Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários AN P Conrado Grava de Souza Diretor de Operações do Metrô de São Paulo E-mail:[email protected] Roque de Lázaro Rosa Assistente de Diretoria do Metrô de São Paulo A SEGURANÇA NA MOVIMENTAÇÃO DOS TRENS O início da sinalização ferroviária A sinalização ferroviária foi desenvolvida para evitar colisões durante a movimentação de trens, pois estes, devido a sua grande massa, muitas vezes não conseguiam parar dentro da distância do campo visual do condutor. Os primeiros veículos utilizados no século XVIII para transporte de passageiros eram carruagens que se movimentavam sobre trilhos, puxados por cavalos ou mulas. Um guia a cavalo precedia o veículo para verificar as condições da via à frente. Ele orientava o condutor do veículo utilizando-se de sinais de mão e braço e, sob neblina ou baixa visibilidade, eram utilizadas bandeirolas e lanternas. A primeira ferrovia de passageiros iniciou sua operação, na Inglaterra, no final de 1820. Não levou muito tempo para que se percebesse a necessidade de mecanismos que pudessem prevenir a possibilidade de dois ou mais trens trafegarem no mesmo trecho e provocarem uma colisão. Os primeiros métodos de prevenção deste tipo de situação foram criados na Inglaterra, na década de 1830 e eram baseados na presença de policiais nas estações, nos cruzamentos e nas junções. Os policiais utilizavam bandeirolas para sinalizar o estado do tráfego e como não se comunicavam entre si baseavam-se em intervalos de tempo suficientes para não permitir que trens seguidores alcançassem e colidissem com os trens à frente. Num dos métodos de sinalização utilizados à época, após a passagem de um trem, o policial mostrava uma bandeirola vermelha (perigo) durante 5 minutos e depois exibia uma bandeirola verde (cuidado) durante outros 5 minutos. Então somente depois de 10 minutos da passagem de um trem era exibida uma bandeirola branca (livre). No entanto, se um trem parasse inadvertidamente após a sua passagem por um desses pontos controlados, mas fora do campo de visão do policial, o condutor do trem seguidor somente percebia a presença do trem à frente quando este já estivesse à vista, o que ficava comprometido nas noites escuras ou com nevoeiro. Mesmo que, naqueles tempos, os trens fossem bem mais lentos, os freios não tinham a potência dos atuais e, portanto, as distâncias de frenagem precisavam ser muito maiores. O uso de bandeirolas foi logo substituído pelo de placas de sinalização à margem de via, indicando a situação presumível do tráfego à frente. Cada ferrovia tinha seu próprio conjunto de placas, sem que houvesse padronização. Quando a linha era tida como livre à frente, a placa simplesmente era posicionada paralelamente à via, de forma que o condutor do trem não tivesse a visão frontal dela. À noite, a sinalização era feita com sinais luminosos coloridos. No início eram utilizadas lanternas manipuladas por agentes ferroviários nos pontos de controle que logo foram substituídas por postes de sinalização. As cores utilizadas eram a vermelha representando perigo, a verde para condução com cuidado e a branca indicando via livre. Como as ferrovias eram em via singela e o tráfego ocorria nos dois sentidos, outras medidas de segurança adicionais tiveram de ser adotadas. Passagem de bastão ou token O sistema token foi desenvolvido na Inglaterra com o intuito de facilitar a movimentação segura dos trens nas ferrovias em via singela. Quando se tratava de um trecho ferroviário simples, ou seja, sem paradas ou bifurcações entre as suas extremidades, um simples token era suficiente. O condutor do trem que estivesse no trecho deveria possuir o token, evitando desta forma a colisão com outro trem. O token mais Carruagem sobre trilhos 79 80 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários usual era um bastão cilíndrico de 80 cm de comprimento por 4 cm de diâmetro, normalmente confeccionado em madeira e possuía uma placa metálica identificando o trecho ferroviário onde era válido. Este método de trabalho era originalmente chamado de OES (One Engine in Steam) mudando depois seu nome para OTW (One Train Working). Além do bastão, eram utilizados também outros tipos de token como os da figura: Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres A aplicação deste método para linhas longas podia implicar tempos de parada excessivamente longos para trens em espera de bastão. O uso de um único token não se mostrava uma operação conveniente quando, por exemplo, trens consecutivos viajavam no mesmo sentido de tráfego. O sistema do token único migrou para outro sistema em que, se um trem era seguido por outro, ao condutor do primeiro trem era mostrado o token, mas não entregue. Era dada a ele uma autorização escrita, denominada bilhete (ticket), permitindo a sua entrada no trecho ferroviário. Um segundo trem poderia então segui-lo, este sim com a posse do token. Tipos de token A título de ilustração, a seguir é apresentado um procedimento que era utilizado para a operação de um sistema de token simples: - um único token é designado para o trecho A – B; - no caso do token estar em posse de um agente ferroviário na locação A, isto indica que o trecho A – B encontra-se livre e que o sentido de tráfego é de A para B; - chega um trem na locação A para ter acesso ao trecho A – B; - o agente entrega o token para o condutor do trem, assim autorizando sua entrada no trecho A – B; - enquanto o trem trafega pelo trecho, nenhum outro trem é autorizado a entrar nele, em qualquer sentido; - quando o trem chega na locação B, o condutor entrega o token para um agente e, então, o trecho torna-se livre para movimentação no sentido B - A. Na medida em que o tráfego nas ferrovias tornou-se mais intenso, o sistema token foi aperfeiçoado para fazer frente aos novos desafios desta nova situação. O sistema token também é chamado de “passagem de bastão” ou de “liberação por blocos”. 81 82 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários Tabela horária Nas ferrovias americanas, no século XIX, foi criado o método de controle de movimentação de trens utilizando a tabela horária (timetable). Uma tabela horária era estabelecida e informada a todos os condutores de trem e a agentes das estações e de outras localidades de controle da ferrovia. Os trens somente tinham acesso a um trecho ferroviário obedecendo um horário programado e, durante o tempo em que um trem tinha a posse do trecho, nenhum outro poderia ter acesso ao mesmo trecho. Quando os trens se movimentavam em sentidos opostos em uma ferrovia em via singela, os encontros eram programados em locais onde existissem vias múltiplas, permitindo, assim, a passagem segura dos trens por vias diferentes. Estes locais, na nomenclatura ferroviária brasileira, são denominados “pátios”. Para evitar conflito, a programação estabelecia que dois trens, movimentando-se em sentido oposto, encontrar-se-iam em um pátio. O primeiro a chegar tinha de aguardar a chegada do outro para então proceder sua movimentação para o trecho seguinte. Quando um trem era seguido em comboio por um outro, ele exibia duas bandeirolas verdes e, na sua chegada ao ponto de encontro, dava vários toques de buzina, o que era respondido pelo trem que estava esperando em sentido oposto. Isto, para sinalizar que este último deveria esperar pela passagem do trem seguidor. Pátio A Pátio B Trem 1 Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres da ferrovia, pois o tempo de posse de um trecho sempre era muito maior que o necessário. Com o advento do telégrafo em 1851, o sistema de tabela horária foi aperfeiçoado, podendo as mensagens serem transmitidas antes dos trens. O telégrafo permitiu a disseminação de alterações nas tabelas horárias, denominadas train orders, que permitiam o cancelamento, a reprogramação e a adição de trens. As equipes dos trens geralmente recebiam suas ordens nas estações. Intertravamentos À medida que os traçados de via tornavam-se mais complexos, principalmente nas zonas de estação e de manobra de trens, e a frequência de trens crescia, o potencial de ocorrência de acidentes aumentava proporcionalmente. Não eram suficientes os métodos de sinalização e regras de movimentação vigentes, pois os sinais ainda precisavam ser operados por indivíduos que, sem comunicação, ficavam correndo entre os sinais e pontos de controle. Havia a necessidade de centralização dos controles em cada uma dessas zonas para tornar possível a ligação entre eles de forma a evitar sinalizações conflitantes. As primeiras cabines de controle de sinais foram instaladas no início de 1869 e controlavam os principais sinais e pontos de controle de uma determinada área, porém deixando sem controle a maioria dos desvios que continuavam a ser operados por alavancas situadas nas suas proximidades. Com a passagem do tempo, mais e mais controles eram realocados para as cabines, até a inclusão de todos. Somente os pátios de estacionamento continuavam a ser operados local e manualmente. Várias formas de intertravamento mecânico foram desenvolvidas para evitar movimentos conflitantes, apesar de que cada instalação tinha de ser customizada para atender os requisitos locais. Trem 2 O sistema de tabela horária tinha diversas desvantagens. Uma delas era a incerteza de a via à frente encontrar-se efetivamente livre. As tabelas horárias eram elaboradas de tal forma que os intervalos programados entre os trens fossem suficientes para garantir que, em caso de falha de um trem que implicasse a sua parada na via ou sua movimentação com baixo desempenho, houvesse tempo suficiente para que alguém da tripulação do trem caminhasse até uma distância segura para ali fixar um sinal indicando a existência de trem parado ou com baixo desempenho à frente. Outra desvantagem era a impossibilidade de alteração das tabelas horárias, pois a comunicação ao longo da ferrovia ocorria na velocidade dos próprios trens. Considerando a existência de atrasos e paradas não programados de trens por motivo de falha, as tabelas horárias promoviam uma operação ineficiente 83 Comunicações Com o crescimento da velocidade e da frequência dos trens, os acidentes também ocorriam mais frequentemente, geralmente em decorrência de uma parada não programada de um trem, ocasionando colisão em sua traseira. Tornou-se necessário um método rápido de transmissão de mensagens entre os pontos de controle para que os trens seguidores pudessem ser advertidos a respeito de obstruções à frente, em tempo de evitar colisões. Em 1837, foi implantado o primeiro sistema de comunicação por fio que evoluiu para o telégrafo e passou a ser utilizado, tanto para a comunicação das condições da ferrovia, como para a transmissão de qualquer tipo de mensagem. 84 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários EVOLUÇÃO DOS SISTEMAS DE CONTROLE DE TRENS Primeira geração A primeira geração dos sistemas de controle ferroviário foi caracterizada por dispositivos mecânicos e eletromecânicos que desempenhavam funções simples, tais como controle de sinais e de chaves individuais, evoluindo para os sistemas de sinalização que centralizavam as operações das zonas de manobra em cabines de controle. Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres Nas zonas de manobra, os antigos painéis de controle eletromecânicos foram substituídos por mesas de controle que funcionavam com lógica de contatos (relés). As antigas alavancas foram substituídas por botões de comando e de indicação. Nas vias de manobra, as chaves de desvio e os sinais eram comandados à distância a partir dessas mesas de controle. Era o advento do Comando de Tráfego Centralizado - CTC, que era utilizado para controle das rotas e sinais nessas zonas de manobra e era munido de uma lógica eletrônica de interface com os dispositivos de via para garantir o intertravamento seguro entre as posições das chaves, das rotas e dos sinais. Para os centros de controle foram desenvolvidos os sistemas de código, constituídos de armários de dispositivos eletrônicos que funcionavam com lógica de relés, recebendo informações de estado da sinalização da via, exibindo-as em painéis e mesas de controle e difundindo os comandos do centro para a sinalização de via e para as estações, visando a organização do tráfego da rede ferroviária. Cabines e painel de controle da sinalização. A segurança da movimentação dos trens entre zonas de manobra, bem como o desempenho operacional do serviço ferroviário eram regidos pelas técnicas de liberação por blocos e por tabelas horárias. A comunicação na rede ferroviária foi feita inicialmente por meio do telégrafo e depois por telefone e telex. Estes sistemas de comunicação também possibilitaram a obtenção de um certo nível de centralização. Segunda geração A segunda geração dos sistemas de controle ferroviário surgiu na década de 1960, com a utilização de dispositivos eletrônicos que, além de oferecer substancial economia de espaço, também ofereciam processamento de funções mais complexas. Além dos controles de sinais e de chaves de desvio, foram desenvolvidos novos mecanismos de segurança e de apoio à operação, sendo o principal a criação do circuito de via que permitia a localização e o rastreamento dos trens entre estações e zonas de manobra. Nesta fase, os sistemas de comunicação passaram a transmitir informações mais complexas via cabo e a comunicação de voz via radio incluiu o condutor do trem na rede de comunicação. Os centros de controle passaram a abranger toda a ferrovia. Nesses centros podia-se visualizar o estado de toda a rede, inclusive a localização e a identificação de trens, as posições das chaves de desvio e os estados em que se encontravam os sinais. 85 Numa última fase desta geração, os sistemas de código dos centros de controle foram substituídos por computadores digitais, denominados minicomputadores em contraposição aos computadores de grande porte. A grande vantagem desta evolução foi o significativo aumento na capacidade de processamento, pois os softwares dos computadores digitais ofereciam potencial de processamento significativamente superior e flexível quando comparados aos sistemas baseados em lógica de relés. Os sistemas centrais puderam então operar funções muito mais sofisticadas e complexas que aquelas dos sistemas de código, dada a flexibilidade dos softwares de programação utilizados. Nos metrôs, este salto tecnológico ainda possibilitou a implementação de funções muito mais sofisticadas, como as de regulação automática do tráfego de trens, e outras de automação de funções de operação dos trens nas estações e nas vias. Ainda nos metrôs, os centros de controle passaram a operar funções de monitoramento e controle dos sistemas de alimentação elétrica, de telecomunicações e de outros sistemas auxiliares. Terceira geração A terceira geração de sistemas de controle de trens surgiu na década de 1980 com a difusão dos microcomputadores. O primeiro salto significativo foi nos sistemas de transmissão de dados que passaram para processamento com lógica microprocessada, com aumento significativo de inteligência e de capacidade de processamento. A segunda grande evolução foi a dos sistemas de sinalização, para os quais foi desenvolvida uma nova tecnologia de 86 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres segurança, baseada em microprocessadores em substituição à lógica dos então “insubstituíveis” relés vitais. Com a evolução, o barateamento e a difusão dos microcomputadores, os sistemas de controle trilharam um caminho de rápido aumento na capacidade de processamento e no desenvolvimento de linguagens de programação mais apropriadas às suas necessidades, tornando-se muito mais eficientes. Quarta geração Esta é a fase atual da tecnologia dos sistemas de controle. Ela se caracteriza por muitos fatores decorrentes da evolução da ciência da computação e da comunicação. No campo da comunicação, a transmissão por meio de fibras óticas e a comunicação sem fio potencializaram a rapidez e o volume das transmissões. Para a transmissão de informação, os dados, as imagens e os sons são tratados da mesma forma e transmitidos simultaneamente e digitalmente pelos mesmos canais. No campo computacional, a miniaturização dos componentes, o crescimento descomunal da capacidade de armazenamento e da rapidez de processamento trouxeram benefícios inestimáveis ao desenvolvimento de sistemas de controle. As interfaces com os processos controlados também sofreram evoluções significativas com a criação de sensores e atuadores muito mais precisos, confiáveis e potentes. Outro grande avanço foi no campo do software, com a utilização de linguagens formais mais amigáveis e programadas em ambientes de sistemas operacionais e de software de apoio que se apresentam como produtos genéricos do mercado e, portanto, mais testados, conhecidos e utilizados. Em todos esses aspectos - o computacional, o ambiente de programação e a comunicação -, um outro grande salto foi o da confiabilidade e o da segurança da informação. Isto permite atualmente a aquisição de sistemas de sinalização tão seguros ou mais que os tradicionais, utilizando-se de comunicação de dados wireless (sem fio) de alta confiabilidade e segurança, transformando os métodos de controle discreto em métodos de controle contínuo e, assim, melhorando o desempenho operacional mantendo-se o mesmo nível de segurança. CONCEITOS BÁSICOS DE CONTROLE AUTOMÁTICO DE TRENS Nas ferrovias urbanas de transporte de passageiros, compreendendo os metrôs, os trens metropolitanos e os metrôs leves, os sistemas de controle estão organizados conforme a seguinte hierarquia: 87 Automatic Train Protection – ATP (proteção automática de trens) O ATP é o sistema de segurança da movimentação dos trens. Usualmente, os componentes deste sistema estão localizados na via ferroviária e nas salas técnicas das estações de passageiros. O sistema ATP tem por finalidades: - prevenir ou impedir a ocorrência de colisões frontal, traseira e lateral entre trens em circulação nas vias ferroviárias; - prevenir ou impedir a ultrapassagem de sinal vermelho pelos trens, seja ele um sinal físico localizado à margem de via, ou virtual, percebido pelo trem por meio de informações transmitidas por equipamentos de via, com ou sem visualização na cabine de condução; - prevenir ou impedir a ultrapassagem, pelos trens, das velocidades de segurança impostas pelos limites de velocidade civil da via, pelas condições de tráfego ou pelos estados operacionais das zonas de manobra. Automatic Train Operation – ATO (operação automática de trens) O ATO compreende um conjunto de funções locais relacionadas à operação dos trens que não envolvam aspectos de segurança. As funcionalidades inerentes ao ATO podem incluir: - a identificação dos trens, quando de sua entrada em operação comercial, com a finalidade de viabilizar a comunicação terra-trem e o seu rastreamento pelo centro de controle da linha ou por postos de controle local; 88 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários - o despacho dos trens dos terminais das linhas em conformidade com horários, eventos ou outros critérios estabelecidos pelo centro de controle da linha ou por postos de controle local; - o controle do desempenho da movimentação dos trens nas áreas interestações, atuando sobre a sua aceleração, velocidade e frenagem em resposta às imposições de desempenho estabelecidas pelo centro de controle da linha ou por postos de controle local; - o controle do processo de parada dos trens nas estações, assegurando perfis de parada suave e posicionamento dos trens em locais exatos e alinhados às plataformas das estações; - o controle automático de abertura das portas dos trens e das portas de plataforma nas estações; - o controle automático ou manual de fechamento das portas dos trens nas estações, garantindo o tempo adequado de permanência com as portas abertas para a entrada e saída dos passageiros, em função de parâmetros estabelecidos pelo centro de controle da linha ou postos de controle local. Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres OPERAÇÃO DOS TRENS – NÍVEIS DE AUTOMAÇÃO Um trabalho realizado pela União Internacional de Transportes Públicos - UITP, publicado em 2007, descreve os níveis de automação na operação de trens. Neste item e no próximo, estão sumarizadas as principais conclusões do estudo. O quadro, a seguir, detalha os diversos níveis de automação: Automatic Train Supervision – ATS (supervisão automática de trens) O ATS é a inteligência central do sistema de supervisão e controle. Ele é responsável pelo cumprimento do programa de tráfego da rede ferroviária. É o sistema que controla a movimentação do conjunto de trens de forma organizada, visando uma oferta que atenda à demanda de passageiros ao longo do dia. Suas funcionalidades podem incluir: - o controle da colocação de trens em serviço, a partir dos pátios de estacionamento, dos terminais e de outras localidades da linha, em conformidade com os programas de oferta; - o controle das partidas dos trens dos terminais, após manobra de retorno, em conformidade com os programas de oferta; - controle das rotas de entrada dos trens nos terminais da linha e nos pátios de estacionamento, visando a otimização das manobras e a minimização de conflitos entre os trens; - regulação do tráfego dos trens na linha, em conformidade com programas de oferta que estabelecem os parâmetros de partida dos terminais, o desempenho e os tempos de parada nas estações. - regulação do tráfego de trens na rede, em conformidade com programas de oferta globais que consolidam a transferência de trens de uma linha para outra, quando certos serviços abrangerem duas ou mais linhas; - regulação do tráfego de trens na rede, em conformidade com programas de oferta, construídos em função das demandas de transferência de passageiros entre linhas independentes. 89 Nível 1 – ATP com condutor A operação de trem em nível 1 é aquela em que o trem é conduzido por um condutor, mas tem seu desempenho limitado pelas condições de segurança impostas pelo ATP. Neste nível, o trem pode ou não ser equipado com mecanismos de atuação que respondam automaticamente aos estímulos recebidos do equipamento ATP da via. Na operação de um trem em nível 1: - o condutor é responsável pela operação do trem, observando as condições da via para uma movimentação segura; - o sistema ATP indica ao condutor as condições seguras de operação do trem por meio de sinais de via e/ou de informações na própria cabine de condução; - o condutor comanda a partida segura do trem nas estações, incluindo o fechamento das portas. Em alguns sistemas, os condicionantes de segurança são simplesmente as indicações de sinais localizados à margem de via, perten90 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários centes ao ATP, que devem ser respeitados pelo condutor, nada havendo que impeça a violação desses condicionantes. Em outros sistemas, porém, o ATP reside tanto na via quanto no próprio trem, quando então os condicionantes de segurança são respondidos automaticamente pelo próprio trem. Nível 2 – ATP e ATO com condutor O segundo nível de automação da operação de trem incorpora o primeiro nível e acrescenta funções automáticas não relacionadas à segurança. Em um trem operado no nível 2: - o condutor é responsável pela operação do trem, observando as condições da via para uma movimentação segura, como no nível 1; - o sistema ATP supervisiona continuamente os comandos do condutor, limitando automaticamente a sua ação dentro de condições seguras de operação do trem; - o condutor, com apoio do pessoal operacional de terra, comanda a partida segura do trem da estação; - a abertura e o fechamento das portas são geralmente automáticas e em alguns casos o fechamento das portas pode ter interferência do condutor. Nível 3 – Condução sem condutor – DTO (Driverless Train Operation) O nível 3 de automação na operação de trens é caracterizado pela ausência de condutor no trem. Em operação DTO: - o trem se movimenta, para, abre e fecha portas automaticamente; - é prevista a presença no trem de um empregado operacional (atendente) que pode assumir a operação do veículo quando necessário e prestar assistência aos passageiros; - a partida segura do trem de uma estação é automática, podendo ter apoio de pessoal operacional. Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres - no sistema UTO, os trens (funcionamento e passageiros) são monitorados pelo centro de controle operacional da linha; - os trens com UTO possuem recursos de comunicação entre os passageiros e o centro de controle operacional; - em certas situações de emergência, tais como descarrilamento e detecção de fumaça ou fogo, é necessária a intervenção de pessoal operacional de estação. BENEFÍCIOS DA OPERAÇÃO DE TRENS NOS NÍVEIS 3 E 4 Os níveis 3 e 4 oferecem vantagens significativas em relação aos outros níveis. O estudo da UITP ressalta um elenco de benefícios que a operação nestes dois níveis traz para os usuários, para a própria empresa operadora do transporte e inclusive para as autoridades financiadoras dos empreendimentos de implantação de sistemas automáticos nesses níveis. Benefícios para os usuários Maior velocidade e menor tempo de viagem Nos sistemas DTO e UTO os trens são totalmente controlados por computador, que utilizam algoritmos avançados de controle, otimizando o desempenho da movimentação dos trens através de aplicação de perfis ótimos de aceleração, velocidade e frenagem e, como resultado, conseguindo menores tempos de percurso entre estações. Nas redes onde adicionalmente são implantadas portas de plataforma, estes sistemas atuam de forma a obter o máximo de eficiência nas operações de embarque e desembarque nas estações, implicando os menores tempos de parada para atendimento da demanda existente. Uma vez que os tempos de percurso são mais rápidos e os tempos de parada são menores, o uso de sistemas UTO e DTO promovem viagens mais rápidas. Nível 4 – Operação desatendida - UTO (Unattended Train Operation) Menores intervalos entre trens e menor tempo de espera A diferença deste nível de automatismo na operação de um trem com relação ao DTO é que: - o trem movimenta-se automaticamente, sem condutor e sem qualquer outro tipo de atendimento direto em seu interior; - a partida segura do trem de uma estação é totalmente automática, suportada por portas de plataforma; - o sistema UTO detecta e gerencia situações de perigo e de emergência; Outra grande vantagem dos sistemas de controle de trens sem condutor é que os intervalos entre trens tornam-se menores e, consequentemente, os tempos de espera nas estações também serão menores. 91 Isto se deve às seguintes características: - nesses sistemas, as manobras nos terminais são mais rápidas, pois são automáticas, o que minimiza a interferência causada pela operação de troca de cabines de comando, realizada por um ou dois condutores; 92 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários - tempos de percurso entre estações, tempos de parada nas plataformas e tempos de manobra mais rápidos implicam voltas também mais rápidas: Duração = ∑ tempos de percurso + ∑ tempos de parada + ∑ tempos de da volta entre estações nas estações manobra nos terminais Duração da volta Intervalo = Número de trens Portanto: Menor duração da volta → intervalo menor → maior oferta Melhor segurança pública e operacional Os sistemas UTO e DTO são projetados para oferecer melhor segurança pública e operacional, pois são equipados com: - monitoração visual dos interiores dos trens pelo centro de controle operacional; - comunicação visual e de áudio nos interiores dos trens, para veiculação de mensagens audiovisuais aos passageiros; - recurso para comunicação dos passageiros com o centro de controle operacional; - portas de plataforma para assegurar a segurança do embarque e desembarque de passageiros; - trens fabricados com tecnologia de alta confiabilidade, oferecendo menor risco de ocorrência de defeitos e maior disponibilidade para a operação. Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres Maior confiabilidade e baixo índice de paradas do sistema Os trens UTO e DTO são fabricados para oferecer maior confiabilidade e disponibilidade em relação aos dos sistemas convencionais e desta forma: Redução dos tempos de trem fora de serviço → melhor qualidade + do serviço menores custos de manutenção Maior segurança operacional A maior causa de acidentes nas ferrovias urbanas é o erro humano. Não havendo necessidade do condutor, a operação do trem ocorre com menor risco de acidentes devido à remoção do risco humano. Eficiência global da organização Nas ferrovias onde este tipo de sistema foi implantado, verificou-se uma grande oportunidade de aperfeiçoamento dos processos internos da empresa em decorrência dos benefícios que podem ser obtidos dessa nova tecnologia. Mudança de perfil do empregado Viagem mais rápida → menor intervalo → maior vazão → melhor conforto Também foi verificado nas ferrovias com UTO ou DTO que os empregados de operação se apresentam com melhor qualificação profissional, pois: - estes sistemas implicam no desaparecimento da atividade rotineira e cansativa de operação de trem; - o perfil do pessoal operativo fica muito mais voltado à assistência ao usuário; - acumulam mais conhecimentos do funcionamento dos equipamentos para o restabelecimento operacional. Equipe operacional mais voltada à assistência ao usuário Benefícios para as autoridades financiadoras Outra vantagem aos passageiros é que o perfil do empregado é voltado ao usuário, seja ele lotado no centro de controle operacional, nas estações ou no próprio trem no papel de assistente. Investimentos Melhor conforto durante os picos de demanda Os trens com tecnologia UTO e DTO oferecem maior conforto nas viagens aos passageiros, pois: Benefícios para a empresa operadora de transporte Gestão operacional flexível O primeiro grande benefício para a empresa que se utiliza de sistemas UTO e DTO é que ela passa a trabalhar com uma oferta adaptável à demanda devido a uma melhor utilização dos trens nos picos e nos horários vale. Outro benefício é que, utilizando equipamento de alta confiabilidade, a empresa reduz sua necessidade de provimento de reserva operacional, implicando aumento da janela para manutenção dos trens. 93 Quando uma empresa implanta um sistema UTO ou DTO, o custo de investimento adicional para novos sistemas é marginal se comparado ao dos sistemas tradicionais. A experiência das ferrovias que migraram para sistemas DTO ou UTO mostrou que a transformação de linhas convencionais para níveis 3 e 4, incluindo a reforma de trens e da sinalização, tem um retorno do investimento previsto para 10 anos. Finalmente, considerando-se que os equipamentos UTO e DTO apresentam maior confiabilidade, isto implica a necessidade de uma frota de reserva menor e, consequentemente, menor o investimento neste quesito. 94 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30/31 - 2008 - 3º e 4º trimestres Custos operacionais EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DA SINALIZAÇÃO - CBTC Os sistemas UTO e DTO oferecem menores custos operacionais, pois: - a alta confiabilidade dos trens tem menores custos de manutenção; - a eficiência da operação dos trens tem menores custos de consumo de energia. Paralelamente à evolução dos sistemas de operação de trens para as tecnologias DTO e UTO, os sistemas de sinalização dos metrôs estão passando por uma migração tecnológica bastante importante. A tecnologia do bloco fixo que se utiliza de circuitos de via para detecção e transmissão de códigos de velocidade evoluiu para a nova tecnologia de sinalização de bloco móvel, baseada em comunicação de dados por rádio de alta confiabilidade e segurança, o Communication Based Train Control - CBTC. Verificou-se que o custo de operação dos trens em ferrovias que utilizam sistemas UTO e DTO é aproximadamente a metade do custo de operação dos trens com sistemas convencionais. PORTAS DE PLATAFORMA A maioria dos metrôs que utiliza sistemas de operação de trens nos níveis 3 e 4 também instalou portas de plataforma em algumas, ou em todas as suas estações. Nesses metrôs verificaram-se vantagens decorrentes das portas de plataforma: - melhora significativa da segurança dos usuários durante as operações de embarque e de desembarque nas estações; - ausência de suicídios nas estações; - eliminação de invasões das vias e dos túneis por pessoal não credenciado; - sensível diminuição da quantidade de sujeira nas vias; - eliminação de queda de objetos nas vias; - percepção pelo público de melhor segurança pública nas plataformas das estações; - grande utilidade na compartimentação de focos de incêndio. Rennes – Linha 1 Em um sistema de sinalização com bloco fixo os controles da movimentação segura de um trem são aplicados de forma discreta, pois a posição de um trem apresenta a imprecisão de um circuito de via. Além disso, um código de velocidade é aplicado a cada circuito de via inteiro. Desta forma, um trem que esteja em vias de desocupar um circuito de via é visto pela sinalização como ocupando dois circuitos sucessivos. Nos sistemas de sinalização com bloco móvel, a posição do trem é controlada de forma contínua, ou seja, precisa. Hong Kong – Disneyland Resort Comparando estas duas tecnologias, o CBTC apresenta vantagens significativas em relação à de bloco fixo. Uma primeira e importante vantagem reside no fato de que, nos sistemas CBTC, parte dos problemas operacionais desaparecem, enquanto merece destaque, tam95 96 A evolução da segurança e do controle na operação dos sistemas metroferroviários bém, o fim dos problemas de “falsa ocupação” tão prejudiciais ao desempenho das linhas metroviárias. Nos sistemas CBTC, um trem pode se manter, de forma segura, a uma distância bem menor dos trens à frente, o que implica menores intervalos entre trens e consequentemente maior oferta. O controle contínuo da movimentação dos trens permite que os comandos de aceleração, manutenção de velocidade e de frenagem possam ser aplicados de forma contínua podendo ser empregados algoritmos mais sofisticados de comando de tração, voltados à otimização do movimento dos trens. Esta inteligência pode ser usada para melhorar o desempenho, minimizar o consumo de energia e mitigar os esforços aplicados ao material rodante. Desta forma sistemas CBTC propiciam menores consumos de energia de tração e menores custos de manutenção de material rodante. A operação de trens com sistema CBTC, aliada à operação automática nas regiões de manobra, de despacho e de recolhimento de trens, implica uma redução importante nos custos operacionais, pois além de se beneficiar das vantagens do CBTC, esta operação prescinde da presença de condutores para realizá-la. Aproveitando-se da sofisticação tecnológica e da segurança oferecida pelos sistemas computarizados e pelos sistemas de comunicação modernos, os sistemas CBTC são projetados para oferecer maior confiabilidade que os sistemas de sinalização com blocos fixos. Finalmente cabe ressaltar que todos os sistemas CBTC disponíveis no mercado estão preparados para aceitar a operação de trens nos níveis 3 e 4, ou seja, sem a presença de condutor. 97