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COMSEF - Comunidade
Semeando o Futuro
H
istória da Associação das
Artesãs e da Apasca
A Comunidade Semeando o Futuro – COMSEF, em parceria com a ActionAid,
apoia desde 2001, através do Projeto Transformar, associações comunitárias e
produtivas no município de Orobó, agreste setentrional de Pernambuco, a aproximadamente 118 km da capital.
A Associação das Artesãs recebe o apoio prestado pela COMSEF, tendo sido fundada em 1989, e reativada em 1997. Na atualidade conta com 26 sócias, que
desenvolvem trabalhos de frivolité, crochê, pintura, bordados e cestas. Contudo, o
que mais se destaca na confecção de peças é o frivolité, que é um tipo de renda
francesa, na qual se usa um instrumento talhado em madeira longa e achatada,
chamado de naveta. Utiliza o sistema de traçado a dedo, com nó, que pode ser
executada sem qualquer implemento, informa a artesã Josefa Pereira Pedrosa de
Oliveira, que também relatou:
“Apesar de caminharmos com os próprios pés, temos a ajuda da
COMSEF/ActionAid, no apoio para que possamos está participando das feiras de artesanato em Pernambuco, Rio de Janeiro,
Brasília e Rio Grande do Norte, entre outros.”
A Associação das Artesãs é constituída por mulheres que participam do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Orobó, como sócias agricultoras, no Círculo
Operário, mais especificamente na assistência médica, além dos movimentos da
Igreja Católica (Encontro de Irmãos, Apostolado de Oração). Também recebem
apoio para participação nas feiras da Federação das Associações, Cooperativas e
Grupos Produtivos de Artesãos de Pernambuco - FACARPE, Programa Estadual
de Apoio ao Pequeno Produtor Rural - PRORURAL, Agência de Desenvolvimento
As mulheres perceberam mudanças significativas em suas vidas porque, com a
produção dos artesanatos, passaram a ter uma renda, se sentido mais independentes dos recursos dos maridos. Essa situação tem possibilitado o empoderamento econômico das mulheres, sobretudo porque os maridos não decidem o que
elas devem fazer com as rendas geradas pelo artesanato.
E, muitas vezes, surgem situações em que o marido esteja desempregado, e as
mulheres assumem as despesas da casa. Conforme depoimento de dona Rosa
Antonia Pereira, integrante da comissão da Associação das Artesãs:
“Essa renda nos traz, através das vendas e encomendas, benefícios como ajuda na renda familiar, entre outros, e mais saúde. No
começo, em 1989, foi fundada a associação e nós não sabíamos
de sua existência. Na época nos chamavam de “professores de
trabalho manual” e muitos achavam que éramos funcionários da
prefeitura. Só em 1997, na gestão de seu José Francisco, é que
ficamos sabendo que fazíamos parte de uma associação. Então,
a partir daí foi que a Secretaria de Ação Social, através de Josefa
Martins Reis, organizou capacitações sobre associativismo, produção e comercialização para 40 sócias.”
A experiência está contribuindo para diminuição da desigualdade entre homens e
mulheres, tendo em vista que os homens estão valorizando a renda, pois ajuda
nas despesas da casa. Todavia, eles ainda reclamam das reuniões da associação,
mas não estão impedindo suas mulheres de participarem.
Observa-se nessas reuniões que as mulheres conversam sobre produção, comercialização, prestação de contas e trocam experiências de vida, nas quais narram como
estão dividindo o tempo entre o trabalho da agricultura, doméstico e do artesanato.
“Quando estamos reunidas é um divertimento, esquecemos as
preocupações, conversamos umas com as outras, tiramos as dúvidas, trocamos ideias e assim fica mais gostoso de trabalhar.”
(Erotildes Barbosa da Silva, 42 anos, Sítio Caiçaras)
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As mulheres, na construção do processo de sua autonomia, utilizam estratégias
que demonstram para os maridos que as reuniões da associação favorecem a geração de renda. Para tal, organizam suas atividades cotidianas antecipadamente,
para não dar motivos para reclamações do marido.
COMSEF
Sistematizações de experiências
de mulheres agricultoras
MULHERES E AGROECOLOGIA
Econômico de Pernambuco - ADDIPER, Serviço de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas - SEBRAE, da Prefeitura e capacitações e intercâmbios pela COMSEF.
A rotina das mulheres é constituída de atividade domésticas (preparo das refeições, cuidar das roupas e filhos) e atividades campesinas (cuidar de animais e
roçado). O artesanato fica para os intervalos surgidos no decorrer do dia.
A atual presidente, Rosa Pereira de Oliveira, 20 anos, do Sítio Urtiga, registra que
tem sido importante a assessoria da COMSEF/ActionAid porque estamos trabalhando com o objetivo de ter mais união entre as sócias. E assim ter uma renda
melhor para manter as despesas da associação na compra de linhas, mantendo
um fundo de reserva de 10%. E, sobretudo aumentar o número de sócias, pois
será maior o fortalecimento da luta das mulheres.
Uma outra associação produtiva que recebe apoio da COMSEF/ActionAid, desde
2001, é a Associação dos Pequenos Agricultores de Serra de Capoeira – APASCA,
fundada em agosto de 1995, por incentivo do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Cipriano Orlando Bezerra, tendo em vista que o governo do estado ia
contemplar dez municípios com projetos, e Orobó estava entre eles.
De início foram listados 80 sócios, permanecendo 40, que elaboram e compreenderam as regras do estatuto, visando serem beneficiados pelo projeto. A comunidade,
por sua vez, reivindicava a melhoria de saúde de seu povo, com a oferta de medicamentos que contivessem o mínimo de conservantes químicos e com baixo custo.
Na atualidade são 44 sócios (43 mulheres e um homem), sendo dez destas famílias integrantes do Sistema de Vínculos Solidários.
De acordo com Maria Júlia (Julita, Serra de Capoeira):
“O local para sede da APASCA foi doado pelo seu Emiliano, e a associação recebeu recursos do governo estadual (1997), um montante de R$ 24.000,00, para construção e aquisição de equipamentos
para o laboratório, sendo gasto um total de R$ 19.000,00. O restante
não dava para pagar aos técnicos e projetista. Então criou-se a frente de emergência, com os homens para construir em mutirão, contando com a presença do sindicato, que ajudou com mão-de-obra.”
No início, a comercialização dos remédios fitoterápicos era difícil, porque a comunidade não dava credibilidade, principalmente porque os técnicos eram da própria
comunidade. Mas, com a divulgação na rádio local, nas reuniões e em outras
entidades (COMSEF, Sindicato, Prefeitura, Médicos do Programa de Saúde da
Família – PSF, com palestras e panfletagens nos ambulatórios), houve uma melhoria. Assim, os sócios organizaram pontos de venda ao lado do Banco do Brasil,
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Para Benedita Maria dos Santos (técnica manipuladora de medicamentos, residente no Sítio Serra de Capoeira):
“Produzimos plantas medicinais de várias espécies como: hortelã, babosa, confrei, capim santo, cavalinha, erva lanceta, colônia, poejo, espinho de cigano, xambá, entre outros. Com essas
plantas fazemos chás, tinturas, pomadas, xaropes e comprimidos
(cápsulas), além da multimistura (amendoim, gergelim, casca de
ovo, entre outros ingredientes) para o caso da desnutrição. No
caso das hortaliças, temos: alface, cenoura, beterraba, coentro,
pimentão, abobrinha, couve-flor, entre outras.”
As principais mudanças na vida das mulheres, a partir da experiência na APASCA, foi
o empoderamento econômico que tornou possível a aquisição de remédios naturais
com desconto, por serem sócias. As mulheres também ficaram conhecendo mais os
seus direitos, perderam o medo de discordar, tanto na associação, quanto em casa.
Os filhos, por sua vez, acham que as mães estão mais liberadas para participarem de
festas da Terceira Idade, quadrilhas juninas, entre tantas outras. E, sobretudo, perderam o medo de ficarem velhas em casa, se libertando e formando em sua comunidade
o grupo da Melhor Idade (idosos), participando de ginástica e eventos comemorativos.
O trabalho em casa tem mais união, com a participação dos filhos e maridos,
havendo melhor valorização do mesmo. As mulheres afirmam que a experiência
na APASCA está contribuindo para a diminuição da desigualdade entre homens
e mulheres, porque hoje elas têm mais vez e voz. Sendo mais respeitadas, sem
impedimento e com incentivo para participarem das reuniões da associação, onde
adquirem mais informações, principalmente sobre os benefícios dos medicamentos fitoterápicos, sobre seus direitos e o poder da organização das mulheres.
Mariele da Silva Gomes Lima (Serra de Capoeira) relata o seguinte, em seu
depoimento:
“Eu faço parte da associação da APASCA, e há 7 anos eu compro
remédio para minha filha, porque ela cansava e tinha que ir para
o hospital. Mas os remédios da farmácia estavam prejudicando,
então eu resolvi dar os xaropes do laboratório e ela se deu bem.”
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Maria da Paz Vieira também concorda, salientando que o laboratório é muito importante porque a gente se beneficia do medicamento sem química, mais barato
para quem é sócio. Eu mando até para os meus parentes, em São Paulo.
COMSEF
Sistematizações de experiências
de mulheres agricultoras
MULHERES E AGROECOLOGIA
na área de entrada da prefeitura, e depois foi alugada uma loja em uma galeria. E
hoje estão comercializando no sindicato, sendo necessário um local mais central.
Contudo, ainda existem dificuldades como a falta de capacitação para outros técnicos, de um fundo de caixa, melhoria na comercialização, expansão para outros
municípios, de um farmacêutico e de uma participação maior das sócias.
Para as mulheres que fazem parte da APASCA, ser mulher, assumir a sua identidade significa:
“[...] ser agricultora, sócia da fitoterapia, dona de casa, avó, mãe,
companheira, organizada, amiga, responsável, compreensiva,
carinhosa, dedicada, estudante, sonhadora, vereadora, batalhadora, valorizada mais do que os homens, sendo muitas vezes
reunidas só com mulheres; orgânica, pois cuida da natureza. Ser
mulher é tudo isso, porque tem ser o dom de guerreira.”
(Trabalho em equipe na Oficina de Sistematização sobre Experiências Agroecológicas de Mulheres no Município de Orobó)
Maria Júlia afirmou que:
“[...] é importante o trabalho de organização das sócias, que se
reúnem de dois em dois meses, para discutir assuntos relacionados à APASCA, e ter também mais conhecimento sobre os direitos e sobre as leis, e a participação nos movimentos (Sindicato,
COMSEF e Prefeitura). Não se pode esquecer que também é importante um trabalho de conscientização sobre o meio ambiente,
para que as pessoas não destruam a natureza.”
Os(as) sócios(as) da APASCA esperam alcançar, no futuro, melhores condições financeiras, expandindo as vendas, com a valorização dos medicamentos fitoterápicos.
Sistematização do trabalho com mulheres - Orobó - PE
A metodologia utilizada teve como finalidade mobilizar as mulheres da Associação
das Artesãs e da Associação dos Pequenos Agricultores de Serra de Capoeira APASCA, para refletirem sobre suas dificuldades e potencialidades.
Para tal, foram organizadas reuniões nas comunidades, para elaboração de um
diagnóstico da história das associações, sendo trabalhada as seguintes temáticas:
• Valorização pelos homens, em relação ao trabalho da mulher;
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• Autonomia (poder de decisão);
• Agroecologia e a contribuição/entraves no modo de vida campesino das
mulheres;
COMSEF
• Organização das mulheres na associação;
• Associativismo.
Para dinamizar, foram realizados intercâmbios entre associações, para “in loco”
se observar a realidade e o cotidiano das sócias, promovendo relações dialógicas,
que possibilitaram a troca de saberes e experiências.
Um instrumento que estreitou as relações entre as mulheres foi a implantação do
correio, respaldado na educação libertária de Celestin Freinet, onde inicialmente
cada sócia escrevia para as suas companheiras de entidade e, posteriormente,
para outra associação. A curiosidade ficou aguçada, cada uma querendo receber
respostas da correspondência enviada. O local de entrega foi a COMSEF.
Grupo de frivolité
Horta - Benedita
Em todos os encontros foi utilizado o trabalho em grupo, para estudo, reflexão,
discussão, sistematização de ideias e apresentação em plenária. É importante
ressaltar que houve, durante o processo, a preocupação em desenvolver a competência de trabalhar em equipe, construindo aprendizagens significativas. Depois
desses procedimentos, foi realizado o I Encontro de Mulheres e Agroecologia.
Naquele momento, a sensibilização das mulheres se desenvolveu, através de dinâmicas, para facilitar a integração e o exercício do ato de falar. A dinâmica do
cartão registrou as expectativas do encontro. E a da árvore, em que cada parte
representava alguma vivência da associação, tais como:
• Espinhos (dificuldades)
• Folhas (projetos em andamento)
• Flores (as coisas que se quer conquistar)
• Frutos (produtos)
Para finalizar, cada associação expôs os seus produtos, numa feira de saberes e
sabores, sendo um momento de confraternização.
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