Sem força de lei, orientação da CVM veio para ficar
Valor Econômico - sexta-feira, 25 de setembro de 2015
Seção: Suplemento - Transparência contábil / Autor: Por Roseli Loturco
Por Roseli Loturco | Para o Valor, de São Paulo
Apesar de não ter força de lei, a OCPC 07
parece que veio para ficar. E já com
adesão de várias empresas de capital
aberto. O que era na prática uma
orientação de procedimento contábil
(OCPC) encabeçada pela Comissão de
Valores Mobiliários (CVM) virou quase
que uma regra.
Isso porque o mercado já tinha a
percepção de que as notas explicativas
dos balanços financeiros explicavam
demais. Eram, por vezes, evasivas e não
iam direto ao ponto do que é de fato
relevante. Mas ninguém tinha coragem
de
eliminar
as
redundâncias
e
informações desnecessárias à tomada
de decisão do acionista e credor. Na
realidade, as empresas tinham receio
que a própria CVM cobrasse delas pelo
enxugamento das demonstrações.
Paul Sutcliffe: tendência dos países latinos é a de
explicar em mais páginas
"A OCPC 07 veio para balizar. Para dizer o que é relevante. Mostra à empresa que se ela não
realiza determinada operação, não precisa dar explicação sobre aquilo se não for
relevante", afirma José Carlos Bezerra, superintendente de normas contábeis e de auditoria
da CVM.
A iniciativa é para dar mais transparência e objetividade aos balanços. "Não objetivamos
redução. Mas sim mais qualidade na informação. Mas o subproduto disso pode sim ser a
redução das notas explicativas", considera Bezerra. Essa, na realidade, não é uma
preocupação isolada da CVM e do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC). Está
alinhada a um movimento mundial para chegar a caminhos que tragam para as
demonstrações contábeis apenas as informações que realmente interessam aos usuários.
A comunidade europeia, por exemplo, tem discutido este tema no âmbito do EFRAG European Financial Reporting Advisory Group. O Iasb (International Accounting Standards
Board) e o Asaf (Accounting Standards Advisory Forum) também mantêm o assunto na
pauta do dia. "Mesmo na Inglaterra, onde as demonstrações financeiras são mais sucintas
do que as do Brasil, há a preocupação em reduzir ainda mais. A busca é pela relevância",
garante Paul Sutcliffe, sócio-líder de IFRS da EY no Brasil. "A tendência dos países latinos é
a de explicar em mais páginas. Isso é cultural. Basta comparar os balanços. A British
Petroleum é bem maior do que a Petrobras e publica menos páginas. A British Airways
publica menos do que a TAM ", avalia Sutcliffe, que vê uma mudança de rota a partir da
nova orientação da CVM.
Tanto é verdade que pesquisa realizada pela Associação Brasileira das Companhias Abertas
(Abrasca) com 250 empresas mostrou que 30, das 73 respondentes, já reduziram em
média 20% das notas explicativas nos balanços de 2014, publicados no início deste ano.
Algumas chegaram a cortar pela metade, sem que houvesse nenhuma reclamação de
Algumas chegaram a cortar pela metade, sem que houvesse nenhuma reclamação de
analistas ou do próprio órgão regulador. "A adesão foi significativa porque todo mundo está
cansado de notas explicativas prolixas e redundantes", avalia o vice-presidente da
entidade, Alfried K. Plöger, que acredita que a CVM vai ser mais tolerante nesse início de
ajustes e deve notificar as empresas se sentir falta de alguma informação. "Esse tem que
ser um trabalho feito a quatro mãos. Preparado pelo controller da empresa e validado pelo
auditor externo que deve ajudar a julgar o que é relevante", diz Antônio Castro, presidente
da Abrasca.
A Totvs foi uma das primeiras a puxar este cordão e montou uma força tarefa para reduzir
em 20 páginas o seu balanço de 2014. Para isso foi pesquisar na prática como é feito em
outros países. Usaram a experiência e o contato com o mercado e perceberam que o
investidor tem pouco tempo para analisar os balanços. "Houve esforço coletivo em busca
da objetividade e para ir além do que o OCPC orienta. Nosso time de controladoria, junto
com o comitê de auditoria interna e externa, trabalharam duro nisso", afirma Gilsomar
Maia, diretor de RI da empresa. A redução levou o balanço a 62 páginas, versão menor até
mesmo do que as 71 que publicava em 2008, quando começou a reportar em IFRS (padrão
internacional contábil).
Só que na época seu faturamento era de R$ 760 milhões. Em 2014, foi de R$ 1,77 bilhão.
"Não teve reclamação de ninguém. Nem dos investidores, nem dos credores, nem dos
auditores e muito menos da CVM. Sinal de que estamos no caminho certo", diz Maia.
Um dos ganhos tangíveis dessa redução está no custo da publicação do balanço, que
também diminui quando há menos páginas. Mas há quem enxergue riscos nesse processo.
O risco da subjetividade. Da interpretação do que é ou não vital publicar. "Sou favorável à
simplificação do processo de informação e acho que vem para o bem. Mas é preciso
cuidado com o real entendimento de cada companhia", alerta Robertson Emerenciano, sócio
da Emerenciano, Baggio e Associados. "Se a empresa está em situação financeira delicada,
pode optar em não divulgar pesquisas e investimentos não realizados. A OGX, por exemplo,
omitiu informações importantes ao mercado", lembra Emerenciano.
http://www.valor.com.br/empresas/4241038/sem-forca-de-lei-orientacao-da-cvm-veio-para-ficar
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