6/21/2015
_-_ Boletim Ebulição _-_
Assuntos em pauta na
conjuntura educacional
Ebulição Virtual Nº19
<< voltar “O atendimento educacional da população prisional deve ser feito pela
rede pública de ensino”
Entrevista: Fábio Costa Sá e Silva, do Departamento Penitenciário Nacional do
Ministério da Justiça
Para representante do Ministério da Justiça, ações educacionais no sistema
prisional sempre foram marcadas por voluntarismo e improvisação. Através de
parceria com o MEC, proposta é levar para dentro das prisões programas
oficiais de educação de jovens e adultos, como o Fazendo Escola e o Brasil
Alfabetizado O Ministério da Justiça realizou recentemente uma parceria com o MEC
para dar novas diretrizes nacionais à Educação Penitenciária, o que
muda? No começo dessa gestão, nós tínhamos apenas convênios com os Estados
para repassarmos recursos para ações na área educacional, que em geral eram
tele­salas. Começamos um diálogo em 2004 com o Ministério da Educação
para constituirmos um grupo de trabalho para pensarmos na Educação na
Prisão, não só o modelo de financiamento, mas também como orientação
política. Então fixamos o entendimento de que o atendimento em termos educacionais
da população prisional deveria ser feito pela rede pública de ensino, pelos
programas oficiais, porque a característica que encontrávamos no sistema
prisional era de muito voluntarismo, muita improvisação, precisávamos superar
isso, colocar lá dentro os programas de governo de EJA: Fazendo Escola e o
Brasil Alfabetizado.
E de onde vinha esse diagnóstico?
Em 2003, o Ministério da Justiça tinha feito um diagnóstico de toda a segurança
pública no Brasil, com um capítulo sobre o sistema penitenciário. Tínhamos ali
dados que apontavam para a falta de programas regulares e mostrava que
havia demanda enorme: 70% não têm primeiro grau completo e 10,5% são
analfabetos. E isso era coerente com as demandas que apareciam no
Ministério: só financiávamos projetos pontuais, sem visualizar políticas públicas
por trás. Então o MEC abre imediatamente no Brasil Alfabetizado uma seção
específica para educação no presídio para mapear as propostas existentes e
também para dar uma bolsa maior para os educadores. Em seguida, realizamos
os seminários estaduais e em julho o nacional sobre educação na prisão.
Quais são os indicativos para a construção das diretrizes nacionais que
apareceram na realização desses seminários?
O primeiro ponto é a remição da pena pelo estudo. Tem juiz que aceita e juiz
que não aceita, às vezes chegamos a situações com dois presos na mesma
sala de aula e um terá a remição e o outro não. Outra questão é a cultura
institucional e até a atuação dos demais profissionais, agentes penitenciários,
diretores de presídios etc, que por razões históricas é muito pouco favorável a
esse tipo de atendimento. Uma preocupação que emerge desses seminários é
a de envolver esse pessoal, sensibiliza­los e torna­los parceiros na oferta de
educação. Outro ponto muito importante é a questão da gestão, é preciso que
exista uma articulação muito forte entre Justiça e Educação para que a oferta
ocorra como queremos. Se a educação vai entrar com seus professores nos
presídios, são duas lógicas distintas de se trabalhar, uma é a lógica da
segurança e a outra é a lógica do envolvimento com o aluno. Isso precisa ser
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muito costurado e os gestores precisam estar em diálogo. Outra questão que esteve muito presente, que não é uma particularidade da
educação prisional mas uma característica da EJA como um todo, é o fato de a
abordagem não infantilizar o sujeito e levar em conta sua história de vida.
Em relação a essa dificuldade de se inserir a educação numa cultura
institucional pouco propícia, quais os caminhos para se envolver nas
ações educativas as instâncias das unidades, a direção e os agentes
penitenciários?
Estamos trabalhando para organizar atividades conjuntas entre agentes e
professores por exemplo. Nós, MEC e Ministério da Justiça, trabalhamos no
desenvolvimento das diretrizes e também trabalhamos com financiamento em
seis estados ­ e agora queremos ampliar para mais oito. A idéia é repassar
recursos para fortalecer esse desenho que a gente propõe. Nesses convênios
que fizemos com os seis estados existem programas de formação continuada
de professores em conjunto com agentes. Para todas as demandas que estão
aparecendo, estamos dando uma resposta em termos de financiamento.
De onde vem a verba destinada a esse programa? O Fundo Penitenciário Nacional responde por parte e a SECAD (Secretaria de
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação)
vai entrar com outra.
O Ministério da Justiça tem alguma forma de monitoramento para poder
diagnosticar as ações de educação penitenciária nos estados? Em relação a esse ponto, existem duas dimensões. Uma é quantitativa:
estamos trabalhando muito fortemente para disponibilizar para os estados um
sistema informatizado. Alguns módulos já estão prontos, mas ainda não
podemos dizer que está funcionando a pleno vapor. Cada unidade prisional
teria um computador com esse software de gestão para termos um cadastro
exato de todos que participam das atividades educacionais. A previsão para que
isso comece a funcionar é 2007/2008. Por outro lado, há o monitoramento
qualitativo, que estamos fazendo através dos seminários, tentando formar uma
rede. Mas a gente sabe o trabalho que isso dá e a dificuldade que há por trás
disso.
A Educação Penitenciária deve ser oferecida em todas as unidades?
Incluindo os centros de detenção provisória e cadeias públicas?
A gente ainda não conseguiu enfrentar esse problema especificamente. No
sistema prisional, o sujeito entra e em tese deve ficar pouco tempo como preso
provisório, e então é julgado: ou é absolvido e sai ou é condenado e fica. Muitas
vezes ele pode ser condenado e continuar em liberdade. Mas a gente observa
que há uma distorção no país, muitas vezes a pessoa fica muito tempo como
preso provisório e nas unidades provisórias não existe estrutura para educação,
justamente porque ele deveria ficar pouco tempo. Mas essa não é uma questão
que a gente conseguiu enfrentar ainda. Por enquanto, queremos assegurar que
pelo menos nas unidades para presos condenados, a educação aconteça,
porque aí realmente é uma obrigação prevista em lei. Até hoje isso não
aconteceu, porque o nível de oferta é muito pequeno.
Como criar condições para que essa educação se realize plenamente? Por
que tão poucos alunos estudam?
Existe um problema de oferta: em muitos presídios não existe quem vá dar aula.
Existe esse problema crônico. Um caminho muito interessante seria a remição
da pena pelo estudo, seria um estímulo. Mas realmente sabemos que existe
limite para realizar direitos humanos na prisão. Não dá para conciliar direitos
humanos e prisão plenamente. Mas nossa tentativa é de esgarçar esse limite.
Como o senhor enxerga a oferta da educação formal e não­formal dentro
dos presídios?
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Mesmo a educação formal é muito improvisada. Tem muito preso que dá aula.
Num primeiro momento, isso não é um problema, mas deve estar articulado
com algo oficial, senão o sujeito está lá assistindo às aulas e depois sai sem
nenhum certificado. Claro que serve para algo, mas isso ainda não é cidadania.
E a educação para o trabalho? Vem sendo oferecida? Como articulá­la
com as demais atividades?
O próprio conceito de Educação de Jovens e Adultos dá abertura para que
trabalhemos com tudo isso de maneira articulada, parte do mesmo processo.
Nesse sentido a parceria com o MEC é muito salutar, nossa idéia é começar a
ampliar esse leque de parcerias, trazer outros órgãos, como o Ministério do
trabalho. Precisamos romper com esse modelo de fazer bola e pipa e inserir
educação profissionalizante mesmo. E também precisamos considerar mais as
atividades e políticas culturais. Inclusive precisamos reconhecer isso como
educação. Um grande desafio no caso de aprovado o projeto de lei da remição
pelo estudo é identificar o que vai ser considerado educação – qual vai ser a
posição do juiz quando o preso apresentar as horas que acumulou participando
de atividades culturais?
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