VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental III-023 – AVALIAÇÃO DA PERMEABILIDADE DA BARREIRA DE PROTEÇÃO DA FUNDAÇÃO DO ATERRO SANITÁRIO DE PIRAÍ Elisabeth Ritter(1) Engenheira Civil pela Escola de Engenharia da UFRGS. Mestre em Engenharia Civil (Geotecnia) pela PUCRio. Doutora em Engenharia Civil (Geotecnia Ambiental) pela COPPE/UFRJ, Professora Adjunta do Depto. Eng. Sanitária e do Meio Ambiente - FEN/UERJ João Alberto Ferrreira D.Sc. em Saúde Pública, M.Sc. em Engenharia Ambiental, Professor Adjunto do Depto. Eng. Sanitária e do Meio Ambiente - FEN/UERJ Alexandre Pessoa Dias Engenheiro Civil com ênfase em Sanitária - UERJ , Especialista em Engenharia Sanitária e Ambiental - UERJ Alessandra Almeida Dias da Silva Graduanda em Engenharia Civil com ênfase em Sanitária - UERJ Endereço(1): Rua General Urquiza, 190 – Leblon, Rio de Janeiro – RJ – CEP. 22431-040 - Brasil - Tel: (21) 25877743 - e-mail: [email protected] RESUMO Amostras retiradas do solo utilizado como material de fundação do Aterro Sanitário de Piraí foram caracterizadas e ensaiadas em laboratório. A medida da permeabilidade foi executada através de ensaio a carga variável em amostra compactada em permeâmetro de parede rígida. Executaram-se dois ensaios: um com umidade correspondente ao ramo seco da curva de compactação, e outro no ramo úmido. Os resultados indicaram valores de permeabilidade no ramo úmido cerca de 40 % menor do que no ramo seco. Ressalta-se a importância do controle tecnológico das barreiras de proteção quanto ao teor de umidade. PALAVRAS-CHAVE: Permeabilidade, Barreira de Proteção, Aterro Sanitário INTRODUÇÃO A disposição adequada de resíduos sólidos seja de origem urbana ou industrial vem sendo um dos grandes desafios dentro do Saneamento Básico e Ambiental. De forma geral, a disposição destes resíduos no solo apresenta-se como uma alternativa bastante eficiente. Entretanto, caso esta disposição seja realizada de forma inadequada, pode acarretar sérios problemas como a contaminação do solo, das águas subterrâneas e superficiais, com sérias conseqüências à saúde pública. No caso específico do Estado do Rio de Janeiro, a grande maioria dos resíduos sólidos gerados pelos municípios ainda é disposta de forma inadequada, em locais provisórios, sem nenhum cuidado com medidas controladoras dos possíveis impactos ambientais decorrentes desta prática. Dos 92 municípios do estado, somente cerca de 10% dos municípios possuem sistemas adequados de disposição de resíduos sólidos urbanos. Entre eles está o município de Piraí, com o Aterro Sanitário operando desde maio de 2000. Observa-se, entretanto, que mesmo quando a disposição dos resíduos é feita através de aterros sanitários, durante a construção dos mesmos, deveria ocorrer um adequado controle da compactação das barreiras de proteção projetadas para a fundação destes aterros. Sabe-se, porém, que devido à escassez de recursos das prefeituras de pequenos e médios municípios, e por falta de cultura vigente no assunto, tal controle não é realizado de forma eficaz, como faz parte da tradição de construção de barragens de terra. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 1 VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental O objetivo deste trabalho é apresentar resultados de medidas de densidade in situ, de ensaios de compactação Proctor Normal e valores de coeficiente de permeabilidade a carga variável medidos em laboratório para o solo de fundação do Aterro de Piraí. AS CONDIÇÕES DE SUBSOLO E O USO DE SOLOS COMPACTADOS EM BARREIRAS DE PROTEÇÃO A norma brasileira NBR- 13896/1997, para aterros de resíduos não perigosos, recomenda no item 4.1.1b “desejável a existência, no local, de um depósito natural extenso e homogêneo de materiais com coeficiente de permeabilidade inferior a 10-6 cm/s e uma zona não saturada com espessura superior a 3,00 m”; em outro ponto define ainda que “entre a superfície inferior do aterro e o mais alto nível do lençol freático deve haver uma camada natural de espessura mínima de 1,50 m de solo insaturado” e que “o aterro deve ser executado em áreas onde haja predominância no subsolo de material com coeficiente de permeabilidade inferior a 5x 10-5 cm/s”. Recomenda também que “sempre que as condições hidrogeológicas do local não atenderem às especificações de 4.1.1.b deve ser implantada uma camada impermeabilizante”. Quando for necessária uma camada impermeabilizante, esta será composta de um solo compactado. As propriedades de solos compactados dependem da umidade de compactação dos solos e dos processos de compactação utilizados, dos quais resultam peso específico seco (ou densidade seca), o grau de saturação e a estrutura do solo. Estes parâmetros irão influenciar o coeficiente de permeabilidade existente no campo. Portanto, se estes fatores não forem cuidadosamente verificados, eventualmente pode-se supor que se tenha um solo com baixa permeabilidade, que é a condição desejada para a barreira de proteção, enquanto que no campo a permeabilidade existente esteja maior do que a almejada. A Tabela 1(Terzaghi e Peck, 1967) resume os valores de permeabilidade e sua classificação quanto ao grau de permeabilidade. Observa-se que coeficientes de permeabilidade menores do que 10-3 cm/s já são considerados de baixa permeabilidade. As permeabilidades recomendadas pela norma estão classificadas como muito baixas. Tabela 1 – Classificação da permeabilidade Grau de permeabilidade Alta Média Baixa Muito Baixa Praticamente Impermeável Coeficiente de Permeabilidade cm/s Acima de 10-1 10-1 a 10-3 10-3 a 10-5 10-5 a 10-7 Menor do que 10-7 Apud Terzaghi e Peck,1967 A curva de compactação do ensaio em laboratório, geralmente Proctor Normal, é definida em um gráfico teor de umidade (w), em porcentagem, versus peso específico seco (γd) em KN/m2. Define-se nesta curva um teor de umidade ótimo e um peso específico seco máximo que delimitam o ramo seco da curva, umidades mais baixas, e o ramo úmido da curva, com umidades mais elevadas. Os coeficientes de permeabilidade ao longo de uma curva de compactação diferem bastante, sendo que no ramo seco o solo é mais permeável (Lambe, 1976). Observa-se que para uma mesma umidade, a permeabilidade é tanto menor quanto mais compacto for o solo, enquanto que para igual peso específico, a permeabilidade diminui com o aumento do teor de umidade. Para o caso de barreiras protetoras, subjacentes a aterros sanitários, recomenda-se que a compactação seja efetuada no ramo úmido da curva, ou seja, com umidades elevadas (Pinto, 2000). O ATERRO SANITÁRIO DE PIRAÍ ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 2 VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental O Aterro de Piraí está situado junto à Rodovia Presidente Dutra, numa área de aproximadamente 50 hectares. A bacia de contribuição da área faz parte da bacia de um pequeno córrego contribuinte do Rio Cachimbal, este distante 13 km do Rio Paraíba do Sul. Dados de pluviosidade da região indicam cerca de 1600 mm de chuva por ano, ocorrendo de forma mais intensa durante os meses do verão. Ao longo de 5 meses por ano a evaporação é mais intensa do que a precipitação. O Aterro que está operando desde maio de 2000 recebe cerca de 18 ton/dia. Maiores detalhes do Aterro estão em Ferreira e Ritter. (2000). As sondagens de reconhecimento da área, realizadas durante a fase de projeto, indicaram como material de fundação do Aterro de Piraí uma argila arenosa, micácea, com matéria orgânica, com espessuras variando de 2,00 a 9,00 m. Este solo está sobrejacente a uma camada de 1,0 m de solo residual. A profundidade do nível d’água indicada nas sondagens variava de 0,50 m a 1,50 m. Esta fase de investigação, executada por empresa contratada pela prefeitura, contemplou também a realização de ensaios de carga variável em laboratório, com amostras moldadas no permeâmetro, ao lado dos furos de sondagem; os coeficientes de permeabilidade obtidos variaram de 4,6 x 10-5 cm/s a 3,6 x 10-6 cm/s. Estes resultados definiram a utilização deste solo, predominante nos taludes adjacentes, como o material a ser compactado para a barreira de proteção, especificada em projeto com 1,0 m de espessura. Nenhum controle de umidade e peso específico in situ foi efetuado durante a execução da barreira de impermeabilização. A situação de Piraí atende a recomendação da norma em termos de valor do coeficiente de permeabilidade do solo de fundação, pois este valor varia de 4,6 x 10-5 cm/s a 3,6 x 10-6 cm/s, portanto menor do que 5 x 10-5 cm/s. Por outro lado, possivelmente somente em uma região específica do Aterro, a camada insaturada, sem contar a barreira de proteção, é de 0,5 m de espessura. Uma camada de 1,0 m de solo compactado foi especificada no projeto, tendo sido executada subjacente a um sistema de drenagem do chorume (vide Ferreira et al, 2001), garantindo assim uma distância mínima de 1,5m entre a superfície inferior do Aterro e o mais alto nível de lençol freático. ESTUDOS EXPERIMENTAIS A decisão de investigar melhor as condições do solo de fundação do Aterro de Piraí surgiu após o início de um projeto de pesquisa, que está em andamento, sobre tratamento de chorume em pequenos e médios municípios, financiado pelo RHAE/CNPq, do qual os autores fazem parte. Como o aterro já vinha operando há alguns meses, não foi possível a retirada de um bloco indeformado da fundação do Aterro, pois toda a primeira célula de deposição dos resíduos domiciliares já estava coberta. No entanto, optou-se por pesquisar o solo local, dos taludes adjacente, utilizado como material da barreira de proteção. Foram coletadas amostras deformadas para caracterizar o solo e fazer ensaio de compactação. De modo a se verificar as condições naturais, foi retirado um bloco no talude natural, junto à célula que está recebendo resíduos. A Tabela 2 resume os dados de caracterização da amostra: limites de Atterberg, Limite de Liquidez (LL) e Limite de Plasticidade (LP) e densidade dos grãos (γs). A Figura 1 apresenta a curva granulométrica do material. Verifica-se que o solo apresenta cerca de 48% de areia, 34% de argila e 18% de silte, predominando assim a granulação fina. O índice de plasticidade é de 24,4. Este solo é classificado pela carta de plasticidade como CL. O índice de atividade deste solo é de 0,89, que é uma atividade normal. O teor de umidade e o peso específico natural (wnat e γnat ) foram determinados a partir de amostra do bloco indeformado. Os ensaios foram efetuados no Laboratório de mecânica dos Solos da faculdade de Engenharia da UERJ. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 3 VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental Tabela 2 – Caracterização do solo local LL LP γs wnat γnat 47,6 % 23,% 26,3 KN/m2 15,05% 19,54 KN/m2 Figura 1 – Curva Granulométrica 1 Peneiras 200 100 100 50 40 4 30 3/8" 2" 10,0000 50 Percentagem Passando 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0,0001 0,0010 0,0750,1000 0,0100 1,0000 100,0000 Aberturas (mm) Argila Silte Areia Fina Pedregulho Média A curva de compactação obtida com energia Proctor Normal está apresentada na figura 2. O teor de umidade ótimo (wot) e densidade seca máxima (γd max) são respectivamente 17,1% e 16,9 KN/m2. Verifica-se que a condição natural do solo, com 15% de teor de umidade natural e 19,5 KN/m2 de peso específico natural vide (Tabela 2), que dará um peso específico seco de 16,96 KN/m2, está acima do ramo seco da curva de compactação. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 4 VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental Figura 2 – Curva de Compactação Proctor Normal 17.00 P eso E s pec ífic o S ec o (k N/m 2 ) 16.80 16.60 16.40 16.20 16.00 15.80 15.60 15.40 15.20 15.00 12.5 13.5 14.5 15.5 16.5 17.5 18.5 19.5 20.5 21.5 22.5 Um idade (% ) Os ensaios de permeabilidade a carga variável foram executados em permeâmetro de parede rígida. As amostras foram compactadas com energia Proctor Normal no cilindro de compactação, posteriormente extraídas deste cilindro, e cravadas no permeâmetro. Executaram-se dois ensaios: um no ramo seco e outro no ramo úmido da curva de compactação. Os ensaios seguiram a norma NBR 14545, que recomenda que em amostras de solo compactado os grãos de areia e pedregulho com diâmetro maior do que 2 mm sejam removidos. Os valores de permeabilidade (k) obtidos estão apresentados na Tabela 3, indicando o teor de umidade inicial (w), referente à umidade de compactação, peso específico seco (γd) e índice de vazios (e). Tabela 3 – Resultados dos Ensaios de Permeabilidade w (%) γd (KN/m2) e k (cm/s) RAMO SECO 10,04 17,33 0,53 2,07x 10-4 RAMO ÚMIDO 22,33 15,84 0,67 7,68x 10-5 As amostras foram moldadas nas condições extremas da curva de compactação. Os resultados do valor de coeficiente de permeabilidade indicaram a diminuição do valor do coeficiente de permeabilidade na amostra moldada no ramo úmido, confirmando as referências anteriores, a partir da teoria. Ressalta-se que o valor do coeficiente de permeabilidade no ramo úmido da curva é cerca de 40% do valor da permeabilidade no ramo seco. Observa-se ainda que os valores do índice de vazios (e) das duas amostras apresentam uma diferença de cerca de 25%, quando seriam desejáveis valores praticamente coincidentes, pois apresentariam a mesma condição de vazios no solo, com teores de umidade diferentes. No entanto, há uma dificuldade em se obter amostras compactadas reproduzindo a mesma condição de vazios, e esta diferença obtida de 25% pode ser considerada irrelevante, pois os valores da permeabilidade indicaram uma diferença de mais do dobro. Os resultados obtidos ressaltam a importância do controle de umidade de compactação no campo, onde são necessárias a verificação e manutenção do teor de umidade, que estará garantindo uma situação mais favorável para as barreiras de proteção, em termos de valor de permeabilidade. ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 5 VI Simpósio Ítalo Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental Ensaios de permeabilidade moldados em torno da umidade ótima também foram efetuados utilizando água e chorume, e indicaram valores de permeabilidade menores com o chorume (Ferreira et al, 2001). CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES Os ensaios de permeabilidade foram realizados em amostras compactadas no ramo seco e úmido da energia Proctor Normal. O valor obtido para o ramo úmido foi cerca de 40% do valor para o ramo seco. Este resultado confirma a importância de se indicar o material de barreira de proteção sempre compactado no ramo úmido da curva, pois nesta situação a permeabilidade será significativamente menor. Os resultados obtidos indicaram que se houvesse um controle da compactação no campo, os solos utilizados poderiam estar numa condição mais favorável para garantir uma melhor impermeabilização da fundação. Nesse sentido, o controle tecnológico na execução das barreiras de proteção de aterros sanitários é perfeitamente justificável e viável sob o ponto de vista de custo/benefício. Por outro lado, na situação do Aterro de Piraí, como os valores determinados estão no limiar de um valor aceitável, e considerando as condições vigentes no aterro, em que a quantidade de chorume gerado é pequena, e existe um sistema de coleta deste chorume, possivelmente a probabilidade de ocorrer uma percolação do chorume gerado através da fundação é bastante remota. AGRADECIMENTOS O presente trabalho foi realizado com o apoio do CNPq, dentro do programa CNPq/Rhae. Agradecemos a colaboração do prof. Rogério Feijó do Laboratório de Mecânica dos Solos da Faculdade de Engenharia da UERJ. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. LAMBE,T. e WHITMAN, R. Mecânica De Suelos. Editorial Limusa. México. 1976. FERREIRA, J.A. e RITTER,E. Viability of Sanitary Landfill for Municipalities of Small and Medium Size in Developing Countries – a Brazilian Experience – International Symposium on Sanitary and Environmental Enginnering. Trento. Vol III, pg.155-160. 2000 3. FERREIRA, J.A., GIORDANO, G., RITTER,E. e ROSSO, T.C., CAMPOS, J.C. e LIMA, P.Z.M. Uma revisão das técnicas de tratamento de chorume e a realidade do Estado do Rio de Janeiro. 21o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. CD – Rom – Trabalhos Técnicos Completos. Vol.1 – III-108. 2001 4. FERREIRA, J.A, RITTER,E. ROSSO, T.C. e DIAS, A.P. Leachate permeability study of compacted soil barrier for Pirai’s Sanitary Landfill. Sardinia 2001 8th International Waste Management and Landfill Symposium. Proceddings Vol III p. 143-148. 2001 5. PINTO, C.S. Curso Básico de Mecânica dos Solos. Oficina de Textos. São Paulo. 2000 ABES - Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental 6