ARTIGO CIENTÍFICO
Encarte da Revista Átomo Nº 9 - SINQFAR
O Banco de Horas
na Atual Jurisprudência
do Tribunal Superior
do Trabalho - TST
Marcelo Wanderley Guimarães 1
Curitiba
2011
1
Marcelo Wanderley Guimarães – Advogado trabalhista em Curitiba desde 1996. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná – UFPR. Pós-graduado em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos - IBEJ. Pós-graduado em Direito Empresarial pela Universidade Positivo – UP. Professor
da Universidade Positivo em disciplinas relacionadas do Direito Material e Processual do Trabalho.
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Sumário
1. Introdução
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2. Limites legais do tempo de trabalho
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3. Modelos de compensação de horas
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3.1 – Eliminação total do trabalho aos sábados
3.2 – Trabalho em sábados alternados – semana espanhola
3.3 – Banco de horas
4. Previsão legal e requisitos de validade da compensação de horas 07
5. Os acordos de compensação e a atual jurisprudência do TST
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6. Considerações finais
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7. Referências Bibliográficas 12
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1. Introdução
Qual a quantidade de trabalho um ser humano pode, conforme a lei, realizar num dado
limite de tempo?
A resposta a essa pergunta passa pelo estudo da duração do trabalho. A quantidade de trabalho
efetivo ou de tempo à disposição do empregador pode ser tomada sob módulos de tempo e circunstâncias
de fatos diferentes. É a partir de parâmetros como esses que a legislação cuida de regulamentar os tempos
de trabalho e de intervalo. Diversos limites máximos e mínimos são previstos em lei: (a) 8 horas de trabalho
por dia, (b) 44 horas de trabalho por semana, (c) 15 minutos ou 1 hora de intervalo, pelo menos, quando a
jornada ultrapassa 4 e 6 horas, respectivamente, de trabalho consecutivo, (d) 11 horas de intervalo mínimo
entre duas jornadas, (e) 24 horas de descanso após 6 dias seguidos de trabalho consecutivo, (f) 30 dias de
férias após 1 ano trabalhado.
Percebe-se que a legislação procura encontrar uma certa (bio)lógica entre a quantidade de
tempo de trabalho e a correspondente necessidade de descanso que lhe deve suceder. E assim se estabelecem
as regras a respeito da jornada de trabalho. Como ensina Maurício Godinho DELGADO, na jornada
de trabalho inclui-se o tempo de efetivo trabalho, o tempo em que o empregado está à disposição do
empregador e ainda alguns intervalos impostos por lei em que, apesar de remunerados, o empregado nem
mesmo fica à disposição, pois tem direito ao descanso remunerado2.
Entretanto, nem sempre foi assim. Os limites da jornada de trabalho é assunto que revela uma
constante bandeira de luta da classe operária desde a Revolução Industrial até os dias atuais.
Há, aí, diversas questões e interesses envolvidos. O trabalho é fonte de realização pessoal e profissional
do ser humano, além de uma obrigação para aqueles que dependem única e exclusivamente da força de trabalho
para obterem os recursos necessários para a subsistência. Mas o homem, como ser social que é, tem necessidade
também de conviver em comunidade. E neste seio encontra outras atividades igualmente importantes, como a
formação acadêmica, a vida religiosa, serviços voluntários, o lazer, a educação dos filhos, a vida política ativa, entre
tantas outras. Além disso, não se pode esquecer que o tema tem relação direta com a saúde do trabalhador.
Sob ângulo diverso, o trabalho humano é um dos fatores de produção e, como tal, quanto
maior e melhor a capacidade de trabalho, tanto melhor a quem dele se utiliza.
Portanto, não é possível deixar de enxergar aí uma contraposição de interesses. Numa
visão demasiado simplista, sem considerar fatores econômicos externos à relação direta entre empregado
e empregador, enquanto os trabalhadores desejariam obter a máxima remuneração pelo menor tempo,
aqueles preferem o mínimo custo para a máxima produção.
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DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7ª ed. São Paulo: LTr, p. 838-856-869.
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Pois é justamente diante deste conflito de interesses que atua a legislação trabalhista. O
Direito do Trabalho veio para regulamentar este desequilíbrio manifesto entre aqueles que dependem da
venda da sua força de trabalho para sobreviver e os que controlam os fatores de produção. Assim, com uma
conotação protetiva, a legislação trabalhista impõe determinados limites e estabelece garantias mínimas ao
trabalhador.
Neste cenário se encontra a regulamentação da duração do trabalho. Interesses contrapostos,
normas legais ora estabelecendo direitos mínimos ora permitido a flexibilização mediante certos requisitos.
A participação dos sindicatos é fundamental neste processo, seja para encontrar fórmulas legais que atendam
as necessidades especificas da empresa, de um lado, seja para resguardar os direitos dos empregados, de outro.
Com vistas a alcançar o objetivo deste trabalho, que tem por destino compreender a
jurisprudência atual do TST sobre o banco de horas, será necessário percorrer um caminho no qual serão
vistos os limites impostos pela legislação brasileira à jornada de trabalho, os modelos de compensação de
horas - flexibilização desses limites -, bem como a sua regulamentação legal e requisitos de validade.
2. Limites legais do tempo de trabalho
A prática consagrou o uso da expressão jornada para se referir à carga diária e à carga
semanal, embora a sua origem seja relacionada ao trabalho realizado no dia.
O legislador constituinte de 1988 optou por reduzir a carga horária semanal de
trabalho, que antes era de 48 horas, para 44 horas. No entanto, foi mantido o limite de 8 horas
de trabalho por dia (art. 7º, XIII, da Constituição Federal). Observe-se que, assim, a Constituição
estabeleceu dois parâmetros: 8 horas por dia e 44 por semana.
Ambos os parâmetros devem ser respeitados, ou seja, não poderá haver trabalho normal
(ordinário) para além de 8 horas por dia nem acima de 44 por semana. Sendo ultrapassado qualquer deles,
caracterizar-se-á o trabalho extraordinário, que por sua vez gera a necessidade de pagamento de horas
extras, cujo valor, conforme previsto no art. 7º, XVI, da Constituição, será pelo menos 50% superior ao da
hora normal.
Outra questão importante, é que as 44 horas de trabalho por semana, no máximo,
podem ser distribuídas, de modo uniforme ou não, entre os 6 dias úteis da semana (sim, o
sábado também é dia útil). Porém, esta distribuição deve ser feita respeitando-se o limite de 8
horas por dia. Assim, a princípio, seria considerado trabalho extraordinário se o empregador,
por exemplo, querendo não trabalhar aos sábados, estabelecesse 5 jornadas de 8h48 minutos,
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porque o limite de 8 horas teria sido extrapolado em 48 minutos em todos os dias trabalhados.
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Do mesmo modo, caso o empregador estabelecesse 6 dias de trabalho de 8 horas, haveria horas
extras, pois o limite de 44 horas por semana teria sido desobedecido.
Por reconhecer a existência de necessidades e conveniências como esta (eliminar o trabalho
aos sábados), é que própria Constituição, art. 7º, XIII, ao mesmo tempo em que estabeleceu os limites,
facultou a compensação de horários mediante Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, matéria que já
era prevista na própria CLT. Portanto, segundo a Constituição, os limites de 8 horas de trabalho por dia e
44 horas por semana podem ser flexibilizados mediante Acordo ou Convenção Coletiva de Trabalho.
A Constituição traz a permissão, mas a regulamentação será dada pela legislação infraconstitucional,
sobretudo pelo art. 59, parágrafo 2º, da CLT.
Em sua redação primitiva esse dispositivo estabelecia a
compensação semanal de horas, isto é, poderia haver acréscimo (acima de 8 até o máximo de 10) de horas em
um(ns) dia(s), com redução em outro(s), mas desde que a soma de horas trabalhadas não superasse 44.
Mais recentemente, em 1998, por meio da Lei 9601/98, ao invés da simples e
tradicional compensação semanal, permitiu-se que a compensação no período de 120 dias.
Ainda em 1998, a MP 1709 ampliou esse prazo de compensação para 1 ano. Por fim, em 2001, a
Medida Provisória 2164 atribuiu a atual redação para o parágrafo 2º, do art. 59, mantendo o mesmo texto
e o prazo de 1 ano para compensação das horas. Instituía-se, assim, no Direito Laboral brasileiro, o banco
de horas, que é uma espécie de compensação de horas com prazo de maior, atualmente, de 1 ano.
3. Modelos de compensação de horas
A legislação estabelece os parâmetros que devem ser respeitados, mas não indica os modelos
de compensação. No mais das vezes, a iniciativa para o estabelecimento de um regime de compensação de horas
parte do empregador, tendo em vista as suas necessidades de produção e a otimização dos recursos produtivos.
Há que desenhar um modelo que se adapte aos seus interesses, mas que respeite os critérios legais.
Apenas a título de exemplo e até porque são mais simples e conhecidos. Serão mencionados 3 modelos.
3.1 – Eliminação total do trabalho aos sábados
Como bem alerta Valentin CARRION, a compensação foi inicialmente prevista para o
sábado e é a corriqueira. Nesse dia, é óbvia a conveniência do trabalhador, evitando deslocar-se para
o trabalho apenas parcial do dia.3
Segundo esse modelo, as 44 horas, isto é, o limite de horas normais de uma semana, devem ser
distribuídos entre os dias de segunda a sexta-feira. Exemplos: 1. os empregados trabalham em jornadas de 8h48 em 5
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CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. p. 115.
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dias; 2. os empregados trabalham em jornadas de 9 horas de segunda a quinta-feira e 8 horas na sexta-feira.
Observe-se que nos dois exemplos, o limite de 44 por semana foi respeitado. No entanto, o limite de 8
horas por dia, nos dois exemplos, foi extrapolado. Como visto antes, quando qualquer um dos dois limites – diário de
8 horas e semanal de 44 horas – foram descumpridos, caracterizar-se-á o trabalho extraordinário. Isso significa
que para ter validade esse sistema de compensação de horas, sem que o trabalho além de 8 horas por dia seja
considerado extra, determinadas formalidades deverão ser respeitadas, tema que será tratado adiante.
3.2 – Trabalho em sábados alternados – semana espanhola
É conhecido como semana espanhola o modelo de compensação em que o empregado trabalha em
semanas alternadas, previamente estabelecidas, de 40 e 48 horas semanais. Considerando-se o padrão de 44 horas
por semana, as 4 horas a menos de trabalho numa semana é compensado com 4 a mais na semana seguinte.
Pode-se estabelecer, segundo esse critério, que é possível a eliminação de trabalho total num sábado,
ao passo que o sábado seguinte será trabalhado em jornada de 8 horas, compensando-se automaticamente.
Registre-se que existe jurisprudência reconhecendo a validade de outro modelo de compensação fixado
por Acordo Coletivo, que por vezes também é chamado semana espanhola, pelo fato de alternar 36 e 48 horas de
trabalho em semanas subseqüentes, mas com jornadas de 12 horas seguidas defolgas de 36. Entretanto, para este modelo,
pensamos haver restrições, já que não seria respeitado o requisito legal de validade do acordo, que seria o máximo de 10
horas de trabalho por dia 4.
3.3 – Banco de horas
A Lei 9.601/98 veio para inaugurar no plano legal brasileiro o modelo rígido de compensação semanal. O
rigor quanto à compensação de horas dentro de uma mesma semana (ou na semana seguinte), foi flexibilizado para que
a compensação pudesse ser feita no período de 120 dias (atualmente, no prazo de 1 ano).
Assim, pode-se dizer que o banco de horas é uma espécie de compensação anual de horas, em contraposição
ao modelo anterior, de compensação semanal. Demanda elevada requer mais horas trabalhadas, mas sem a correspondente
remuneração como horas extras. Baixa demanda possibilita mais folgas. Nem o excesso é remunerado como extra nem a falta
provoca dispensas. Tudo isso a ser tratado num prazo mais amplo, de 1 ano, e não no curto período de 1 semana.
Percebe-se que este novo critério de compensação vem atender primeiro aos interesses da produção,
depois aos dos trabalhadores. O banco de horas tem por objetivo ajustar o tempo de trabalho às necessidades da atividade
econômica, conforme o necessário volume de produção. As horas de não-trabalho e o trabalho extraordinário são
tratados como débito ou crédito, respectivamente, em banco de horas. Chegado o fim do período – anual, segundo
a lei -, se o saldo de horas for positivo, a favor do empregado, este tempo deve ser remunerado como hora extra, se
negativo, deve ser zerado, iniciando-se um novo período.
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VIANNA, Cláudia Salles Vilela. Manual prático das relações trabalhistas, p. 306.
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Em certos casos, o banco de horas protege empregos, sobretudo em circunstâncias de crise econômica,
quando a baixa da produção poderia gerar a dispensa de empregados, o uso do banco de horas permite que os
empregados fiquem sem trabalhar durante determinado período, para posterior reposição destas horas.
Os modelos de compensação, o semanal ou o bissemanal e o sistema de banco de horas
(compensação anual), estão relacionados com o modo de gestão da produção. Os sistemas tradicionais de
compensação alinham-se com o fordismo, ao passo que o banco de horas atende ao toytismo. Isso porque
o primeiro possui uma organização de trabalho rígida, hierárquica e verticalizada, produz antes e mantém
estoques de produtos para venda, motivo pelo qual pode manter ritmo de trabalho constante. Já sob a
ótica toyotista, a demanda de mercado orienta a produção. Na medida em que o consumo oscila, pelos
mais diferentes motivos, haverá necessidade de flexibilizar também o ritmo da produção. Haverá épocas de
maior e de menor ritmo de trabalho.
Passemos à análise da regulamentação legal do assunto.
4. Previsão legal e requisitos de validade da compensação de horas
Conforme já referido, é a própria Constituição Federal que autoriza o sistema de compensação
de horas, pois o art. 7º, inciso XIII, estabelece os limites de 8 horas de trabalho por dia e 44 por semana,
facultada a compensação de horários e a redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.
O art. 59, § 2º, da CLT, regulamenta o sistema de compensação de horas:
Art. 59 - A duração normal do trabalho poderá ser acrescida de horas suplementares, em número não
excedente de 2 (duas), mediante acordo escrito entre empregador e empregado, ou mediante contrato
coletivo de trabalho.
§ 2º Poderá ser dispensado o acréscimo de salário se, por força de acordo ou convenção coletiva
de trabalho, o excesso de horas em um dia for compensado pela correspondente diminuição em outro dia,
de maneira que não exceda, no período máximo de um ano, à soma das jornadas semanais de trabalho
previstas, nem seja ultrapassado o limite máximo de dez horas diárias.
A primeira indagação necessária é quanto ao acordo mencionado na Constituição Federal e
no art. 59, da CLT. Seria tácito, verbal, escrito, individual ou coletivo? Maurício Godinho DELGADO
apresenta ampla explanação, trazendo diferentes opiniões sobre o assunto 5.
Os art. 8º, inciso III e IV, da Constituição, dispõem, respectivamente, que cabe ao sindicato
a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria e que é obrigatória a participação dos
sindicatos nas negociações coletivas de trabalho. Entendendo-se que a compensação de horas seria
modalidade de negociação coletiva de trabalho, a participação do sindicato seria obrigatória e o acordo seria
5
Para aprofundamento sobre estas correntes, consultar: DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, p. 856-869.
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coletivo. Sendo o acordo coletivo, haveria que ser aprovado em Assembléia Geral dos trabalhadores interessados (art.
612/CLT), celebrado mediante Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho e devidamente registrado perante o
Ministério do Trabalho (art. 614/CLT).
Entretanto, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), editou a Súmula 85, I e II, que flexibilizou esta
interpretação constitucional e atribuiu validade ao acordo individual escrito entre empregado e empregador para instituir
a compensação de horários, desde que não exista norma proibitiva em Convenção ou Acordo Coletivo. 6 In Verbis:
I - A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo
ou convenção coletiva.
II - O acordo individual para compensação de horas é válido, salvo se houver norma coletiva em sentido
contrário.
Com isso, fica desde logo esclarecido que o acordo de compensação tem forma definida, ou seja,
forma escrita. Nem o acordo verbal nem o tácito terão validade e a empresa que assim instituir a compensação
sofrerá as conseqüências jurídicas (e econômicas) desta irregularidade, como será visto adiante.
Diz, ainda, a Súmula 85, que irregularidades formais na pactuação do acordo, não implica o
pagamento de todo o tempo trabalhado além de 8 horas por dia como horas extras, desde que tenha sido
respeitado o limite semanal de 44 horas. Neste caso, havendo labor além de 8 horas por dia, mas respeitado o
limite de 44 por semana, para as excedentes de 8 será pago apenas o adicional de hora extra. Textualmente:
III - O mero não-atendimento das exigências legais para a compensação de jornada, inclusive quando
encetada mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada
normal diária, se não dilatada a jornada máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional.
Tal interpretação procurou equilibrar os interesses dos trabalhadores e dos empregadores. A favor
dos empregados, porque há uma remuneração adicional, já que houve trabalho além do limite legal de 8
horas por dia; a bem dos empregadores, que não terão que pagar o valor integral da hora extra (hora mais
adicional), porque embora extrapolado o limite de 8 horas por dia, foi respeitado o limite de 44 por semana.
Tal entendimento se justifica porque houve efetivamente compensação, apesar de formalmente irregular.
Surge então outra questão fundamental: esta forma de acordo – escrita e individual – é válida
somente para o acordo de compensação semanal ou também se aplica ao banco de horas? A matéria será analisada
no tópico seguinte.
Além de acordo escrito, como vimos, o art. 59 da CLT e seu § 2º, estabelecem que (1) haja no
máximo duas horas suplementares; que (2) o excesso de jornada de um dia seja compensado com a diminuição
em outro, de modo que a soma de um ano não ultrapasse a soma das jornadas previstas e (3) que o limite de 10
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horas de trabalho por dia não seja ultrapassado (incluindo as normais e as extras).
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Nesse sentido: MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do Trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas do trabalho, p. 305-306.
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Observa-se que o segundo requisito material retorna ao módulo semanal de carga horária,
isto é, ao final de 1 ano, ao se apurar o saldo de horas realizadas, não se poderá encontrar resultado superior
ao número de horas normais (não extraordinárias) previstas para o mesmo período. Em outras palavras:
para fins didáticos, suponha-se que um ano tenha 52 semanas exatas, cada semana com o limite de 44
horas de trabalho normal (não extraordinário)7.
O terceiro requisito de ordem material é a inexistência de trabalho além de 10 horas por dia.
A lei proíbe expressamente mais de 10 horas de trabalho por dia.
Quanto aos requisitos materiais, a Súmula 85 do TST diz que o trabalho extraordinário habitual
descaracteriza o acordo de compensação e determina o pagamento como horas extras do tempo trabalhado além de
44 horas por semana e apenas do adicional de hora extra para as horas que seriam destinadas à compensação:
IV - A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta
hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias
e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho
extraordinário. (ex-OJ nº 220 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)
Considerando-se que o banco de horas é uma espécie de compensação de horas, seria de se
concluir que as orientações da Súmula 85 seriam válidas para qualquer modalidade de compensação.
Entretanto, não tem sido esse o entendimento.
5. Os acordos de compensação e a atual jurisprudência do TST
Em breve síntese, foi visto que a Constituição Federal e o art. 59 da CLT autorizam a compensação
de horas mediante acordo. Em sua redação original, o 2º, do art. 59, § 2º, da CLT, estabelecia a possibilidade de
compensação semanal de horas. Atualmente, admite-se a compensação anual mediante banco de horas.
Uma vez que o art. 59 da CLT trata genericamente de acordo de compensação, mas não especifica regras próprias
compensação semanal (tradicional) e compensação anual (banco de horas), competiu à jurisprudência disciplinar o tema.
A Súmula 85 do TST interpreta o art. 59 da CLT e acentua que acordo de compensação pode ser
individual, mas deve ser escrito, e que é descaracterizado pela realização de horas extras. Esse entendimento
sumular teve como base fática as ocorrências relativas ao acordo de compensação semanal e não o banco de horas.
Atualmente a jurisprudência do TST consolida-se no sentido de que a Súmula 85 aplica-se tão
somente aos casos de acordos de compensação semanal, não ao banco de horas. A título de exemplo e para bem
compreender as razões da Corte Superior Trabalhista, cita-se o seguinte julgado:
7
Para fins didáticos, desprezando-se os feriados e considerando-se o ano como 52 semanas:
Horas previstas = 52 semanas x 44 horas = 2288 horas de trabalho previstas
Sistema Banco de horas = horas normais + horas de crédito – horas de débito = 2288 horas.
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RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. BANCO DE HORAS. ACORDO DE
COMPENSAÇÃO INDIVIDUAL. SÚMULA Nº 85, III, DO TST. 1. O TST reconhece a validade
do ajuste individual para a compensação de jornada dentro da mesma semana, nos termos do item II da
Súmula nº 85. Porém, o mesmo não acontece com a compensação de jornada mediante a adoção de
banco de horas, por meio do qual a compensação pode ocorrer no período de um ano. 2. Essa diferenciação
se dá pelo fato de que, na compensação de jornada dentro da mesma semana, reconhecem-se, no acordo
entre empregador e empregado, vantagens proporcionais para ambas as partes. O empregador poderá
utilizar-se da força de trabalho do empregado em horário mais adequado às necessidades circunstanciais
da empresa. O empregado, por sua vez, sem prejuízo para a própria saúde e segurança (dada a limitação
semanal), disporá de tempo livre para atividades pessoais, em horário no qual, de outro modo, deveria
estar desempenhando suas atividades na empresa. 3. A compensação anual (banco de horas), gera efetivo
prejuízo para a saúde e segurança do trabalhador, visto que poderá ser submetido por longos períodos
(talvez meses) à sobrejornada, sem a possibilidade de dispor imediatamente de tempo livre para sua
vida pessoal, ou mesmo tempo suficiente para repor suas energias de forma proporcional ao desgaste
sofrido. 4. Nesse contexto, não é admissível ajuste direto entre empregado e empregador, exigindo- se a
presença do sindicato, dada a necessidade de garantir efetivas e proporcionais vantagens para o trabalhador,
em contrapartida ao prejuízo que esse sistema de compensação causa à sua saúde e segurança. 5 - Recurso
de revista de que não se conhece. (TST; RR 261800-27.2009.5.12.0016; Quarta Turma; Relª Minª
Kátia Magalhães Arruda; DEJT 18/03/2011; Pág. 1088)
A partir da decisão acima fica claro o posicionamento do TST no sentido de que a Súmula
85 se aplica apenas aos acordos de compensação semanal, isto é, os clássicos ou tradicionais acordos de
compensação. Basicamente, são os modelos de compensação desenvolvidos antes do ingresso do banco de
horas no sistema jurídico trabalhista brasileiro.
De acordo com os julgados acima e conforme anunciado antes, o banco de horas veio para
atender primeiramente os interesses da produção, ao passo que a compensação semanal oferece vantagens
diretas para ambos os lados. Em razão disso é que as facilidades e benefícios ao empregador apresentados
na Súmula 85 não são aplicáveis ao banco de horas.
Assim, não será admitido acordo para banco de horas individual. O banco de horas só será
formalmente válido quando negociado com a participação obrigatória do sindicato dos empregados e
celebrado por Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho. Do mesmo modo, os requisitos materiais de
validade devem ser respeitados: B) Requisitos materiais: 1) não haver mais de 2 horas suplementares; 2)
não extrapolar o limite de 10 horas por dia; 3) não resultar mais horas do que as normais previstas para o
período. Este último, não invalida o acordo, mas exige o pagamento de horas extras.
Quanto às previsões contidas nos itens III e IV da Súmula 85, igualmente não se aplicam aos
casos de banco de horas. Havendo trabalho além de 8 horas por dia ou 44 por semana, estas serão lançadas
no banco a crédito do empregado. Porém, se qualquer irregularidade houver, o efeito será o pagamento de
todo o excedente dos limites normais – 8 horas por dia e 44 por semana – como horas extras.
Destaca-se que esta consequência é bastante significativa, uma vez que praticamente triplica o
valor do passivo trabalhista em decorrência da nulidade de um acordo de banco de horas quando comparado
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com a invalidade de um acordo de compensação semanal.
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É que os itens III e IV da Súmula 85, em determinadas circunstâncias, determina o
pagamento das horas excedentes apenas com o adicional da hora extra (50%), enquanto a não aplicação
destas orientações ao caso em que houve a decretação de nulidade do acordo de banco de horas ensejará o
pagamento da hora extra integral (1 + 50%).
Portanto, quando se trata de acordo de compensação via banco de horas é de vital importância
que se cumpra rigorosamente os requisitos formais (acordo aprovado por Assembléia, com participação
sindical, escrito, coletivo e registrado na DRT) e os materiais (respeito às regras do próprio acordo além de
não haver mais de 2 horas suplementares nem jornada superior a 10 horas).
6. Considerações finais
A CLT regulamentava inicialmente apenas a compensação semanal de horas. Com base
nesta modalidade de compensação, construiu-se a jurisprudência que enxergou haver na compensação
semanal interesse mútuo, dos empregados e dos empregadores.
Por conta disso, a Súmula 85 procurou encontrar soluções equilibradas para as hipóteses de
descumprimento das exigências legais quanto ao acordo de compensação. Admitiu acordo individual
de compensação e adotou menor rigor quando encontrou irregularidades nos acordos, determinado o
pagamento apenas do adicional de horas extras em determinadas circunstâncias.
A chegada do sistema de compensação por banco de horas no Direito brasileiro fez revelar
que as razões para a sua adoção privilegiam, sobretudo, os interesses da produção, diferentemente do
que ocorria com o acordo de compensação semanal. Por essa razão, a jurisprudência do TST consolida-se no
entendimento de que os benefícios concedidos pela Súmula 85 aos acordos de compensação semanal,
quando apresentavam irregularidades, não podem ser aplicados aos casos de banco de horas.
Portanto, os acordos de compensação via banco de horas recebem tratamento jurídico mais
rigoroso, devendo as partes que o adotam cercarem-se de maiores cuidados, tanto na formalização
quanto na execução, ou seja, na fiscalização do seu cumprimento. As conseqüências da sua anulação
judicial, por sua vez, tendem a causar elevados custos para o empregador, já que todo o trabalho além
dos limites legais será calculado como hora extra.
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7. Referências Bibliográficas
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 10 de outubro de 1988. (Texto
compilado; inclui as alterações posteriores). Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/constituicao.htm. Último acesso em 15.04.2011.
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 31ª ed. atualizada por
Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2006.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 7ª ed. São Paulo: LTr, 2008.
MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do Trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas
do trabalho. 2ª ed, Saraiva, 2011.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. 34ª ed. São Paulo: LTr, 2009.
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