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A GÊNESIS DA CONSERVAÇÃO DO SOLO NO BRASIL 1
Por Mario Borgonovi
Engenheiro Agrônomo
ESALQ 1940
Se examinarmos a história da conservação do solo e sua importância para a
agricultura conclui-se que, no Brasil, esta matéria tinha pouca ou quase nenhuma
significância antes da visita de Hugh Bennett. Ao concluirmos nosso bacharelado em
1940 pudemos afirmar que, durante o nosso curso da ESALQ, não houve nenhuma aula
sobre o assunto, entretanto, nos EUA já existia uma grande organização chamada Soil
Conservation Service (SCS) com centenas de engenheiros agrônomos dedicados a este
trabalho.
Foi com a introdução da cultura do algodão no Estado de São Paulo e com
o impacto imposto aos agricultores pelos estragos no solo causados por esta atividade que
percebeu-se a necessidade de um manejo adequado do solo para se evitar a erosão. Por
este motivo a Secretaria da Agricultura criou o que se chamou de Serviço de
Terraceamento que consistia em construir-se curvas em nível com seção triangular para
impedir-se a formação do enxurro que assustava os agricultores. Tal fato ocorria porque a
cultura do algodão exigia um preparo do solo com aração enérgica e o seu manejo ocorria
justamente na época de chuvas torrenciais.
A conservação do solo no Brasil nasceu no início da década de 1940. Ao
relatarmos partes de sua história não podemos deixar de destacar certos desacertos que
ocorreram na Secretaria da Agricultura especialmente com a criação da Seção de
Conservação do Solo do Instituto Agronômico de Campinas (IAC) destinada à pesquisa
científica. Lamentavelmente os técnicos tinham pouco contato com os agricultores e só se
interessavam por pesquisas muitas vezes já realizadas nos EUA. Foram adquiridos dez
tratores Caterpillar-D4 com o objetivo de se colocar em prática a implantação dos
terraços, o que trouxe certa animozidade com o pessoal da pesquisa.
No campo a preocupação essencial era com a erosão do solo
correlacionada com a cultura do algodão o que causava desconforto no governo, motivo
pelo qual foi criada a Seção de Combate à Erosão e o Departamento de Mecanização da
Agricultura (DEMA).
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Rio de Janeiro, RJ, 22/07/2014 – depoimento do Eng. Agrônomo Mario Borgonovi aos seus 100 anos e sete meses de
idade.
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Por outro lado o trabalho junto aos agricultores era mais rápido e trazia
resultados positivos. Nós estávamos em contato direto com o S.C.S. dos USA. O Estado
de São Paulo ficou em evidência e já tinha um engenheiro agrônomo e um trator
Caterpillar para cada uma das dez regiões criadas. Todos fizeram um estágio de oito
meses nos EUA consolidando o contato com os trabalhos desenvolvidos no Soil
Conservation.
Renato Costa Lima, nesta época Secretário da Agricultura, entusiasmado
com nosso trabalho convidou Hugh Bennett e esposa para uma visita ao Brasil a fim de
conhecer o trabalho realizado no estado. Nos tinhamos sob nosso comando dez
engenheiros agrônomos denominados conservacionistas e fomos indicados para
acompanhar o doutor Bennett por todo
território paulista e parte do paranaense, ou
seja os municípios de Londrina e Maringá
onde se iniciava a cultura do café. Foi uma
viagem relativamente longa e de muita
responsabilidade principalmente por tratarse de um casal não muito jovem. A viagem
de Bennett foi um marco na história da
conservação do solo e deixou excelente
impressão não só pela sua cultura mas pela
Dedicatória de Bennett à Mario Borgonovi.
sua cordialidade e atenção à todos os
técnicos. A visita teve seu final com uma
grande festa na Fazenda Santa Gertrudes, (SP), seguida de uma cerimônia na capital
paulista com a presença de autoridades. A presença de Bennett foi um estímulo a todos os
órgãos que trabalhavam nesta especialidade.
Depois da visita o acervo deixado por Bennett assim como seu livro, que
acabou tornando-se uma espécie de biblia, intensificou-se o contato com os técnicos do
Brasil, especialmente do Estado de São Paulo com o EUA. Este fato foi essencial porque
enquanto nos EUA a conservação do solo já estava bem desenvolvida aqui no Brasil tudo
ainda estava por ser feito e estávamos em um estágio muito insipiente.
Começamos então a trabalhar com as práticas mais simples, porém
fundamentais, urgentes e absolutamente necessárias como por exemplo as culturas e os
cordões em nível que não eram nada mais do que valas simples para segurar a água. No
nosso ponto de vista, o trabalho mais importante era convencer os fazendeiros da
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necessidade de implementar o serviço de conservação do solo. Da nossa parte dois
trabalhos nos deixaram com um sentido de orgulho e utilidade: o primeiro foi a
publicação da tabela que determinava a distância entre os terraços combinando a
declividade com o tipo de solo e o segundo foi a idealização de um implemento agrícola,
digamos assim, tupiniquim, que gerava uma economia significativa porque o trabalho que
utilizava os tratores eram caríssimos, uma verdadeira fábula para a época. Tratava-se de
construir os terraços de forma barata, acessível e fácil. Produzimos o que chamamos de
Plaininha que consistia em duas tabuas em forma de “V”: uma ficava no sentido da vala
em nível e outra jogava a terra para a lateral para compor o desenho do terraço. A tábua
que denominavamos de faca tinha uma cantoneira de metal para reforçar e evitar o
desgaste da madeira. Este implemento foi distribuido, em grande número, nas dez
regiões; era de tração animal e evidentemente constituia um trabalho muito mais barato
embora com a produtividade baixa. De qualquer maneira valeu para disseminar nos
agricultores a importância de se conservar o solo.
O sucesso deste trabalho resultou em diversas solicitações para atuarmos
em outras frentes. Nesta altura já estávamos na acessoria do Dr. Walter Ramos Jardim,
Secretário da Agricultura (SP), posição esta que nos possibilitou alcançar recursos
financeiros para se fazer a cobertura aérea do estado o que evidentemente traria um
grande avanço no planejamento do uso do solo, por meio da aerofotogrametria, já adotado
nos USA.
O desenvolvimento rápido dos trabalhos de controle da erosão,
planejamento agrícola e enfim o manejo dos recursos naturais se interligavam
possibilitando-nos a trabalhar com a secretaria de águas implementando polders para
irrigação controlada de arroz no Vale do Paraiba do lado paulista.
Neste ponto houve uma interrupção de nosso trabalho no Estado de São
Paulo por termos sido solicitados a trabalhar na Cia Vale do Rio Doce na forma de
empréstimo ao Ministério das Minas e Energia.
Da década de 1960 até hoje a semente deixada por Bennett germinou e
produziu frutos que são coletados até hoje em todo país por diversas instituições
científicas e acadêmicas como por exemplo a EMBRAPA.
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