VIII SOBER Nordeste
Novembro de 2013
Parnaíba- PI - Brasil
A DINÂMICA DE (RE) ORGANIZAÇÃO DO BATATAN: UMA CONFLUÊNCIA INTERMUNICIPAL
DO RECÔNCAVO BAIANO, UM LUGAR DE AGRICULTORES FAMILIARES
Ivan dos Reis Cardoso (UNEB)Licenciado em Geografia, Mestre em Ciencias Agrarias pela UFBA, profesor
Assistente da UNEB, atual doutorando em Difusão do Conhecimento - curso multinstitucional e multidiscplinar.
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Pluralidades Econômicas, Sociais e Ambientais: interações para reinventar o Nordeste rural
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A DINÂMICA DE (RE) ORGANIZAÇÃO DO BATATAN: UMA CONFLUÊNCIA
INTERMUNICIPAL DO RECÔNCAVO BAIANO, UM LUGAR DE
AGRICULTORES FAMILIARES
THE DYNAMICS OF (RE) ORGANIZATION OF BATATAN: A CONFLUENCE OF
INTERMUNICIPAL RECÔNCAVO BAIANO, A PLACE OF FAMILY FARMERS
Grupo de Pesquisa: NEDER
RESUMO
As atividades desenvolvidas pelos agrupamentos humanos vão produzindo,
organizando e re-organizando a configuração do espaço, com especificidades e
particularidades explicitas de acordo com os agentes e suas ações in loco. Independente da
forma, a agricultura é uma importante atividade que tem relevante poder e capacidade de
organizar e re-organizar as atividades e desenhar o espaço dando-lhe feições próprias, de
acordo com o foco e a técnica utilizada para atribuir ao uso do solo notoriedade e importância
econômica; por isso este estudo se justifica; uma pesquisa que busca entendimento das
particularidades impressas na região do Batatan - uma confluência intermunicipal do
Recôncavo Baiano, especificamente o encontro dos municípios de Cruz das Almas,
Maragogipe, São Felipe e São Félix. O objetivo desse trabalho, em andamento, é identificar as
formas e os fatores de (re) organização do espaço rural da citada localidade, área tipicamente
de agricultores familiares. Pretende-se assim, identificar como se apresenta o processo de (re)
organização local, a partir da analise da produção agropecuária, da configuração territorial e
dos elementos de ocupação rural não essencialmente agrícola, bem como dos elementos
exógenos implementados no local. Para atender a estes propósitos, o método de pesquisa
utilizado tem sido o estudo de caso com análise bibliográfica e documental, e avaliação de
observações a partir de visitas técnicas à região. Como aparato teórico, a base vem de
SANTOS, M. (2001), EDUARDO, M. F.(2010) e QUEIROZ (2009), autores que abordam
questões relativas à organização do espaço e da vida social; TEIXEIRA, E. C. (2002)
especificamente sobre a ação das políticas públicas e ELIAS, D. (2003) com vistas sobre a
globalização e agricultura;
O recorte temporal de análise dos processos desenvolvidos neste
local remota de uma década e meia, aproximadamente de 1995 até 2010, quando são
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repensadas as formas de organização da produção local. Assim, entende-se que o conjunto de
práticas desenvolvidas no campo, especialmente na confluência estudada, promove a
configuração da paisagem, com poder de organização e reorganização, e esta é que irá
garantir ao povo do local a identidade e peculiaridade espacial.
Palavras-chave: Agricultura, familiar, reorganização.
ABSTRACT
The activities developed by the human groupings are producing, organizing and reorganizing the space configuration, with specificities and particularities according to explicit
the agents and their actions on the spot. Independent of the way farming is an important
activity that has relevant power and ability to organize and re-organize the activities and draw
the space giving it its own identity, according to the focus and the technique used to assign to
the land use and economic importance notoriety; that's why this study is justified; a survey
that seeks understanding of the details printed on the Batatan region-a confluence of
intermunicipal Recôncavo, specifically the municipalities of Cruz das Almas, Maragogipe,
São Felipe and São Félix. The objective of this work in progress, is to identify the shapes and
the factors of (re) organisation of rural areas of that locality, area typically family farmers. It
is intended that way, identify as presenting the process of (re) local organization, from the
analysis of agricultural production, and territorial configuration of the elements not primarily
rural agricultural occupation, as well as the exogenous elements implemented on-site. To
serve these purposes, the research method used has been the case study literature and
documentary analysis, and evaluation of observations from technical visits to the region. As
theoretical apparatus, the base comes from SANTOS, m. (2001), EDUARDO, m. f. (2010)
and QIU (2009), authors who address issues relating to the organisation of space and of social
life; TEIXEIRA, e. c. (2002) specifically on the actions of public policies and ELIAS, d.
(2003) with views on globalization and agriculture; The timeframe of analysis of processes
developed in this remote location of a decade and a half, from about 1995 until 2010, when it
is reconsidered the forms of organization of local production. Thus, it is understood that the
set of practices developed in the field, especially at the confluence studied, promotes the
landscape setting, with power of organization and reorganization, and this is what will
guarantee the people of local identity and uniqueness.
Key words: Agriculture, family, reorganization.
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1. INTRODUÇÃO
As atividades desenvolvidas pelos agrupamentos humanos, nos diferentes períodos
históricos vão produzindo, organizando e re-organizando a configuração do espaço, com
especificidades e particularidades explicitas de acordo com os agentes e suas ações in loco.
Assim sempre foi com a agricultura, de modo amplo, desde o neolítico ou mais específico
como, por exemplo, relacionando-se aos grandes ciclos, extrativista ou agrícolas do Brasil
desde sua colonização, ou ainda observando os pequenos núcleos localizados pelas partes
mais interiores do país. Independente de período e forma, a agricultura é uma importante
atividade econômica que tem relevante capacidade de organizar e re-organizar o espaço,
dando-lhe feições próprias em cada lugar; por isso este estudo se justifica, a busca de
entendimento das particularidades impressas na região em que a pesquisa se desenvolve: no
Batatan, uma confluência intermunicipal do Recôncavo Baiano, especificamente o encontro
dos municípios de Cruz das Almas, Maragogipe, São Felipe e São Félix. O objetivo dessa
pesquisa, em andamento, é identificar as formas de (re) organização do espaço rural dessa
confluência intermunicipal, local de agricultores familiares. Pretende-se assim, identificar
como se apresenta a (re) organização local, a partir da ocupação e uso do solo, no que se
refere à produção agropecuária (produtos, método de produção e de trabalho, escoamento,
etc.), à configuração territorial (dimensão das propriedades, as referências para a organização
do ambiente físico, construídos e reveladores das formas que compõem o espaço), e aos
elementos de ocupação rural não essencialmente agrícola. Para atender a estes propósitos, o
método utilizado tem sido o estudo de caso com análise bibliográfica e documental, e
avaliação de observações a partir de visitas técnicas ao local. Assim, entende-se que o
conjunto de práticas desenvolvidas no campo, especialmente na confluência estudada,
promove a configuração da paisagem e esta é que irá garantir ao povo do local a identidade e
peculiaridade espacial. De acordo com os dados analisados fica evidente que as mudanças
promovidas por diversos fatores atuantes no campo são vivenciadas pelos atores locais nos
processos sócio-espaciais e observados empiricamente a partir dos novos arranjos revelados.
As questões agrárias e seus desdobramentos vêem influindo decisivamente em todos
os processos sociais do cenário rural, e também de aspectos das atividades urbanas, mormente
aqueles que se referem à configuração das relações sociais e das paisagens do campo. O
recorte temporal de analise dos processos desenvolvidos neste local remota de uma década e
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meia, aproximadamente de 1995 quando são amplamente repensados, de modo coletivo, sobre
as formas de organização da produção local e há a inserção de elementos, a priori exógenos,
ao costumeiro modo de vida, produção e organização do povo residente. De acordo com
SANTOS (1992), sobre a situação apresentada:
No começo (...) cada grupo humano construía seu espaço de vida com as
técnicas que inventava para tirar do seu pedaço de Natureza os elementos
indispensáveis à sua própria sobrevivência. Organizando a produção,
organizava a vida social e organizava o espaço, na medida de suas próprias
forças, necessidades e desejos. A cada constelação de recursos correspondia a
um modelo particular. (Santos, 1992, p. 97 in Eduardo, M. F., 2010, p.181)
A análise em curso faz referência a experiências em marcha, processos (re)
organizativos de lugares, nesta pesquisa o lugar é de produtores rurais originalmente pobres,
policultores, essencialmente trabalhadores da agricultura familiar. Trata-se de um processo
centrado na organização e desenvolvimento de alternativas que possuem particularidades, as
quais, buscamos destacar, identificando efeitos, ainda que indiretos, do processo mais geral de
globalização da economia, e de apontar especificidades de experiências organizativas, neste
caso, uma história relativamente curta (16 anos), que pode remeter a reflexões críticas de
natureza diversa.
Não se pode esperar que o Batatan configure como uma área de economia fechada,
como algumas áreas rurais em que viviam mais de 50% da população na década de 50 do
século passado. Assim, lembra Jacques Lambert (1995, p.95) quando relata que num Brasil de
50 milhões de habitantes, apenas cerca de 12 milhões eram de fato consumidores. Podemos
dizer que o Batatan está inserido num contexto de desenvolvimento e que o morador da
confluência participa de uma dinâmica de produção que reflete no espaço suas interações com
a cidade onde elementos não essencialmente agrícolas passam a fazer parte da paisagem. A
esse respeito, Queiroz (2009, p.57) comenta: “A economia fechada é incompatível com o
desenvolvimento econômico porque limita as ambições e os esforços dos trabalhadores
exclusivamente à satisfação das necessidades familiares”.
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Notadamente para se efetivar tais mudanças nas áreas interiores do país foram necessários
a inserção de conhecimentos e instrumentos da ciência e tecnologia, de novos sistemas de
produção, novas formas de relação social e melhor entendimentos e acesso aos mecanismos
políticos ou políticas públicas a serviço da sociedade.
Fora do alcance do sistema de assistencialismo do Estado, a saída é a instalação de
mecanismos alternativos para garantia de melhoria de vida pela porta da expansão com
desenvolvimento. As inserções de novos processos de produção, mesmo sendo exógenos,
partem da necessidade interna de renovação e geralmente são viabilizados pela população
local. Sobre este ponto, SANTOS evidencia a situação:
Na verdade, o espaço geográfico considerado como uma porção bem
delimitada do território é tanto o teatro das ações da sociedade local como das
influências externas e até mesmo estrangeiras, cujo peso nem sempre é
perceptível à primeira vista. (SANTOS, 2001, p.72)
A região onde analisamos o processo de (re)organização espacial e das atividades
insere-se numa área do Recôncavo da Bahia que, do ponto de vista estritamente físico,
apresenta condições de potencialidade agrícola relativamente boas ou elevadas, quando
compara-se com outras regiões brasileiras, e principalmente nordestinas, onde também
predomina o padrão dominante da presença majoritária de agricultores pobres e familiares1.
Pelas particularidades do local, esta pesquisa tem sido realizada a partir de um estudo de
caso; desse modo garante abarcar a realidade do empírico. Para que isso se firmasse,
inicialmente houve uma série de visitas ao campo, não para aplicação de técnica específica de
investigação, mas para formar um conjunto de informações que eram agrupadas em
compartimentos definidos para servir de aporte e orientar a coleta e análise posterior dos
dados; estas visitas também serviram para se estabelecer um conhecimento mútuo entre o
local pesquisado, seus atores e o pesquisador.
1
A conceituação do que sejam tais agricultores, implicaria uma longa discussão teórica. Sumariamente, entendese aqui tal figura com a do agricultor que fundamentalmente trabalha a terra com sua força de trabalho familiar; e
constitui em essência um produtor policultor, que mantém uma inserção toda especial com o mercado. Nesta
qualidade, frente a ele se colocam duas alternativas extremas: uma de capitalização, via tecnificação e integração
com um sistema de mercado de tipo capitalista (seja ele em sua forma tradicional ou mesmo sob a forma
cooperativista, do tipo dos complexos agroindustriais); a outra alternativa, com todas as variantes que possam vir
a assumir, consiste no chamado processo de proletarização pelo qual uma parte da força de trabalho familiar, ou
em casos extremos, o próprio chefe de família, se vê obrigada a temporariamente complementar seus
rendimentos monetários via assalariamento, na própria região ou em regiões até distantes.
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Com o envolvimento preestabelecido, iniciou-se a coleta de dados diretamente dos
agricultores através da técnica de entrevista sobre o objeto e o local; utilizaram-se questões
para coligir informações com cerca de 10 dez agricultores; anteriormente, em outra pesquisa
foram entrevistados 27 agricultores cooperados e mesma quantidade, de agricultores nãocooperados; pela homogeneidade do grupo de agricultores entrevistado anteriormente, no
maior número de variáveis, e pela maior importância na leitura sociológica que se pretendeu
fazer, hoje, a quantidade de dez entrevistas serve para nosso propósito, principalmente porque
a escolha dos agricultores se processou de forma aleatória. Deu-se maior importância à
qualidade dos dados, sua consistência, e não a dados quantitativos; outras informações foram
encontradas em registros ou fontes secundárias.
2. A CONFLUÊNCIA INTERMUNICIPAL DO RECÔNCAVO BAIANO: UM
LUGAR DE AGRICULTORES FAMILIARES
O entendimento da questão apresentada perpassa por uma descrição breve e sistemática do
lugar considerado aqui fonte do processo analisado. O local guarda uma dinâmica com feições
próprias, mas, mesclada pelas inter-relações com os elementos inseridos pelos moradores no
intuito de garantir sobrevivência e permanência na terra; essa descrição sistemática permitirá
contextualizar e identificar o objeto em estudo histórico e geográfico, uma possibilidade de
visualizar o recorte espaço-temporal que se pretende estudar.
A microrregião econômica do Recôncavo Sul situa-se na parte Centro-Oriental do Estado
da Bahia; disposta nas proximidades do litoral, na área da Baía de Todos os Santos, no lado
leste e com outras microrregiões nas demais laterais; partindo para o oeste há uma nítida
mudança entre a vegetação de mata atlântica e a caatinga – pode-se considerar uma área de
transição. Área situada na faixa climática intertropical, trás indício de condições favoráveis a
todas as atividades que dependem dos fatores climáticos e pedológicos, bem como
morfológicos, já que a área não possui terras em altitudes elevadas e recortadas. Em termos de
extensões, a microrregião não é área de terras alargadas, possui em média 11 Km2, numa
combinação de fatores e recursos que foram determinantes para a ocupação humana e
exploração econômica, quer de subsistência ou atendendo aos ditames dos centros que
imprimirão suas demandas desde a chegada dos europeus ibéricos. (ver mapa do local abaixo)
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Rec ôncavo Sul
39°
A
R
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AÇ
GU
Cabaceira do
Paraguaçu Gov. Mangabeira
R
E
.
P
A
RE. LITORAL
NORTE
Sto. Amaro
Cachoeira
Murutiba
São Félix
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40°
Sapeaçu
Cruz das
Almas
Conceição do
Almeida
Maragogipe
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Castro Alves
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Saubara
Sta. Terezinha
Dom Macêdo
Costa
Amargosa
São Miguel das
Matas
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Jiquiriça
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Mutuípe
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Nazaré
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Jesus
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Margarida
Muniz
Ferreira
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13°
Varzedo
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Elísio
Medrado
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São Felipe
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39°
Cidade
Limite municipal
Limite regional
Municípios envolvidos
Área de estudo
No centro desta microrregião, está o lugar da pesquisa, a confluência intermunicipal; ali
alguns agricultores familiares se concentram e com ação decisiva, sobretudo na produção e
organização do espaço geográfico, conferiram à região um caráter dinâmico, mas específico
desse tipo de organização de produtores, não os isentando de relação com o espaço mais
amplo, desde as feiras livres nos arredores do lugar, até ao comércio de exportação para
grandes centros nacional e mundial. Sobre essa relação do local com o mundo, SANTOS
(2001), faz referência:
Cada lugar é, à sua maneira, o mundo. (...) Mas,
irrecusavelmente imerso numa comunhão com
também,
o
cada
mundo,
lugar,
torna-se
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exponencialmente diferente dos demais. A uma maior globalidade,
corresponde uma maior individualidade.
(SANTOS 2001, p.314)
Quanto ao processo histórico dessa área, está intimamente ligado às relações econômicas
desenvolvidas no Brasil, especificamente relacionado aos momentos dos ciclos de produção
da história econômica do país, nesse caso, o ciclo da cana-de-açúcar e depois, em menor
escala, o ciclo do fumo, que trouxe povoamento ao local, mas limitado pelo sistema colonial
agro-exportador; com a crise contínua da produção de açúcar no local, as grandes
propriedades começam a sofrer o retalhamento, fruto dos processos de heranças e venda de
lotes, assim, historicamente as pequenas propriedades passaram a dominar a paisagem.
A ocupação das propriedades, em termos de produção, passa pelas principais culturas
exploradas na região, o maior destaque em área cultivada é para a mandioca e o inhame; a
produção de mandioca é direcionada tanto para o consumo direto quanto para o mercado local
e regional. Esta flexibilidade entre consumo e comércio é justamente o motivo que faz da
mandioca o produto de maior expressividade na região. Além destes produtos pode-se
observar ainda a presença marcante da cultura da laranja e do fumo nos municípios, tanto em
área cultivada, quanto em quantidade produzida. A outra cultura marcante na região é a
produção do inhame; são cerca de 1.000ha plantados temporariamente que coloca o Estado da
Bahia como segundo produtor nacional da cultura, competindo apenas com a Paraíba2,
principal produtor do país.
Com menor destaque e respondendo à boa aptidão agrícola da região, são produzidas
ainda outras culturas e criações, é o caso das culturas temporárias de milho, feijão, amendoim,
e as criações de gado bovino e caprino ou ovino, além de criação de animais de pequeno porte
como as aves – galinhas, criadas a soltas ou em pequenas granjas.
Além das atividades agropecuárias há também as atividades não agrícolas inseridas nesta
confluência. De modo geral, em todas as áreas rurais, estas atividades vêem elevando a taxa
de crescimento contínuo e acelerado o desenvolvimento no meio rural, bem como uma melhor
qualidade de vida com acesso, no campo, às atividades antes vistas como essencialmente
urbanas; sobressaem os serviços de transportes, a comunicação, a administração pública, a
prestação de serviços e a indústria de transformação. No Novo Rural Brasileiro, Graziano da
Silva (2000) faz uma análise da realidade observada no Batatan - “Por tudo isso, já não se
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Segundo o mesmo IBGE.
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pode caracterizar mais o meio rural brasileiro como estritamente agrário”. (GRAZIANO
DA SILVA, 2000, p.10).
De acordo com os anuários estatísticos (a exemplo do Projeto Rurbano – 2000), nos anos
subseqüentes da década de 90, a situação apresenta uma queda no número total da população
economicamente ativa (PEA) agrícola, e elevação dos indicies no que se refere à população
não-agrícola do meio rural. Vale ressaltar que as informações apresentadas são do Estado da
Bahia como um todo e não foram divulgados dados da realidade local e nem foi feito pesquisa
direta sobre esse tema, mas não deixa de ser um dado sistemático e importante para o estudo.
3. OS ELEMENTOS DE (RE) ORGANIZAÇÃO DO BATATAN
3.1 UMA COOPERATIVA NO BATATAN - UM ELEMENTO DIFERENCIADOR
O retrato do cooperativismo que se pretende focar aqui não tem a intenção de ser amplo,
mas, voltado para a experiência que ocorreu no Batatan. Da Inglaterra, o movimento se
espalhou rapidamente por outros pontos da Europa e outras partes do mundo, causando
transformações onde se instalava sempre estabelecendo sua visão apologética de um tipo de
instituição capaz de transformar as bases estruturais da sociedade que já estava firmada no
capitalismo. No entanto, nem tudo contribuía para a consolidação do movimento de
cooperação mútua; contrapõem-se ao cooperativismo os elementos do capitalismo e das
forças estatais.
Um dos cientistas sociais do Brasil que avalia o cooperativismo, com trabalho
significativo na década de 70 é MATO (1974), buscou evidenciar o poder reformador das
cooperativas, principalmente junto aos agricultores familiares. No entanto, é comum entre
este e outros autores a idéia de que a força de reformulação do cooperativismo provém de
fatores locais, que poderão usar esse movimento como base de negociação e de forte poder de
reivindicações. É válido lembrar que se o produtor direto ou agricultor familiar, ao cooperarse, não isenta de está a serviço do capital empresarial em suas relações comerciais, fato que
ocorre com maior exposição, estando fora do cooperativismo.
Por outro lado, não se pode rejeitar o curso de expansão que o movimento cooperativista
trilhou em seu processo histórico. Existem experiências de cooperativas com sucesso, não
isoladas do mercado, mas fora de serem subestimadas pela hegemonia dos paradigmas
capitalistas. As cooperativas são usadas para competir, como que um sistema empresarial, há
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associados resistindo à monopolização; outros casos, cooperativas tendem a uma organização
na vertente da economia solidária, e, cooperativas, especialmente no Brasil, com a postura
contraditória do Estado e com a fragilidade do movimento que promove em curto espaço de
tempo uma ascensão e ocaso de instituições montadas, mas que trazem reflexão junto ao
pessoal envolvido quanto ao processo de produção e relação social travada no local ou em
outras escalas de relação.
Há experiências voltadas aos agricultores familiares que revelam a busca pelas
organizações para escaparem à reprodução simples dessa categoria de produtores rurais; é o
caso da Cooperativa Agro-industrial do Recôncavo da Bahia que desde 1996 foi instalada na
comunidade do Batatan, município de Maragogipe, abrangendo também povoados dos outros
municípios de fronteira – Cruz das Almas, São Felipe e São Félix. A Cooperativa do
Recôncavo pode ser classificada, segundo tipologia de RECH (2000, p.35), como de
produção3, e quanto à função, pode ser classificada como funcional ou mista, neste caso, se
dedica, além das atividades de produção, também às atividades de fornecer insumos
necessários, viabilizar a assistência técnica e serviços de crédito diretamente ao produtor. Na
área de comercialização, se propõe a transportar das propriedades até a sede da cooperativa,
ao recebimento do produto, à limpeza, à classificação das raízes, ao armazenamento e à
venda. Com isso os agricultores do local, passaram de fato às condições mais favoráveis para
desenvolver as atividades da cadeia produtiva, no caso do inhame.
A Cooperativa do Recôncavo, instalada numa área do Nordeste, desde que foi implantada,
trouxe para os agricultores da região – especificamente os agricultores familiares, uma nova
alternativa de sistema de trabalho. A decisão de fundar a cooperativa nessa região do Batatan
partiu de um grupo de agricultores relativamente pequeno que se reuniam numa associação
comunitária. Nestas reuniões, o que mais preocupava os agricultores eram as questões
relativas ao financiamento rural para os pequenos produtores, a forma de comercialização
feita por intermediários e o escoamento da produção.
Com a criação da infra-estrutura mínima necessária para receber o produto, promover
reuniões, armazenar insumos, etc., a cooperativa conseguia receptar e vender, na sua primeira
safra (1997), 450 toneladas de inhame, no melhor preço do mercado, acima da oferta dos
3
São as cooperativas de alocação de produção: as que se dedicam à colocação de seus sócios dentro das
melhores condições possíveis de preço, regularidade e segurança; destacam-se nesse tipo, principalmente as
agropecuárias.
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comerciantes “atravessadores” (intermediários) e com forma de pagamento à vista para o
produtor; nesse caso, desapareceu a figura do ágio e dos prazos excessivamente longos,
negociados por intermediários junto ao produtor. A referida cooperativa instalada no local,
aumentou sensivelmente sua produção, chegando a um patamar cerca de 10 vezes mais a
produção inicial e em mais de cinco vezes o número de associados, quando começa a declinar
sua atuação tendendo a um estrangulamento das atividades.
No entanto, como o foco dessa pesquisa é a re-organização espacial, esse fenômeno
promovido pela cooperativa instalada na confluência vem a partir das mudanças em aspectos
relacionados à produção local, por exemplo, como mudança no modo de produção a partir do
acesso ao serviço de assistência técnica que tinha a finalidade de dar cobertura às
necessidades de informação para as transformações que estavam ocorrendo no sistema de
cultivo (ampliação da quantidade e melhoria da qualidade). A necessidade da assistência
técnica junto aos produtores do local é evidente, uma vez que a tradição regional é de cultivo
com técnicas rudimentares. Segundo a agente de atividade agropecuária encarregada pelo
local, cerca de 20% da produção era perdida ou tinha seu valor depreciado somente no
momento da colheita, com a produção danificada e rejeitada no mercado consumidor.
Mesmo considerando a conjuntura desfavorável e a falta de tradição para o
desenvolvimento do sistema cooperativista na região, a cooperativa instalada buscou romper
com o perfil conservador do agricultor local. Este, em geral submisso, sempre tendendo a
rejeição de mudanças estruturais, havendo ainda inclinação ao individualismo nos processos
de produção e comercialização, ausência de cooperação nas atividades e desconhecimento da
potencialidade das atividades do meio rural, com fracos laços de solidariedade, dependência
de terceiros e desconhecimento, por vezes até total, do seu papel de cidadão.
Todavia o objetivo central e o “modus operandi” da cooperativa esteve voltado para
estimular e desenvolver especificamente a cultura do inhame, no entanto possuía um caráter
comercial frágil perante esta cultura e, além disso, extremamente dependente de
financiamento por parte de agentes intermediários. A ação da cooperativa, permitindo a tais
agricultores, acesso direto ao crédito bancário oficial, associadamente a um trabalho de
assistência técnica independente da ação dos agentes comerciais, contribuiu, e vem
contribuindo, mesmo depois de desativada, para uma (re) organização local devido aos
seguintes efeitos:
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Instalação e atuação da cooperativa: mesmo com o curto período de atuação efetiva da
cooperativa – menos de uma década, houve mudanças na forma de produção e relação
social dos agricultores da confluência;
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Predomínio da lavoura de inhame no local: Aumento progressivo e significativo das
quantidades de inhame produzidos;
-
Conduta empresarial da cooperativa para promover competição direta com os agentes
compradores tradicionais conhecidos como intermediários;
-
Comercialização a nível regional e exterior; a produção passa a ser comercializada
para outros estados, principalmente do Nordeste e países da Europa;
-
Mudança nas técnicas de produção – para atender às exigências dos novos nichos de
mercado.
Certamente a cooperativa instalada no local promoveu mudanças significativas que
ofereceu novas feições ao espaço do Batatan, entendendo aqui como um viés de reorganização espacial com atuação dos atores locais interrelacionando-se com atores externos.
3.2 COMERCIALIZAÇÃO
O comércio para os agricultores familiares gira em torno da necessidade de completar o
ciclo mercadoria-dinheiro-mercadoria. Não se trata aqui de comunidade auto-suficiente ou de
comunidade que se limite a um ciclo menor, mercadoria-mercadoria. Malgrado a necessidade
de consumo, o agricultor familiar vem orientando o produto excedente destinando ao
mercado, por vezes, de modo bastante simples e direto, partindo de dentro da propriedade
para o consumidor, para os centros de abastecimento e agroindústrias (geralmente pequenas);
pode ser visto como um vínculo direto e modesto com o mercado ou via agentes
intermediários; na maioria das vezes, a produção para o mercado é acompanhada com maior
“proximidade” e pouco complexa. Pode-se dizer então que, quanto maior a integração do
agricultor com o mercado, maior será a complexidade de sua orientação técnica. Como o nível
tecnológico que cerca a maioria dos agricultores familiares é simples e o menos desenvolvido
possível, a integração com o mercado, de modo mais amplo também é frágil, cheia de pontos
de estrangulamento entre a produção e o consumidor final.
Do modo como o agricultor familiar pode estruturar sua produção, existe a dificuldade na
sua relação direta ao consumidor final ou à indústria de transformação; assim, a linha de
contato com o consumidor final é fragmentada pelos intermediários e a parte mais próxima da
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base, que são os produtores diretos, é a mais frágil, se refletem na impossibilidade de
controles de preços, na incapacidade de armazenar, no baixo poder de negociação com o
mercado. No caso da relação direta ao consumidor, o agricultor familiar se limita às feiras
livres, às entregas a domicílio, às lojas ou mercados e restaurantes das cidades, mas essa parte
de escoamento da produção é insignificante, visto a pequena quantidade que pode passar por
este escoamento com relação ao número de agricultores familiares envolvidos no processo e a
produção que juntos operacionalizam.
Por outro lado, a produção individual de cada unidade não atende às demandas das firmas
de comercialização e das indústrias de processamento. Essas empresas não têm interesse em
fazer a captação da matéria-prima in loco em cada propriedade. Neste ponto é que os
intermediários se consolidam, fazendo o controle dos preços, geralmente a menor margem,
controlando também a oferta e concentrando a produção.
Como o agricultor familiar não tem condições de relação direta com o consumidor, os
comerciantes intermediários acabam por fazer o papel, tanto de receptor da mercadoria como
do agente financeiro, assim expõem o agricultor ao perigo muito maior da dependência e
possível expropriação do que pelos meios legítimos de financiamento e comercialização. Para
o intermediário, é interessante sempre ter o produtor sob o seu controle; assim é possível
determinar os preços, garantindo-lhes maior parcela de lucro. Foi por esses entraves que os
agricultores da confluência começaram a articular meios de eliminar a participação do
comerciante intermediário da relação comercial; a exemplo, podemos citar, a organização da
própria cooperativa local e de outras associações que também aspiram ampliar o poder de
negociação e competitividade do coletivo.
Nesse sentido, com relação ao escoamento da produção, verificou-se que os agricultores
se valiam das seguintes modalidades: venda pela cooperativa, via intermediários, diretamente
ao consumidor, e formas mistas, ou seja, parte a intermediário e parte a cooperativa, ou ainda
nas feiras livres. De acordo com os entrevistados, os fluxos de comércio se ampliaram nos
últimos anos, diversificando o agente comprador, a forma de venda, o destino e o pagamento.
De acordo com CARDOSO (2001), no caso dos agricultores cooperados, a venda ocorria
preferencialmente pela cooperativa; são 63% desses agricultores que executavam seu
escoamento via cooperativa; 26%, apesar de serem cooperados, ainda continuavam vendendo
a produção a intermediários; 7% fazem um repasse misto, cooperativa e intermediário, e o
restante, 4% não responderam à questão. Nesse aspecto surge um questionamento: porque a
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quarta parte dos agricultores cooperados entrevistados, estão passando sua produção para
agentes intermediários? A resposta mais comum ouvida desses agricultores foi justificar que,
talvez por ainda não esteja com uma estrutura bem firmada, a cooperativa, em alguns
momentos não conseguia absorver toda a produção da safra, ficando o agricultor exposto aos
mecanismos de alterações dos preços, perda da qualidade do produto, armazenagem, riscos
sazonais; por isso passavam a produção para os intermediários que estavam sem
impedimentos para fazerem a captação do produto. Justificaram ainda, ao seu modo, que, se
esperassem a cooperativa para absorver toda a produção, poderiam perder a oportunidade do
momento de equilíbrio entre a oferta e a procura.
Já que os comerciantes intermediários foram tão criticados anteriormente, como
controlador de preços e das demandas, das colheitas das safras, etc., o que faz, então, os
entrevistados, de modo geral, continuar a vender a estes agentes, já que a cooperativa
esperava eliminá-los? Segundo agricultores dos dois subgrupos, citado pelo mesmo autor,
com a chegada da cooperativa, os intermediários elevaram seus preços de compra,
equiparando-os aos da cooperativa; esses agentes vendem seus produtos, na maioria das
vezes, nas feiras livres dos grandes centros regionais, a um preço mais elevado que a
cooperativa que só consegue preços mais elevados entregando a produção em empresas de
comercialização – supermercados e exportadoras, por exemplo. Também, os intermediários
têm transporte próprio, ou seja, não pagam a transportadores, como faz à cooperativa. E ainda,
os intermediários não cobram taxas mantenedoras da instituição. Então, o risco da venda via
intermediários se traduz de modo extremo ao não recebimento do pagamento, pois por essa
via nem sempre há garantias, e há delongas no recebimento do valor pago. Um risco que os
agricultores familiares continuaram expostos.
Quanto às condições de venda, encontram-se três modalidades básicas e uma mista: à
vista, a prazo, por contrato e a mista (parte à vista e parte a prazo). Dentre os não-cooperados,
onde predominam as vendas para intermediários, 44,4% vendem a prazo, são 12 dos
entrevistados na pesquisa de CARDOSO (2001). Nas vendas exclusivamente à vista,
identificaram-se 33,3% dos casos, que vendem sob essa condição a intermediários,
cooperativa e consumidor. 18,6% vendem tanto a vista quanto a prazo, e 3,7% dos
entrevistados, não informou. Não se identificou nessa categoria a venda por contrato.
Outro aspecto relacionado a comércio que se investigou, útil para analisar o grau de
informação do agricultor a respeito do seu próprio produto, diz respeito ao destino final da
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produção. Assim, os agricultores, das duas categorias, em sua maioria, conhecem o destino
final da sua produção: são 77,7% dos entrevistados na pesquisa citada anteriormente, em
geral, que informaram sobre os destinos citados; foram: Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Feira
de Santana, Salvador, além de Alemanha e França. Já a produção de farinha, conforme
indicaram os próprios agricultores, se destina mesmo é a mercados do próprio estado da
Bahia, principalmente o mercado local dos municípios da confluência.
Nos primeiros anos, após a implantação da cooperativa, ainda não havia nenhuma
relação da produção local, da cooperativa ou não, com o mercado externo; no entanto, a partir
do ano 2000, houve a efetivação da venda de pequena parte da produção para o mercado
europeu, especificamente a França, e na negociação por parte da cooperativa, para o envio de
novas remessas para outros países, a exemplo da Alemanha e Inglaterra. Segundo nota no
Diário Oficial – Estado da Bahia (23 e 24 –09-2000, p.5), esse é um grupo de agricultores que
extrapolam o mercado nordestino e efetivam vendas sem a participação de intermediários.
Essa exportação de inhame significou para o produtor familiar uma grande oportunidade de
expandir o mercado, no entanto, por sua estrutura econômica e necessidade de resposta ao
mercado, bem mais rápido que a produção dos cooperados, e a capacidade da cooperativa
desenvolver parcerias, a organização tende ao enfraquecimento. Para conseguir o padrão do
produto para o mercado externo, o produtor necessitou se adequar às novas tecnologias, fruto
de pesquisas, no processo produtivo, mas nem sempre acessível para a maioria dos
agricultores, tanto na questão técnica quanto e tanto mais na questão cultural de aderir a
determinadas mudanças.
Nesse sentido, fica evidente a participação do comércio realizado pelos agricultores do
Batatan como potencial de (re) organização do espaço local, com suas variações na forma de
comercialização, nas relações para se comercializar, nos destinos dos produtos, nos
procedimentos e adequações a exigências externas, tudo isso promovendo novas
configurações no espaço e relações entre as pessoas.
3.3 RETALHAMENTO DOS LOTES
Outro item que tem promovido uma modificação na região do Batatan, diz respeito a uma
fragmentação dos lotes de imóveis dos proprietários locais. A região tem um histórico de
ocupação antiga, junto com as primeiras áreas exploradas do Brasil, por sua localização
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geográfica com certa proximidade em relação aos primeiros núcleos de ocupação do país. A
ligação ocorria pela foz do rio Paraguaçu nas margens de Maragogipe que tem acesso à Baia
de Todos os Santos e assim favorecia o escoamento da produção para o mercado de Salvador
e mercado colonizador. As terras da confluência, ocupadas por agricultores que produziam
principalmente alimentos da agricultura e das criações; com o tempo foi sendo retalhada e as
culturas de subsistência e pastagens, mais recentemente o incremento de frutas cítricas e
inhame passam a fazer parte da pauta de produtos cultivados e comercializados.
Pela tabela 1 (abaixo), a análise revela um retrato da Bahia e da região pesquisada no
que se refere à distribuição de terras e nela percebe-se a concentração das terras em grupos de
agricultores não familiares ao passo que um grande número de estabelecimentos de
agricultores familiares, tanto na Bahia quanto nos municípios que estão confluentes nesta área
de estudo, repartem uma área em que as parcelas de cada propriedade tornam-se efetivamente
menores. O fato do município de Maragogipe sobressair com relação aos demais, diz respeito
ao tamanho do território, principalmente porque este é dotado de grande área rural e
historicamente passou a ser mais isolado que os demais – pela posição geográfica com relação
às vias de fluxo para escoamento da produção, que deixou de ser pelo porto e passou a ser
pelas vias rodoviárias.
Tabela 1 - Estabelecimento e área da agricultura familiar, segundo a Unidade da
Federação (Bahia) e Municípios da confluência intermunicipal
Unidades da Federação e
Município
Bahia
Agricultura familiar
Não familiar
Lei nº 11.326
Estabele-
Área
Estabele-
Área
cimentos
(ha)
cimentos
(ha)
665.831
9.955.563
95.697
19.224.996
Cruz das Almas
1.322
3.398
103
2.614
Maragogipe
4.192
14.043
183
8.910
São Felipe
2.653
10.454
203
6.485
900
4.406
91
4.317
São Félix
Fonte: IBGE, Resultado do Censo 2010
A área de terra agricultável da categoria dos agricultores familiares, por serem de
extensão insuficiente com relação ao número de trabalhadores e necessidade para garantir a
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renda da família e assim manter as demandas essenciais, promove a busca continua destes
agricultores por terras para utilizarem em suas atividades agrícolas. Um dos motivos que
explicam ainda o arrendamento de terras para o cultivo neste local é a justificativa para os
agricultores que junto com suas famílias necessitam de maiores áreas para o plantio mesmo
fazendo o pastoreio de animais de médio e grande porte em terrenos não laborados com
culturas para o consumo humano e com pastagens plantadas ou nativas na região. Além dessa
falta de terras para os agricultores familiares da região do Batatan, e creio que seja prática
comum em todo o Estado, há uma promoção de retalhamento (divisão) das propriedades e
uma diversificação nas formas de propriedade e uso do solo, favorecendo de alguma forma a
garantia de exploração e provimento das necessidades desses moradores locais.
Os lotes são ordenados pelas estradas vicinais de fluxos da região, principalmente da
estrada de ligação entre Cruz das Almas e Maragogipe; de acordo com Cardoso (2001) há na
região uma predominância (98,5%) de pequenos ou mini-proprietários com pose jurídica da
terra, fator que garante a manutenção e reprodução social da agricultura familiar. O fato de
predominar na região pequenos proprietários diz respeito à divisão constante dos terrenos;
foram identificados retalhamentos do tipo partilha dos lotes para herdeiros, venda e compra de
lotes ou parte de lotes, doação por parte de familiares, isolamento de lotes para desenvolver
atividades não agrícolas de atendimento comercial ou serviços. Desse modo, o habitat
disperso linear comum no meio rural de pequenos proprietários, começa ganhar novas
configurações do tipo apresentado por Wanderley (2009, p.266) como “coagular”, um
pequeno aglomerado de casas, embora ainda disperso, mas bastante próximas uma das outras,
tendendo ao que poderíamos chamar de “bairros rurais”. Ocorre nesse contexto, tanto um
redimensionamento e configuração das terras quanto um novo contexto de relações sociais no
meio rural, nesse caso no Batatan.
O retalhamento constante dos lotes tem promovido uma nova configuração à região do
Batatan e promovido uma re-organização do lugar. Com a aquisição de novos lotes os
usuários passam a promover uma utilização de áreas com atividades e oferece assim ocupação
e/ou ampliação da produção local. Com o retalhamento, formando-se ai pequenas áreas, há
famílias que já não utilizam a terra como meio de produção e apenas como local de moradia e
pequena roça para consumo próprio, dedicando-se com principal fonte de renda a venda da
força de trabalho em outra propriedade ou instituição de serviço no local ou nas áreas urbanas
mais próximas.
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Além dos elementos apresentados como passíveis de mudanças e com poder de
(re)organização da configuração espacial local estudados aqui: cooperativa, comércio e
fragmentação dos lotes rurais há outros elementos a serem considerados e que necessitam de
investigação mais sistemática e detalhada, como é o caso da inserção de elementos não
agrícolas no Batatan, do planejamento de pavimentação da estrada que interliga Maragogipe e
Cruz das Almas, a recente exploração de petróleo e gás natural no município de Maragogipe e
a reativação de estaleiro da indústria naval, pontos para ampliação dos estudos da área e que
exigem investigação mais complexa.
4. CONCLUSÃO
Para a pesquisa em curso foi selecionada uma área no Recôncavo Sul da Bahia,
abrangendo uma confluência de quatro municípios (Cruz das Almas, Maragogipe, São Felipe
e São Félix) por ter sido identificado na referida região um processo organizativo e
(re)organizativo de dinâmica peculiar a outras áreas da proximidade; trata-se de local com
predominância de agricultores familiares, mas com especificidade particular, as quais
fundamentamos essa pesquisa para verificar as referidas particularidades do processo de
(re)organização desse local.
Desde o início da investigação houve delimitação, tanto no espaço físico geográfico,
quanto no momento histórico, no entanto, não se tem a pretensão de encerrar o estudo desse
objeto neste foco, uma vez que o local já foi pesquisado com outros pontos relevantes,
inclusive propostas que deu suporte a esta pesquisa.
O estudo foi conduzido segundo metodologia pertinente, na expectativa de que a
pesquisa conseguisse atender aos objetivos e preencher possíveis lacunas na bibliografia
sobre o fenômeno identificado inicialmente e a inserção do local e atores, sob foco de análise
científica. Na verdade o estudo buscou contribuição para entendimento da questão e
representou de certo modo um desafio, tanto pelas divergências de opiniões já formadas, a
respeito dos conceitos utilizados (organização, lugar, região, agricultura familiar) quanto pela
falta de informações oficiais especificas sobre a região.
Nessa análise, a agricultura familiar atual, é definida, enquanto exploração onde os
fatores de produção estão intimamente relacionados à família. Esse é um conceito genérico e
consensual, formulado a partir de um conjunto de variáveis, exatamente contraposto à
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agricultura patronal. Já região, lugar e organização passaram pela análise da epistemologia da
Geografia enquanto conceitos genéricos de categorias utilizadas para estudar fenômenos de
ciências com fronteiras com a própria Geografia, assim o estudo não deteve o foco sob a
construção teórica e sim sobre os aspectos que favorecem a uma (re)organização do local
estudado.
Do exame detido nas considerações desenvolvidas com o referencial teórico,
comparados com certos elementos críticos, de aspectos gerais, conduzem a uma reflexão
crítica acerca do papel fundamental que a cooperativa do Batatan, o comércio e a
fragmentação dos lotes possuem frente ao poder de organizar e re-organizar a configuração da
região e as relações entre os atores do lugar característico de agricultores familiares.
É necessário observar, entretanto, que a cooperativa em sua curta atuação direta no
local, o comércio, a fragmentação dos lotes não estão sendo vistos aqui como uniformes,
restritos e decisivos na (re) organização da região de confluência; tantos outros elementos
podem ser identificados atualmente, como outros podem surgir e tornarem-se relevantes em
todo e qualquer processo de transformação local, assim é que de fato este trabalho não cessa a
condição de continuidade, porquanto não cessa a necessidade criativa e demanda humana
pelas de mudanças de padrões e materiais.
Assim, os locais típicos de agricultura familiar, como é o caso da confluência
intermunicipal do Batatan, em suas relações espacial-sócio-econômicas, vêm se revelando
como fenômeno extremamente complexo e dinâmico. A contribuição maior dessa pesquisa foi
salientar esse tema, para que possa ser mais amplamente investigado.
5. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
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Bahia: Um estudo de caso. Cruz das Almas: UFBA, 2001
ELIAS, D., Globalização e agricultura. São Paulo: Edusp, 2003
Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE. Levantamento da Produção
Agrícola. Rio de Janeiro: 2010.
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estadual – Nordeste. São Paulo: UNICAMP, 2000.
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MATO, M. A. A cooperativa agrícola na dinâmica social. Caderno do CEAS, Salvador:
v.33, n.61, set./out., 1974.
QUEIROZ, M. I. P., Uma categoria rural esquecida. São Paulo: UNESP, 2009
RECH. Cooperativas: uma alternativa de organização popular. Rio de Janeiro: DP&A,
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SANTOS, M. 1992, in EDUARDO, M. F. Geografia agrária, território e desenvolvimento.
São Paulo: Expressão Popular, 2010.
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TEIXEIRA, E. C., O papel das políticas públicas no desenvolvimento local e na
transformação da realidade. São Paulo: AATR, 2002.
WANDERLEY, M. N. B. O mundo rural como um espaço de vida. Porto Alegre: UFRGS
Editora, 2009.
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