"Também sabemos que o Filho de Deus é vindo e nos tem dado entendimento
para reconhecermos o verdadeiro; e estamos no verdadeiro, em seu Filho, Jesus
Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna."
(1João 5.20)
Jesus Cristo, Deus e homem
A Trindade e a Encarnação são temas que se relacionam. A doutrina da Trindade
declara que o homem Jesus é verdadeiramente divino; a da Encarnação declara que o
divino Jesus é verdadeiramente humano. Juntas, elas proclamam a plena realidade do
Salvador que o Novo Testamento apresenta, o Filho que veio da parte do Pai, pela
vontade do Pai, para tornar-se o substituto do pecador sobre a cruz (Mt 20.28; 26.36-46;
Jo 1.29; 3.13-17; Rm 5.8; 8.32; 2Co 5.19-21; 8.9; Fp 2.5-8).
O movimento decisivo sobre a doutrina da Trindade ocorreu no Concílio de Nicéia
(325 d.C.), quando a igreja rejeitou a idéia ariana de que Jesus era a primeira e mais
nobre criatura de Deus, e afirmou que Ele era da mesma "substância" ou "essência" (isto
é, a mesma entidade existente) do Pai. Assim, há somente um Deus, não dois; a
distinção entre Pai e Filho está dentro da unidade divina, e o Filho é Deus no mesmo
sentido em que o Pai o é. Dizendo que o Filho e o Pai são "de uma substância", e que
o Filho é "gerado" ("único gerado, ou unigênito", João 1.14,18; 3.16,18) mas "não
feito", o Credo Niceno inequivocamente reconhece a deidade do homem da Galiléia.
Um evento crucial para a confissão da doutrina da Encarnação aconteceu no
Concílio de Calcedônia (451 d.C), quando a igreja rejeitou a idéia nestoriana de que
Jesus era duas personalidades - o Filho de Deus e um homem - sob a mesma pele, como
a idéia eutiquianista de que a divindade de Jesus tinha absorvido sua humanidade.
Rejeitando ambos, o concílio afirmou que Jesus é uma pessoa divino-humana em duas
naturezas (isto é, dois conjuntos de capacidades para a experiência, expressão, reação e
ação); e que as duas naturezas são unidas em seu ser pessoal, sem mistura, confusão,
separação ou divisão; e que cada natureza retém seus próprios atributos. Em outras
palavras, todas as qualidades e poderes que estão em Deus, estavam, estão e sempre
estarão real e distintamente presentes na pessoa do homem da Galiléia. Assim, a
fórmula calcedônia afirma, em termos categóricos, a plena humanidade do Senhor
(nascido homem pela ação divina).
A Encarnação, este milagre misterioso no coração do Cristianismo histórico, é o
ponto central do testemunho do Novo Testamento. É surpreendente que os judeus
tenham chegado a aceitar tal crença. Oito dos nove escritores do Novo Testamento,
como os discípulos originais de Jesus, eram judeus instruídos no axioma judaico de que
há somente um Deus e nenhum homem é divino. Todos eles, no entanto, ensinam que
Jesus é o Messias de Deus, o filho de Davi ungido pelo Espírito prometido no Velho
Testamento (por exemplo, Is 11.1-5; Christos, "Cristo", é a palavra grega para Messias).
Todos eles o apresentam em um tríplice papel de mestre, portador de pecados (dos seres
humanos) e governante - profeta, sacerdote e rei. E, em outras palavras, todos insistem
que Jesus o Messias deve ser pessoalmente adorado e crido - o que significa dizer que
Ele é Deus não menos do que é homem. Observe-se como os quatro mais habilitados
teólogos do Novo Testamento (João, Paulo, o escritor de Hebreus e Pedro) falam sobre
isto.
O Evangelho de João emoldura as narrativas do testemunho visual do escritor (Jo
1.14; 19.35; 21.24) com as declarações de seu prólogo (Jo 1.1-18); que Jesus é o
eterno Logos (Palavra ou Verbo) divino, agente da Criação e fonte de toda vida e luz (Jo
1.1-5,9), que, tornando-se "carne", foi revelado como Filho de Deus e fonte de graça
e verdade, naturalmente como "o unigênito de Deus" (Jo 1.14,18). O evangelho é
pródigo em declarações "Eu sou", que têm significação especial porque Eu sou
(grego: ego eimi) foi usado para traduzir o nome de Deus na tradução grega de Êxodo
3.14; toda vez que João se refere a Jesus dizendo ego eimi, está implícita uma alegação
de divindade. Exemplos disto são João 8.28,58, e as sete declarações de sua graça como
(a) o Pão da Vida, dando alimento espiritual (6.35,48,51); (b) a Luz do Mundo, banindo
a escuridão (8.12; 9.5); (c) a porta das ovelhas, dando acesso a Deus (10.11,14);
(d) o Bom Pastor, protegendo do perigo (10.11,14); (e) a Ressurreição e a Vida,
dominando nossa morte (11.25); (f) o Caminho, a Verdade e a Vida, guiando a
comunhão com o Pai (14.6); (g) a Videira verdadeira, nutrindo para a fertilidade
(15.1,5). Tomé, com intensa emoção, adora a Jesus como "Senhor meu e Deus meu!"
(Jo 20.28). Jesus então pronuncia uma bênção sobre todos os que compartilham a fé de
Tomé, e João insta seus leitores a juntarem-se a eles (Jo 20.29-31).
Paulo cita o que parece ser um hino que declara a divindade pessoal de Jesus (Fp
2.6); declara que "nele habita corporalmente toda a plenitude da Divindade" (Cl 2.9;
confira Cl 1.19); aclama Jesus o Filho como a imagem do Pai e seu agente na criação e
manutenção de todas as coisas (Cl 1.15-17); declara ser Ele "Senhor" (um título de
realeza, com nuanças divinas), a quem se deve rogar por salvação, de acordo com a
prescrição para invocar Yahweh em Joel 2.32 (Rm 10.9-13); chama-lhe "Deus sobre
todos" (Rm 9.5) e "Deus e Salvador (Tt 2.13); e faz preces diretamente a Jesus
(2Co 12.8,9), olhando para Ele como fonte da graça divina (2Co 13.13). O testemunho é
explícito: a fé na divindade de Jesus é fundamental para a teologia e religião de Paulo.
O escritor da carta aos Hebreus, pretendendo expor a perfeição do sumo sacerdócio
de Cristo, começa declarando a plena divindade e singular dignidade do Filho de Deus
(Hb 1.3,6,8-12), cuja plena humanidade ele então celebra no capítulo 2. A perfeição, e
certamente a própria possibilidade, do sumo sacerdócio que ele assinala cumprido por
Cristo depende da união de uma vida divina infindável e infalível com uma experiência
humana plena de tentação, aflição e sofrimento (Hb 2.14-17; 4.14 a 5.2; 7.1328; 12.2,3).
Não menos significativo é o uso que Pedro faz de Isaías 8.12,13 (1Pe 3.14). Ele cita
a versão grega (dos Setenta), estimulando as igrejas a não temerem o que outros temem,
mas a santificarem o Senhor. Onde, porém, o texto de Isaías diz, "a Ele [Senhor dos
Exércitos] santificai", Pedro escreve, "santificai a Cristo, como Senhor" (1Pe 3.15).
Pedro tributaria a adoração em temor devida ao Todo-Poderoso a Jesus de Nazaré, seu
Mestre e Senhor.
O Novo Testamento proíbe a adoração de anjos (Cl 2.18; Ap 22.8,9), mas ordena a
adoração de Jesus (Hb 1.6) e focaliza consistentemente o divino-humano Salvador e
Senhor como o permanente objeto próprio da fé, esperança e amor, aqui e agora. A
religião a que faltam estas ênfases não é Cristianismo. Que não haja nenhum engano
sobre isto!
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