INTERNATO EM PEDIATRIA HRAS - 2011 CASO CLÍNICO:Linfadenites na Infância Osvaldo Simari Neto - Interno 6º ano Coordenação: Luciana Sugai; Bruno Vaz ESCS www.paulomargotto.com.br Brasília, 20/6/2011 ID: R.P.Q., sexo masculino, 02 anos e 10 meses, procedente do Grará II - DF. QP: caroço no pescoço há 05 dias. HDA: Acompanhantes (pai e mãe) relatam que criança apresentou há 05 dias surgimento súbito de nodulação em região mandibular D, de aproximadamente 01 cm, sem sinais flogísticos e de crescimento progressivo. Há 01 dia queixa de febre não aferida, hiporexia, irritabilidade e dor local. Tem história de coriza hialina há 10 dias, sem tosse ou dispnéia. Não evacua há 02 dias. Diurese e sono preservados. Procurou emergência do HRAS hoje, sendo internado e solicitados exames. ANTECEDENTES: Nascido de PNAT, 40 semanas, P: 3185g, PC: 33,5cm, C: 49cm, Apgar 9/10. Com 01 mês mudou-se para Correntina-Ba, onde permaneceu até o 7º mês sem realizar acompanhamento ambulatorial de CD. Sem atraso do DNPM. História de OMA aos 07 meses, respondendo a tratamento ambulatorial. Sem comorbidades. Nega outras doenças na infância Mãe 32 anos, com relato de D. Chagas (SIC). Pai 31 anos, hígido. Irmãos de 10 e 07 anos e irmã de 01 mês de vida, hígidos. 01 tio paterno com relato de deficiência mental/física. Sem doenças típicas na família. Reside em casa de alvenaria, 07 cômodos, água encanada, sem animais de estimação em casa. Nega viagens ou infecções recentes. Sem pessoas doentes em casa. Não freqüenta creches ou escolas. Ao exame físico: P: 12.8Kg REG, corado, hidratado, eupnéico, acianótico, afebril, irritado, chorando, ativo e reativo. Não colabora com o exame. Massa em região cervical D, volumosa (aprox. 08cm), estendo-se até região submandibular E, com presença de irregularidades sugerindo nodulações confluentes, dolorosa à palpação, sem sinais de flogose, endurecida, pouco móvel. Sem linfadenopatia em outras cadeias. Otoscopia e oroscopia sem alterações. ACV: RCR 2T, BNF, sem sopros. FC: 98bpm. AR: MVF+ bilateral, sem RA. Sem sinais de esforço respiratório. FR: 24irpm. Abdome flácido, indolor, sem vísceromegalias, sem sinais de peritonite, RHA+ fisiológico. Extremidades bem perfundidas sem edema. Laboratório(chegada ao PS): Amilase 91. Hb 12.5/ Ht 37.8% / HC: 18000 leucócitos* ( 71% seg/ 3 mono/ 26 linf.)/ Plq 368000/ anisocitose +/ VHS 49*. US cervical: Aumento de ecogenicidade do TCS de região cervical D. Linfonodos aumentados à D na região cervical, submandibular, 1.7cm, e ao nível 3 da região cervical D, 1.3x0.8 cm. Em relação ao endurecimento cervical D observa-se linfonodo aumentado (1.8cm), área heterogêncea de limites mal definidos de 2x1.5cm. Na região cervical E nível 3 observa-se linfonodo aumentado de 1.6cm. EVOLUÇÃO: No 1º DIH foi introduzido cefazolina 100mg.kg.dia 6x6 horas O paciente evoluiu no 2º DIH com eritema e calor local, mantendo-se endurecido, sem área de flutuação. O paciente não apresentou febre ou comprometimento do estado geral durante internação. Apresentou área de flutuação no 4º DIH. No 5º DIH foi avaliado pela cirurgia pediátrica da unidade, optando-se por abordagem cirúrgica. EVOLUÇÃO: No 7º DIH a lesão foi drenada cirurgicamente, com saída de pequena quantidade de pus espesso. Colocado dreno penrose na incisão. No 8º DIH manteve-se hiperemia da lesão, com drenagem de pequena quantidade de secreção purulenta. Trocado antibiótico para VO (cefalexina), e programada alta para dia seguinte. 9º DIH: retirada do dreno e alta hospitalar com esquema de cefalexina VO mantido por mais 6 dias. Agendado retorno para ambulatório de infectologia/ linfadenomegalia. LINFADENITES NA INFÂNCIA *LINFADENITES CERVICAIS* CONCEITOS Linfadenomegalia ou Adenomegalia: aumento dos linfonodos. Linfadenopatia ou adenopatia: aumento e/ou inflamação do linfonodo. Linfadenite ou adenite é aumento e inflamação do linfonodo. Hiperplasia reacional é a maior causa de adenite, adenopatia ou adenomegalia na pediatria. Mais que 80% das adenites cervicais envolvem cadeia submandibular e/ou cervical posterior. 2002;7(4):22-28 - Revista Diagnóstico & Tratamento FISIOPATOLOGIA - ADENITE Penetração de pele ou mucosa – transporte linfático Infiltração sintomática ou não Proliferação linfócitos aumento do nódulo Agentes piogênicos: Micobactérias e fungos: Inflamação aguda e flogose Recrutamento neutrófilos = abscesso Inflamação arrastada, + - supuração *Causa mais comum de adenite na infância é infecciosa! FORMAS CLÍNICAS Forma aguda bilateral Aguda unilateral Subaguda ou crônica bilateral Subaguda ou crônica unilateral Etiology and clinical manifestations of cervical lymphadenitis in children; 2011 UpToDate FORMA AGUDA BILATERAL A mais comum *Vírus VAS Adenovírus, influenza Inflamação de garganta, rinorréia, congestão nasal, tosse Linfonodo: Pequeno, elástico, móvel, sem flogose *Auto-limitado GAS (Streptococcus grupo A): Faringite Outras: Faringite pelo Mycoplasma pneumoniae Gengivoestomatite herpética EBV e CMV Mais associados à forma generalizada e subaguda /crônica FORMA AGUDA UNILATERAL Bactérias: Staphylococcus aureus e GAS 40-80% * < 05 anos História de impetigo Febre, taquicardia, mal-estar, sem toxemia Linfonodos 3-6cm, com flogose, menos móvel, + - flutuação(até 30%) FORMA AGUDA UNILATERAL Streptococcus grupo B Lactentes Manifestação tardia da infecção(3ª - 7ª semana) Febre, irritação, recusa alimentar Eritema facial/inchaço submandibular, margens mal definidas Bacteremia Lactente com adenite por GBS; Medical Discussion Forum FORMA AGUDA UNILATERAL Anaeróbios Crianças mais velhas com afecções dentárias Tularemia Francisella tularensis Animais infectados (coelhos, hamster) ou mordedura de artrópodes (ácaros) Lesão papular na área do linfonodo inflamado FORMA BILATERAL SUBAGUDA/CRÔNICA *EBV e CMV Mononucleose ou mono-like Febre, faringite exsudativa, linfadenopatia generalizada, hepatoesplenomegalia Predomínio de linfócitos – linfócitos atípicos > 10% Toxoplasmose, TB, HIV, sífilis * generalizada FORMA UNILATERAL SUBAGUDA/CRÔNICA Micobactéria não tuberculosa – NTM * complexo Mycobacterium avis Aumento + insidioso(semanas) *submandubular < 04cm Róseo violáceo Dor e febre são incomuns Drenagem purulenta + tardia FORMA UNILATERAL SUBAGUDA/CRÔNICA Arranhadura do gato Bartonella henselae Mordedura/arranhadura do gato Nódulo satélite quente e eritematoso Pápula no local da inoculação Febre e sintomas sistêmicos em30% por 4-6 semanas – adenopatia por meses (pode supurar) Sd. Parinaud: Conjuntivite + adenite ipsilateral(submandibular ou periauricular) FORMA UNILATERAL SUBAGUDA/CRÔNICA Tuberculose Extensão de nódulos peritraqueais (submandibulares) ou pleura apical (supraclaviculares) Rev. Para. Med. v.20 n.3 Belém set. 2006 FORMA UNILATERAL SUBAGUDA/CRÔNICA Toxoplasmose Toxoplasma gondii Congênita Adquirida * assintomática ou mono-like * benigna e autolimitada Adenite discreta não supurativa, persistente (meses) Source: Patrick Hickey, MD, FAAP, DTMH, and Michael Rajnik, MD OUTRAS CAUSAS PARACOCCIDIODOIMICOSE Paracoccidioides brasiliensis – forma aguda/subaguda (tipo juvenil) Pico com10-20 anos Área agrícola Instalação em 4-12 semanas QC: linfadenomegalia, manifestações digestivas, hepatoesplenomegalia, envolvimento ósteoarticular e lesões cutâneas Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 39(3):297-310, mai-jun, 200 OUTRAS CAUSAS LEUCEMIAS * idosos Inicialmente tipicamente benignos Cursa com aumento de tamanho e confluência * LLA Astenia, sangramentos e febre, dor óssea Adenomegalia cervical ou generalizada em 75% Anemia+plaquetopenia+ contagem de leucócitos variável (*blastos) Confirmação por Biópsia e aspirado de MO Pode haver crescimento rápido do linfonodo LLC Alerta para malignidade Palidez cutâneomucosa ou anemia Febre persistente Emagrecimento Hepatoesplenomegalia Gânglios: aderidos a planos profundos ou à pele, coalescentes, endurecidos, supraclaviculares Envolvimento mediastinal no RX de tórax OUTRAS CAUSAS LINFOMAS Linfoma Não-Hodgkin Não doloroso, * cervical * idosos Linfomas indolentes Acomete * TGI Pico aos 11 anos Linfomas agressivos Crescimento lento Crescimento rápido Altamente agressivos – Burkitt 2º linfoma + comum na infância Crescimento rápido e sintomático (compressão de estruturas) Resposta dramática à poliQT – cura em até 60% Forma esporádica do Burkitt Forma africana Associação com EBV em 95% Pico aos 7 anos Massa cervical órgãos OUTRAS CAUSAS LINFOMAS Linfomas Hodgkin 70% cervical ou supraclavicular E Nódulos móveis, elásticos(ou endurecidos), > 2cm, doloroso à ingesta alcoólica, persistentes Picos: 20-30 e 50-60 anos Esplenomegalia em 10% 35% cursam com sintomas B ABORDAGEM DIAGNÓSTICA Não é necessário identificar etiologia sempre! 1) Aguda bilateral: * auto-limitada(viral) Doença leve Acompanhar evolução Severa, progressiva ou persistente Febre; > 6-8 semanas, sem melhora ou com piora, solicitar: HC (contagem de células) VHS PCR TGO e TGP Hemocultura PPD Sorologia (EBV, CMV, HIV e conforme epidemiologia) ABORDAGEM DIAGNÓSTICA 2) Aguda unilateral: Leve Acompanhar Moderada Febre, sem flutuação PAAF – Gram e cultura; BAAR Hemocultura Cultura de exsudato de pele e garganta (não confirma GAS) Cultura – não exclui anaeróbios Grave Febre, toxemia, flutuação + - celulite Hemocultura! US (suspeita de abscesso) Drenagem Gram e cultura – incluir micobactéria e fungo Biópsia ABORDAGEM DIAGNÓSTICA 3) Subaguda/crônica: VHS e PCR PPD 5-15mm – NTM ou TB > 15mm – TB Considerar aspecto e evolução Sorologias – B. henselae, tularemia, toxoplasmose Não definição: biópsia excisional Indicação de biópsia: Ausência de resposta terapêutica Adenite supraclavicular ou escalênica Adenite de crescimento rápido Diagnostic approach to and initial treatment of cervical lymphadenitis in children; 2011 UpToDate. TRATAMENTO INICIAL Aguda bilateral: Acompanhar evolução – Tratamento conservador Doença severa, persistente ou progressiva – pesquisar e tratar conforme etiologia Aguda unilateral: Leve Moderada Acompanhar ATBO VO Grave ATBO EV + drenagem cirúrgica VO empírico: Cefalexina 25100mg.kg.dia 6x6h (máx. 4g) Cefadroxil 30mg.kg.dia 12x12h (máx. 2g) Clindamicina 30mg.kg.dia 6x6 ou 8x8h (máx. 1.8g) MRSA ou anaeróbios 10 a 14 dias Resposta 1ªs 24-48 horas Se não responder – PAAF e/ou drenagem TRATAMENTO INICIAL EV empírico: Cefazolina50100mg.kg.dia 8x8h (máx. 6g) Oxacilina 150mg.kg.dia 6x6h (máx. 12g) Clindamicina 40mg.kg.di(máx. 4.8g) Associar vancomicina se há ameaça à vida da criança Troca para VO Melhora clínica e laboratorial - PCR/VHS Completar 10-14 dias Falha terapêutica Considerar outras causas ( incluindo nãoinfecciosas) TRATAMENTO INICIAL Subaguda/Crônica: Doença da arranhadura do gato Caso suspeito não confirmado Mesmo tratamento da forma aguda unilateral Caso confirmado Auto-limitado ou: Azitromicina, rifampcina, gentamicina NTM Macrolídeo (azitro ou claritromicina) + etambutol/rifabutin – quando excisão não é possível Excisão cirúrgica – tratamento de escolha Incisão + drenagem é contra-indicado pela grande chance de fistulização crônica TESTES ADICIONAIS Etiologia incerta; 6-8 semanas sem resposta VDRL Sorologias - EBV, CMV, HIV, histoplasmose, coccidioidomicose, paracoco, toxoplasmose, tularemia, brucelose Radiografia de tórax Biópsia excisional Massa mediastinal – correlação RX CT tórax PROGNÓSTICO Remissão total em semanas na maioria Reativação Predisposição à infecções Fonte não tratada (abscesso dentário) Complicações Doença disseminada (micobactéria) Celulites e abscessos GNDA (GAS) BIBLIOGRAFIA Etiology and clinical manifestations of cervical lymphadenitis in children; Swanson, S.D.; 2011 UpToDate. Diagnostic approach to and initial treatment of cervical lymphadenitis in children; ; Swanson, S.D.; 2011 UpToDate. Consenso em paracoccidioidomicose; acessado em http://www.scielo.br/pdf/rsbmt/v39n3/a17v39n3.pdf Rev. Para. Med. v.20 n.3 Belém set. 2006. 2002;7(4):22-28 - Revista Diagnóstico & Tratamento. Paes Andréa Luzia Vaz, Neto Frederico Jorge Rodrigues, Filho José Ribamar Trindade Sales. Tuberculose ganglionar periférica: aspectos clínico-epidemiológicos. Rev. Para. Med. [periódico na Internet]. 2006 Set [citado 2011 Jun 13] ; 20(3): 33-37. Disponível em: http://scielo.iec.pa.gov.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-59072006000300007&lng=pt.