Resumo
Aula-tema 3: A coesão textual: definição, funções, procedimentos e recursos
da coesão (a repetição)
O sentido de um texto é o resultado de uma relação de dependência entre as
suas partes. Assim, o texto é definido como uma unidade de sentido, ou seja, o seu
o significado é o resultado da articulação entre todos os seus segmentos. A
propriedade que estabelece a conexão entre as partes de um texto e que contribui
sensivelmente para a construção do sentido é a coesão textual. Dessa forma, a
propriedade da coesão textual define-se como:
(...) um conceito semântico referente às relações de sentido que se
estabelecem entre os enunciados que compõem o texto; assim, a
interpretação de um elemento depende da interpretação de outro. O sistema
linguístico está organizado em três níveis: o semântico (significado), o
léxico-gramatical (formal) e o fonológico ortográfico (expressão). Os
significados estão codificados como formas e estas, realizadas como
expressões. Desse modo, a coesão é obtida parcialmente através da
gramática e parcialmente através do léxico (Fávero, 2009: 09).
A função da coesão é, portanto, encadear as partes dos textos. Esse
encadeamento estabelece a ligação entre os segmentos do texto, articulando e
sinalizando a continuidade de ideias. Sem a coesão, a articulação entre as partes de
um texto perde a continuidade, e, consequentemente, a interpretação do sentido fica
prejudicada. Vejamos um exemplo de texto sem coesão:
(1)
Antigamente, os vizinhos cumprimentam-se mais. A correria da vida é
menor.
Nesse exemplo (1), a ligação entre as partes das orações está comprometida,
porque há uma inadequação entre os tempos verbais (o advérbio antigamente indica
uma ação no passado e os verbos cumprimentar e ser estão conjugados no
presente). Tais fatores desarticulam o sentido do texto. Uma possibilidade de
corrigirmos esse problema de coesão do exemplo (1) seria: alterar os tempos
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verbais e utilizar um conectivo para unir as duas orações. Vejamos como fica o
exemplo com tais alterações:
(2)
Antigamente, os vizinhos cumprimentavam-se mais, pois a correria da vida
era menor.
No exemplo corrigido (2), a coesão foi realizada por meio da adequação dos
elementos gramaticais. No entanto, a coesão também ocorre por meio de outros
elementos, como por exemplo: recursos lexicais, semânticos e sintáticos. Nesta
aula, abordaremos um dos procedimentos da coesão: a repetição. Especificamente,
trataremos o procedimento da repetição a partir de três recursos: a paráfrase, o
paralelismo e a repetição propriamente dita.
A paráfrase
A paráfrase possibilita retomar segmentos textuais, isto é, voltar a dizer o que
já foi dito, seja para exemplificar ou evidenciar algum conteúdo do texto. Ao retomar
algum segmento do texto, a paráfrase constitui um recurso de coesão por repetição.
No caso da paráfrase, a repetição ocorre pela reformulação de uma parte do texto,
sem a modificação do conteúdo original. O exemplo abaixo ilustra o uso desse
recurso coesivo:
(3)
De acordo com a orientação que vem sendo seguida pelos tribunais brasileiros, a
pessoa que se considera ofendida tem direito de ajuizar a ação no foro do seu próprio
domicílio. Isso significa que todos os que exercem, regular ou esporadicamente, a
liberdade de expressão por meio da internet correm o risco de ser processados em qualquer
lugar do país, dependendo do domicílio da pessoa que vier a se sentir ofendida pela matéria
publicada.
Fonte: http://palavrasoutras.blogspot.com.br/2012/06/liberdade-de-expressao-em-jogo-nostf.html. [com adaptações]. Acesso em: 04 set. 2012.
No exemplo (3), a expressão destacada (isso significa) explica o conteúdo do
período anterior. A paráfrase, que tem início no segundo período do parágrafo,
reformula com outras palavras o conteúdo do primeiro período. A reformulação
ocorre para evidenciar a informação anterior sem que haja a alteração de sentido.
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Dessa forma, a informação a respeito do direito de ajuizar a ação no foro do seu
próprio domicílio é repetida por meio de uma reformulação.
Em função dessa reformulação, o texto apresenta coesão, pois é estabelecida
uma ligação visível entre os dois períodos do texto.
No português, temos
expressões típicas que indicam a presença de paráfrases no texto. Essas
expressões sinalizam que determinadas informações voltam a ser evidenciadas no
texto por meio de uma reformulação. Algumas expressões recorrentes desse tipo
são: em outras palavras, ou seja, isto é, em resumo, em síntese, em suma, quer
dizer, ou melhor, isso significa.
O paralelismo
O recurso do paralelismo está relacionado ao princípio de simetria na
construção das orações. Em um período, quando há o emprego de termos sintáticos
equivalentes, ocorre uma ligação visível entre os elementos do texto. Dessa forma,
as ideias de um texto são organizadas por meio do uso de estruturas idênticas, o
que evidencia a coesão textual. O exemplo abaixo ilustra o uso de duas estruturas
idênticas que organizam o período no texto:
(4)
Os cientistas descobriram uma nova forma de tratamento do câncer e
anunciaram a cura da doença.
Podemos observar, no exemplo acima, que os núcleos dos objetos diretos
dos verbos descobrir e anunciar são substantivos (tratamento e cura). Graças a uso
da mesma estrutura sintática no mesmo período, é possível perceber a coesão entre
as orações. Vejamos um exemplo em que há a substituição das estruturas:
(5)
Os cientistas descobriram uma nova forma de tratamento do câncer e
anunciaram curar a doença.
No exemplo (5), o núcleo do objeto do verbo descobrir é um substantivo,
porém o mesmo tipo de preenchimento do objeto não ocorre no verbo anunciar. O
objeto de anunciar é preenchido por outro verbo (curar). Diferentemente do exemplo
(4) em que ocorre o paralelismo, é possível observar que coesão é prejudicada pelo
uso de estruturas sintáticas diferentes.
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Observemos um exemplo em que o paralelismo ocorre por meio do emprego
de expressões que induzem à complementação de partes do texto:
(6)
O tucano José Serra, em trajetória de queda desde o fim de junho, oscilou mais um
ponto para baixo e agora tem 21%. Fernando Haddad (PT) oscilou dois para cima e está
com 16%. Como a margem de erro é de 3 pontos para mais ou para menos, Serra e Haddad
estão em empate técnico. O candidato do PMDB, Gabriel Chalita, manteve os 7% da
pesquisa anterior. Soninha Francine (PPS) tem 5%.
Em simulações de segundo turno, Russomanno venceria tanto Serra quanto
Haddad. Num embate direto com o tucano, ele triunfaria por 58% a 30%. Se disputasse a
fase final com Haddad, ganharia por 56% a 30%. Fonte: Folha de São Paulo. 05 set. 2012.
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/poder/1148562-russomanno-volta-acrescer-e-se-distancia-de-adversarios.shtml. Acesso em: 05 set. 2012.
O segundo parágrafo do exemplo (6) apresenta a expressão correlativa tanto/
quanto que une duas partes da informação do texto. No caso desse exemplo, a
possível vitória de Russomanno sobre os candidatos José Serra e Fernando
Haddad.
Existem expressões que sinalizam no texto a ocorrência de paralelismo. As
mais comuns são: tanto/ quanto, tanto/como, mas/ também, por um lado/ por outro
lado, não apenas/ mais ainda, primeiro/ segundo (para enumeração de fatos ou
argumentos), seja, quer, ora. Vale destacar também que os usos dos mesmos
tempos verbais e de estruturas sintáticas idênticas indicam a coesão realizada por
meio do recurso do paralelismo.
A repetição propriamente dita
A repetição tem por objetivo enfatizar determinado referente no texto ou de
remeter o leitor às informações já ditas anteriormente. O conto “Furto de Flor”, de
Carlos Drummond de Andrade, reproduzido abaixo, ilustra o uso dessas funções no
estabelecimento da coesão textual.
(5)
Furto de flor
Furtei uma flor daquele jardim. O porteiro do edifício cochilava, e eu furtei a flor.
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Trouxe-a para casa e coloquei-a no copo com água. Logo senti que ela não estava
feliz. O copo destina-se a beber, e flor não é para ser bebida. Passei-a para o vaso, e notei
que ela me agradecia, revelando melhor sua delicada composição. Quantas novidades há
numa flor, se a contemplarmos bem.
Sendo autor do furto, eu assumira a obrigação de conservá-la. Renovei a água do
vaso, mas a flor empalidecia. Temi por sua vida. Não adiantava restituí-la ao jardim, nem
apelar para o médico de flores. Eu a furtara, eu a via morrer.
Já murcha, e com a cor particular da morte, peguei-a docemente e fui depositá-la no
jardim onde desabrochara. O porteiro estava atento e repreendeu-me:
- Que idéia a sua, vir jogar lixo de sua casa neste jardim!
(ANDRADE, 1985, apud, ANTUNES, 2005, p. 75)
Ao lermos o conto, verificamos que a referente flor repete-se seis vezes ao
longo do texto. A repetição estabelece a coesão no texto justamente por marcar
continuidade da narrativa e evidenciar o referente principal do conto.
Podemos observar que a repetição é um recurso coesivo importante e que
pode ser usado. No entanto, devemos sempre considerar que sua função deve ser
orientada para unir partes do texto ou para enfatizar determinado referente ou ação.
O uso excessivo da repetição pode prejudicar o desenvolvimento das informações
do texto. Isso pode ocasionar o que chamamos de texto circular, ou seja, no qual
não há a inserção e o desenvolvimento de novos argumentos, fatos ou informações
no texto.
Conceitos Fundamentais
Coesão: propriedade responsável pela continuidade e a ligação entre as partes de
um texto. A coesão é uma das propriedades responsáveis pela articulação entre as
orações, períodos e parágrafos de um texto.
Paráfrase: retomada de uma informação no texto por meio de reformulação. Na
paráfrase, o conteúdo semântico de um determinado segmento textual é conservado
e reescrito de uma forma diferente em outra parte do texto.
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Paralelismo: uso de estruturas idênticas para a construção de orações e períodos
no texto. O paralelismo tem como princípio a simetria e objetiva dar clareza à
organização do texto.
Referências
ANTUNES, Irandé. Lutar com as palavras: coesão e coerência. São Paulo:
Parábola, 2005.
FÁVERO, Leonor. Lopes. Coesão e coerência textuais. 11ª ed. São Paulo: Ática,
2009.
KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender os sentidos do
texto. São Paulo: Contexto, 2006.
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