ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Unidade II
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4 ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NA
DINÂMICA FAMILIAR CONTEMPORÂNEA
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Para o Serviço Social, o tema família não é nenhuma
novidade, tampouco recente, visto que o assistente social atua
junto à dinâmica familiar a todo o instante.
No entanto, a análise das relações na família, sobretudo
a partir da mudança nos papéis familiares, é fundamental,
principalmente se considerarmos a crescente incorporação da
mulher no mercado de trabalho e a possibilidade de contracepção
cada vez mais difundida.
4.1 A família na concepção de pensadores
Para Platão, todo o mal da sociedade residia na família e na
propriedade privada. Para ele, a propriedade privada instituía as
25 diferentes classes sociais, pressupondo a luta de classe pelo poder,
e a família, por ser espaço de laços afetivos e de preservação
religiosa, organizada em poderosos clãs, poderia prejudicar os
interesses gerais da pólis8, uma vez que, na Antiguidade romana
e grega, o objetivo da formação e preservação familiar estava
9
30 alicerçado no culto religioso .
Aristóteles não comungava da mesma concepção de Platão;
ele defendia a unidade familiar como fator para se alcançar uma
vida perfeita. Segundo Aristóteles (1998, p. 55),
35
A Cidade é uma sociedade estabelecida, com casas
e famílias, para viver bem, isto é, para se levar uma
Pólis (do grego, que significa “cidade”) é uma expressão geográfica
política que designa um lugar em que a população é submetida à mesma
soberania.
9
No Direito Grego e no Direito Romano, não eram levados em
consideração sentimentos e afetos naturais, que podiam até existir no
âmago dos corações, mas que não tinham qualquer valia para o Direito.
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Unidade II
vida perfeita e que se baste a si mesma. Ora, isto não
pode acontecer senão pela proximidade de habitação
e pelos casamentos.
Na teoria desse filósofo grego, a família é uma comunidade
formada de acordo com a natureza para satisfazer às necessidades
do cotidiano, sendo uma delas a de preservação da espécie
através da procriação. Naquele momento histórico, o sucesso
das relações familiares e a felicidade provinda do matrimônio
eram objetivos perseguidos pelo Estado.
No século XVIII, John Locke, em seu livro O Segundo Tratado
Sobre o Governo, defendia que Deus criou o homem como criatura
sociável que não deveria ficar só, pressupondo a existência de
sentimentos de necessidade, conveniência e inclinação para a
vida em sociedade.
Locke acreditava que a sociedade conjugal provinha de um
desejo entre o homem e a mulher com a finalidade de procriação,
porém, ele defendia que o vínculo conjugal deveria ir além da
procriação com o intuito de criar os filhos originados dessa
união até que estes tivessem condições de prover seu próprio
sustento. Na relação conjugal defendida por Locke, haveria
deveres conjugais constituindo-se em sustento, amparo mútuo
e comunhão de interesses do casal e da prole.
No século XIX, Hegel (1997, p. 158), filósofo alemão,
conceitua a família como uma sociedade natural, onde seus
componentes estão ligados pelo amor, pela confiança e pelo
respeito e obediência, tendo o casamento espontâneo e livre
entre duas pessoas:
(...) o casamento não é a relação de um contrato que
incide sobre a sua base substancial. Ao contrário,
ele sai do ponto de vista do contrato, que é o da
pessoa autônoma em sua individualidade, para
ultrapassá-lo.
50
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Hegel (idem, p. 161) considera que a união entre duas
pessoas com a finalidade de constituir uma família é fruto de
um desejo mútuo de abandonar sua personalidade individual
para constituírem um só ser:
O casamento é essencialmente monogâmico, porque
quem se situa neste estado e a ele se entrega é a
personalidade, a individualidade exclusiva imediata.
A verdade e interioridade desta união (formas
subjetivas da substancialidade) só podem ter origem
na dádiva recíproca e indivisa desta personalidade
que, só quando o outro está incluído nessa identidade
como pessoa, isto é, como individualidade indivisível,
adquire o seu legítimo direito de ser consciente de si
no outro.
Para o filósofo alemão, o espaço do homem é o espaço
público; o da mulher é o espaço privado, do lar, da casa,
afirmando que é na família que a mulher encontra o seu destino.
No entanto, ele faz uma ressalva, alegando que a família só
pode ser considerada como tal tendo um homem à sua frente,
defendendo a constituição familiar composto por pai, mãe
e filhos. Essa configuração familiar proposta por Hegel está
alicerçada na concepção de unidade biológica defendida pela
antropologia10, composta por marido, mulher e filhos, e que deu
origem à denominação de família nuclear.
Foi Lévi-Strauss (2009) quem propôs a desnaturalização
da família, ao deslocar o fator biológico e voltar sua atenção
para o sistema de parentesco como um todo, introduzindo
os laços de parentesco como um fato social, produzido
social e historicamente, e não mais como um fator natural.
Para Lévi-Strauss, o sistema de parentesco inclui os laços de
consanguinidade, descendência e laços de aliança, formando
uma ampliação familiar e compondo a constelação familiar de
duas famílias que se juntam por meio da união de seus membros
pelo casamento.
O debate sobre essa questão encontra-se em Sexo e repressão
na sociedade selvagem, obra de Bronislaw Malinowski (Petrópolis, Vozes,
1973).
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51
Unidade II
A família nuclear tem sua gênese no processo de colonização
imposto pela Europa aos povos dos continentes conquistados,
inspirada no modelo patriarcal, sistema que predominou desde
a Idade Média. Nesse tipo de composição familiar, o homem é
o chefe da família e a ele compete estipular as regras e normas
que a mulher e os filhos deverão seguir. Ele é o responsável por
prover o sustento e defender os interesses de seus componentes,
exigindo respeito e obediência sem contestação, tendo a
autoridade de disciplinar aqueles que não seguirem suas ordens.
Quanto à mulher e aos filhos, podiam transitar no espaço privado
dos lares burgueses, considerados suficientes para suprir todas
as suas necessidades.
Marx identificou a condição de subserviência e submissão
da mulher em relação ao seu marido. A mulher era obrigada
a desistir de suas vontades e desejos de realização pessoal e
profissional, e contentar-se em se realizar por meio do sucesso
de seu marido garantindo o conforto e o sustento do lar. A
mulher deveria orientar todas as energias em proporcionar ao
marido o ambiente propício para que ele alcançasse sucesso
pessoal, profissional, social e financeiro.
A classe trabalhadora, ao adotar a estrutura da família
nuclear, legitimou a moral burguesa, pois não encontrou outra
forma de criar seus filhos, compartilhar sentimentos e desfrutar
momentos de lazer a não ser através dos padrões burgueses
de concepção familiar, mesmo que os seus interesses fossem
contrários a esse padrão.
A propriedade privada, constitutiva do sistema capitalista,
traz em suas raízes a necessidade de preservação da herança, e
as relações passam a ser monogâmicas, o corpo e a sexualidade
da mulher passam a ser controlados, instituindo-se a divisão
sexual e social do trabalho entre homens e mulheres.
Enquanto categoria social, o poder masculino não estava
restrito ao poder do pai. O patriarcado caracteriza-se por ser
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ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
uma forma de organização social, centrada na figura masculina,
regida por dois princípios referentes à subordinação hierárquica
das mulheres em relação aos homens e dos jovens aos homens
mais velhos.
4.2 Um breve histórico do conceito de família
no Brasil
É absolutamente natural a transformação da família
brasileira no decorrer da história desde o período colonial, já que
a sociedade também se transformou. No Brasil-colônia, a família
foi marcada pelo modelo patriarcal já discutido anteriormente,
ou seja, era geralmente formada por pai, mãe, filhos legítimos
ou não, além de parentes diversos, e vista como um clã, no qual
havia um comandante (homem) que determinava as ações
e pensava pelos demais. A família estava, portanto, centrada
na figura masculina: era o pai quem ditava as ordens a serem
respeitadas pela família e pelos escravos, sendo comum a
repressão àqueles que não o respeitavam.
A mulher, por sua vez, era submissa ao patriarca, ficando
responsável por cuidar da casa e da educação dos filhos. Ela
não podia sequer sair sem a presença do marido, era mantida
isolada em sua casa e tinha liberdade apenas para frequentar a
igreja. Em relação à prole, a filha aprendia desde cedo a fazer os
afazeres domésticos, permanecendo em casa, enquanto o filho
era educado para ser chefe de família, sendo o único a ter acesso
à sociedade e ao direito de frequentar a escola. O contexto
escolar só começaria a fazer parte da vida das mulheres no final
do século XVIII.
O casamento nesse período, na maioria das vezes, era
realizado para atender a interesses econômicos, políticos e/ou
sociais. Eles eram arranjados de acordo com os interesses e
entre pessoas muito jovens. As pessoas em situação de pobreza
casavam-se em busca de organizar o trabalho agrário, porém,
entre os mais ricos, ou seja, os aristocratas, a vida sexual não
53
Unidade II
só era permitida, como ligada ao poder. Até então, não existia a
família com seus laços de parentesco, com sentimento ou com
valor. Foi durante o século XVIII que surge o sentimento familiar
e a ideia do amor entre os membros.
A Igreja Católica influenciou o cotidiano e o conceito das
famílias brasileiras, tornando-se responsável pela aprovação
do matrimônio. Com a ausência de cartórios, as funções civis
ficavam a cargo dos registros feitos pela Igreja, que tinha por
atribuição fazer o registro do casamento e a emissão da certidão
de nascimento. Somente no final do século XIX é que o casamento
civil pôde ser realizado independentemente do religioso.
Pode-se dizer que foi durante esse período que, principalmente
pelas mulheres, se começou a questionar o modelo patriarcal
da família. Nesse sentido, mais uma transformação acontece: o
conceito de família muda conforme os interesses societários, e
o casamento começa a ser realizado com base no amor entre o
casal.
Com o fim da escravidão e o início da migração estrangeira
e da industrialização, há uma crescente urbanização, que leva a
um ordenamento mononuclear (apenas um núcleo) da família,
que se torna uma unidade de produção e reprodução social.
Após a 1ª e 2ª Guerras Mundiais, houve certo agravamento
da situação social e econômica no Brasil, pois muitos homens
que foram convocados morreram em ambos os conflitos, e como
a centralidade das famílias estava no homem, muitas acabaram
ficando sem o provedor do seu sustento, o que obrigou que as
mulheres saíssem para trabalhar e prover o custeio das despesas
da casa.
Outro fator bastante interessante na transformação do
conceito de família ocorreu na década de 1960, quando foi
difundida a pílula anticoncepcional, separando, assim, as ideias
de sexualidade e reprodução. Provocou-se uma interferência na
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ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
sexualidade feminina: a mulher não mais precisaria associar sua
vida sexual à maternidade.
Em 1977, surge a Lei do Divórcio, reconhecendo como
legal a dissolução do casamento. Nessa separação, os filhos
e a casa ficam com a mulher, que, por sua vez, torna-se a
provedora do lar, pondo em xeque a figura masculina como
chefe da casa.
Com o avanço da medicina, a partir dos anos 1980, surgem
novas formas reprodutivas, que dissociam a gravidez da relação
sexual entre pessoas de sexo oposto, o que afetou, novamente, a
identificação da família. Essas ações deram maior autonomia às
mulheres, já que elas passam a ter alternativas para escolherem
se querem ou não ser mães naquele momento.
As Constituições Brasileiras refletem os momentos pelos
quais o Brasil passou. Assim, as Constituições de 1824 e
1891 não apontavam para relações familiares; na de 1891,
direciona-se a família somente para o casamento civil. A
Constituição de 1934 começava a conceber uma proteção
especial às famílias, principalmente aquelas numerosas, assim
como a de 1937, que discorre sobre a educação dos filhos (dever
dos pais), iguala filhos naturais aos legítimos e por meio da qual
o Estado começa a assumir a tutela das crianças em caso de
abandono dos pais. A Constituição de 1946 estimulava a família
numerosa e assegurava a assistência à maternidade, à infância
e à adolescência. Finalmente, a Constituição de 1988, dita como
“cidadã”, amplia a proteção do Estado à família – que passa a ser
constitucionalmente reconhecida como base da sociedade – e
também coloca normas de igualdade entre os gêneros, inclusive
no casamento.
A difusão do exame de DNA, em 1990, proporcionou mais
uma mudança na dinâmica familiar: a ciência passou a permitir
a identificação da paternidade e da maternidade da criança,
atrelando responsabilidade dos pais para com seus pupilos.
55
Unidade II
A Constituição Federal de 1988 foi um marco em virtude
do seu desejo de sanar os estigmas estabelecidos por
ordenamentos jurídicos anteriores e firmar princípios como
igualdade, dignidade da pessoa humana e liberdade. Com tal
posicionamento, a família possui, agora, um embasamento
legal sustentável e pode enfatizar laços afetivos anteriormente
esquecidos.
Essa Constituição ainda representa, ao mesmo tempo,
um resgate da democracia e dos direitos políticos, e uma
transformação substancial na perspectiva de acesso aos
direitos sociais. Ela estabeleceu direitos individuais, coletivos,
sociais, políticos e deu nova roupagem ao Estado brasileiro,
para cumprir funções variadas com o objetivo de assegurar
direitos, prestar serviços públicos universais, garantir o
desenvolvimento nacional e combater desigualdades regionais
e sociais.
Especificamente sobre a família, vamos destacar o artigo
226 da Constituição de 1988:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial
proteção do Estado.
§ 1º – O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º – O casamento religioso tem efeito civil, nos
termos da lei.
§ 3º – Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida
a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão
em casamento.
§ 4º – Entende-se, também, como entidade familiar
a comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes.
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ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
§ 5º – Os direitos e deveres referentes à sociedade
conjugal são exercidos igualmente pelo homem e
pela mulher.
§ 6º – O casamento civil pode ser dissolvido pelo
divórcio, após prévia separação judicial por mais de
um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada
separação de fato por mais de dois anos.
§ 7º – Fundado nos princípios da dignidade da pessoa
humana e da paternidade responsável, o planejamento
familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva
por parte de instituições oficiais ou privadas.
§ 8º – O Estado assegurará a assistência à família
na pessoa de cada um dos que a integram, criando
mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas
relações.
Em síntese, o conceito de família trazido pela Constituição
Federal do Brasil de 1988 foi um dos primeiros atos por meio
dos quais se tentou romper com o viés preconceituoso e
discriminatório que traziam as Constituições anteriores, devido
à mudança societária desses períodos.
Nós, assistentes sociais, precisamos ter claro que a família é um
patamar fundamental, possuindo sentimento de pertencimentos,
construção de identidades sociais e de histórias de vida, onde
são construídos os enlaces do cotidiano e, principalmente, onde
se sedimentam os valores pessoais.
Na Constituição Federal vigente, podemos observar, no
artigo 227, que a convivência familiar é tida como um direito
originário das crianças e dos adolescentes, pois em sua redação
esclarece-se que:
57
Unidade II
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.
Quando do surgimento do Código Civil de 1916, ainda
tínhamos uma sociedade com resquícios coloniais e intensificadas
desigualdades de gênero; fazia pouco tempo que o Brasil
tornara-se República, sendo essa a primeira legislação civil do
país. Como já citado, o homem ostentava sua responsabilidade
pela família em todos os parâmetros – econômicos, sociais,
religiosos e políticos – e a mulher permanecia submissa ao varão
e às regras impostas pela sociedade da época. A união da família
girava em torno do pai, que garantia a subsistência do grupo.
A mulher era dona de casa e não possuía voz ativa nem poder
dentro do núcleo familiar.
No Código Civil de 2002, é possível observar que a visão
patriarcal ainda se faz presente em sua estrutura. Os avanços
que surgiram dizem mais respeito à posição da mulher,
anteriormente colocada de forma submissa ao marido pelo
instituto do casamento.
Quanto à regulação sobre família, o Código Civil traz em seu
artigo 1.511 a seguinte referência: “(...) o casamento estabelece
a comunhão de vida plena, com base na igualdade de direitos
e deveres dos cônjuges”. Da mesma forma, em seu artigo 1.565,
considera que, pelo casamento, o homem e a mulher assumem
mutuamente a condição de consortes11, companheiros e
responsáveis pelos encargos da família.
Com isso, o Código Civil ratificou preceitos constitucionais
previamente estabelecidos na Constituição Federal de 1988,
Consorte: termo derivado do latim “consors”, é aplicado, na
técnica jurídica, para indicar a pessoa que participa com outra de um
mesmo destino. É, assim, sinônimo de cônjuge e do consórcio, ou comparte.
Diz também consorte, em sentido análogo, para a pessoa que tem interesse
comum com outra em pleito. Designa, mais propriamente, litisconsorte.
11
58
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
como o da igualdade de direitos entre homens e mulheres
– transcrito no capítulo dos direitos fundamentais, mais
especificamente no artigo 5º, inciso I da Constituição Federal
– e também incorporou a igualdade de direitos e deveres
conjugais, na esteira do artigo 226, parágrafo 5º do mesmo
diploma fundamental.
Podemos notar que o Código Civil sistematizou algumas
das transformações político-sociais decorridas pelo tempo,
incorporando preceitos constitucionais da igualdade
entre gêneros e de direitos e deveres entre os cônjuges ou
companheiros. Vale observar, porém, que houve a omissão
quanto ao relacionamento homoafetivo presente em nossa
sociedade. Como dissemos que leis e códigos refletem o
momento societário vigente, cabe a nós, profissionais,
lutarmos pela igualdade e o distanciamento do preconceito.
Foram deixados de fora, também, temas como a inseminação
artificial e a possibilidade da guarda paterna.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), promulgado
em 1990, assegura – entre os direitos fundamentais da criança
já preconizados na Constituição Federal – a convivência familiar
e comunitária, e coloca a família como um dos responsáveis pela
promoção das condições fundamentais para a vida da criança e
do adolescente juntamente à sociedade e ao Estado. A família
é o primeiro grupo em que as crianças e os adolescentes são
inseridos, comportando-se também como núcleo de proteção
e inclusão.
O ECA caracteriza a família como condição fundamental
na vida da criança e do adolescente, pois é nela que estes
se desenvolvem. Estabelece, ainda, a proibição de qualquer
qualificação discriminatória em relação à filiação: os filhos
legítimos e ilegítimos terão os mesmos direitos e a mesma
igualdade de condições.
59
Unidade II
De todos os avanços trazidos pelo ECA, destacaremos os
seguintes artigos:
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda
e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda,
no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer
cumprir as determinações judiciais.
Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais
não constitui motivo suficiente para a perda ou a
suspensão do poder familiar.
Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por
si só autorize a decretação da medida, a criança ou o
adolescente será mantido em sua família de origem,
a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em
programas oficiais de auxílio.
Assim, os pais são responsabilizados por seus filhos e deixa-se
claro que somente a situação de pobreza não é motivo para a
perda ou suspensão do poder familiar, obrigando que o Estado,
nesses casos, intervenha com políticas sociais que assegurem
assistência às necessidades básicas da entidade familiar. A
partir do exposto, as famílias mais vulneráveis12 precisam de um
acompanhamento de maior qualidade, em que os profissionais
trabalhem a autonomia da mulher e o resgate de sua autoestima.
Essas mulheres precisam fortalecer a sua identidade para, assim,
optarem por um projeto de vida que tenha objetivos e que
beneficie todo o grupo familiar. Assim, aos poucos, a família
começa a planejar e entender o significado da vida.
A definição econômica da vulnerabilidade, ainda que deva ser
a base material para o seu mais amplo enquadramento, é insuficiente e
incompleta, porque não especifica as condições pelas quais se ingressa
no campo dos vulneráveis. E, ao não especificar, repousa a esperança da
resolução ou atenuação da vulnerabilidade no econômico, o qual certamente
é indispensável, mas não clarifica o processo pelo qual precisamente se
constrói esse amplo universal que é a vulnerabilidade. Ao não fazê-lo,
subsume a luta contra a vulnerabilidade social, verbi gratie contra a
discriminação social, aos mecanismos de mercado, que são precisamente
a determinação mais abrangente, o produtor mais amplo da própria
discriminação (OLIVEIRA, 2001).
12
60
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Como se observa nessa breve passagem histórica referente às
transformações ocorridas no conceito da família em nosso país,
nota-se que esta é um grupo social que sofreu transformações
devido, principalmente, ao fato de a sociedade ter mudado,
mas trataremos somente dos assuntos pertinentes ao tema
principal.
Vamos elencar outros fatores que influenciaram para que
ocorressem tais mudanças nas entidades familiares:
• Famílias com menor número de filhos;
• Aumento de pessoas vivendo sozinhas;
• Acréscimo de famílias chefiadas por um só cônjuge
(geralmente mulheres);
• Aumento da gravidez entre as adolescentes e que assumem
seus filhos;
• Elevação do número de pessoas que recorrem às
tecnologias da medicina para a reprodução, popularmente
chamada de “produção independente”;
• Acréscimo no número de separações, acarretando
recomposição da família, formadas por novas uniões
matrimoniais.
Apesar de todas as mudanças já citadas e, com isso, a geração
de novos modelos familiares, ainda o modelo considerado
“ideal” por grande parte das pessoas é o da família nuclear. Esse
modelo pode ser chamado de conjugal, tendo sua formação
com o homem/pai, mulher/mãe e filhos, vivendo todos juntos
para que possam desfrutar de um ambiente familiar. Para José
Filho (2002, p.31)
A família nuclear moderna surge como um modelo
hegemônico, “ideal”. E, em decorrência disso, todos
os arranjos familiares que não se encaixam dentro
do modelo preestabelecido são considerados como
61
Unidade II
“família fora da lei”, que se escondem debaixo de
aparências tão respeitáveis. Por intermédio dos
diversos “espaços de socialização” e/ou diversos
“aparelhos ideológicos”, as crianças aprendem, desde
pequenas, como “deve” ser uma família.
Há outro modelo familiar, denominado de família ampliada
ou extensa, que é mais ampla, formada por vários parentes,
existindo uma grande relação entre pais e filhos para com avós,
pais e netos. Geralmente, é formada por duas ou mais famílias
nucleares; esses parentes, na maioria das vezes, moram juntos
por questões econômicas. O próprio ECA apresenta esse tipo de
modelo no artigo 25:
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou
ampliada aquela que se estende para além da unidade
pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes
próximos com os quais a criança ou adolescente convive
e mantém vínculos de afinidade e afetividade.
A seguir, veremos outros modelos de entidades familiares:
• Monoparental – os filhos são criados por um dos pais,
devido a inúmeros motivos, tais como: abandono do lar
por um dos cônjuges, separação, morte, opção da mulher
em ser mãe solteira etc.
• Mista – a presença de filhos de outra união socializando-se
em um mesmo ambiente (casa);
• Unipessoal – pessoas que convivem sozinhas;
• Comunitária – há uma descentralização do papel dos
pais, assim, os filhos vivem sob a responsabilidade de
membros adultos.
• Homossexual – união de pessoas do mesmo sexo, pode
haver a presença de filhos biológicos, de um ou de ambos,
ou filhos adotivos.
62
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Por ser o modelo ideal, a família nuclear continua detendo
a hegemonia e ditando as regras, porém vem dando espaços a
novos arranjos familiares, diferentes desse padrão tradicional.
Outro ponto a ser destacado é a inserção, no texto da
Constituição Federal de 1988, sobre o planejamento familiar em
seu artigo 226:
§ 7º – Fundado nos princípios da dignidade da pessoa
humana e da paternidade responsável, o planejamento
familiar é livre decisão do casal, competindo ao
Estado propiciar recursos educacionais e científicos
para o exercício desse direito, vedada qualquer
forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas.
Atenção
Leia a Lei 9.263 (12/01/1996), que oferece as diretrizes
para a condução do planejamento familiar no Brasil, bem
como estabelece as penalidades e dá outras providências ao
§7º do art. 226 da Constituição Federal.
Exercício
1) A Lei 9.263, de 12 de janeiro de 1996, regula o “§ 7º do art.
226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar,
estabelece penalidades e dá outras providências”. Assinale a
alternativa que, segundo esta Lei, contenha corretamente as
informações para as situações em que é possível a esterilização
voluntária:
a) ( ) I – em homens e mulheres com capacidade civil plena
e maiores de dezoito anos de idade ou, pelo menos, com
dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo
de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o
63
Unidade II
ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade,
incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar,
visando desencorajar a esterilização precoce; II – risco
à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto,
testemunhado em relatório escrito e assinado por dois
médicos.
b) ( ) I – em homens e mulheres com capacidade civil plena e
maiores de vinte e um anos de idade ou, pelo menos, com
três filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo
de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o
ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade,
incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar,
visando desencorajar a esterilização precoce; II – risco
à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto,
testemunhado em relatório escrito e assinado por três
médicos.
c) ( ) I – em homens e mulheres com capacidade civil
plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo
menos, com três filhos vivos, desde que observado o prazo
mínimo de noventa dias entre a manifestação da vontade
e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade,
incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar,
visando desencorajar a esterilização precoce; II – risco
à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto,
testemunhado em relatório escrito e assinado por dois
médicos.
d) ( ) I – em homens e mulheres com capacidade civil plena
e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos,
com dois filhos vivos, desde que observado o prazo
mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade
e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
64
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade,
incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar,
visando desencorajar a esterilização precoce; II – risco
à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto,
testemunhado em relatório escrito e assinado por dois
médicos.
e) I – em homens e mulheres com capacidade civil plena e
maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos,
com três filhos vivos, desde que observado o prazo
mínimo de trinta dias entre a manifestação da vontade e
o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade,
incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar,
visando desencorajar a esterilização precoce; II – risco
à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto,
testemunhado em relatório escrito e assinado por dois
médicos.
Resolução do exercício
d) I – em homens e mulheres com capacidade civil plena e
maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos,
com dois filhos vivos, desde que observado o prazo
mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade
e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade,
incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar,
visando desencorajar a esterilização precoce; II – risco
à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto,
testemunhado em relatório escrito e assinado por dois
médicos.
Voltando à questão da gravidez entre adolescentes, verifica-se
que faltam projetos que se proponham a trabalhar com
adolescentes e as famílias, em conjunto e/ou separadamente.
Em geral, os projetos existentes focalizam a atenção nas
65
Unidade II
famílias, buscando suprir ou melhorar a renda familiar, mas
esquecendo-se de incluir os adolescentes nas reuniões feitas. Ao
incluí-los, poderíamos aumentar os laços interfamiliares e trazer
o adolescente para a reflexão a respeito de sua responsabilidade
como pessoa, concomitantemente a sua família.
A iniciação da vida sexual entre os adolescentes pode
propiciar o início da exposição à gravidez precoce e de doenças
sexualmente transmissíveis. Esses fatores, muitas vezes, não são
momentâneos, acarretando transformações para toda a vida.
Obviamente, sempre existiu a gestação precoce, mas não havia
um apego a esse tema, porque não era somente a jovem que
ficava grávida, mas, sim, a família que se constituía, pois, dentro
dessa sociedade de então, o casamento também era precoce
e, muitas vezes, forçado pelos pais, já que era extremamente
vergonhoso ter uma jovem grávida solteira em casa. No entanto,
como houve a transformação do cotidiano, dos interesses
econômicos e da cultura, atualmente nota-se que a gravidez
entre as adolescentes é solitária e bastante problemática, porque,
muitas vezes, o parceiro, quando sabe que será pai, tem como
primeira atitude abandonar tanto a futura mãe quanto seu
filho; além disso, essa questão não é apenas vista pela sociedade
como um problema para a vida ou saúde da adolescente, mas
também para a economia do país.
A família, como parte da sociedade, sofreu mudanças como
a própria sociedade também sofreu. Resumidamente, alguns
pontos foram fundamentais para a transformação das famílias:
• A mulher e sua inserção no mercado de trabalho formal,
em igualdade de gênero;
• A sexualidade ser “vista” com maior liberdade entre a
sociedade;
• Avanços na medicina;
• Acesso facilitado à informação.
66
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
O casamento formal não é mais ponto-chave para o início
de uma “nova família”, como aconteceu em gerações anteriores.
Atualmente, separar-se não é uma atitude discriminada pela
sociedade com a intensidade que acontecia no passado, ponto que
possivelmente potencializou o aumento do número dos divórcios.
É importante destacar que a capacidade de cuidado e
proteção dos grupos familiares está diretamente relacionada à
qualidade de vida que eles têm no contexto social nos quais
estão inseridos. Atualmente, as políticas econômicas não
asseguraram as condições mínimas de sustentação das famílias,
gerando desequilíbrio familiar.
Assim, podemos concluir que a família contemporânea pode
ser vista como um desafio, que envolve problemas de ordem ética,
econômica, política e social. E tem sido um espaço de conflitos
em que são enfrentadas diariamente situações contraditórias,
como:
• dificuldade de prover as necessidades básicas, a proteção
e o cuidado à criança;
• o embate entre o projeto pessoal dos pais e o projeto
familiar de cuidado do outro;
• a convivência de um estereótipo de modelo familiar ideal,
baseado nos históricos de constituições familiares, em
contraposição à diversidade dos arranjos familiares atuais.
De maneira bem simplificada,
é importante que o profissional de
Serviço Social veja que não existe uma
família-padrão, chamada de clássica,
pois, com o aumento da liberdade de
escolha e de novas conjunturas sociais,
há outros arranjos familiares, como as
chefiadas por mulheres, avós, pessoas
do mesmo sexo, sem a presença
materna etc. O aspecto primordial é que
o assistente social não julgue famílias
como algo padronizado, já que elas são
formadas por pessoas, que, por sua
vez, são singulares.
Podemos dizer que a qualidade de vida das famílias depende
da articulação que cada uma consegue fazer entre as demandas
internas e aquelas do seu espaço social, além das formas de
lidar com as transformações ocorridas no âmbito das relações
familiares.
O núcleo familiar que o sujeito está inserido torna-se,
geralmente, seu primeiro contato com grupos socialmente
estabelecidos, com isso, surgindo as relações sociais primárias.
67
Unidade II
Essa articulação se constitui num processo doloroso, diante
das respostas que vêm sendo dadas pelas famílias e seus
membros, como a violência doméstica (contra a mulher e a
criança). Esses conflitos podem ser entendidos como uma luta
pela sobrevivência, já que a cada dia aumenta o número de
famílias em condições de miserabilidade.
Nós, assistentes sociais, precisamos entender que o ser
humano é um ser social; não podemos vê-lo somente de forma
individualizada e precisamos ter claro que ele faz parte de uma
família com características distintas que, por sua vez, está
inserida em um grupo socialmente estabelecido (comunidade),
formando uma área/região.
Exercício
1) Em seu trabalho como assistente social, você deverá fazer
o cálculo de renda per capita da entidade familiar. Para essa
finalidade, como é caracterizada a família? (Fundamente sua
resposta a partir de pesquisas nas legislações pertinentes, sem
“achismos”.)
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
Resolução do exercício
1) A Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), em seu artigo
20º § 1º, diz que “para os efeitos do disposto no caput, entende-se
como família o conjunto de pessoas elencadas no artigo 16 da Lei
n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo
teto”. Para completar o raciocínio, a lei e o artigo citado na Loas
estabelecem “I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e
68
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21
(vinte e um) anos ou inválido; II – os pais; III – o irmão não
emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um)
anos ou inválido”.
4.3 A prática profissional e os processos
familiares
Como profissionais, somos também inseridos no mercado de
trabalho, em que o empregador, seja quem for, espera certas
atitudes e cria expectativas a respeito das atitudes do assistente
social, que, por sua vez, em função da organização institucional,
trabalhará, principalmente, com o modelo assistencial, cuja
preocupação está centrada na resolução de problemas do
indivíduo fragilizado (por exemplo, criança violentada ou com
deficiência etc.), esquecendo-se de interagir/intervir com a
família envolvida.
É com a família que os membros que a compõem formam
suas respectivas personalidades, desenvolvem condições físicas
e mentais no decorrer dos processos de desenvolvimento da
vida e constroem a identidade (DIAS, 1995).
A noção de família tal como conhecemos hoje data do século
XV e sua conceituação jurídica surgiu da necessidade criada
pela complexidade da civilização. Sua evolução ocorreu como
consequência do ritual religioso, progredindo para o casamento
civil com a respectiva disciplina legal.
O tema sobre a família contemporânea nos instiga a trazer
para o debate os aspectos que perpassam o espaço da vida
privada, da intimidade do cotidiano e das relações sociais e
afetivas que são constitutivas de seu interior, suas inter-relações,
suas manifestações de contradições e ambiguidades. A família
contemporânea, em suas diversas configurações, é constituída
por diversos arranjos, materializada pelas transformações sociais
que perpassam seus contornos.
69
Unidade II
As discussões e estudos sobre a instituição “família” nos
mostram a complexidade em determinar os meandros que
permeiam o interior da cotidianidade familiar, seus valores,
seus princípios, suas concepções que vão sendo delineadas
historicamente.
O pensamento patriarcal tradicional pressupõe o poder
paterno como origem e modelo de todas as relações de poder
e autoridade. Os valores que permeiam o patriarcado atribuem
maior valorização às atividades masculinas em detrimento
às femininas, dando legalidade ao controle do corpo e da
sexualidade feminina, estabelecendo papéis sexuais e sociais
privilegiando com vantagens os papéis masculinos.
A posição da mulher na família demonstra que o modelo de
família patriarcal foi uma das matrizes da organização social
brasileira. As mulheres, nas primeiras décadas do século XX, ainda
não haviam conquistado seus direitos civis, enquanto cidadã
plena de direitos. O Código Civil Brasileiro de 1916 preconizava
que a mulher casada precisava de autorização de seu marido
para poder trabalhar. Essa posição de tutelada pelo pai e, depois,
pelo marido retirava da mulher a possibilidade de exercer sua
cidadania e desenvolver seu potencial profissional (SAFFIOTTI,
1987). A mulher estava na condição de dependente do marido
e/ou do pai na relação com o sustento da família. Não tinha os
mesmos direitos trabalhistas de que os homens gozavam, por isso,
não era considerada como mantenedora do sustento da família
e recebia um salário menor do que o percebido pelo homem em
iguais condições. Somente em 1941, com a Consolidação das
Leis Trabalhistas, é que o trabalho feminino foi regulamentado.
As mulheres trabalhadoras acumulam papéis, sobrecarregadas
com a segunda jornada de trabalho, distribuída entre as tarefas
domésticas e os cuidados com os filhos. A responsabilidade pelas
tarefas do lar e os cuidados com a prole é de predominância
feminina, sendo um trabalho invisível, desvalorizado pelo
contexto social e ao qual não cabe remuneração. O trabalho da
70
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
mulher é considerado complementar à manutenção do sustento
familiar, persistindo o modelo do homem como provedor
financeiro e de autoridade.
No modelo de família patriarcal burguês, o papel prescrito
aos homens refere-se ao sustento econômico-financeiro, e o
papel destinado às mulheres está no âmbito dos cuidados ao
marido, ao lar e aos filhos, mesmo quando a mulher já está
inserida no mundo do trabalho. A crença de que a mãe deve
dedicar-se integralmente aos filhos, ao marido e ao seu lar tem
atravessado os séculos, sendo apregoada desde Rousseau, que
defendia a ideia de que a maternidade é a mais bela função
cívica das mulheres.
A orientação patriarcal, presente no inconsciente coletivo,
é regulada por mitos que postulam a maternidade como
experiência fundamental ao sentimento de completude das
mulheres.
Diante da cultura da época, a mulher era socializada num
sistema que privilegiava a antipaixão; a sexualidade estava
circunscrita ao casamento e era destinada à reprodução.
O casamento era indissolúvel, exceto por morte de um dos
cônjuges.
Já no início do século XX, ocorreram várias mudanças no
plano sócio-político-econômico relacionadas ao processo de
globalização da economia capitalista. Tal situação interferiu
na estrutura familiar, possibilitando mudanças em seu padrão
tradicional de organização.
O modelo tradicional de autoridade e poder, com
protagonismo da figura masculina, vem sendo indiretamente
substituído pelo da figura feminina. As mudanças na
sociedade acerca da inserção da mulher na educação e no
mercado de trabalho, as várias configurações de família e
os crescentes índices de famílias dirigidas por mulheres têm
71
Unidade II
mostrado que elas não aceitam a dominação masculina, nem
se sujeitam em continuar convivendo quando o principal
elemento que impulsionou o casamento, a união estável,
ou concubinato – o amor – não mais existir; a separação é
inevitável.
É percebido que, apesar das conquistas das articulações
femininas e de todas as transformações importantes no campo
da sexualidade e da reprodução – o que liberou a mulher para
o prazer das relações íntimas – ainda há uma delimitação de
papéis e modelos. Ao homem, ainda cabe o papel de provedor
e, numa situação de separação, os filhos permanecem com a
mãe, numa clara distinção de que o papel de criar os filhos é de
âmbito feminino. Na sociedade contemporânea, a concepção de
criação de filhos tem se restringido à mulher, não incluindo o
homem, enquanto pai da criança, na esfera de participação da
construção da vida de seus filhos.
Para entender como são estruturados os novos papéis no
contexto da sexualidade e reprodução, faz-se necessário voltar
às discussões sobre os estudos referentes às relações de gênero
no tocante à construção social da masculinidade.
A definição do conceito de gênero refere-se ao sexo
socialmente construído, desnaturalizado, papéis e práticas sociais
atribuídas e incorporadas por homens e mulheres, consideradas
como atributos masculinos e femininos.
O conceito de gênero apresenta a perspectiva analítica
relacional determinando que homens e mulheres devam ser
pensados como construções sociais interdependentes, o que
possibilita desconstruir os argumentos de culpabilidade sobre o
masculino. A hegemonia desse pensamento, em que o homem
aparece como o único responsável por toda uma gama de
restrições e delimitações do mundo feminino, se desmonta
com a aceitação da dimensão relacional do estudo sobre a
compreensão das relações de gênero.
72
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Os estudos referentes às relações de gêneros pautam-se
na busca de compreender e explicar como se constroem essas
relações, o que vem possibilitando as transformações orientadas
pelas desigualdades de gênero. Essas desigualdades residem nas
formas como homens e mulheres se relacionam na produção
e reprodução de sua existência, norteados pelas concepções
religiosas, educacionais, políticas, jurídicas e científicas.
As determinações de papéis orientados pelas concepções
sociais não são fruto de consenso da sociedade, mas, sim,
de conflitos presentes na construção de multiplicidade de
instituições demarcando, para os gêneros, as distinções entre
homens e mulheres. O suposto destino biológico da mulher à
maternidade tem sido construído através de símbolos que visam
ao controle social das formas de organização das sociedades,
em que o masculino é associado à produção e administração
da riqueza, afastado, portanto, do âmbito da reprodução
humana. Esse posicionamento confere poder aos homens, mas
isso não significa que tais vivências sejam isentas de conflitos e
contradições.
O poder social outorgado à masculinidade é fonte de poder
e privilégio individual, ao mesmo tempo em que é foco de dor
e alienação13. O poder dos homens é construído nas instituições
e nas formas como os homens se apropriam e reproduzem
esse poder, incluindo a supressão de emoções, necessidades
e possibilidades, materializadas em situações que produzem
prazer em cuidar, de ser receptivo, de desenvolver a empatia e a
possibilidade de ter compaixão, transformados em alienação de
sentimentos, afetos e potencial de relacionamentos humanos.
O sofrimento dos homens origina-se na constatação do
questionamento desse poder atribuído às questões relativas à
masculinidade, delineando os contornos da significação do que
é ser homem na sociedade contemporânea. A resposta masculina
à intensidade dessa dor tem levado à mobilização de grupos de
reflexão, movimentos e organizações em busca da defesa de sua
Alienação: diminuição da capacidade dos indivíduos em pensar
e agir por si próprios. É a negação da realidade gerando acomodação,
passividade, não participação das mudanças sociais e, por vezes, a busca por
certo isolamento.
13
73
Unidade II
identidade como ser humano, repleto de significados e pleno de
sentimentos.
A requisição da participação masculina nas atividades
domésticas, incluindo o cuidado com os filhos, insere o papel
do homem na agenda das famílias modernas. A posição do pai
que antes foi negligenciado tem emergido nas reivindicações
dos movimentos das mulheres e das instituições internacionais
e nacionais que propõem a implementação de políticas
públicas que visam diminuir as diferenças de gênero, conforme
preconizado nos oito objetivos do milênio14.
A paternidade, quando refletida, parece que tem como
fundamento reforçar a ideia de que as mulheres são as
responsáveis pela gravidez. Ou seja, a relação homem/gravidez
raramente é avaliada, embora tal qual a mulher, é parte
importante no processo de geração da vida, podendo dizer,
assim, que é aí que está o grande conflito, pois, quando se fala
em gravidez, dá-se à mulher todas as honras pela geração da
vida; somente após o nascimento do filho é que se dá conta
de que, além da gravidez, da mulher e do filho, existe também
um pai, momento a partir do qual se inicia uma série de
fatores que poderão culminar com as questões envolvendo o
desenvolvimento dos filhos. Podem ocorrer, também, questões
ainda maiores: se, da união que gerou o filho, ocorrer uma
separação, ou seja, homem e mulher geram uma vida e, após o
nascimento, separam-se.
As relações familiares podem se romper por ocorrências das
mais diversas, como questões financeiras, incompatibilidade de
gênios, divergências sexuais etc., ou seja, por desentendimentos
dos mais variados que culminam com o processo de descompasso
da família. No ato da separação, há um aspecto importantíssimo
que ocorre normalmente: a guarda da criança é uma espécie
de guarda natural sob a tutela da mãe e somente da mulher; o
pai acaba por separar-se da mãe e, consequentemente, de sua
prole.
Entre os oito objetivos do milênio, o terceiro trata da igualdade
entre os sexos e a valorização da mulher.
14
74
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
A partir das mudanças ocorridas em nossa sociedade,
acabou-se por observar que, além dessa mulher que gerou o
filho, também existe a figura de um homem que participou de
toda a gestação. E com todo esse movimento conjuntural de
transformação em nossa sociedade, temos também a mudança
na legislação brasileira: ontem, havia o Pátrio Poder; hoje, há o
Poder Familiar. O Pátrio Poder, de feição romana de dominação,
traduzido pela palavra “poder”, deixa de ter o ranço patriarcal,
dando luz ao Poder Familiar, que se apresenta em uma linha
de igualdade de direitos entre os gêneros, partindo da visão
de bem-estar da criança e alcançando, assim, o sentido de
proteção.
Se considerarmos o usuário fragilizado como expressão de
um contexto familiar comprometido, estaremos alterando o
eixo da atenção profissional, o que proporcionará uma mudança
tanto na compreensão do problema como na ação profissional
propriamente dita.
Após esse breve histórico sobre a família contemporânea,
temos subsídios para entender a sua vida cotidiana. Infelizmente,
contudo, os profissionais não fazem essa reflexão ao trabalhar
com as famílias, pois atuam somente no sentido de atender o
objetivo da instituição, tentando resolver pontualmente o caso
do usuário, o que proporciona outra questão: essas famílias
percorrem diversas instituições, nas quais essa mesma conduta
profissional se repete. Esse “vício” em trabalhar com atendimento
específico precisa ceder seu lugar para uma ação que vise à
família em sua totalidade.
Cabe o entendimento de que são as ligações emocionais
com pessoas da família e da comunidade que permitem nosso
desenvolvimento. A família converte-se numa estrutura básica
de formação de pessoas da qual nenhum indivíduo pode
prescindir, sendo dentro desse contexto que se forma o ser social.
Assim, a família tem por função socializar a criança e adaptá-la
à convivência na sociedade, oferecendo e ensinando os modelos
75
Unidade II
de comportamento adotados em sua própria cultura; esse
aprendizado compõe o processo de humanização do ser social.
Assim, podemos concluir que é necessário rever as formas
de atenção às famílias, pois, no momento em que elas procuram
projetos ou um atendimento, suas relações já estão, de alguma
forma, fragilizadas. É preciso transformar o cotidiano profissional
em uma prática investigativa e capaz de propor novos métodos
de trabalho que consigam fazer frente a essa nova realidade que
se nos apresenta.
A atuação do assistente social precisa seguir algumas
condutas técnicas, pois toda problematização resulta em uma
ação sobre a qual, consequentemente, o profissional refletirá e,
depois, reproduzirá sob a forma de uma ação modificada. Esse
sistema de trabalho é chamado popularmente pela sigla ARA
(Ação – Reflexão – Ação Diferenciada) e transforma todas as
ações em um ciclo continuo de mudanças, não se trabalhando
na perspectiva de fim, mas de processo.
É importante frisar que a atuação profissional, em qualquer
que seja a área a ser desenvolvida pelo Serviço Social, precisa
contar com um olhar holístico frente às situações apresentadas,
de maneira que a ação não seja impulsionada pelo imediatismo
inerente ao ser humano, e isso não é diferente no atendimento
às famílias que recorrem ao Assistente Social.
Na ilustração da página seguinte, procuramos demonstrar
de maneira mais visual as formas primordiais pelas quais o
ser humano precisa ser analisado pelo Serviço Social. Sendo
aquele um ser constitucionalmente estabelecido, o profissional
precisa ver sua singularidade, depois suas relações familiares e,
a partir disso, levar em conta que, naturalmente, essa família
faz parte de uma sociedade, que, por sua vez, forma civilizações,
culturas etc. Precisamos incluir a necessidade de formulação e
implantação de políticas sociais que busquem atuar no contexto
familiar totalitário.
76
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
5 SERVIÇO SOCIAL NO SEGMENTO FUNERÁRIO
Como já referido anteriormente, o curso de Serviço Social
proporciona ao graduando uma formação generalista, que
permite a esse profissional estabelecer sua atividade em diversos
seguimentos, inclusive no serviço de assistência funerária.
5.1 O medo da morte
A morte ainda é um tabu para a nossa cultura. Isso quer dizer
que, em vez de se encarar a única certeza de forma concreta,
prefere-se ignorá-la e, até mesmo, considerar como algo negativo
a mera pronúncia dessa palavra. Tanto é verdade, que surgiu o
mito segundo o qual falar sobre a morte é perigoso, pois isso
pode invocá-la. É um tipo de pensamento ainda presente em
várias famílias.
O medo não se circunscreve à morte propriamente dita,
mas também às doenças ainda incuráveis e aos próprios fatos
positivos e negativos do cotidiano. Por exemplo, para as crianças,
somente são ditas as coisas boas e maravilhosas da vida, havendo
negligência, entretanto, quando os filhos fazem perguntas sobre
temas ligados à morte; trata-se o tema como se ele não existisse.
77
Unidade II
A morte é um assunto tão evitado de ser conversado entre as
pessoas, que não é debatida livremente nem entre os seguidores
das diversas religiões espalhadas pelo mundo.
O fato é que grande parte da sociedade quer distanciar a
morte de si. Não se trata de considerarmos essa conduta errada
– visto que todos que partilham desse pensamento procuram
estabelecer uma vida com hábitos saudáveis, visitas constantes
ao médico, alimentação adequada, exercícios físicos etc. –, mas
o fato que queremos estabelecer é que, como técnicos, devemos
apresentar o tema sempre com naturalidade e profissionalismo.
Como profissionais, não podemos reproduzir o medo da morte
que acomete a sociedade em geral, uma vez que, como sabemos,
não é se distanciando do tema que a morte também se afasta.
Vamos tomar como exemplo a atuação do assistente social
que está inserido em um determinado hospital. Ele convive com
a morte diariamente, e também fazem parte do seu cotidiano
pessoas doentes que, em tese, estão propensas a morrer, assim
como os familiares desses indivíduos. Espera-se, portanto, que
o profissional, em seu atendimento a essas pessoas, não seja
frio. Ao contrário, espera-se que ele reflita de forma técnica
e, com isso, promova a elaboração de projetos que visem ao
melhoramento das ações desenvolvidas nesse contexto.
Nesse aspecto, é também interessante o trabalho
multiprofissional, com o intuito de promover a integração e a
continuidade das ações realizadas à família e ao paciente, pois,
como vimos no texto anterior, a mulher ainda é o centro do lar.
Assim sendo, como é, para a família, estar com essa pessoa sob
risco de morte? Nesse contexto, a família apresenta-se abalada
como um todo: muitas vezes, o marido não consegue trabalhar
normalmente, em virtude do abalo psicológico sofrido; os filhos
param de frequentar adequadamente a escola, em função da
preocupação com a mãe; isso sem contar outros laços familiares
importantes que também são afetados direta ou indiretamente.
78
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Por isso, é de fundamental importância que uma equipe
profissional esteja preparada para entender o contexto que as
pessoas envolvidas estão vivenciando.
Vale destacar, também, que os profissionais envolvidos
nessas situações também precisam de atenção especial, pois
a sobrecarga emocional é muito intensa, sendo inevitável
o desgaste psicológico. Desta forma, é necessário que tais
profissionais sejam constantemente acompanhados, para
minorar os sintomas relacionados ao cotidiano do trabalho.
Além do medo da morte em si, há outras questões que
amedrontam as pessoas: a forma como ela acontecerá e o
que esperar para depois da morte. Esses temores podem ser
aumentados se as pessoas seguem preceitos religiosos: por
exemplo, prega-se o que determinadas pessoas vão para o céu, o
inferno, o purgatório, além de outras crenças, como ressurreição,
reencarnação e vida após a morte.
Devido a essa variedade de crenças religiosas, é preciso que
a assistência religiosa, quando houver, respeite a crença dos
sujeitos de trabalho, pois isso pode resultar num conforto maior
e fortalecer a passagem dessa fase difícil na vida dos familiares
envolvidos.
O olhar profissional precisa ser diferente do pessoal, por mais
que saibamos que o assistente social seja um ser humano com
seus próprios medos e tabus. É fundamental, entretanto, não
perder de vista que a morte existe e está tão presente quanto a
própria vida.
Para ampliar seu conhecimento, indicamos a leitura
do texto “O tabu da morte”15, uma reportagem de Mirian
Ribeiro feita para o Jornal da Orla, em 27/09/2009, na seção
Comportamento. Nele, a autora fala sobre o assunto de
forma simples e objetiva, facilitando o entendimento.
Texto disponível em: http://www.jornaldaorla.com.br/noticias_
integra.asp?cd_noticia=3575. Acesso em 04/12/2010.
15
79
Unidade II
5.2 O Serviço Social atuando na assistência
funeral
O assistente social pode trabalhar no seguimento funerário
sob duas perspectivas: em órgãos públicos ou privados. Num
primeiro momento, trataremos da atuação em organismos
públicos.
5.2.1 Atuação profissional em órgãos públicos
Não há legislação federal especifica que estabeleça o direito
funerário. Pode-se, então, respaldar-se na Constituição Federal
de 1988, em seu sexto artigo:
São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a
moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a
proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição.
Esse artigo pode subsidiar o tema, visto que a expressão
assistência aos desamparados pode ter inúmeras interpretações,
inclusive aquela que conduza para a assistência funeral gratuita
aos que dela precisarem.
Como é sabido, o embasamento do assistente social dentro
de órgãos públicos precisa conter legislações pertinentes à ação
profissional. Sabendo da necessidade, realidade e importância
de existir respaldo legal ao tema, muitos municípios possuem
leis direcionadas ao assunto. A seguir, observaremos alguns
exemplos de cidades que as possuem e quais as condicionalidades
de acesso:
• São Paulo: a cidade é respaldada por duas leis: a de
nº 11.083/91, que assegura o direito à gratuidade aos
munícipes que não tenham condições de arcar com as
despesas do funeral, e a de nº 11.479/94, regulamentada
pelo decreto 35.198/95, que garante – à família de pessoa
80
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
que tiver doado algum órgão para transplante – também
a gratuidade caso assim se deseje, necessitando-se,
para isso, a apresentação do comprovante de doação de
órgãos.
• Sorocaba/SP: é amparada pelas leis nº 4.595/94
e nº 7.998/06, que prevê a alteração do artigo 5º
da referida lei e relata: “As empresas funerárias
concessionárias obrigam-se ao fornecimento de
caixão mortuário, transporte gratuito (ônibus), velório
e uma coroa de flores às pessoas reconhecidamente
pobres sem recursos financeiros dentro dos limites do
município.”
• Diadema/SP: a localidade dispõe sobre o funeral e o
sepultamento gratuito do Serviço Funerário Municipal
por meio da lei nº 1.385/94, que contém em seu artigo
1º: “Fica assegurada, no Serviço Público Municipal, a
gratuidade dos funerais e do sepultamento das pessoas
que não possuírem capacidade econômica, residentes no
Município, que não forem concessionárias de sepulturas
a prazo indeterminado junto ao Cemitério Público
Municipal.”
• Macaé/RJ: aqui, o representante precisa recorrer à
Fundação Municipal Recanto da Igualdade para fazer a
solicitação do atendimento gratuito funerário a pessoas
cuja renda per capita familiar seja igual ou inferior a um
quarto do salário mínimo vigente.
• Vitória/ES: no município, a gratuidade é chamada de
auxílio funeral, que opera sob duas perspectivas: a) a
gratuidade funerária, com direito a urna funerária (caixão),
três remoções (transporte do corpo) e pagamento de
taxas de sepultamento; b) o auxílio financeiro, ou seja,
concessão de um salário mínimo vigente para cobrir as
despesas do enterro (prazo de 45 a 60 dias). Tem direito
a qualquer uma das opções as pessoas que atendam às
condicionalidades do programa.
81
Unidade II
Uma vez que exista respaldo legal referente à solicitação
de gratuidade no funeral do sujeito de direito, o profissional
não terá dificuldades em efetivar essa solicitação. Porém, uma
reflexão há de ser feita: o serviço prestado ao cidadão é digno?
Para responder a isso, cabe ao profissional de campo fazer uma
analise e buscar soluções para algum eventual problema a ser
enfrentado, pois, infelizmente, alguns órgãos municipais não
dispõem de serviços dignos, esquecendo-se de que todos somos
sujeitos de direito e que, na verdade, não há gratuidade, visto
que todas as benfeitorias são advindas dos pagamentos de
nossos impostos.
No estado de São Paulo, existe o auxílio funeral concebido a
esposa/esposo, parceiros/parceiras de relacionamentos estáveis
ou, na falta dessas pessoas, ao indivíduo que custeou as despesas
fúnebres do funcionário público estadual, esteja ele ativo ou
inativo. Resumidamente, esse auxílio consiste no pagamento de
um mês do salário do colaborador.
Ao assistente social que trabalhe em algum município sem
lei específica para o assunto, cabe um olhar crítico e a iniciativa
de trabalhar na perspectiva do problema, não como um fim
nele mesmo, mas na busca por oportunidades, ou seja, fazendo
projetos com embasamento e levando-os ao conhecimento dos
órgãos pertinentes e/ou à Câmara Municipal.
5.2.2 Atuação profissional em órgãos privados
Antes da reflexão propriamente dita a respeito da atuação
do assistente social no segmento funerário, vamos entender a
evolução ocorrida nessa área muito mistificada pela sociedade.
As mudanças sociais também foram refletidas no setor
funerário, que passou a contar com clientes que começaram a
exigir melhores serviços. Trata-se de uma situação distinta da
que ocorria até os anos 1990, quando o setor não contava com
trabalho profissionalizado nem havia o interesse em criar novas
82
O maior impedimento para uma ação
melhorada junto aos órgãos públicos
é, possivelmente, a falta de dialogo
entre eles; passa-se a impressão de
que são concorrentes. Para que haja
mudança nesse quadro, precisa-se,
principalmente,
de
profissionais
engajados em seu trabalho.
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
tecnologias, fatores que eram apenas reflexos de uma sociedade
que tinha preconceito quanto aos serviços funerários e que,
por isso, acabava por não valorizar o trabalho desempenhado.
Consequentemente, as empresas tampouco se preocupavam na
qualificação dos seus serviços, não os divulgavam abertamente
e proporcionavam pouca informação a respeito, principalmente,
por atuarem somente para a morte ou com a morte.
Entretanto, com a competitividade do mercado e a visão
de ganho nesse segmento com o decorrer dos anos, este foi
ganhando notoriedade com o incremento tecnológico, o início
da capacitação dos trabalhadores, a divulgação e a participação
ativa das empresas em eventos nacionais ou internacionais. Esse
tipo de mercado não mais se vinculava somente à morte, mas
passava a oferecer outros serviços, como planos médicos, entre
outros.
Focando na mais significativa mudança para nós, a
implantação do Serviço Social neste setor, teremos que o
assistente social poderá atuar também em funerárias privadas,
não sendo restrito o trabalho somente a órgãos públicos.
Como em qualquer outra empresa particular, é preciso que
o assistente social, mais intrinsecamente, identifique o interesse
do contratante. A atuação do profissional se dá junto a:
• Diretores – ajudam diretamente na implementação de
projetos que visem à resolução de problemas corriqueiros
e em ações que melhorem os pontuais, seja interna ou
externamente, e outras ações que forem necessárias.
• Clientes internos (colaboradores) – ação similar à
ocorrida em qualquer outra empresa privada: verificar
as reivindicações/necessidades; elaborar projetos que
visem à implantação de benefícios; quando solicitado,
atuar na contratação/demissão; treinar, de acordo com
seus conhecimentos/possibilidades, profissionais e
83
Unidade II
proporcionar capacitações; promover, com a equipe, a
melhora da qualidade de vida no trabalho.
• Clientes externos (consumidores dos produtos e/ou
serviços) – divulgação, por meio de palestras com pessoas
aptas, sobre a doação de córneas, bem como a efetivação
de parcerias para a distribuição desses órgãos; aumento
da oferta de serviços com diferentes profissionais da
saúde; criação de trabalho com grupos específicos;
empréstimos de equipamentos reabilitatórios; elaboração
de campanhas; parcerias com farmácias que vendam, a
preços mais acessíveis, remédios aos associados, como
também com outros estabelecimentos comerciais e/ou de
lazer; promoção de atividades culturais e educativas etc.
• Comunidade – cursos que visem profissionalizar as
pessoas em diferentes áreas ou até mesmo no segmento
funerário; promoção do acesso à informação referente ao
tema morte; atividades culturais e educativas; projetos
de cunho social com diferentes olhares; elaboração de
campanhas preventivas etc.
Como se verifica, o trabalho não fica restrito à atenção à
morte, ao contrário, abre a possibilidade de promover outro
olhar às empresas que atuam nesse segmento. Além disso,
obviamente, há o trabalho realizado no pós-morte e que envolve
ações como:
• Acolher as famílias que perderam o ente;
• Proporcionar o melhor acesso aos serviços funerais
disponibilizados pelo plano de assistência funerária
contratado pelo cliente, incluindo a atenção ao translado
do corpo para outros municípios ou regiões;
• Disponibilizar cópias da certidão de óbito;
• Quando necessário ou sempre que possível, visitar o
velório para assistir à família;
84
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
• Viabilizar as devidas informações, a quem de fato
interessar, quanto aos direitos deixados pelo familiar;
• Procurar conhecer um pouco mais da pessoa que faleceu,
como forma de aproximar as ações;
• Mobilizar grupos que auxiliam no período do luto, em
concomitância a um psicólogo etc.
Da mesma maneira que em outros segmentos de trabalho
do assistente social, neste também precisamos saber inovar e
proporcionar o reconhecimento da atuação profissional nesse
ramo de atividade, sempre tendo em mente o Código de Ética
Profissional.
6 O ASSISTENTE SOCIAL DESENVOLVENDO SEU
TRABALHO NA ÁREA DA SAÚDE
A área da saúde ainda emprega o maior número de
assistentes sociais, porém, a quantidade de profissionais
aumenta substancialmente na área da assistência social devido
à consolidação do Suas (Sistema Único de Assistência Social).
6.1 Entendendo o processo histórico da saúde
no Brasil e o Sistema Único de Saúde (SUS)
O maior empregador dos assistentes sociais é o Estado, nas
diferentes esferas de governo – federal, estadual e municipal.
No entanto, são poucos os profissionais que atuam nesses
ambientes e entendem ou, ao menos, procuram compreender o
processo histórico que a saúde em nosso país precisou caminhar
para chegar ao padrão, ainda em desenvolvimento, atual.
Para que possa ser feita a reflexão esperada, é preciso o
entendimento prévio de que a evolução das políticas em saúde está
intrinsecamente ligada à transformação político-social e econômica
de nossa sociedade, e de que tais mudanças ocorrem no caminhar
do processo capitalista, concomitantemente aos seus interesses.
85
Unidade II
Durante o período colonial, no tocante a saúde, no
Brasil-colônia, não se tinha quase nenhum interesse: o principal
eram a exploração e o enriquecimento da metrópole (Portugal).
Durante a exploração do pau-brasil, não houve ações para a
promoção da saúde, visto que não existia o interesse em povoar
as novas terras descoberta por Portugal; apenas a extração era
o foco.
Os portugueses desenvolveram a atividade de exploração
do pau-brasil, porque havia grande quantidade dessa árvore na
Mata Atlântica. Além disso, tal exploração foi facilitada porque
elas estavam próximas ao litoral (o que motivou o povoamento
litorâneo) e também por causa da barganha feita com os nativos,
com quem trocavam mercadorias europeias e desconhecidas
por mão de obra, que extraía e transportava o pau-brasil até
as embarcações. No entanto, esse tipo de comércio, chamado
de escambo, não perdurou muito; com o passar do tempo, os
portugueses foram alimentando certa desconfiança quanto aos
índios, em função, principalmente, do modo de vida que tinham:
houve um choque de culturas motivado pelo fato de os hábitos
e as crenças de ambos os povos serem totalmente diferentes.
A boa qualidade da terra do Nordeste atraiu os colonizadores
para lá. Com o tempo, eles notaram que a região, ainda
inexplorada, favorecia o plantio da cana-de-açúcar e que tal
atividade apresentaria extrema rentabilidade, o que de fato se
confirmou.
A partir daí, os colonos tentaram submeter os índios à sua
dominação, impondo-lhes a cultura portuguesa e a religião
católica, trazida pelos jesuítas, por meio da catequese. Foram
forçados também ao trabalho escravo nas atividades necessárias,
restando, então, dois caminhos aos nativos: rebelarem-se
ou aceitarem a nova situação, que, aliás, contribuía para que
perdessem seus territórios. Alguns grupos indígenas tentavam se
rebelar, mas eram mortos ou fugiam para lugares remotos e de
difícil acesso. Aqueles que ficavam e se submetiam ao trabalho
86
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
escravo eram superexplorados, com alto índice de mortes,
decorrentes em grande parte por maus-tratos e doenças trazidas
pelos colonos europeus (e para as quais o sistema imunológico
do indígena não estava preparado), como as doenças venéreas e,
mais tarde, a varíola, esta trazida pelos escravos africanos.
Como os nativos não estavam suprindo as necessidades de
rentabilidade que os portugueses esperavam com a exploração do
pau-brasil, não hesitaram em desenvolver a atividade açucareira,
pois havia grande aceitação desse produto no mercado europeu;
no entanto, era preciso uma grande quantidade de mão de obra
barata. Com isso, houve a ideia de lucrar também com o tráfico
de escravos das colônias portuguesas na África, iniciando a
inserção destes no então Brasil-colônia, oficialmente, a partir de
1559, embora, antes mesmo dessa data, já houvesse esse tipo de
comércio informalmente em virtude da escassez de mão de obra.
Provenientes de Angola e da Guiné em embarcações chamadas
de navios negreiros, os africanos que aqui chegavam eram,
em sua maioria, capturados em guerras tribais (os vencedores
escravizavam e vendiam os derrotados aos europeus) ou
escravizados por falta de pagamento de dívidas. As negociações
eram feitas também por negros africanos, que os trocavam por
produtos como fumo, armas e aguardentes.
Durante a viagem para o Brasil, muitos negros morriam
em função da superlotação dos navios negreiros, das péssimas
condições de higiene e de doenças, principalmente a varíola.
Quando aqui chegavam, eram vendidos em praça pública, com
os mais fortes e saudáveis sendo os mais valiosos. Não havia
interesse algum na promoção da saúde dessa parte população,
até porque, aliás, eles nem eram vistos como pessoas.
Já devidamente comercializados, a nova realidade a ser
enfrentada pelos índios escravizados e negros africanos estava
posta: eram obrigados a viver sob tortura em cativeiros,
principalmente os negros, vivendo em masmorras, sem condições
mínimas de higiene adequadas, uma vez que, nesses locais
87
Unidade II
havia um número elevado de fezes, urina, vômitos e doentes.
Não era difícil presenciar mortes por anorexia, desidratação etc.,
pois não existia preocupação maior com essa parcela social. A
comida ofertada pelos seus senhores era incapaz de suprir as
necessidades nutricionais básicas devido ao ritmo de trabalho
exaustivo, condição agravada ainda pela falta de higiene na
preparação e/ou manipulação dos alimentos, que muitas vezes
estavam estragados.
Os escravos africanos eram totalmente submissos aos seus
senhores, não tinham direitos básicos, como liberdade de ir
e vir, alimentação adequada, horário para as refeições etc.
Não tinham, inclusive, direito a constituir ou manter vínculos
familiares, já que, a qualquer momento, poderiam ser vendidos
a terceiros: tudo girava em torno da conveniência em relação
ao senhor e da possibilidade de lucros. Aos escravos, restava
apenas o trabalho exaustivo, punitivo e árduo, uma vez que
o trabalho braçal não era feito por nobres, como se nota
no trecho de uma carta de Nicolau Clenardo ao seu amigo
Latônio, em 1535: “em Lisboa, os escravos e as escravas são
mais que os portugueses” (HOLANDA, 1995, p. 54). Não havia
a convivência fraterna e materna, fato que pode ser verificado
nessa mesma carta, pois a venda dos filhos de escravos era
bastante lucrativa.
Assim, até o século XVII, a economia açucareira era a
atividade predominante, e todos os interesses estavam voltados
a esse cultivo; porém, outra fonte de renda bastante atrativa
e lucrativa passou a ser explorada: a mineração. Os paulistas
tiveram grande importância nessa exploração, pois, em meados
do século XVII, descobriram alguns metais não preciosos, mas
que já serviam para indicar que matérias-primas de mais valor
poderiam ser encontradas, principalmente no caminho para
o interior de Minas Gerais. Entre esses paulistas, destacava-se
Fernão Dias Pais, que partiu para o sertão, desbravou grande
parte das terras ali e, de certa forma, abriu caminho para futuras
e importantes descobertas relacionadas à mineração.
88
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
No século XVIII, a mineração passa a ganhar destaque como
atividade exploratória, mas a situação dos escravos em nada
melhorou, continuava a mesma: trabalhavam exaustivamente,
recebiam apenas trapos como roupa e alimentação insuficiente
para suprir suas reais necessidades nutricionais, continuavam
a viver nas senzalas, galpões escuros, úmidos e sem nenhuma
higiene, sendo ali acorrentados para que não fugissem.
Os castigos físicos eram comuns, principalmente o açoite
(chicotada) e o tronco, o que potencializava a diminuição do
tempo de vida dessa mão de obra. Além do sofrimento físico,
com as condições desumanas nas quais viviam, passavam por
torturas psicológicas, como a proibição de praticar religião ou
realizar quaisquer festas e rituais africanos, devendo seguir o
catolicismo e adotar a língua portuguesa para se comunicarem.
Ainda assim, entretanto, não deixavam a cultura africana se
apagar, realizando às escondidas rituais, festas e danças como
a capoeira.
A despeito de tudo isso, indiretamente, a mineração trouxe
algo de positivo para certos escravos, pois como alguns senhores,
principalmente os pequenos mineradores, não possuíam
meios de arcar com as despesas de manutenção de uma
escravaria numerosa, davam a eles certa autonomia para que
desenvolvessem suas atividades longe da casa-grande e liberdade
para minerarem por conta própria, desde que entregassem parte
das preciosidades encontradas. Essas situações possibilitaram aos
escravos o acúmulo de riqueza suficiente para, posteriormente,
comprarem sua alforria (liberdade). É importante frisar, no
entanto, que tal situação não tornava menos dolorosa nem mais
democrática a vida dos escravos, pois os castigos sofridos eram
ainda mais árduos do que os infligidos na época da exploração
do pau-brasil e da produção de açúcar, sem qualquer cuidado
em relação à saúde.
Em 1º. de março de 1894, Prudente de Moraes foi eleito
presidente, fato que, diga-se de passagem, trouxe o fim da presença
do Exército na Presidência da República, exceção feita ao marechal
89
Unidade II
Hermes da Fonseca, eleito para o período de 1910 a 1914. O novo
presidente era representante do café, produto cujo cultivo estava
se expandindo bastante: em 1890, no estado de São Paulo, havia
cerca de 200 milhões de cafeeiros; em 1905, o número ultrapassava
680 milhões; em 1930, passou de um bilhão, números que faziam
de São Paulo o responsável pela comercialização da metade do
consumo mundial do produto. No entanto, o café não trazia muitos
benefícios para a população de massa, ou seja, os trabalhadores
rurais, mas sim, apenas aos plantadores, comerciantes e banqueiros
que investiam capital com o intuito de fazer crescer as lavouras e
obter lucro nas transações comerciais e financeiras.
O café trouxe inúmeros benefícios para o país na área
econômica, como maior empregabilidade, arrecadação fiscal,
alargamento do mercado interno e promoveu o desenvolvimento
da rede ferroviária e a ampliação dos portos e serviços urbanos.
Além disso, começou a cogitar-se o desenvolvimento de uma
política de imigração, pois, conforme a industrialização crescia
e se firmava nos países europeus, havia a substituição da mão
de obra humana por máquinas. Muitas dessas pessoas, agora
desempregadas, então, abandonavam a Europa para tentar uma
vida melhor no Brasil, algo que, infelizmente, não conseguiram,
visto que a cultura do trabalho exploratório ainda persistia no
país, herança do período escravagista que se encerrara há pouco
tempo. Os setores social e de saúde foram esquecidos e havia
disparidades entre as diferentes regiões do país e classes sociais:
a burguesia detinha a concentração do capital junto às casas
exploradoras estrangeiras, o que acentuava as desigualdades,
principalmente nos períodos de crise.
Devido à falta de políticas na área de saúde, as pessoas, já
separadas em classes sociais, como dito, tratavam-se também
de forma diferenciada:
• Aqueles em situação de pobreza utilizavam a medicina
de folk: tratavam-se com base em uma medicina popular,
realizada pela própria família e pela comunidade local;
90
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
• Aqueles em situação de riqueza recebiam cuidados, na área
da saúde, de pessoas especializadas, vindos principalmente
de Portugal.
Talvez o primeiro passo na área da saúde no Brasil foi a criação
da Academia Real de Medicina Social, na Bahia, cujos principais
objetivos eram os cuidados da saúde populacional seguindo os
modelos europeus equivalentes. Apesar disso, a saúde pública
no país só ganhava destaque quando as epidemias ou endemias
afetavam os campos sociais e econômicos capitalistas: havia a
preocupação de que estes não afetassem o desenvolvimento
urbano das cidades, de maneira que ações eram desempenhadas
na forma de campanhas focalizadas. No entanto, uma vez
que as doenças eram controladas, as ações sanitárias eram
abandonadas, sem que houvesse uma política de prevenção
para o futuro.
Com o fim da escravidão e o início do processo transitório
das atividades agrícolas para as industriais, a urbanização e a
industrialização passaram a estar presentes, o que propiciou
a formação de classes sociais médias: funcionários públicos,
profissionais liberais, empregados das firmas de serviços públicos
e comerciais. As classes mais baixas eram formadas pelo nascente
proletariado. Estima-se que, em 1910, a população de São Paulo
girava em torno de 375 mil habitantes, enquanto a do Rio de Janeiro,
em cerca de 850 mil. O desenvolvimento das cidades e do processo
de produção conduzia a algumas e significativas alterações sociais,
com a consequente mudança de muitos hábitos, como, por exemplo,
a troca do vinho pelo café na socialização de final da tarde entre
os burgueses. Estes, aliás, sempre que fosse interessante, investiam
parte de sua renda em outras atividades lucrativas, principalmente
industriais, o que acabou formando uma força reserva de trabalho,
formada principalmente por imigrantes, usados nas indústrias
principalmente nos momentos de crise do café.
Na primeira fase da República, no final do século XIX até
1930, a imigração foi um dos traços mais significativos no
91
Unidade II
contexto socioeconômico: acredita-se que entraram no Brasil,
à época, cerca de 3,8 milhões de estrangeiros, havendo um
declive durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), fato
que causou medo nos latifundiários, que temiam a falta de mão
de obra justo no momento em que havia forte desenvolvimento
da indústria. Logo após a guerra, no entanto, houve novamente
a procura dos emigrantes pelo país.
O aparecimento da indústria, entretanto, não trouxe
melhoria para a vida dos operários: excluídos, marginalizados e
com pouco dinheiro, restava-lhes morar em favelas e cortiços;
os salários ofertados variavam de acordo com a vontade do
empregador e, em geral, eram miseráveis, não permitindo que
vivessem com dignidade.
A questão sanitária passa a ser vinculada à questão política a
partir da campanha sanitária de Osvaldo Cruz, que privilegiava a
higienização, em 1904, com as leis de vacinação contra a varíola,
fato que gerou revoltas na parcela mais pobre da sociedade. Com
a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública, a ideia
era estender os serviços de saneamento às regiões urbanas e
rurais, momento em que a saúde começa a ser entendida como
expressão da questão social.
Enquanto isso, a elite brasileira contava com as Caixas de
Aposentadorias e Pensões (CAPs), que tinham serviços como
atendimento médico e dispensação de medicamentos. Na
Constituição de 1934, aparece o tema da saúde, incluindo a
atenção ao trabalhador, às crianças e mulheres, como veremos
a seguir:
Art. 10 – Compete concorrentemente à União e aos
Estados:
(...)
II – cuidar da saúde e assistência públicas;
92
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Art. 121 – A lei promoverá o amparo da produção
e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade
e nos campos, tendo em vista a proteção social do
trabalhador e os interesses econômicos do País.
§ 1º – A legislação do trabalho observará os seguintes
preceitos, além de outros que colimem melhorar as
condições do trabalhador:
(...)
h) assistência médica e sanitária ao trabalhador e à
gestante, assegurando a esta descanso antes e depois
do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, e
instituição de previdência, mediante contribuição
igual da União, do empregador e do empregado, a
favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos
casos de acidentes de trabalho ou de morte;
§ 3º – Os serviços de amparo à maternidade e à infância,
os referentes ao lar e ao trabalho feminino, assim
como a fiscalização e a orientação respectivas, serão
incumbidos de preferência a mulheres habilitadas.
Art. 138 – Incumbe à União, aos Estados e aos
Municípios, nos termos das leis respectivas:
(...)
c) amparar a maternidade e a infância;
(...)
e) proteger a juventude contra toda exploração, bem
como contra o abandono físico, moral e intelectual;
(...)
93
Unidade II
g) cuidar da higiene mental e incentivar a luta contra
os venenos sociais.
Com a aceleração industrial e o aumento da consciência
política dos trabalhadores, o Estado teve de passar a ouvir
as reivindicações dos operários, como a instituição de um
salário mínimo (Constituição de 1934) para o suprimento
das necessidades básicas. Na prática, porém, não era o que
acontecia, as condições de vida só pioravam, o que se refletia
em demandas por assistência médica, fato que motivou os
Institutos de Assistência Previdenciária a começarem a prestar
esse tipo de serviço.
Na Constituição de 1937, temos, no tocante à saúde, ações
que a vinculam a um caráter de defesa e proteção:
Art. 16 – Compete privativamente à União o poder de
legislar sobre as seguintes matérias:
(...)
XXVII – normas fundamentais da defesa e proteção da
saúde, especialmente da saúde da criança.
Art. 18 – Independentemente de autorização, os
Estados podem legislar, no caso de haver lei federal
sobre a matéria, para suprir-lhes as deficiências ou
atender às peculiaridades locais, desde que não
dispensem ou diminuam as exigências da lei federal,
ou, em não havendo lei federal e até que esta regule,
sobre os seguintes assuntos:
(...)
c) assistência pública, obras de higiene popular,
casas de saúde, clínicas, estações de clima e fontes
medicinais;
94
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Criou-se também o plano Salte (saúde, alimentação,
transporte e energia), sendo essas as áreas prioritárias. No
entanto, investimentos em Saúde Pública, principalmente, nunca
fizeram parte real das políticas de investimentos do governo,
pois eram vistos como despesas.
Com a Constituição Federal de 1946, temos:
Art. 5º – Compete à União:
(...)
XV – legislar sobre:
(...)
b) normas gerais de direito financeiro; de seguro e
previdência social; de defesa e proteção da saúde; e
de regime penitenciário;
(...)
Art. 157 – A legislação do trabalho e da previdência
social obedecerá aos seguintes preceitos, além
de outros que visem à melhoria da condição dos
trabalhadores:
(...)
VIII – higiene e segurança do trabalho;
(...)
X – direito da gestante ao descanso antes e depois do
parto, sem prejuízo do emprego nem do salário;
(...)
95
Unidade II
XIV – assistência sanitária, inclusive hospitalar e
médica preventiva, ao trabalhador e à gestante;
Em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde
Pública, que, no entanto, sofria abalos devido às instabilidades
políticas que envolviam as diferentes forças do novo governo.
Em 1934, passou a se chamar Ministério da Educação e Saúde
e começa sua institucionalização. Com o aumento do setor da
saúde, criaram-se as delegacias federais de saúde, que visavam
ajudar nos serviços locais, e também se iniciaram as Conferências
Nacionais de Saúde, de cunho administrativo.
O Ministério da Educação e Saúde tinha como característica
marcante o caráter centralizador: sua estrutura permaneceu
intacta até 1953, com a criação do Ministério da Saúde. As
ações de saúde pública ainda estavam atreladas ao sanitarismo
campanhista, autoritário e centralizador. Com a separação da
Educação, o então Ministério da Saúde passou a receber apenas
um terço dos recursos antigamente destinados.
Na Constituição de 1967, temos, em referência à saúde:
Art. 8º – Compete à União:
(...)
XIV – estabelecer planos nacionais de educação e de
saúde;
(...)
c) Normas gerais de direito financeiro; de seguro e
previdência social; de defesa e proteção da saúde; de
regime penitenciário;
É nesse contexto de interesses entre as classes sociais
que surge o Sistema Único de Saúde (SUS), um processo
96
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
histórico brasileiro. Em função disso, torna-se importante um
conhecimento mais holístico em nossa atuação profissional.
Entender que, até a promulgação da Constituição Federal de
1988, ocorreram inúmeras questões societárias, cujas demandas
foram batalhadas e conseguidas a duras marcas.
Na Constituição de 1988, houve a primeira grande
mudança: garantir a saúde como um direito social, como
vemos a seguir:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a
alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança,
a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma
desta Constituição.
Elencaremos a seguir os principais pontos abordados, nessa
Constituição, referente à saúde
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais,
além de outros que visem à melhoria de sua condição
social:
(...)
IV – salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente
unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais
básicas e às de sua família com moradia, alimentação,
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte
e previdência social, com reajustes periódicos que
lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua
vinculação para qualquer fim;
(...)
XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por
meio de normas de saúde, higiene e segurança;
97
Unidade II
(...)
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios:
(...)
II – cuidar da saúde e assistência pública, da
proteção e garantia das pessoas portadoras de
deficiência;
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito
Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
XII – previdência social, proteção e defesa da saúde;
(...)
Art. 30. Compete aos Municípios:
(...)
VII – prestar, com a cooperação técnica e financeira da
União e do Estado, serviços de atendimento à saúde
da população;
(...)
Art. 194. A seguridade social compreende um
conjunto integrado de ações de iniciativa dos
Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a
assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência
e à assistência social.
(...)
98
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
Seção II
DA SAÚDE
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços
de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos
da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e
controle, devendo sua execução ser feita diretamente
ou através de terceiros e, também, por pessoa física
ou jurídica de direito privado.
Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde
integram uma rede regionalizada e hierarquizada e
constituem um sistema único, organizado de acordo
com as seguintes diretrizes:
I – descentralização, com direção única em cada
esfera de governo;
II – atendimento integral, com prioridade para as
atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços
assistenciais;
III – participação da comunidade.
§ 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos
termos do art. 195, com recursos do orçamento
da seguridade social, da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, além de outras
fontes.
99
Unidade II
§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços
públicos de saúde recursos mínimos derivados da
aplicação de percentuais calculados sobre:
I – no caso da União, na forma definida nos termos da
lei complementar prevista no § 3º;
II – no caso dos Estados e do Distrito Federal, o
produto da arrecadação dos impostos a que se
refere o art. 155 e dos recursos de que tratam
os arts. 157 e 159, inciso I, alínea a, e inciso II,
deduzidas as parcelas que forem transferidas aos
respectivos Municípios;
III – no caso dos Municípios e do Distrito Federal, o
produto da arrecadação dos impostos a que se refere
o art. 156 e dos recursos de que tratam os arts. 158 e
159, inciso I, alínea b e § 3º.
§ 3º Lei complementar, que será reavaliada pelo menos
a cada cinco anos, estabelecerá:
I – os percentuais de que trata o § 2º;
II – os critérios de rateio dos recursos da União
vinculados à saúde destinados aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios, e dos Estados destinados a
seus respectivos Municípios, objetivando a progressiva
redução das disparidades regionais;
III – as normas de fiscalização, avaliação e controle
das despesas com saúde nas esferas federal, estadual,
distrital e municipal;
IV – as normas de cálculo do montante a ser aplicado
pela União.
100
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
§ 4º Os gestores locais do Sistema Único de Saúde
poderão admitir agentes comunitários de saúde
e agentes de combate às endemias por meio de
processo seletivo público, de acordo com a natureza
e complexidade de suas atribuições e requisitos
específicos para sua atuação.
§ 5º Lei federal disporá sobre o regime jurídico,
o piso salarial profissional nacional, as diretrizes
para os Planos de Carreira e a regulamentação
das atividades de agente comunitário de saúde
e agente de combate às endemias, competindo
à União, nos termos da lei, prestar assistência
financeira complementar aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios, para o cumprimento do
referido piso salarial.
§ 6º Além das hipóteses previstas no § 1º do art. 41 e no
§ 4º do art. 169 da Constituição Federal, o servidor que
exerça funções equivalentes às de agente comunitário
de saúde ou de agente de combate às endemias
poderá perder o cargo em caso de descumprimento
dos requisitos específicos, fixados em lei, para o seu
exercício.
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa
privada.
§ 1º – As instituições privadas poderão participar
de forma complementar do sistema único de saúde,
segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito
público ou convênio, tendo preferência as entidades
filantrópicas e as sem fins lucrativos.
§ 2º – É vedada a destinação de recursos públicos para
auxílios ou subvenções às instituições privadas com
fins lucrativos.
101
Unidade II
§ 3º – É vedada a participação direta ou indireta de
empresas ou capitais estrangeiros na assistência à
saúde no País, salvo nos casos previstos em lei.
§ 4º – A lei disporá sobre as condições e os requisitos que
facilitem a remoção de órgãos, tecidos e substâncias
humanas para fins de transplante, pesquisa e
tratamento, bem como a coleta, processamento e
transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado
todo tipo de comercialização.
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de
outras atribuições, nos termos da lei:
I – controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e
substâncias de interesse para a saúde e participar
da produção de medicamentos, equipamentos,
imunobiológicos, hemoderivados e outros
insumos;
II – executar as ações de vigilância sanitária
e epidemiológica, bem como as de saúde do
trabalhador;
III – ordenar a formação de recursos humanos na área
de saúde;
IV – participar da formulação da política e da execução
das ações de saneamento básico;
V – incrementar em sua área de atuação o
desenvolvimento científico e tecnológico;
VI – fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido
o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas
e águas para consumo humano;
102
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
VII – participar do controle e fiscalização da produção,
transporte, guarda e utilização de substâncias e
produtos psicoativos, tóxicos e radioativos;
VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele
compreendido o do trabalho.
Nota-se que, nessa Constituição, a saúde passa a integrar
a seguridade social e o SUS surge baseado nos seguintes
princípios: equidade, universalidade, integralidade e
participação da população, principalmente nos Conselhos de
Saúde.
Há muitos profissionais que trabalham no SUS, mas que não
acreditam nele por falta, muitas vezes, de conhecimento de
sua magnitude. Evidentemente, ele possui várias deficiências,
mas o SUS não é feito apenas de erros. No entanto, a mídia
se encarrega de divulgar apenas as notícias negativas – que
atraem mais a atenção e, por isso, vendem mais –, porém, é
preciso também que se divulguem tudo o que também dá
certo nesse sistema, extremamente avançado se comparado
ao de outros países.
Vale refletirmos, portanto, que o SUS é mais uma etapa
do processo de surgimento e estabelecimento de uma política
pública de saúde no Brasil. Uma iniciativa legítima e legalmente
instituída ainda em desenvolvimento.
Dica
Como complemento do aprendizado, não deixe de ler
o texto O sistema único de saúde, um processo social em
construção16, de Eugênio Vilaça Mendes, e de assistir ao
filme História das políticas de saúde no Brasil. São materiais
que proporcionarão maior entendimento sobre os aspectos
abordados aqui.
Texto disponível em http://www.opas.org.br/rh/publicacoes/
textos_apoio/ACF9371.pdf. Acesso em 06/12/2010.
16
103
Unidade II
6.2 O assistente social e a área da saúde
Na Constituição Federal de 1988, como vimos e vale frisar, a
saúde é colocada como um direito social de todo cidadão. Além
disso, é citado o direito do trabalhador à garantia de um salário
mínimo suficiente ao suprimento das necessidades vitais para si
e sua família, incluindo aquelas de saúde. Acrescenta, também,
a questão da saúde no trabalho e coloca, ainda, que compete
às três esferas de governo legislar em favor da defesa da saúde
e aos municípios, com a ajuda da União e do Estado, prestar
serviços de atendimento à saúde.
Há inúmeras legislações a respeito do assunto nos três
níveis de governo, porém, nosso intuito maior é posicionar o
aluno no campo do direito do cidadão e do dever do Estado em
prover acesso à saúde. Mas, para que isso ocorra, é importante
que você conheça as leis pertinentes ao seu cotidiano e, assim,
aprofunde-se no tema.
Atualmente, há inúmeros programas de atenção à saúde que
atendem diversos seguimentos societários, como:
• Idosos;
• Mulheres;
• Crianças e adolescentes;
• Imunodeprimidos;
• Pessoas com deficiência;
• Pessoas com doenças crônicas, como diabetes.
O conceito mais utilizado de saúde é o da Organização
Mundial da Saúde, que diz: “Saúde é um estado de completo
bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência
de doenças”. Podemos até não concordar com ele, cabendo,
então, um estudo aprofundado para a elaboração de críticas
104
ESTUDOS TEMÁTICOS EM SERVIÇO SOCIAL
embasadas no conhecimento técnico da questão debatida e
não simplesmente a partir de atitudes impulsionadas pelo senso
comum. Com isso, conseguimos tramitar profissionalmente nos
mais diversos setores que fazem parte da atenção à saúde.
Dica
Leia a cartilha Parâmetros para a atuação de assistentes
sociais na política de saúde17, desenvolvida em conjunto
pelo Conselho Federal de Serviço Social e o Conselho
Regional de Serviço Social, em especial seu item 3: “Atuação
do assistente social na saúde”, pois ele vem ao encontro do
tema que estamos desenvolvendo nesta unidade.
Exercícios
1) Assinale a alternativa correta que contemple,
respectivamente, as leis nº 8.142, de 28/12/1990, e nº 8.080, de
19/09/1990:
a) ( ) Lei Orgânica da Saúde e Sistema Único de Saúde;
b) ( ) Sistema Único de Saúde e Pessoas Portadoras de
Transtornos Mentais;
c) ( ) Lei Orgânica da Saúde e Pessoas Portadoras de
Transtornos Mentais;
d) ( ) Sistema Único de Saúde e Lei Orgânica da Saúde;
e) ( ) Nenhuma das anteriores.
2) Assinale a alternativa que determina corretamente sobre
a disposição preliminar da Lei Orgânica da Saúde:
a) ( ) Artigo 1º – Esta Lei regula, em todo o território
nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada
Texto disponível em http://www.cfess.org.br/arquivos/Parametros_
para_a_Atuacao_de_Assistentes_Sociais_na_Saude.pdf.
Acesso
em
06/12/2010.
17
105
Unidade II
ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual,
por pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou
privado.
b) ( ) Artigo 2º – Esta Lei regula, em todo o território
nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada
ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual,
por pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou
privado.
c) ( ) Artigo 2º – Esta Lei regula, em todo o território
nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada
ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual,
por pessoas naturais e não jurídicas de direito privado.
d) ( ) Artigo 1º – Esta Lei regula, em todo o território
nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada
ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual,
por pessoas naturais e não jurídicas de direito privado.
e) ( ) Artigo 1º – Esta Lei regula, somente na região Sudeste,
as ações e serviços de saúde, executados isolada ou
conjuntamente, em caráter permanente ou eventual,
por pessoas naturais ou jurídicas de direito público ou
privado.
Resolução dos exercícios
1) d) Sistema Único de Saúde e Lei Orgânica da Saúde.
2) a) Artigo 1º – Esta Lei regula, em todo o território
nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada ou
conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas
naturais ou jurídicas de direito público ou privado.
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