ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO INFORMAÇÃO N° 026/11/PDPE INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO DIRETA: SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS DE DEFESA DA CEEE-D NA AÇÃO Nº 10502459976. HIPÓTESE DO ART. 25, INCISO II, DA LEI Nº 8666/93. O Sr. Secretário de Estado de Infraestrutura e Logística encaminha, nos termos do Decreto nº 42.566/2003, para exame desta Procuradoria-Geral, expediente oriundo do Grupo CEEE, que versa sobre contratação direta, sem licitação, de empresa de advocacia para prestação de serviço especializado na defesa da CEEE-D nos autos da ação judicial nº 10502459976. A contratação teria esteio no art. 25, inciso II, da Lei nº 8.666/93, em razão da inexigibilidade de licitação por notória especialização. Relata a consulente que foi a CEEE-D condenada ao pagamento de valores que já ultrapassam a cifra de 6 milhões de reais, acrescidos de horários advocatícios, os quais estão sendo executados provisoriamente. Pende, ainda, de decisão Agravo de Instrumento junto ao Superior Tribunal de Justiça, com o objetivo de dar seguimento ao Recurso Especial interposto. Afirma que houve falha na apresentação da contestação, não tendo a juíza de 1º grau apreciado a totalidade das provas. Seria necessário um trabalho intenso junto ao Tribunal Superior, visando o acolhimento das alegações da CEEE-D. Consta do expediente proposta de honorários de três escritórios de advocacia, minuta de contrato com o escritório Marinoni Advocacia, valores praticados por este último com outros clientes, comprovantes de sua regularidade fiscal , justificativa da escolha do contratado pela CEEE-D, cópia da decisão judicial que determina o pagamento do montante executado provisoriamente no prazo de 15 dias. É o breve relatório. 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO De pronto, cabe ressaltar a inexistência de obrigatoriedade de exame da presente contratação pela PGE, tendo em vista a redação do art. 1º do Decreto nº 47.366/10, que estipula como limite para análise por esta Procuradoria o valor de R$ 410.000,00. A CEEE-D almeja contratar diretamente, por inexigibilidade de licitação, a empresa Marinoni Advocacia, para prestação de serviços especializados visando a defesa do ente público na ação judicial nº 10502459976. Assim está estipulado na cláusula primeira da minuta de termo contratual (fls. 152-153): “CLÁUSULA PRIMEIRA – OBJETO É objeto do presente Contrato a execução, pelo CONTRATADO, dos serviços advocatícios abaixo descritos: 1.1 Elaboração e protocolo de memoriais ao Agravo de Instrumento nº 1386404, em trâmite junto ao Superior Tribunal de Justiça, incluindo a entrega ao Ministro Relator, em audiência a ser especialmente designada para tanto, visando a apreciação do Recurso Especial; 1.2 Elaboração e protocolo dos demais recursos necessários no caso do Agravo de Instrumento nº 1386404 não ser provido; ou, no caso de provimento do mesmo, acompanhamento do Recurso Especial junto ao Superior Tribunal de Justiça, mediante a apresentação pessoal de memoriais junto aos Ministros da Turma julgadora competente e sustentação oral, se o caso exigir, até o trânsito em julgado no Superior Tribunal de Justiça; 1.3 Elaboração e protocolo de ação cautelar para suspender a execução/cumprimento de sentença da ação principal, incluindo atuação pessoal junto ao Superior Tribunal de Justiça; 1.4 Elaboração e protocolo de impugnação à execução/cumprimento de sentença a ser apresentada na ação principal nº 001/1.05.0245997-6.” 2 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO A contratação tem amparo no permissivo do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.666/93, que tem a seguinte redação: “Art. 25 – É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: I - ... II – para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;” E o § 1º do citado dispositivo define a notória especialização, verbis: “§1º - Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto contratado”. A seu turno, o artigo 13 da Lei nº 8666/93, a que faz remissão o transcrito art. 25, arrola, em seus incisos, exemplificativamente, quais são os serviços técnicos profissionais especializados que ensejam a inexigibilidade licitatória. Na espécie, a contratação estaria enquadrada no inciso V do citado dispositivo. A inexigibilidade de licitar, portanto, ocorrerá quando for inviável a competição entre os potenciais interessados, dada a singularidade do serviço técnico a ser contratado com profissional de notória especialização. É que, como asseverado por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (Curso de Direito Administrativo, ed. Malheiros, 12ª ed., p. 468), se não há viabilidade de competição entre possíveis ofertantes, falta ao procedimento licitatório pressuposto lógico, não havendo, pois, 3 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO sentido, em a Administração realizá-lo. E isto ocorre quando o objeto é singular. Discorrendo sobre a singularidade do serviço a ser contratado, assevera o citado autor: “Em suma: a singularidade é relevante e um serviço deve ser havido como singular quando nele tem de interferir, como requisito de satisfatório atendimento da necessidade administrativa, um componente criativo de seu autor, envolvendo o estilo, o traço, a engenhosidade, a especial habilidade, a contribuição intelectual, artística, ou a argúcia de quem o executa, atributos, estes, que são precisamente os que a Administração reputa convenientes e necessita para a satisfação do interesse público em causa. (...). É natural, pois, que, em situações deste gênero, a eleição do eventual contratado - a ser obrigatoriamente escolhido entre os sujeitos de reconhecida competência na matéria - recaia em profissional ou empresa cujos desempenhos despertem no contratante a convicção de que, para cada caso, serão presumivelmente mais indicados do que os de outros, despertando-lhe a confiança de que produzirá a atividade mais adequada para o caso.” Ainda sobre o tema, traz-se à colação o magistério de EROS ROBERTO GRAU: “Isso enfatizado, retomo o fio de minha exposição para salientar, ainda, que, ser singular o serviço, isso não significa seja ele - em gênero - o único. Outros podem realizá-lo, embora não possam fazê-lo do mesmo modo, com o mesmo estilo e com o mesmo grau de confiabilidade de determinado profissional ou de determinada empresa. Logo, é certo que os serviços de que cuidamos jamais assumem a qualificação de únicos. Único é, exclusivamente - e isso é inferido em um momento posterior ao da caracterização de sua singularidade -, o profissional ou empresa, dotado de notória especialização, que deverá prestá-lo. 4 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO Porque são singulares, a competição (= competição aferível mediante licitação, segundo as regras do julgamento objetivo) é inviável, nada obstante mais de um profissional ou empresa possam prestá-los. Mas, como devem ser contratados com o profissional ou empresa dotados de notória especialização e incumbe à Administração inferir qual desses profissionais ou empresas prestará, em relação a cada um deles, o trabalho que, essencial e indiscutivelmente, é (será) o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato, neste segundo momento, quando a Administração inferir o quanto lhe incumbe, caracterizar-se-á não a unicidade do serviço, porém a unicidade do trabalho de determinado profissional ou empresa, justamente o que deve ser contratado para a prestação do serviço.” (In Licitação e Contrato Administrativo, ed. Malheiros, 1995, pp. 72/73). Logo, considerando a Administração que o serviço a ser contratado é singular, nos termos acima postos, poderá escolher, de forma discricionária - e devidamente justificada -, o profissional para prestá-lo, fazendo-o em razão de sua notória especialização e do grau de confiança que nele deposita. In casu, o órgão consulente lançou, por meio de manifestação subscrita pela Sra. Chefe da Divisão de Direito Público, Dra. Marcella Selbach Garcia Wolff, a justificativa da escolha da empresa Marinoni Advocacia, nos seguintes termos (fls. 129/134): “(...). O feito ainda se encontra na fase de conhecimento, estando pendente de apreciação o recurso de Agravo de Instrumento nº 1386404 em Recurso Especial contra a decisão que negou seguimento ao Recurso Especial (nº 70034618470), consoante extrato processual de fl. 06. A fim de se obter êxito no Agravo, para subida do Recurso Especial para apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça, necessário seja efetuado um intenso trabalho junto a esse órgão superior. Importante lembrar que esse intenso trabalho terá de ser feito junto ao Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, sendo que a Companhia não 5 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO conta com profissionais alocados em referida localidade, afigurando-se dificultoso o acompanhamento e atendimento judicial do feito. Ademais, a reversão da condenação é de suma importância para a CEEE-D principalmente em razão de que a diferença apurada como devida à empresa INEPAR corresponde quase que na sua integralidade aos descontos que foram efetuados nas faturas a título de multas contratuais, circunstância essa que foi afastada pelo juízo de 1º grau de forma expressa, sob a alegação de perempção, restando evidenciado que o formalismo processual se sobrepôs à verdade material, em que pese ter sido detectada pela perícia, ensejando até mesmo a incidência de enriquecimento ilícito da parte autora. Assim, haja vista a especial situação processual do caso, os vultosos valores envolvidos (atualmente o valor da condenação já ultrapassa os sete milhões reais), bem como a necessidade de acentuada expertise processual e trânsito junto ao Superior Tribunal de Justiça, entende-se que as chances de êxito da CEEE-D serão bem maiores com a terceirização dos serviços advocatícios abaixo elencados: (...) Assim, almeja-se a contratação do Escritório Marinoni Advocacia Advogados para prestar esse atendimento ao feito – por inexigibilidade de licitação -, uma vez que o profissional que prestará os serviços, dr. Luiz Guilherme Marinoni, consoante documentação acostada ao presente Expediente Interno, conta com notória especialização no ramo processual civil, consoante demonstra o seu currículo (fls. 38-40). Registra-se que o Dr. Luiz Guilherme Marinoni já prestou serviços à administração pública, tendo sido contratado pelo município de Tubarão/SC (cópia do contrato às fls. 78-81), para o qual, inclusive, executou trabalho semelhante ao que será prestado à CEEE-D, de acordo com a peça de fls. 41-60, a qual consubstancia-se em agravo regimental interposto junto ao Superior Tribunal de Justiça em ação cautelar destinada a dar efeito suspensivo a recurso especial.” Nessa senda, face aos argumentos expendidos pelo órgão consulente, acima reproduzidos, encontra-se justificada a escolha da empresa Marinoni Advocacia para prestar o 6 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO atendimento advocatício, em razão da singularidade do objeto a ser contratado e da notória especialização daquela empresa para desenvolvê-lo. Mister destacar, todavia, que a verificação dos requisitos técnicos da inexigibilidade da licitação incumbe exclusivamente à autoridade administrativa contratante, como, aliás, já assentado no Parecer nº 12.626, desta Casa, de lavra da Procuradora do Estado Dra. VERENA NYGAARD, do qual se transcreve o seguinte excerto: “Não há dúvida de que, por se tratar de uma área de conhecimento científico altamente especializada, é juridicamente possível admitir-se que a singularidade do trabalho a ser desenvolvido seja relevante para o contratante. Todavia, entendemos não caber a esta Procuradoria-Geral afirmar se, efetivamente, o serviço pretendido se reveste ou não da singularidade prefigurada na lei, pois tal juízo implica num ‘componente subjetivo ineliminável por parte de quem contrata’, conforme consignado pelo professor Celso Antônio, após haver explicitado: (...)”. Portanto, o juízo acerca da efetiva presença de singularidade do objeto do contrato, bem como da notória especialização do contratado é de exclusiva alçada do Administrador contratante. Ressalte-se que a viabilidade de contratação direta de serviços advocatícios já foi objeto de exame pelo Tribunal de Contas da União, cujo entendimento segue no mesmo sentido do aqui esposado. A título de exemplo, cita-se excerto do aresto a seguir: “[VOTO] No mérito, analiso o primeiro aspecto questionado, qual seja, a circunstância de a empresa contratar advogado particular para defender seus interesses na Justiça, apesar de contar com quadro próprio de 7 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO advogados. [...] Contrariamente ao que alega a denunciante, portanto, este Tribunal não tem entendimento firmado de que contratação similar à que ora se examina seja necessariamente ilegal. Na verdade, o entendimento hoje prevalecente neste Tribunal sobre a matéria é de que: 1º) a circunstância de entidade pública ou órgão governamental contar com quadro próprio de advogados não constitui impedimento legal a contratar advogado particular para prestar-lhe serviços específicos, desde que a natureza e as características de singularidade e de complexidade desses serviços sejam de tal ordem que se evidencie não poderem ser normalmente executados pelos profissionais de seus próprios quadros, justificando-se portanto a contratação de pessoa cujo nível de especialização a recomende para a causa; 2º) o exame da oportunidade e da conveniência de efetuar tal contratação compete ao administrador, a quem cabe analisar e decidir, diante da situação concreta de cada caso, se deve promover a contratação de profissional cujos conhecimentos, renome ou grau de especialização sejam essenciais para a defesa do interesse público que lhe cabe resguardar, e que não encontrem paralelo entre os advogados do quadro de pessoal da entidade sob sua responsabilidade. 3º) a contratação deve ser feita entre advogados pré-qualificados como os mais aptos a prestar os serviços especializados que se pretende obter. 4º) a contratação deve ser celebrada estritamente para prestação de serviço específico e singular, não se justificando portanto firmar contratos da espécie visando à prestação de tais serviços de forma continuada. [...] Nessas circunstâncias, tal como na hipótese anteriormente apreciada pelo Tribunal, a contratação do Professor [omissis] parece justificada pela necessidade de defender adequadamente os interesses do erário, ameaçado de vultoso prejuízo pela iminência de perda da causa na 8 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO demanda movida pela empreiteira contra a Rede Ferroviária.” (DC-0494-36/94-P Sessão: 02/08/94 Grupo: II Classe: VII Relator: Ministro Carlos Átila Álvares da Silva - FISCALIZAÇÃO - DENÚNCIA)” De outra parte, há de ser devidamente justificado o preço dos serviços contratados, como expressamente exigido pelo art. 26 da Lei nº 8.666/93. A respeito, registra JESSÉ TORRES PEREIRA JÚNIOR: “(...). Assim, a Lei nº 8.666/93 terá engendrado modo de obrigar a Administração a promover, mesmo em hipótese de dispensa de licitação, um levantamento sobre as condições do mercado que, nada obstante seu informalismo e rapidez, servirá ao princípio da licitação e criará vinculação a razões de fato, deduzidas expressamente e cujo eventual falseamento poderá conduzir à invalidade da aquisição, por vício de motivo ou desvio de finalidade, a par da responsabilização do agente que as firmou”. (In Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública, ed. Renovar, 4ª ed., 1997, p. 211) No caso em tela, foram juntadas ao expediente outras duas propostas de honorários de escritórios de advocacia, demonstrando estar o valor a ser contratado dentro dos preços praticados no mercado. Também foram apresentadas avenças realizadas pelo futuro contratado com outros clientes. Desta forma, considera-se atendidos os requisitos expostos no art. 26 da Lei de Licitações. Em relação à minuta de contrato, sugere-se algumas complementações, a saber: - cláusula 1.3 (fl. 153) – acrescentar também o acompanhamento da ação cautelar, não somente a elaboração e protocolo; 9 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO - cláusula 5ª (fl. 154) – especificar a qual trânsito em julgado está atrelada a vigência contratual. Além disso, a redação leva a crer que estaria incluído nos serviços a serem prestados eventual Recurso Extraordinário – uma vez que anterior ao trânsito em julgado -, o que não restou especificado no objeto contratual; - cláusula 6.4 (fl. 154) – excepcionalmente, admite-se a hipótese que alguma parte do objeto não venha a ser cumprida pessoalmente pelo contratado, desde que não se trate das atuações pessoais constantes das cláusulas 1.1 a 1.3, seja a impossibilidade de atuação devidamente fundamentada e que não desvirtue a justificativa da inexigibilidade de licitação. Por último, conforme referido à fl. 130, foi detectada falha na defesa apresentada pela CEEE-D em 1º grau, levando à indevida condenação em valores vultosos e à necessidade da contratação ora em análise. Necessário, portanto, seja apurada a responsabilidade pela contestação deficiente realizada, a fim de que busque a CEEE-D ressarcimento por eventuais danos daí decorrentes. Em conclusão, entende-se juridicamente viável a contratação direta dos serviços pretendidos, levando-se em conta a avaliação procedida pela CEEE na aferição da singularidade do serviço e da notória especialização do contratado. É a informação. Porto Alegre, 13 de abril de 2011. MARLISE FISCHER GEHRES Procuradora do Estado Ref. Expediente nº 2210-0480/11-0 10 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO Processos no 002210-04.80/11-0 Acolho as conclusões da Informação nº 026/11, da Procuradoria do Domínio Público Estadual, de autoria da Procuradora do Estado Doutora MARLISE FISCHER GEHRES. Em 13 de abril de 2011. Bruno de Castro Winkler, Procurador-Geral Adjunto para Assuntos Jurídicos. De acordo. Restitua-se o expediente à Secretaria de Infraestrutura e Logística. Carlos Henrique Kaipper, Procurador-Geral do Estado.