidade com o processo de ensino e aprendizagem e principalmente compromisso com o outro. A partir da análise minha pesquisa demonstrou que houve a instauração do diálogo entre as professoras formadoras da universidade e as alunas professora nas ações expressas na escrita das monografias. Posso afirmar, baseada nas evidências trazidas a partir dos fragmentos destacados em meu trabalho, onde são trazidos relatos que demonstram o conhecimento adquirido na universidade através das professoras formadoras, os acréscimos produzidos pelos conteúdos apresentados, as memórias despertadas por momentos vivenciados durante o curso e como tudo isso constituiu as escritas das alunas professoras. A interação entre as professoras formadoras e as alunas professoras pôde ser identificada a partir da retomada que elas fazem dos conteúdos abordados no curso e como os mesmos puderam contribuir para o desenvolvimento de suas 101 práticas. Quando uma aluna professora15 diz que está aplicando os conhecimentos adquiridos na especialização em sala de aula com seus alunos e que vai aos poucos ressignificando o que já sabia isso demonstra que, assim como o som que pode tomar vários direcionamentos no fenômeno da reverberação, ela pôde perceber a importância do conhecimento adquirido na especialização não só para ela, mas também para seus alunos. Esses conhecimentos alcançam também as crianças na sala de aula a partir do momento em que organizam o fazer pedagógico. A voz das formadoras se faz presente, não como a fala específica da formadora enquanto pessoa, mas no sentido da voz que compõe o saber norteador da prática da aluna professora. Concluí através de suas narrativas, que as alunas professoras falam, cada uma de contexto existencial, ligadas a uma concepção de mundo e partindo para novas perspectivas. O cuidado ao escolher uma prática para falar sobre ela, ao optar por uma forma de montar essa apresentação, narrar as atividades com seus alunos e até mesmo entender a necessidade de investir na formação continuada contribuiu para que pudessem dar sentido (ou sentidos) a esse fazer docente. A concretude dada à prática através das monografias trouxe a elas a noção de pertencimento a um lugar muitas vezes tido como inacessível. Elas não estavam escrevendo para outros professores, mas sim, para si como uma forma de agregar novas consciências. Essa visibilidade, imagem externa, constitui o sujeito e o acolhimento dessas imagens forma a autoconsciência. Assim como nos aponta Bakhtin: A personagem interessa a Dostoiévski como ponto de vista específico sobre o mundo e sobre si mesma, como posição racional e valorativa do homem em relação a si mesmo e a realidade no mundo (...) Por conseguinte, não são os traços da realidade – da própria personagem e de sua ambiência – que constituem aqueles elementos dos quais se forma a imagem da personagem, mas o valor de tais traços para ela mesma, para a sua autoconsciência (...) torna-se objeto de reflexão da própria personagem o objeto de sua autoconsciência; a própria função dessa autoconsciência é o que constitui o objeto da visão e representação do autor.(2010, p. 52-53) 15 Célia – Turma B 102 Para as alunas professoras, autoras de seu próprio dizer e fazer a imagem externa produzida através de seus escritos constitui o acolhimento das vozes das formadoras e a legitimidade do saber adquirido na universidade. Por fim, percebo a importância dada pela alunas professoras às crianças. Fica evidente que o centro do planejamento e das ações pedagógicas é a criança em processo de aprendizagem e que as decisões mais coerentes e responsivas são tomadas com a participação de todos, inclusive das crianças. Esse processo de propiciar um diálogo horizontal entre os professoras e alunos ocupa os sentidos estabelecidos como os reais objetivos, abrindo a possibilidade de se ultrapassar as barreiras dos medos de expor o que se pensa. Um espaço-tempo de sujeitos dialógicos que, ao pronunciarem o mundo, vão compreendendo as suas realidades e intervindo sobre elas para transformá-las. (KRAMER, 2011, p. 56) As monografias do CESPEB Alfa trazem um grande ganho para os campos que discutem a inserção da criança como produtora de cultura, saberes e também de práticas assim como demonstram professoras comprometidas com as mesmas, e com o processo de ensino aprendizagem. Refiro-me à importância do curso, como espaço de estudo, pesquisa e prática do professor, no qual, a criança está no centro das discussões em todo o tempo, pois a prática docente não existe sem a criança, a prática das mesmas é a mais importante pois ela dá movimento ao fazer pedagógico do professor, instiga-o, coloca desafios diante do professor. É na sala de aula que as teorias vão tomando forma e sendo validadas à medida que os sentidos vão sendo estabelecidos para a criança e em contrapartida vão confirmando ou refutando as hipóteses do docente. Segundo Charlot (2012) não importa se o saber do professor é tradicional ou não mas sim se enquanto professor ele oferece ao aluno espaço para atividades intelectuais que permitam ao discente aprender a desenvolver suas próprias práticas intelectuais e qual o sentido que estas têm para o aluno e se o mesmo tem prazer em sua realização. Benjamim (2002) diz que “cada uma de nossas experiências possui efetivamente conteúdos”(p.23). Concluo nesse sentido que as alunas professoras estão comprometidas com seus alunos. É por eles também que muitas retomam os estudos, na perspectiva de lhes oferecer uma melhor forma de se relacionar com o conteúdo escolar propiciando a elas oportunidades de diálogo e produção de 103 sentidos. Dividem com seus alunos um saber adquirido na universidade que lhe confere uma visão ampliada das situações do dia a dia de sala de aula, um saber que está sempre em transformação em prol da criança. Ler de uma professora16 que é necessário garantir a fala de cada um, para que todos tomassem parte do todo evidencia o quanto temos professores comprometidos com seus alunos e a responsabilidade que a ação pedagógica exige de cada educador, seja na universidade ou na escola básica. 16 Sofia – Turma A 104 Referências bibliográficas ALMEIDA, Benedita de. A Escrita na formação continuada de professoras alfabetizadoras: práticas de autoria. Tese. 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Modulo II: Temas contemporaneidade Transversais, questões, dilemas de nossa Perfil da turma: professores / alunos de diferentes disciplinas Unidades responsáveis: Diferentes Unidades do CFCH Duração: 45 h/ 9 encontros mais 5 horas deatividades na escola O Módulo II aborda questões s de ordem mais geral que marcam o nosso tempo presente e que interferem direta e /ou indiretamente no nosso cotidiano. A idéia é reconhecer no processo de formação, o professor como sujeito político que pensa, interpreta e age a partir da sua inserção em um mundo historicamente construído. As diferentes disciplinas oferecidas (anexo 4) traduzem o investimento deste curso na potencialidade da pluralidade de enfoques e contribuições teóricas das diferentes áreas das ciências humanas na compreensão do mundo. Por exemplo: a temática da violência poderá ser trabalhada a partir de recortes disciplinares diferenciados como 110 por exemplo, a perspectiva histórica; pelo viés dos Direitos Humanos ou através da ênfase na articulação entre violência e dimensão cultural, etc. Modulo III: Saberes pedagógicos Perfil da turma: professores/ alunos de diferentes disciplinas Unidades responsáveis: Faculdade de Educação e Cap 45 horas – 9 encontros presenciais, 5 horas de atividades na escola O Módulo III aborda os conteúdos pedagógicos que visam aprofundar os conhecimentos dos professores em formação sobre as pesquisas atuais no campo da Educação, abordando aspectos referentes ao currículo e à constituição do conhecimento escolar, às teorias sobre os processos de ensino-aprendizagem, à avaliação bem como a formação de visão crítica sobre as políticas educacionais em perspectiva histórica e os subsídios para a compreensão das práticas pedagógicas em perspectiva cultural e sociologicamente fundamentada. Nesse módulo serão discutidos, em particular, os conhecimentos oriundos das ciências da educação . Modulo IV: Saberes disciplinares: ( Atualização científica) Perfil da turma: professores / alunos de uma mesma disciplina Unidades responsáveis: Faculdade correspondentes à disciplina específica de Educação, CAp e Unidades Duração: 110 horas 22 encontros presenciais. 5 horas – atividades na escola O Módulo IV volta-se para a atualização dos conteúdos das áreas específicas, quando os professores em formação continuada terão oportunidade de cursar disciplinas que contemplam não apenas os aspectos fundamentais dos diferentes campos do saber como também aspectos mais específicos decorrentes de pesquisas recentes. As disciplinas (anexos correspondentes aos diferentes cursos específicos ) desse núcleo visam à atualização de conteúdos em áreas disciplinares acadêmicas, tendo em vista a possibilidade de inter-relação entre os temas nas disciplinares escolares. São disciplinas distribuídas a serem ministradas por professores dos diferentes institutos da UFRJ e/ou de outras instituições do Ensino superior envolvida. Modulo v: Saberes didáticos Perfil da turma :professores /alunos de uma mesma disciplina Unidades responsáveis: Faculdade de Educação , CAp 111 Duração: 115 horas – 23encontros presenciais. 5 horas – atividades na escola O Módulo V volta-se para o ensino das áreas específicas, momento no qual os processos de transposição didática que os professores desenvolvem no exercício cotidiano de sua profissão são objeto de análise. Os saberes curriculares citados como um dos componentes dos saberes docentes são aqui considerados como expressões do conhecimento escolar que, não apenas resultam de uma seleção cultural mas que, no momento do ensino pelos professores, mesclam saberes adquiridos durante sua vida escolar, em sua formação profissional, na vida profissional e pessoal, criando ou reproduzindo configurações cognitivas próprias de uma epistemologia escolar. Esse momento é relevante e estratégico no curso, pois apresenta uma oferta de disciplinas e oficinas (anexos correspondentes aos diferentes cursos específicos ) com abordagem inovadora que tem aberto possibilidades de compreensão do processo de ensino que norteia a ação docente, oferecendo instrumental para que o professor conheça e reconheça a ação que desenvolve na prática do ensinar, reconhecendo sua subjetividade e possibilidades de autoria num contexto de autonomia relativa. Dinâmica de funcionamento Módulos IV e V: Esses módulos se desenvolvem simultaneamente de forma alternada. Cada coordenador de curso pode organizar a distribuição da carga horária respeitando os seguintes aspectos: mesmo número de encontros referentes a cada um dos módulos; incluir pelo menos 5 oficinas cujos conteúdos nos dois módulos sejam trabalhados de forma articulada; Garantir que a dimensão da interdisciplinaridade esteja presente tanto como objeto de reflexão como estratégia metodológica. Modulo VI: Seminário de Monografia Perfil da turma: professores /alunos de uma mesma disciplina Unidades responsáveis: Acadêmicas envolvidas Faculdade de Educação e demais Unidades Duração: 120 h: sendo 30 horas (6 encontros presenciais) distribuídos ao longo da formação e90 horas detrabalho individual Neste módulo está prevista a elaboração de um trabalho final de curso sob orientação de um professor credenciado, versando sobre um tema relativo ao ensino na área específica de conhecimento do professor em formação continuada. O trabalho deverá ser construído ao longo do curso, constando de atividade elaborada e aplicada pelo professor-aluno em turma na qual atue. 112 A elaboração do trabalho final do curso cria oportunidade para que o professor, ao definir um tema relacionado à sua prática docente, articule os vários saberes para explicá-la, ou seja, justificar as opções e decisões tomadas, avaliando também, os resultados alcançados. Essa elaboração expressa e possibilita a produção de saberes sobre a atividade docente, contribuindo para o desenvolvimento da sua capacidade profissional. Essa reflexão sobre a prática estará presente nos diversos momentos do curso, mas será no trabalho coletivo desenvolvido no módulo VI e na elaboração individua do trabalho final que os professores poderão articular os diferentes saberes e práticas confrontados. Observação: Atividades na escola: (20 horas): distribuídas ao longo dos módulos II, II, IV e V. Trata-se de um exercício de qualificação do olhar do professor no sentido de ele perceber, registrar, estranhar e questionar situações vivenciadas no seu cotidiano profissional que eles estimem estarem relacionados com as questões debatidas no curso.