VIII SOBER Nordeste Novembro de 2013 Parnaíba- PI - Brasil A DINÂMICA DE (RE) ORGANIZAÇÃO DO BATATAN: UMA CONFLUÊNCIA INTERMUNICIPAL DO RECÔNCAVO BAIANO, UM LUGAR DE AGRICULTORES FAMILIARES Ivan dos Reis Cardoso (UNEB)Licenciado em Geografia, Mestre em Ciencias Agrarias pela UFBA, profesor Assistente da UNEB, atual doutorando em Difusão do Conhecimento - curso multinstitucional e multidiscplinar. VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / A DINÂMICA DE (RE) ORGANIZAÇÃO DO BATATAN: UMA CONFLUÊNCIA INTERMUNICIPAL DO RECÔNCAVO BAIANO, UM LUGAR DE AGRICULTORES FAMILIARES THE DYNAMICS OF (RE) ORGANIZATION OF BATATAN: A CONFLUENCE OF INTERMUNICIPAL RECÔNCAVO BAIANO, A PLACE OF FAMILY FARMERS Grupo de Pesquisa: NEDER RESUMO As atividades desenvolvidas pelos agrupamentos humanos vão produzindo, organizando e re-organizando a configuração do espaço, com especificidades e particularidades explicitas de acordo com os agentes e suas ações in loco. Independente da forma, a agricultura é uma importante atividade que tem relevante poder e capacidade de organizar e re-organizar as atividades e desenhar o espaço dando-lhe feições próprias, de acordo com o foco e a técnica utilizada para atribuir ao uso do solo notoriedade e importância econômica; por isso este estudo se justifica; uma pesquisa que busca entendimento das particularidades impressas na região do Batatan - uma confluência intermunicipal do Recôncavo Baiano, especificamente o encontro dos municípios de Cruz das Almas, Maragogipe, São Felipe e São Félix. O objetivo desse trabalho, em andamento, é identificar as formas e os fatores de (re) organização do espaço rural da citada localidade, área tipicamente de agricultores familiares. Pretende-se assim, identificar como se apresenta o processo de (re) organização local, a partir da analise da produção agropecuária, da configuração territorial e dos elementos de ocupação rural não essencialmente agrícola, bem como dos elementos exógenos implementados no local. Para atender a estes propósitos, o método de pesquisa utilizado tem sido o estudo de caso com análise bibliográfica e documental, e avaliação de observações a partir de visitas técnicas à região. Como aparato teórico, a base vem de SANTOS, M. (2001), EDUARDO, M. F.(2010) e QUEIROZ (2009), autores que abordam questões relativas à organização do espaço e da vida social; TEIXEIRA, E. C. (2002) especificamente sobre a ação das políticas públicas e ELIAS, D. (2003) com vistas sobre a globalização e agricultura; O recorte temporal de análise dos processos desenvolvidos neste local remota de uma década e meia, aproximadamente de 1995 até 2010, quando são 1 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / repensadas as formas de organização da produção local. Assim, entende-se que o conjunto de práticas desenvolvidas no campo, especialmente na confluência estudada, promove a configuração da paisagem, com poder de organização e reorganização, e esta é que irá garantir ao povo do local a identidade e peculiaridade espacial. Palavras-chave: Agricultura, familiar, reorganização. ABSTRACT The activities developed by the human groupings are producing, organizing and reorganizing the space configuration, with specificities and particularities according to explicit the agents and their actions on the spot. Independent of the way farming is an important activity that has relevant power and ability to organize and re-organize the activities and draw the space giving it its own identity, according to the focus and the technique used to assign to the land use and economic importance notoriety; that's why this study is justified; a survey that seeks understanding of the details printed on the Batatan region-a confluence of intermunicipal Recôncavo, specifically the municipalities of Cruz das Almas, Maragogipe, São Felipe and São Félix. The objective of this work in progress, is to identify the shapes and the factors of (re) organisation of rural areas of that locality, area typically family farmers. It is intended that way, identify as presenting the process of (re) local organization, from the analysis of agricultural production, and territorial configuration of the elements not primarily rural agricultural occupation, as well as the exogenous elements implemented on-site. To serve these purposes, the research method used has been the case study literature and documentary analysis, and evaluation of observations from technical visits to the region. As theoretical apparatus, the base comes from SANTOS, m. (2001), EDUARDO, m. f. (2010) and QIU (2009), authors who address issues relating to the organisation of space and of social life; TEIXEIRA, e. c. (2002) specifically on the actions of public policies and ELIAS, d. (2003) with views on globalization and agriculture; The timeframe of analysis of processes developed in this remote location of a decade and a half, from about 1995 until 2010, when it is reconsidered the forms of organization of local production. Thus, it is understood that the set of practices developed in the field, especially at the confluence studied, promotes the landscape setting, with power of organization and reorganization, and this is what will guarantee the people of local identity and uniqueness. Key words: Agriculture, family, reorganization. 2 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / 1. INTRODUÇÃO As atividades desenvolvidas pelos agrupamentos humanos, nos diferentes períodos históricos vão produzindo, organizando e re-organizando a configuração do espaço, com especificidades e particularidades explicitas de acordo com os agentes e suas ações in loco. Assim sempre foi com a agricultura, de modo amplo, desde o neolítico ou mais específico como, por exemplo, relacionando-se aos grandes ciclos, extrativista ou agrícolas do Brasil desde sua colonização, ou ainda observando os pequenos núcleos localizados pelas partes mais interiores do país. Independente de período e forma, a agricultura é uma importante atividade econômica que tem relevante capacidade de organizar e re-organizar o espaço, dando-lhe feições próprias em cada lugar; por isso este estudo se justifica, a busca de entendimento das particularidades impressas na região em que a pesquisa se desenvolve: no Batatan, uma confluência intermunicipal do Recôncavo Baiano, especificamente o encontro dos municípios de Cruz das Almas, Maragogipe, São Felipe e São Félix. O objetivo dessa pesquisa, em andamento, é identificar as formas de (re) organização do espaço rural dessa confluência intermunicipal, local de agricultores familiares. Pretende-se assim, identificar como se apresenta a (re) organização local, a partir da ocupação e uso do solo, no que se refere à produção agropecuária (produtos, método de produção e de trabalho, escoamento, etc.), à configuração territorial (dimensão das propriedades, as referências para a organização do ambiente físico, construídos e reveladores das formas que compõem o espaço), e aos elementos de ocupação rural não essencialmente agrícola. Para atender a estes propósitos, o método utilizado tem sido o estudo de caso com análise bibliográfica e documental, e avaliação de observações a partir de visitas técnicas ao local. Assim, entende-se que o conjunto de práticas desenvolvidas no campo, especialmente na confluência estudada, promove a configuração da paisagem e esta é que irá garantir ao povo do local a identidade e peculiaridade espacial. De acordo com os dados analisados fica evidente que as mudanças promovidas por diversos fatores atuantes no campo são vivenciadas pelos atores locais nos processos sócio-espaciais e observados empiricamente a partir dos novos arranjos revelados. As questões agrárias e seus desdobramentos vêem influindo decisivamente em todos os processos sociais do cenário rural, e também de aspectos das atividades urbanas, mormente aqueles que se referem à configuração das relações sociais e das paisagens do campo. O recorte temporal de analise dos processos desenvolvidos neste local remota de uma década e 3 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / meia, aproximadamente de 1995 quando são amplamente repensados, de modo coletivo, sobre as formas de organização da produção local e há a inserção de elementos, a priori exógenos, ao costumeiro modo de vida, produção e organização do povo residente. De acordo com SANTOS (1992), sobre a situação apresentada: No começo (...) cada grupo humano construía seu espaço de vida com as técnicas que inventava para tirar do seu pedaço de Natureza os elementos indispensáveis à sua própria sobrevivência. Organizando a produção, organizava a vida social e organizava o espaço, na medida de suas próprias forças, necessidades e desejos. A cada constelação de recursos correspondia a um modelo particular. (Santos, 1992, p. 97 in Eduardo, M. F., 2010, p.181) A análise em curso faz referência a experiências em marcha, processos (re) organizativos de lugares, nesta pesquisa o lugar é de produtores rurais originalmente pobres, policultores, essencialmente trabalhadores da agricultura familiar. Trata-se de um processo centrado na organização e desenvolvimento de alternativas que possuem particularidades, as quais, buscamos destacar, identificando efeitos, ainda que indiretos, do processo mais geral de globalização da economia, e de apontar especificidades de experiências organizativas, neste caso, uma história relativamente curta (16 anos), que pode remeter a reflexões críticas de natureza diversa. Não se pode esperar que o Batatan configure como uma área de economia fechada, como algumas áreas rurais em que viviam mais de 50% da população na década de 50 do século passado. Assim, lembra Jacques Lambert (1995, p.95) quando relata que num Brasil de 50 milhões de habitantes, apenas cerca de 12 milhões eram de fato consumidores. Podemos dizer que o Batatan está inserido num contexto de desenvolvimento e que o morador da confluência participa de uma dinâmica de produção que reflete no espaço suas interações com a cidade onde elementos não essencialmente agrícolas passam a fazer parte da paisagem. A esse respeito, Queiroz (2009, p.57) comenta: “A economia fechada é incompatível com o desenvolvimento econômico porque limita as ambições e os esforços dos trabalhadores exclusivamente à satisfação das necessidades familiares”. 4 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / Notadamente para se efetivar tais mudanças nas áreas interiores do país foram necessários a inserção de conhecimentos e instrumentos da ciência e tecnologia, de novos sistemas de produção, novas formas de relação social e melhor entendimentos e acesso aos mecanismos políticos ou políticas públicas a serviço da sociedade. Fora do alcance do sistema de assistencialismo do Estado, a saída é a instalação de mecanismos alternativos para garantia de melhoria de vida pela porta da expansão com desenvolvimento. As inserções de novos processos de produção, mesmo sendo exógenos, partem da necessidade interna de renovação e geralmente são viabilizados pela população local. Sobre este ponto, SANTOS evidencia a situação: Na verdade, o espaço geográfico considerado como uma porção bem delimitada do território é tanto o teatro das ações da sociedade local como das influências externas e até mesmo estrangeiras, cujo peso nem sempre é perceptível à primeira vista. (SANTOS, 2001, p.72) A região onde analisamos o processo de (re)organização espacial e das atividades insere-se numa área do Recôncavo da Bahia que, do ponto de vista estritamente físico, apresenta condições de potencialidade agrícola relativamente boas ou elevadas, quando compara-se com outras regiões brasileiras, e principalmente nordestinas, onde também predomina o padrão dominante da presença majoritária de agricultores pobres e familiares1. Pelas particularidades do local, esta pesquisa tem sido realizada a partir de um estudo de caso; desse modo garante abarcar a realidade do empírico. Para que isso se firmasse, inicialmente houve uma série de visitas ao campo, não para aplicação de técnica específica de investigação, mas para formar um conjunto de informações que eram agrupadas em compartimentos definidos para servir de aporte e orientar a coleta e análise posterior dos dados; estas visitas também serviram para se estabelecer um conhecimento mútuo entre o local pesquisado, seus atores e o pesquisador. 1 A conceituação do que sejam tais agricultores, implicaria uma longa discussão teórica. Sumariamente, entendese aqui tal figura com a do agricultor que fundamentalmente trabalha a terra com sua força de trabalho familiar; e constitui em essência um produtor policultor, que mantém uma inserção toda especial com o mercado. Nesta qualidade, frente a ele se colocam duas alternativas extremas: uma de capitalização, via tecnificação e integração com um sistema de mercado de tipo capitalista (seja ele em sua forma tradicional ou mesmo sob a forma cooperativista, do tipo dos complexos agroindustriais); a outra alternativa, com todas as variantes que possam vir a assumir, consiste no chamado processo de proletarização pelo qual uma parte da força de trabalho familiar, ou em casos extremos, o próprio chefe de família, se vê obrigada a temporariamente complementar seus rendimentos monetários via assalariamento, na própria região ou em regiões até distantes. 5 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / Com o envolvimento preestabelecido, iniciou-se a coleta de dados diretamente dos agricultores através da técnica de entrevista sobre o objeto e o local; utilizaram-se questões para coligir informações com cerca de 10 dez agricultores; anteriormente, em outra pesquisa foram entrevistados 27 agricultores cooperados e mesma quantidade, de agricultores nãocooperados; pela homogeneidade do grupo de agricultores entrevistado anteriormente, no maior número de variáveis, e pela maior importância na leitura sociológica que se pretendeu fazer, hoje, a quantidade de dez entrevistas serve para nosso propósito, principalmente porque a escolha dos agricultores se processou de forma aleatória. Deu-se maior importância à qualidade dos dados, sua consistência, e não a dados quantitativos; outras informações foram encontradas em registros ou fontes secundárias. 2. A CONFLUÊNCIA INTERMUNICIPAL DO RECÔNCAVO BAIANO: UM LUGAR DE AGRICULTORES FAMILIARES O entendimento da questão apresentada perpassa por uma descrição breve e sistemática do lugar considerado aqui fonte do processo analisado. O local guarda uma dinâmica com feições próprias, mas, mesclada pelas inter-relações com os elementos inseridos pelos moradores no intuito de garantir sobrevivência e permanência na terra; essa descrição sistemática permitirá contextualizar e identificar o objeto em estudo histórico e geográfico, uma possibilidade de visualizar o recorte espaço-temporal que se pretende estudar. A microrregião econômica do Recôncavo Sul situa-se na parte Centro-Oriental do Estado da Bahia; disposta nas proximidades do litoral, na área da Baía de Todos os Santos, no lado leste e com outras microrregiões nas demais laterais; partindo para o oeste há uma nítida mudança entre a vegetação de mata atlântica e a caatinga – pode-se considerar uma área de transição. Área situada na faixa climática intertropical, trás indício de condições favoráveis a todas as atividades que dependem dos fatores climáticos e pedológicos, bem como morfológicos, já que a área não possui terras em altitudes elevadas e recortadas. Em termos de extensões, a microrregião não é área de terras alargadas, possui em média 11 Km2, numa combinação de fatores e recursos que foram determinantes para a ocupação humana e exploração econômica, quer de subsistência ou atendendo aos ditames dos centros que imprimirão suas demandas desde a chegada dos europeus ibéricos. (ver mapa do local abaixo) 6 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / Rec ôncavo Sul 39° A R U AÇ GU Cabaceira do Paraguaçu Gov. Mangabeira R E . P A RE. LITORAL NORTE Sto. Amaro Cachoeira Murutiba São Félix Itatim 40° Sapeaçu Cruz das Almas Conceição do Almeida Maragogipe VA DO Castro Alves R Saubara Sta. Terezinha Dom Macêdo Costa Amargosa São Miguel das Matas DE Aratuípe Brejões PO Jaguaripe E Laje . ET S Jiquiriça O . D M U Mutuípe Ubaíra 13° RO R Nazaré A Sto.Antônio de Jesus Nova Itarana Salinas da Margarida Muniz Ferreira AN 13° Varzedo LIT Elísio Medrado SAL São Felipe Milagres E RE 40° E S T L R E I T O R A L L S U . 39° Cidade Limite municipal Limite regional Municípios envolvidos Área de estudo No centro desta microrregião, está o lugar da pesquisa, a confluência intermunicipal; ali alguns agricultores familiares se concentram e com ação decisiva, sobretudo na produção e organização do espaço geográfico, conferiram à região um caráter dinâmico, mas específico desse tipo de organização de produtores, não os isentando de relação com o espaço mais amplo, desde as feiras livres nos arredores do lugar, até ao comércio de exportação para grandes centros nacional e mundial. Sobre essa relação do local com o mundo, SANTOS (2001), faz referência: Cada lugar é, à sua maneira, o mundo. (...) Mas, irrecusavelmente imerso numa comunhão com também, o cada mundo, lugar, torna-se 7 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / exponencialmente diferente dos demais. A uma maior globalidade, corresponde uma maior individualidade. (SANTOS 2001, p.314) Quanto ao processo histórico dessa área, está intimamente ligado às relações econômicas desenvolvidas no Brasil, especificamente relacionado aos momentos dos ciclos de produção da história econômica do país, nesse caso, o ciclo da cana-de-açúcar e depois, em menor escala, o ciclo do fumo, que trouxe povoamento ao local, mas limitado pelo sistema colonial agro-exportador; com a crise contínua da produção de açúcar no local, as grandes propriedades começam a sofrer o retalhamento, fruto dos processos de heranças e venda de lotes, assim, historicamente as pequenas propriedades passaram a dominar a paisagem. A ocupação das propriedades, em termos de produção, passa pelas principais culturas exploradas na região, o maior destaque em área cultivada é para a mandioca e o inhame; a produção de mandioca é direcionada tanto para o consumo direto quanto para o mercado local e regional. Esta flexibilidade entre consumo e comércio é justamente o motivo que faz da mandioca o produto de maior expressividade na região. Além destes produtos pode-se observar ainda a presença marcante da cultura da laranja e do fumo nos municípios, tanto em área cultivada, quanto em quantidade produzida. A outra cultura marcante na região é a produção do inhame; são cerca de 1.000ha plantados temporariamente que coloca o Estado da Bahia como segundo produtor nacional da cultura, competindo apenas com a Paraíba2, principal produtor do país. Com menor destaque e respondendo à boa aptidão agrícola da região, são produzidas ainda outras culturas e criações, é o caso das culturas temporárias de milho, feijão, amendoim, e as criações de gado bovino e caprino ou ovino, além de criação de animais de pequeno porte como as aves – galinhas, criadas a soltas ou em pequenas granjas. Além das atividades agropecuárias há também as atividades não agrícolas inseridas nesta confluência. De modo geral, em todas as áreas rurais, estas atividades vêem elevando a taxa de crescimento contínuo e acelerado o desenvolvimento no meio rural, bem como uma melhor qualidade de vida com acesso, no campo, às atividades antes vistas como essencialmente urbanas; sobressaem os serviços de transportes, a comunicação, a administração pública, a prestação de serviços e a indústria de transformação. No Novo Rural Brasileiro, Graziano da Silva (2000) faz uma análise da realidade observada no Batatan - “Por tudo isso, já não se 2 Segundo o mesmo IBGE. 8 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / pode caracterizar mais o meio rural brasileiro como estritamente agrário”. (GRAZIANO DA SILVA, 2000, p.10). De acordo com os anuários estatísticos (a exemplo do Projeto Rurbano – 2000), nos anos subseqüentes da década de 90, a situação apresenta uma queda no número total da população economicamente ativa (PEA) agrícola, e elevação dos indicies no que se refere à população não-agrícola do meio rural. Vale ressaltar que as informações apresentadas são do Estado da Bahia como um todo e não foram divulgados dados da realidade local e nem foi feito pesquisa direta sobre esse tema, mas não deixa de ser um dado sistemático e importante para o estudo. 3. OS ELEMENTOS DE (RE) ORGANIZAÇÃO DO BATATAN 3.1 UMA COOPERATIVA NO BATATAN - UM ELEMENTO DIFERENCIADOR O retrato do cooperativismo que se pretende focar aqui não tem a intenção de ser amplo, mas, voltado para a experiência que ocorreu no Batatan. Da Inglaterra, o movimento se espalhou rapidamente por outros pontos da Europa e outras partes do mundo, causando transformações onde se instalava sempre estabelecendo sua visão apologética de um tipo de instituição capaz de transformar as bases estruturais da sociedade que já estava firmada no capitalismo. No entanto, nem tudo contribuía para a consolidação do movimento de cooperação mútua; contrapõem-se ao cooperativismo os elementos do capitalismo e das forças estatais. Um dos cientistas sociais do Brasil que avalia o cooperativismo, com trabalho significativo na década de 70 é MATO (1974), buscou evidenciar o poder reformador das cooperativas, principalmente junto aos agricultores familiares. No entanto, é comum entre este e outros autores a idéia de que a força de reformulação do cooperativismo provém de fatores locais, que poderão usar esse movimento como base de negociação e de forte poder de reivindicações. É válido lembrar que se o produtor direto ou agricultor familiar, ao cooperarse, não isenta de está a serviço do capital empresarial em suas relações comerciais, fato que ocorre com maior exposição, estando fora do cooperativismo. Por outro lado, não se pode rejeitar o curso de expansão que o movimento cooperativista trilhou em seu processo histórico. Existem experiências de cooperativas com sucesso, não isoladas do mercado, mas fora de serem subestimadas pela hegemonia dos paradigmas capitalistas. As cooperativas são usadas para competir, como que um sistema empresarial, há 9 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / associados resistindo à monopolização; outros casos, cooperativas tendem a uma organização na vertente da economia solidária, e, cooperativas, especialmente no Brasil, com a postura contraditória do Estado e com a fragilidade do movimento que promove em curto espaço de tempo uma ascensão e ocaso de instituições montadas, mas que trazem reflexão junto ao pessoal envolvido quanto ao processo de produção e relação social travada no local ou em outras escalas de relação. Há experiências voltadas aos agricultores familiares que revelam a busca pelas organizações para escaparem à reprodução simples dessa categoria de produtores rurais; é o caso da Cooperativa Agro-industrial do Recôncavo da Bahia que desde 1996 foi instalada na comunidade do Batatan, município de Maragogipe, abrangendo também povoados dos outros municípios de fronteira – Cruz das Almas, São Felipe e São Félix. A Cooperativa do Recôncavo pode ser classificada, segundo tipologia de RECH (2000, p.35), como de produção3, e quanto à função, pode ser classificada como funcional ou mista, neste caso, se dedica, além das atividades de produção, também às atividades de fornecer insumos necessários, viabilizar a assistência técnica e serviços de crédito diretamente ao produtor. Na área de comercialização, se propõe a transportar das propriedades até a sede da cooperativa, ao recebimento do produto, à limpeza, à classificação das raízes, ao armazenamento e à venda. Com isso os agricultores do local, passaram de fato às condições mais favoráveis para desenvolver as atividades da cadeia produtiva, no caso do inhame. A Cooperativa do Recôncavo, instalada numa área do Nordeste, desde que foi implantada, trouxe para os agricultores da região – especificamente os agricultores familiares, uma nova alternativa de sistema de trabalho. A decisão de fundar a cooperativa nessa região do Batatan partiu de um grupo de agricultores relativamente pequeno que se reuniam numa associação comunitária. Nestas reuniões, o que mais preocupava os agricultores eram as questões relativas ao financiamento rural para os pequenos produtores, a forma de comercialização feita por intermediários e o escoamento da produção. Com a criação da infra-estrutura mínima necessária para receber o produto, promover reuniões, armazenar insumos, etc., a cooperativa conseguia receptar e vender, na sua primeira safra (1997), 450 toneladas de inhame, no melhor preço do mercado, acima da oferta dos 3 São as cooperativas de alocação de produção: as que se dedicam à colocação de seus sócios dentro das melhores condições possíveis de preço, regularidade e segurança; destacam-se nesse tipo, principalmente as agropecuárias. 10 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / comerciantes “atravessadores” (intermediários) e com forma de pagamento à vista para o produtor; nesse caso, desapareceu a figura do ágio e dos prazos excessivamente longos, negociados por intermediários junto ao produtor. A referida cooperativa instalada no local, aumentou sensivelmente sua produção, chegando a um patamar cerca de 10 vezes mais a produção inicial e em mais de cinco vezes o número de associados, quando começa a declinar sua atuação tendendo a um estrangulamento das atividades. No entanto, como o foco dessa pesquisa é a re-organização espacial, esse fenômeno promovido pela cooperativa instalada na confluência vem a partir das mudanças em aspectos relacionados à produção local, por exemplo, como mudança no modo de produção a partir do acesso ao serviço de assistência técnica que tinha a finalidade de dar cobertura às necessidades de informação para as transformações que estavam ocorrendo no sistema de cultivo (ampliação da quantidade e melhoria da qualidade). A necessidade da assistência técnica junto aos produtores do local é evidente, uma vez que a tradição regional é de cultivo com técnicas rudimentares. Segundo a agente de atividade agropecuária encarregada pelo local, cerca de 20% da produção era perdida ou tinha seu valor depreciado somente no momento da colheita, com a produção danificada e rejeitada no mercado consumidor. Mesmo considerando a conjuntura desfavorável e a falta de tradição para o desenvolvimento do sistema cooperativista na região, a cooperativa instalada buscou romper com o perfil conservador do agricultor local. Este, em geral submisso, sempre tendendo a rejeição de mudanças estruturais, havendo ainda inclinação ao individualismo nos processos de produção e comercialização, ausência de cooperação nas atividades e desconhecimento da potencialidade das atividades do meio rural, com fracos laços de solidariedade, dependência de terceiros e desconhecimento, por vezes até total, do seu papel de cidadão. Todavia o objetivo central e o “modus operandi” da cooperativa esteve voltado para estimular e desenvolver especificamente a cultura do inhame, no entanto possuía um caráter comercial frágil perante esta cultura e, além disso, extremamente dependente de financiamento por parte de agentes intermediários. A ação da cooperativa, permitindo a tais agricultores, acesso direto ao crédito bancário oficial, associadamente a um trabalho de assistência técnica independente da ação dos agentes comerciais, contribuiu, e vem contribuindo, mesmo depois de desativada, para uma (re) organização local devido aos seguintes efeitos: 11 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI - / Instalação e atuação da cooperativa: mesmo com o curto período de atuação efetiva da cooperativa – menos de uma década, houve mudanças na forma de produção e relação social dos agricultores da confluência; - Predomínio da lavoura de inhame no local: Aumento progressivo e significativo das quantidades de inhame produzidos; - Conduta empresarial da cooperativa para promover competição direta com os agentes compradores tradicionais conhecidos como intermediários; - Comercialização a nível regional e exterior; a produção passa a ser comercializada para outros estados, principalmente do Nordeste e países da Europa; - Mudança nas técnicas de produção – para atender às exigências dos novos nichos de mercado. Certamente a cooperativa instalada no local promoveu mudanças significativas que ofereceu novas feições ao espaço do Batatan, entendendo aqui como um viés de reorganização espacial com atuação dos atores locais interrelacionando-se com atores externos. 3.2 COMERCIALIZAÇÃO O comércio para os agricultores familiares gira em torno da necessidade de completar o ciclo mercadoria-dinheiro-mercadoria. Não se trata aqui de comunidade auto-suficiente ou de comunidade que se limite a um ciclo menor, mercadoria-mercadoria. Malgrado a necessidade de consumo, o agricultor familiar vem orientando o produto excedente destinando ao mercado, por vezes, de modo bastante simples e direto, partindo de dentro da propriedade para o consumidor, para os centros de abastecimento e agroindústrias (geralmente pequenas); pode ser visto como um vínculo direto e modesto com o mercado ou via agentes intermediários; na maioria das vezes, a produção para o mercado é acompanhada com maior “proximidade” e pouco complexa. Pode-se dizer então que, quanto maior a integração do agricultor com o mercado, maior será a complexidade de sua orientação técnica. Como o nível tecnológico que cerca a maioria dos agricultores familiares é simples e o menos desenvolvido possível, a integração com o mercado, de modo mais amplo também é frágil, cheia de pontos de estrangulamento entre a produção e o consumidor final. Do modo como o agricultor familiar pode estruturar sua produção, existe a dificuldade na sua relação direta ao consumidor final ou à indústria de transformação; assim, a linha de contato com o consumidor final é fragmentada pelos intermediários e a parte mais próxima da 12 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / base, que são os produtores diretos, é a mais frágil, se refletem na impossibilidade de controles de preços, na incapacidade de armazenar, no baixo poder de negociação com o mercado. No caso da relação direta ao consumidor, o agricultor familiar se limita às feiras livres, às entregas a domicílio, às lojas ou mercados e restaurantes das cidades, mas essa parte de escoamento da produção é insignificante, visto a pequena quantidade que pode passar por este escoamento com relação ao número de agricultores familiares envolvidos no processo e a produção que juntos operacionalizam. Por outro lado, a produção individual de cada unidade não atende às demandas das firmas de comercialização e das indústrias de processamento. Essas empresas não têm interesse em fazer a captação da matéria-prima in loco em cada propriedade. Neste ponto é que os intermediários se consolidam, fazendo o controle dos preços, geralmente a menor margem, controlando também a oferta e concentrando a produção. Como o agricultor familiar não tem condições de relação direta com o consumidor, os comerciantes intermediários acabam por fazer o papel, tanto de receptor da mercadoria como do agente financeiro, assim expõem o agricultor ao perigo muito maior da dependência e possível expropriação do que pelos meios legítimos de financiamento e comercialização. Para o intermediário, é interessante sempre ter o produtor sob o seu controle; assim é possível determinar os preços, garantindo-lhes maior parcela de lucro. Foi por esses entraves que os agricultores da confluência começaram a articular meios de eliminar a participação do comerciante intermediário da relação comercial; a exemplo, podemos citar, a organização da própria cooperativa local e de outras associações que também aspiram ampliar o poder de negociação e competitividade do coletivo. Nesse sentido, com relação ao escoamento da produção, verificou-se que os agricultores se valiam das seguintes modalidades: venda pela cooperativa, via intermediários, diretamente ao consumidor, e formas mistas, ou seja, parte a intermediário e parte a cooperativa, ou ainda nas feiras livres. De acordo com os entrevistados, os fluxos de comércio se ampliaram nos últimos anos, diversificando o agente comprador, a forma de venda, o destino e o pagamento. De acordo com CARDOSO (2001), no caso dos agricultores cooperados, a venda ocorria preferencialmente pela cooperativa; são 63% desses agricultores que executavam seu escoamento via cooperativa; 26%, apesar de serem cooperados, ainda continuavam vendendo a produção a intermediários; 7% fazem um repasse misto, cooperativa e intermediário, e o restante, 4% não responderam à questão. Nesse aspecto surge um questionamento: porque a 13 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / quarta parte dos agricultores cooperados entrevistados, estão passando sua produção para agentes intermediários? A resposta mais comum ouvida desses agricultores foi justificar que, talvez por ainda não esteja com uma estrutura bem firmada, a cooperativa, em alguns momentos não conseguia absorver toda a produção da safra, ficando o agricultor exposto aos mecanismos de alterações dos preços, perda da qualidade do produto, armazenagem, riscos sazonais; por isso passavam a produção para os intermediários que estavam sem impedimentos para fazerem a captação do produto. Justificaram ainda, ao seu modo, que, se esperassem a cooperativa para absorver toda a produção, poderiam perder a oportunidade do momento de equilíbrio entre a oferta e a procura. Já que os comerciantes intermediários foram tão criticados anteriormente, como controlador de preços e das demandas, das colheitas das safras, etc., o que faz, então, os entrevistados, de modo geral, continuar a vender a estes agentes, já que a cooperativa esperava eliminá-los? Segundo agricultores dos dois subgrupos, citado pelo mesmo autor, com a chegada da cooperativa, os intermediários elevaram seus preços de compra, equiparando-os aos da cooperativa; esses agentes vendem seus produtos, na maioria das vezes, nas feiras livres dos grandes centros regionais, a um preço mais elevado que a cooperativa que só consegue preços mais elevados entregando a produção em empresas de comercialização – supermercados e exportadoras, por exemplo. Também, os intermediários têm transporte próprio, ou seja, não pagam a transportadores, como faz à cooperativa. E ainda, os intermediários não cobram taxas mantenedoras da instituição. Então, o risco da venda via intermediários se traduz de modo extremo ao não recebimento do pagamento, pois por essa via nem sempre há garantias, e há delongas no recebimento do valor pago. Um risco que os agricultores familiares continuaram expostos. Quanto às condições de venda, encontram-se três modalidades básicas e uma mista: à vista, a prazo, por contrato e a mista (parte à vista e parte a prazo). Dentre os não-cooperados, onde predominam as vendas para intermediários, 44,4% vendem a prazo, são 12 dos entrevistados na pesquisa de CARDOSO (2001). Nas vendas exclusivamente à vista, identificaram-se 33,3% dos casos, que vendem sob essa condição a intermediários, cooperativa e consumidor. 18,6% vendem tanto a vista quanto a prazo, e 3,7% dos entrevistados, não informou. Não se identificou nessa categoria a venda por contrato. Outro aspecto relacionado a comércio que se investigou, útil para analisar o grau de informação do agricultor a respeito do seu próprio produto, diz respeito ao destino final da 14 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / produção. Assim, os agricultores, das duas categorias, em sua maioria, conhecem o destino final da sua produção: são 77,7% dos entrevistados na pesquisa citada anteriormente, em geral, que informaram sobre os destinos citados; foram: Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Feira de Santana, Salvador, além de Alemanha e França. Já a produção de farinha, conforme indicaram os próprios agricultores, se destina mesmo é a mercados do próprio estado da Bahia, principalmente o mercado local dos municípios da confluência. Nos primeiros anos, após a implantação da cooperativa, ainda não havia nenhuma relação da produção local, da cooperativa ou não, com o mercado externo; no entanto, a partir do ano 2000, houve a efetivação da venda de pequena parte da produção para o mercado europeu, especificamente a França, e na negociação por parte da cooperativa, para o envio de novas remessas para outros países, a exemplo da Alemanha e Inglaterra. Segundo nota no Diário Oficial – Estado da Bahia (23 e 24 –09-2000, p.5), esse é um grupo de agricultores que extrapolam o mercado nordestino e efetivam vendas sem a participação de intermediários. Essa exportação de inhame significou para o produtor familiar uma grande oportunidade de expandir o mercado, no entanto, por sua estrutura econômica e necessidade de resposta ao mercado, bem mais rápido que a produção dos cooperados, e a capacidade da cooperativa desenvolver parcerias, a organização tende ao enfraquecimento. Para conseguir o padrão do produto para o mercado externo, o produtor necessitou se adequar às novas tecnologias, fruto de pesquisas, no processo produtivo, mas nem sempre acessível para a maioria dos agricultores, tanto na questão técnica quanto e tanto mais na questão cultural de aderir a determinadas mudanças. Nesse sentido, fica evidente a participação do comércio realizado pelos agricultores do Batatan como potencial de (re) organização do espaço local, com suas variações na forma de comercialização, nas relações para se comercializar, nos destinos dos produtos, nos procedimentos e adequações a exigências externas, tudo isso promovendo novas configurações no espaço e relações entre as pessoas. 3.3 RETALHAMENTO DOS LOTES Outro item que tem promovido uma modificação na região do Batatan, diz respeito a uma fragmentação dos lotes de imóveis dos proprietários locais. A região tem um histórico de ocupação antiga, junto com as primeiras áreas exploradas do Brasil, por sua localização 15 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / geográfica com certa proximidade em relação aos primeiros núcleos de ocupação do país. A ligação ocorria pela foz do rio Paraguaçu nas margens de Maragogipe que tem acesso à Baia de Todos os Santos e assim favorecia o escoamento da produção para o mercado de Salvador e mercado colonizador. As terras da confluência, ocupadas por agricultores que produziam principalmente alimentos da agricultura e das criações; com o tempo foi sendo retalhada e as culturas de subsistência e pastagens, mais recentemente o incremento de frutas cítricas e inhame passam a fazer parte da pauta de produtos cultivados e comercializados. Pela tabela 1 (abaixo), a análise revela um retrato da Bahia e da região pesquisada no que se refere à distribuição de terras e nela percebe-se a concentração das terras em grupos de agricultores não familiares ao passo que um grande número de estabelecimentos de agricultores familiares, tanto na Bahia quanto nos municípios que estão confluentes nesta área de estudo, repartem uma área em que as parcelas de cada propriedade tornam-se efetivamente menores. O fato do município de Maragogipe sobressair com relação aos demais, diz respeito ao tamanho do território, principalmente porque este é dotado de grande área rural e historicamente passou a ser mais isolado que os demais – pela posição geográfica com relação às vias de fluxo para escoamento da produção, que deixou de ser pelo porto e passou a ser pelas vias rodoviárias. Tabela 1 - Estabelecimento e área da agricultura familiar, segundo a Unidade da Federação (Bahia) e Municípios da confluência intermunicipal Unidades da Federação e Município Bahia Agricultura familiar Não familiar Lei nº 11.326 Estabele- Área Estabele- Área cimentos (ha) cimentos (ha) 665.831 9.955.563 95.697 19.224.996 Cruz das Almas 1.322 3.398 103 2.614 Maragogipe 4.192 14.043 183 8.910 São Felipe 2.653 10.454 203 6.485 900 4.406 91 4.317 São Félix Fonte: IBGE, Resultado do Censo 2010 A área de terra agricultável da categoria dos agricultores familiares, por serem de extensão insuficiente com relação ao número de trabalhadores e necessidade para garantir a 16 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / renda da família e assim manter as demandas essenciais, promove a busca continua destes agricultores por terras para utilizarem em suas atividades agrícolas. Um dos motivos que explicam ainda o arrendamento de terras para o cultivo neste local é a justificativa para os agricultores que junto com suas famílias necessitam de maiores áreas para o plantio mesmo fazendo o pastoreio de animais de médio e grande porte em terrenos não laborados com culturas para o consumo humano e com pastagens plantadas ou nativas na região. Além dessa falta de terras para os agricultores familiares da região do Batatan, e creio que seja prática comum em todo o Estado, há uma promoção de retalhamento (divisão) das propriedades e uma diversificação nas formas de propriedade e uso do solo, favorecendo de alguma forma a garantia de exploração e provimento das necessidades desses moradores locais. Os lotes são ordenados pelas estradas vicinais de fluxos da região, principalmente da estrada de ligação entre Cruz das Almas e Maragogipe; de acordo com Cardoso (2001) há na região uma predominância (98,5%) de pequenos ou mini-proprietários com pose jurídica da terra, fator que garante a manutenção e reprodução social da agricultura familiar. O fato de predominar na região pequenos proprietários diz respeito à divisão constante dos terrenos; foram identificados retalhamentos do tipo partilha dos lotes para herdeiros, venda e compra de lotes ou parte de lotes, doação por parte de familiares, isolamento de lotes para desenvolver atividades não agrícolas de atendimento comercial ou serviços. Desse modo, o habitat disperso linear comum no meio rural de pequenos proprietários, começa ganhar novas configurações do tipo apresentado por Wanderley (2009, p.266) como “coagular”, um pequeno aglomerado de casas, embora ainda disperso, mas bastante próximas uma das outras, tendendo ao que poderíamos chamar de “bairros rurais”. Ocorre nesse contexto, tanto um redimensionamento e configuração das terras quanto um novo contexto de relações sociais no meio rural, nesse caso no Batatan. O retalhamento constante dos lotes tem promovido uma nova configuração à região do Batatan e promovido uma re-organização do lugar. Com a aquisição de novos lotes os usuários passam a promover uma utilização de áreas com atividades e oferece assim ocupação e/ou ampliação da produção local. Com o retalhamento, formando-se ai pequenas áreas, há famílias que já não utilizam a terra como meio de produção e apenas como local de moradia e pequena roça para consumo próprio, dedicando-se com principal fonte de renda a venda da força de trabalho em outra propriedade ou instituição de serviço no local ou nas áreas urbanas mais próximas. 17 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / Além dos elementos apresentados como passíveis de mudanças e com poder de (re)organização da configuração espacial local estudados aqui: cooperativa, comércio e fragmentação dos lotes rurais há outros elementos a serem considerados e que necessitam de investigação mais sistemática e detalhada, como é o caso da inserção de elementos não agrícolas no Batatan, do planejamento de pavimentação da estrada que interliga Maragogipe e Cruz das Almas, a recente exploração de petróleo e gás natural no município de Maragogipe e a reativação de estaleiro da indústria naval, pontos para ampliação dos estudos da área e que exigem investigação mais complexa. 4. CONCLUSÃO Para a pesquisa em curso foi selecionada uma área no Recôncavo Sul da Bahia, abrangendo uma confluência de quatro municípios (Cruz das Almas, Maragogipe, São Felipe e São Félix) por ter sido identificado na referida região um processo organizativo e (re)organizativo de dinâmica peculiar a outras áreas da proximidade; trata-se de local com predominância de agricultores familiares, mas com especificidade particular, as quais fundamentamos essa pesquisa para verificar as referidas particularidades do processo de (re)organização desse local. Desde o início da investigação houve delimitação, tanto no espaço físico geográfico, quanto no momento histórico, no entanto, não se tem a pretensão de encerrar o estudo desse objeto neste foco, uma vez que o local já foi pesquisado com outros pontos relevantes, inclusive propostas que deu suporte a esta pesquisa. O estudo foi conduzido segundo metodologia pertinente, na expectativa de que a pesquisa conseguisse atender aos objetivos e preencher possíveis lacunas na bibliografia sobre o fenômeno identificado inicialmente e a inserção do local e atores, sob foco de análise científica. Na verdade o estudo buscou contribuição para entendimento da questão e representou de certo modo um desafio, tanto pelas divergências de opiniões já formadas, a respeito dos conceitos utilizados (organização, lugar, região, agricultura familiar) quanto pela falta de informações oficiais especificas sobre a região. Nessa análise, a agricultura familiar atual, é definida, enquanto exploração onde os fatores de produção estão intimamente relacionados à família. Esse é um conceito genérico e consensual, formulado a partir de um conjunto de variáveis, exatamente contraposto à 18 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / agricultura patronal. Já região, lugar e organização passaram pela análise da epistemologia da Geografia enquanto conceitos genéricos de categorias utilizadas para estudar fenômenos de ciências com fronteiras com a própria Geografia, assim o estudo não deteve o foco sob a construção teórica e sim sobre os aspectos que favorecem a uma (re)organização do local estudado. Do exame detido nas considerações desenvolvidas com o referencial teórico, comparados com certos elementos críticos, de aspectos gerais, conduzem a uma reflexão crítica acerca do papel fundamental que a cooperativa do Batatan, o comércio e a fragmentação dos lotes possuem frente ao poder de organizar e re-organizar a configuração da região e as relações entre os atores do lugar característico de agricultores familiares. É necessário observar, entretanto, que a cooperativa em sua curta atuação direta no local, o comércio, a fragmentação dos lotes não estão sendo vistos aqui como uniformes, restritos e decisivos na (re) organização da região de confluência; tantos outros elementos podem ser identificados atualmente, como outros podem surgir e tornarem-se relevantes em todo e qualquer processo de transformação local, assim é que de fato este trabalho não cessa a condição de continuidade, porquanto não cessa a necessidade criativa e demanda humana pelas de mudanças de padrões e materiais. Assim, os locais típicos de agricultura familiar, como é o caso da confluência intermunicipal do Batatan, em suas relações espacial-sócio-econômicas, vêm se revelando como fenômeno extremamente complexo e dinâmico. A contribuição maior dessa pesquisa foi salientar esse tema, para que possa ser mais amplamente investigado. 5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA CARDOSO, I. R., A dinâmica da agricultura familiar numa área do recôncavo sul da Bahia: Um estudo de caso. Cruz das Almas: UFBA, 2001 ELIAS, D., Globalização e agricultura. São Paulo: Edusp, 2003 Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE. Levantamento da Produção Agrícola. Rio de Janeiro: 2010. GRAZIANO da SILVA, J., CAMPANHOLA, C. O novo rural brasileiro: uma análise estadual – Nordeste. São Paulo: UNICAMP, 2000. 19 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste VIII SOBER Nordeste Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural Parnaíba – PI / MATO, M. A. A cooperativa agrícola na dinâmica social. Caderno do CEAS, Salvador: v.33, n.61, set./out., 1974. QUEIROZ, M. I. P., Uma categoria rural esquecida. São Paulo: UNESP, 2009 RECH. Cooperativas: uma alternativa de organização popular. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. SANTOS, M. 1992, in EDUARDO, M. F. Geografia agrária, território e desenvolvimento. São Paulo: Expressão Popular, 2010. ___________, A natureza do espaço. São Paulo: Edusp, 2001. TEIXEIRA, E. C., O papel das políticas públicas no desenvolvimento local e na transformação da realidade. São Paulo: AATR, 2002. WANDERLEY, M. N. B. O mundo rural como um espaço de vida. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2009. 20 Parnaíba, 06 a 08 de novembro de 2013, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural – VIII SOBER Nordeste