v.5, Jan. – Jul. 2012
ISSN 1982 – 2065
MÉTODO DO CASO: UMA ALTERNATIVA EFICAZ NA BUSCA PELA
FORMAÇÃO DE ADMINISTRADORES PENSANTES
1
Everton Rodrigues da Silva
2
Daiana Castilho
RESUMO
A motivação para este artigo surgiu do interesse pela elaboração de casos de ensino
na Administração. Para aprofundar a compreensão sobre o assunto, optou-se, no
primeiro instante, por conhecer os processos de ensino e aprendizagem da
Administração, a fim de verificar como o método do caso se relaciona com o cenário
examinado. Observou-se, a partir destes estudos, que o país necessita rever seu
modelo educacional de gestão, exageradamente baseado na memorização do
conhecimento, com vistas a substituí-lo pelo paradigma da reflexão crítica. O que se
pretende neste trabalho é apresentar a utilização do caso de ensino como um dos
instrumentos didáticos para auxiliar esta necessária metamorfose. Diante de tal
objetivo, considerou-se pertinente verificar o interesse da comunidade científica pelo
tema. Para tanto, foi feita uma pesquisa nos periódicos QUALIS A e B da CAPES,
vinculados à área de “Administração, Ciência Contábeis e Turismo”. Constatou-se
que existem poucos materiais publicados e um espaço reduzido, nas publicações,
para os casos didáticos. Para ajudar na superação desta deficiência, esta obra traz
um passo a passo, baseado nos escritos de Roesch (1997 e 2006) e Gil (2004), para
auxiliar a elaboração dos mesmos, além de apresentar uma revisão conceitual e
histórica sobre o método.
PALAVRAS-CHAVE: Método do caso. Caso de ensino. Ensino e pesquisa em
administração.
1
Mestre em Administração pelo COPPEAD/UFRJ, professor e coordenador do projeto de iniciação científica
“Elaboração de casos empresariais para o ensino de estratégia”, junto a Faculdade Metodista Granbery.
2
Administradora de empresas e ex-bolsita do projeto de iniciação científica “Elaboração de casos empresariais
para o ensino de estratégia”
Revista da Ciência da Administração
versão eletrônica v.5, Jan. - Jul. 2012
1
CASE METHOD: AN EFFECTIVE ALTERNATIVE IN THE SEARCH FOR
THINKING ADMINISTRATOR TRAINING
ABSTRACT
The motivation for this article came from the interest in the development of
administration teaching cases. To deepen the understanding about the subject, it
was decided, in the first moment, to know the processes of teaching and learning of
Administration, in order to verify how the case method is related to the scenario
examined. It was observed, from these studies, that the country needs to review its
educational model management, which is overly based on memorization of
knowledge, in order to replace it with the paradigm of critical reflection. The intention
in this article is to present the use of teaching case as a didactic instrument to assist
this needed transformation. This way, it was appropriate to verify the scientific
community's interest in the subject. For this, a search was made in the journals
QUALIS A and B of CAPES, linked to the area of "Management, Accounting and
Tourism." It was found there are few published materials and reduced space in
publications, for didactic cases. To help overcome this deficiency, this work provides
a step-by-step, based on the writings of Roesch (1997 and 2006) and Gil (2004), to
assist it’s preparation, moreover it presents a conceptual and historical review of the
method.
KEY WORDS: Case method. Case teaching. Teaching and research in administration.
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2
1 INTRODUÇÃO
A motivação para o desenvolvimento deste artigo surgiu do interesse sobre
um importante método de ensino em Administração: a produção de casos de ensino.
Apesar de relevante, o tema é pouco explorado na literatura científica
brasileira. A fim de verificar tal hipótese, foi realizada uma pesquisa descritivaquantitativa3 em todos os periódicos listados na CAPES, sob a área “Administração,
Ciência Contábeis e Turismo” (CAPES, 2011), que receberam QUALIS A1, A2, B1,
B2, B3, B4 e B5 (universo preliminar). Neste montante encontram-se 571
publicações. Deste conjunto foram retirados os títulos estrangeiros, os que não
guardam relação com a Administração, os inativos4 e aqueles em que não foi
possível realizar a busca pelo site1, alcançando 61 publicações (universo definitivo),
conforme explica a Figura 1:
571
CAPES – QUALIS A e B
(ADM, CONTÁBEIS E TURISMO)
Filtro eliminatório: publicação
estrangeira ou sem vínculo com a
Administração ou inativa ou sem
opção de busca pelo site.
61 publicações
(universo da
pesquisa)
Fonte: Os autores
Figura 1 - Corte inicial da pesquisa
A distribuição absoluta e percentual do universo da pesquisa, de acordo
com o critério QUALIS, pode ser assim representada pela Figura 2:
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3
A1
0
A2
4
B1
10
B2
6
B3
12
B4
11
B5
18
TOTAL
61
A2
6,6%
B5
29,5%
B4
18,0%
B1
16,4%
B2
9,8%
B3
19,7%
Fonte: Os autores.
Figura 2 - Distribuição absoluta e percentual do universo da pesquisa.
O intuito da pesquisa é realizar o levantamento do número de artigos que
aborda o método do caso5; o levantamento do número de periódicos que possuem
uma seção específica sobre “Ensino e pesquisa em administração”; e o
levantamento do número de periódicos que possuem uma seção específica sobre
“Casos de ensino”. Todo o universo foi investigado através de consulta ao site das
publicações. Na sequência, os resultados são apresentados.
Constatou-se que 77% dos periódicos não possuem uma seção dedicada à
difusão de artigos que abordem o tema “Ensino e pesquisa em administração”.
Quando se observa se há espaço nos veículos de divulgação acadêmicos brasileiros
para o relato das práticas empresariais, por meio de casos de ensino, chega-se a
conclusão que apenas 3,3% oferecem tal oportunidade. O Gráfico 1 retrata este
cenário:
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4
3,3%
100%
23,0%
80%
60%
96,7%
77,0%
40%
SIM
NÃO
20%
0%
POSSUI SEÇÃO "ENSINO
E PESQUISA EM ADM."?
POSSUI SEÇÃO "CASOS
DE ENSINO"?
Fonte: Os autores
Gráfico 1 - Periódicos que possuem a seção “Ensino e pesquisa em
Administração” e “Casos de ensino”
Poderiam argumentar os mais críticos, que a análise anterior não seria
justa, pois existem periódicos voltados para áreas específicas (ex.: Pesquisa
Operacional) e, por tal conseguinte, seria uma decorrência natural os mesmos não
possuírem espaço para abordar o tema ensino e pesquisa. Entendendo que esse é
um argumento razoável, analisou-se o espaço destinado a veiculação de casos
somente nos meios que possuem uma seção sobre “Ensino e pesquisa em
administração”5. Neste novo universo, os periódicos com área exclusiva para casos
empresariais representam 14,3% (dois periódicos num universo de catorze),
conforme revela o Gráfico 2.
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5
POSSUI SEÇÃO "CASOS DE ENSINO"?
14,3%
SIM
85,7%
NÃO
Fonte: Os autores.
Gráfico 2 - Periódicos com a área "Ensino e pesquisa em administração" que
possuem uma seção “casos de ensino".
Também foi investigado, considerando-se o universo inicial6, os periódicos
que possuem artigo publicado sobre o método do caso. O Gráfico 3 apresenta o
resultado:
POSSUI ARTIGOS SOBRE O MÉTODO DO
CASO?
11,3%
SIM
88,7%
NÃO
Fonte: Os autores.
Gráfico 3 - Periódicos que já publicaram artigos sobre o método do caso
O percentual acima de 11,3% representa os seis periódicos (totalizando
nove artigos publicados) descritos na Tabela 1:
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6
Periódico
QUALIS
Número de
artigos
Publicação
Educação e Pesquisa (USP. Impresso)
B1
1
2009
RAC. Revista de Administração Contemporânea
(Impresso)
B1
1
2007
RAE (Impresso)
B1
3
1977
Organizações & Sociedade (Impresso)
B2
2
1997, 2005
RAUSP-e (São Paulo)
B2
1
2006
Contextus (Fortaleza)
B4
1
2004
Fonte: Os autores.
Tabela 1 - Periódicos que possuem artigos sobre o método do caso
Como pode ser visto, a produção acadêmica brasileira sobre o tema (nos
periódicos QUALIS A e B) pode ser expressa por nove trabalhos científicos.
Também chama atenção a constatação de que existem apenas dois periódicos que
abrem espaço para a publicação de casos de ensino6.
Tal cenário precisa ser revisto, pois o caso de ensino é um importante
instrumento didático que estimula a identificação do aluno com o fato estudado,
favorecendo o aprendizado, ao mesmo tempo, que desconstrói a visão do ensino
baseado somente na transmissão dos saberes dos professores. Um dos principais
fundamentos dessa ferramenta é a “crença na capacidade que os alunos têm para o
desenvolvimento de habilidades por meio de suas experiências pessoais” (GIL,
2004: 9).
Borba, Silveira e Faggion (2005) afirmam que há urgência na reavaliação
dos processos de ensino aprendizagem aplicados nos cursos de Administração, uma
vez que o modelo atual de ensino, coloca os alunos como memorizadores do
conhecimento, não atendendo, portanto as exigências do mercado de trabalho. Este
ensino não problematizante impossibilita o aluno “de desenvolver sua própria
percepção acerca do fenômeno administrativo e uma visão crítica das teorias que
lhe são ensinadas” (NICOLINI, 2003: 52), ideia apoiada também por Closs,
Aramburu e Antunes (2009) e Saccol e Munck (2003). O autor complementa,
afirmando que: “Em lugar de treiná-lo [o aluno] para dar respostas prontas aos
problemas costumeiros, devemos educá-los para desafios maiores. O aluno precisa
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7
ser incentivado a romper paradigmas, a criar, a ousar em um mundo de
complexidade crescente e que se transforma rapidamente (NICOLINI, 2003: 50)”.
A fim de estimular o aprendiz neste processo de construção participativa
do conhecimento, os casos podem ser utilizados como uma alternativa para a
geração de conteúdo sobre empresas locais e regionais. Entende-se que a
motivação dos discentes pode ser potencializada se os mesmos utilizarem suas
experiências pessoais no debate sobre a realidade de empresas que constituem o
universo da cidade/região em que estão se graduando. Para tanto, é necessário
estimular o professorado a produzir, de modo autônomo, uma parcela do conteúdo
didático utilizado em sala.
O professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
Agrícola Bethlem menciona, em seu livro “Evolução do pensamento estratégico no
Brasil”, que a inadequação de modelos oriundos de outros ambientes de negócio e
outras culturas tem sido um leitmotiv da sua produção escrita (BETHLEM, 2003).
Os docentes de administração, em geral, defrontam-se com essa
realidade que se revela estampada na maioria dos livros didáticos, através da
preponderância de conceitos e corporações internacionais utilizadas como base
para o ensino. Ainda assim, quando se trata de um caso brasileiro, o foco recai,
muitas vezes, nas grandes empresas distantes do repertório do alunado.
Diante do contexto apresentado, este artigo traz um apanhado da
produção acadêmica brasileira sobre o conceito e a metodologia de produção de
casos, a fim de auxiliar os profissionais que desejam aventurar-se nestas paragens.
A existência deste manuscrito encontra respaldo na conclusão dos participantes do I
Encontro de Ensino e Pesquisa em Administração e Contabilidade – I EnEPQ,
promovido
pela
Associação
Nacional de
Pesquisa
e
Pós-Graduação
em
Administração – ANPAD: “Não é possível falar seriamente do método do caso (“caso
para ensino”) sem colocar de entrada a preparação do professor – um caso mal
trabalhado é pior que uma aula tradicional (EnEPQ, 2007, p. 8). Mais adiante, no
mesmo relatório, foi observada a carência de fontes de estudo sobre o tema: “É
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8
essencial preparar os professores para usarem o método do caso como estratégia
de ensino, mas faltam cursos e livros que os ajudem” (EnEPQ, 2007, p. 40).
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9
2 CASOS EMPRESARIAIS: CONCEITO
Casos são relatos de situações reais7 que as empresas enfrentam (ou
enfrentaram) num determinado momento “com o objetivo de estimular os alunos a
refletirem sobre decisões para o episódio em estudo” (IKEDA, VELUDO-DEILIVEIRA e CAMPOMAR, 2006, p. 147). Erskine, Leenders, Mauffette-Leenders
(1981, p. 10 apud CESAR, 2010) assim os definem:
[...] um caso é a descrição de uma situação administrativa recente,
comumente envolvendo uma decisão ou um problema. Ele normalmente é
escrito sob o ponto de vista daquele que está envolvido com a decisão e
permite aos estudantes acompanhar os passos de quem tomou a decisão e
analisar o processo, decidindo se o analisaria sob enfoques diferentes ou se
enveredaria por outros caminhos no processo de tomada de decisão.
O caso pode ser entendido como uma ferramenta pedagógica, por meio da
qual “uma parte da realidade é trazida para a sala de aula para ser trabalhada pelos
alunos e pelo professor” (GIL, 2004: 8).
O interessante desse instrumento é que poucos casos têm uma resposta
certa. Barney e Hesterly (2011) afirmam que, por meio do método, o aluno irá
conhecer e discutir os desafios reais enfrentados pelas empresas, o que propiciará o
desenvolvimento da capacidade de julgamento e de aplicação dos conceitos.
Sobre esse aspecto, cabe replicar Alfred North Whitehead citado por Barney e
Hesterly (2011, p. 374): “Essa discussão [referindo-se ao método do caso] rejeita a
doutrina de que os alunos devem primeiro aprender passivamente e depois, tendo
aprendido, devem aplicar o conhecimento. [...] O verdadeiro significado das coisas
conhecidas está envolto em suas relações com as demais coisas. Esse
conhecimento não aplicado é um conhecimento sem significado”.
O caso busca exercitar a habilidade analítica dos alunos, através da execução
de passos lógicos, como a “definição do problema, identificação de alternativas,
estabelecimento de objetivos e critérios para a tomada de decisões, escolha de
alternativas e plano de implementação”.(LEENDERS e ERSKINE, 1973, p. 11 apud
ROESCH, 1997).
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10
César (2010) aponta características virtuosas do método. Segundo a autora,
um relato bem elaborado transporta o aluno para uma vivência muito próxima da
situação real, não havendo necessidade de um rigor metodológico, como num
método de pesquisa convencional. Inclusive, para ela, essa característica é o que
possibilita a aproximação do aluno com o mundo tal como ele é.
Os casos são descrições de acontecimentos reais vivenciados por
administradores em organizações, e não construções elaboradas pelos professores.
Apesar de os mesmos serem desenvolvidos a partir de fatos verídicos, em geral, o
desfecho da história não é revelado, para que os alunos possam formular a solução
mais conveniente. Gil (2004, p. 2) afirma que “o que se espera com o uso dos casos
é que o estudante se coloque no lugar da pessoa a quem cabe tomar a decisão ou
resolver o problema. Dessa forma, o estudante tem uma oportunidade para
desenvolver habilidades administrativas num ambiente de laboratório”.
Graham (2010) corrobora tal afirmativa ao dizer que em vez de apresentar
uma versão definitiva, os casos desafiam o leitor a acrescentar sua interpretação,
diante de um campo incompleto de conhecimento.
Desta forma, a relação entre professor - aluno se diferencia do modelo
tradicional de ensino que coloca o segundo como recebedor de conhecimento.
Nesta metodologia “Tanto o professor quanto os estudantes assumem a
responsabilidade pela aprendizagem” (GRAHAM, 2010, p. 39). O docente torna-se
coordenador do processo e o aluno toma as decisões necessárias para solucionar a
questão do caso. Há uma troca de conhecimentos entre as partes envolvidas, como
diria Freire (1996, p. 23) “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina
ao aprender”. Para o autor “é neste sentido que ensinar não é transferir
conhecimentos/conteúdos, nem formar é ação pela qual um sujeito criador dá forma,
estilo ou alma a um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência,
as duas se explicam e seus sujeitos apesar das diferenças que os conotam, não se
reduzem á condição de objeto, um do outro”. (FREIRE, 1996, p. 23).
Michiel Leenders, citado por Roesch (1997, p. 121), assim justificou sua
preferência pelo método:
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11
Eu ensino através de casos porque gosto de debates facilitados
através de questões, oportunidades e desafios, e desejo que os
alunos contribuam para a sua própria aprendizagem, bem como a
dos colegas. Mantém-me em dia com a realidade da comunidade de
negócios; ajuda os estudantes a desenvolver habilidades e
motivação para ´aprender a aprender´ de forma contínua; enfatiza o
processo de aprendizagem versus a aprendizagem de conteúdo e,
quando
isto
acontece,
constitui-se
numa
experiência
verdadeiramente agradável.
Outro aspecto ressaltado é que “o caso didático deve propiciar o
estabelecimento de conexão entre a experiência do profissional envolvido na
situação e a teoria que embasa a resolução do caso” (CÉSAR, 2010, p. 11). A autora
relata que “[...] embora no método do caso não haja a preocupação de construção
de conhecimento científico, a teoria deve estar por trás do desenvolvimento do caso,
de modo que variáveis que sejam consideradas importantes para a análise do
mesmo possam estar presentes no relato do caso”. (CÉSAR, 2010, p. 11).
O relatório do I EnEPQ afirma que “é necessário adotar estratégias, tais como
a preparação individual das teorias pelos alunos para evitar o empirismo imediato, o
uso do senso comum e a superficialidade das discussões. As propostas de aplicação
do método do caso como estratégia de ensino dos autores implicam num estudo
individual dos livros e artigos teóricos, com o espaço em sala de aula dedicado às
discussões da aplicação da teoria na prática.”(EnEPQ, 2011, p. 8).
Esta é uma característica especial desse método. Parafraseando Ésther,
Paço-Cunha e Sanábio (2006, p. 10), pode-se dizer que ele é um importante passo
no sentido de superar a falsa “dicotomia entre teoria e prática e o falso
distanciamento entre a universidade e o mundo lá fora”.
Pelo que foi dito, é sensato afirmar que os principais objetivos8 de um caso
para ensino são o desenvolvimento de habilidades úteis no processo de tomada de
decisão gerencial, o estímulo à interação do aluno com as empresas e com o
contexto mercadológico atual. Além disso, seu uso representa uma alternativa para
uma aula expositiva (ROESCH, 2006), não pretendendo ser a única. Como disse
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12
Graham (2010) empregar apenas esta ferramenta é insuficiente, uma vez que a
aprendizagem humana ocorre de diversas formas.
Por fim, cabe alertar ao leitor que existe uma confusão freqüente entre o
método do caso (casos didáticos, casos empresariais ou ainda cases) e a técnica de
estudo de caso, conceito mais amplo e rigoroso sob o ponto de vista científico
(CÉSAR, 2010). Como visto, o caso tem uma finalidade didática, representando uma
alternativa em relação às aulas expositivas e pressupõe uma narrativa neutra, sem
incorporar a discussão teórica do estudo de caso e sem o julgamento do autor
(ROESCH, 1997).
O estudo de caso, por sua vez, é uma técnica de pesquisa científica, que,
apesar de sua base empírica, normalmente, tem como ponto de partida um conjunto
de princípios teóricos, que servem como suporte para a coleta e análise de dados
(PEREIRA et al., 2005).
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3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO MÉTODO DO CASO
Em 1880, na escola de Direito de Harvard, foi desenvolvido o método do caso
por Christopher Langdell. Este observou que os juízes para darem seus pareceres
consultavam decisões e opiniões de vários juristas. Diante disto, ele desenvolveu
uma metodologia para suas aulas objetivando um estudo prático da lei (NUÑEZ,
2003 apud IKEDA, VELUDO-DE-OLIVEIRA e CAMPOMAR, 2006). Langdell
expunha aos alunos decisões dos tribunais e esses refletiam sobre o assunto, com
isso o professor conseguia unir a teoria e a prática formando alunos mais bem
preparados para tomarem decisões (MENEZES, 2009).
O professor Arch W. Shaw, a pedido do diretor da Harvard Business School,
escola de Administração fundada em 1908, fez a adaptação do método utilizado no
curso de direito para as aulas da faculdade de administração da instituição.
Executivos se interessaram pela novidade levando problemas de suas empresas
para suas classes, buscando assim soluções juntamente aos alunos. Tal fato gerou
várias publicações de casos que viraram referência (IKEDA, VELUDO-DE-OLIVEIRA
e CAMPOMAR, 2006).
Conant (1968), citado por Menezes (2009), argumenta que qualquer novidade
precisa de um período para aceitação e sempre há resistência. Com o método do
caso não foi diferente, muitos anos demoraram para que este instrumento
pedagógico fosse aceito e ganhasse a credibilidade que possui atualmente.
No Brasil, o método ainda se apresenta de maneira tímida, sendo popular
apenas em algumas escolas de Administração (BOAVENTURA, 2007 apud
MENEZES, 2009). Uma das explicações possíveis pode residir no fato, apresentado
por Menezes (2009), de que o país possui uma cultura dedutiva9 de ensino. Outra
hipótese, aventada por Roesch (2006), sugere a insuficiência da construção textual
de cases sobre as empresas brasileiras: são raros os professores que desenvolvem
casos para o ensino, tornando a literatura nacional escassa.
Na década de 80, foi fundada a Central Brasileira de Casos na tentativa de
desenvolver cases nacionais. O COPPEAD (instituto de pós-graduação da
14
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Universidade Federal do Rio de Janeiro), apoiado pela Universidade Federal de
Minas Gerais - UFMG e pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
conseguiu fazer publicações, porém o projeto não se estendeu além da década
mencionada. No mundo, a escola de Harvard continua até hoje sendo a maior
disseminadora dos casos empresariais para fins de ensino. Segundo Menezes
(2009), a necessidade de um novo perfil de profissional está fazendo com que
ressurja a ideia de criar canais disseminadores de cases brasileiros.
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15
4 ELABORAÇÃO DE CASOS
Este tópico se propõe a enumerar as principais etapas para a construção
de um caso empresarial. Antes, porém, é conveniente mencionar que existem
diversas classificações para os casos. O Quadro 1 apresenta uma dessas
propostas10, escolhida pelos autores desse artigo em função de sua natureza
simples e objetiva.
Caso-ilustração
Caso-análise
Restringe-se
à Propõe aos estudantes a
apresentação
de
uma análise do caso, mediante
situação verificada em uma sua decomposição em
organização.
partes significativas e a
identificação da relação
De modo geral, não se entre as variáveis.
solicita sua análise com
vistas à tomada de uma
decisão, pois esta já é
apresentada na descrição.
Fonte: Adaptado de Gil (2004).
Caso-problema
Exige dos estudantes mais do
que uma capacidade analítica,
à medida que demanda a
apresentação
de
soluções
possíveis para o problema,
ponderando-se as vantagens e
desvantagens de cada uma
delas.
São os modelos adotados, em
geral, pela Universidade de
Harvard.
Quadro 1 – Classificações do caso empresarial
Em geral, o mais utilizado nas salas de aula é o caso-ilustração, seguido
pelo caso-análise e o caso-problema. O foco deste trabalho é apresentar
orientações para incentivar a produção nacional dos dois últimos. Na visão de Gil
(2004), semelhante a Roesch e Fernandes (2007), o processo de elaboração de um
caso pode ser dividido em oito estágios, conforme revela a Figura 3:
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16
I
II
VIII
VII
III
VI
IV
V
Fonte: Adaptado de Gil (2004).
Figura 3 - Estágios da elaboração de um caso didático.
Cada uma das etapas acima será comentada, tendo como conceitos
norteadores os escritos de Gil (2004).
I. Identificação do problema
•
O que é: consiste na definição da principal questão a ser solucionada pelo
caso. Pode ser entendida como a definição do escopo do caso.
•
Como fazer: o educador deve recorrer ao conteúdo da sua disciplina,
buscando identificar os aspectos essenciais a serem abordados, sempre
usando como crivo a realidade vivenciada pelo aluno.
•
Cuidados: não trabalhar com problemas muito amplos, genéricos e
imprecisos.
•
Exemplos de problemas: introdução de novas tecnologias, integração
vertical, crescimento empresarial, análise ambiental, redução de custos,
comunicação organizacional, etc.
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17
II Definição dos objetivos
•
O que é: trata-se dos objetivos pedagógicos esperados com o caso. Em
suma, o que está em foco é a avaliação dos conhecimentos e habilidades que
os alunos terão ao analisar o caso. Determina a estrutura e forma de
apresentação.
•
Como fazer: O professor deve refletir sobre os gaps de aprendizado do aluno
em relação às demandas do mercado e, a partir do problema identificado,
descrever as habilidades que o caso pretende desenvolver. É útil nesta fase
conversar com demais professores.
•
Cuidados: O professor deve evitar priorizar habilidades que não serão
exigidas dos alunos no atual estágio profissional em que se encontram.
•
Exemplos: identificar os problemas relacionados à produção industrial;
comparar o modelo de produção adotado nas empresas líderes do mercado;
reconhecer os possíveis desafios do mapeamento de processos; etc.
•
Sobre esta etapa, Roesch (2006, p. 4) comenta:
A maioria das histórias organizacionais que lembramos é relevante. O
desafio é saber relatá-las tendo em vista os objetivos de aprendizagem.
Para o professor, o ponto de partida normalmente é a identificação de
objetivos educacionais e a escolha de um tópico dentro do programa de sua
disciplina, para o qual deseja produzir casos.
Seja qual for a inspiração, conforme sinaliza a autora, o escritor não pode
perder o foco de que o caso para ensino não busca construir histórias somente, ele
é elaborado para auxiliar o processo de aprendizado dos alunos.
III. Pesquisa e coleta de informações
•
O que é: consiste na localização de casos, entrevistas, artigos, dissertações,
etc. que podem ser úteis no alcance dos objetivos. Também é válido examinar
informações internas da empresa, caso seja possível obter acesso as
mesmas.
•
Como fazer: pesquisas em livros, revistas, na internet (em sites de
universidades e em bibliotecas públicas de casos empresarias), etc. Outro
Revista da Ciência da Administração
versão eletrônica v.5, Jan. - Jul. 2012
18
recurso imprescindível é a realização de entrevistas (fonte primária de
informação) com gerentes, empresários, colaboradores, fornecedores, etc.
•
Cuidados: no que tange à realização de entrevistas, vários cuidados devem
ser tomados: a correta identificação do pesquisador e o esclarecimento do
propósito da entrevista; a certificação de que o entrevistado tem autorização
para falar pela empresa e de que as informações fornecidas poderão ser
publicadas; a certificação de que o entrevistado encaixa-se no perfil
demandado pelo caso; o entrevistador precisa, também, tomar o cuidado de
pesquisar aspectos sobre a empresa e elaborar um roteiro; e, por fim, se
possível, as informações absorvidas devem passar pelo senso crítico do
entrevistado e ser conferida com outras fontes.
Roesch (2006) sugere uma tática interessante para os casos construídos com
base em pesquisa primária: antes de aprofundar o levantamento de informações, o
educador deve realizar a entrevista com o seu contato, pois ele indicará outras
fontes de informação (relatórios, dados, publicações técnicas, informações internas,
etc.) e também abrirá as portas para outras entrevistas. Feita a primeira, recomendase esboçar, num texto breve, qual a situação problema a ser estudada.
I. Análise da dificuldade do caso
O que é: é uma classificação que representa o nível de dificuldade que
o estudante terá ao analisar o caso.
Como fazer: Erskine et al. (1998 apud GIL, 2004) criaram uma
metodologia para avaliar o grau de complexidade de um caso didático, chamada de
cubo
de
dificuldade,
baseada nas dimensões analítica, conceitual e
de
apresentação, conforme explicitado no Quadro 2:
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19
Dimensão analítica
Níveis de
complexidade
1
2
3
Analisa a tarefa do
estudante em relação à
questão chave do caso.
Casos que descrevem o
problema que a
organização enfrentou e
o modo como ela o
solucionou e pergunta
ao leitor “você acha que
a solução foi
adequada?”
Este é o problema que a
organização está
enfrentando. Que
solução você daria para
o problema?
Veja esta situação. Que
problemas ela envolve?
Que soluções devem ser
dadas?
Dimensão
conceitual
Dimensão de
apresentação
Relaciona-se à
exigência dos
conceitos, teorias ou
técnicas que podem
ser úteis na análise.
Refere-se à quantidade
e à forma que a
informação é
apresentada no caso.
O caso apresenta um
único conceito, claro
e preciso, que pode
ser facilmente
compreendido.
Vários conceitos são
combinados,
requerendo análise
mais profunda.
O caso envolve uma
combinação
complexa de
conceitos,
requerendo ativa
participação do
professor.
Fonte: Adaptado de Erskine et al. (1998 apud GIL, 2004).
O caso é curto, bem
organizado e
apresentado de forma
clara e direta.
O caso envolve uma
quantidade maior de
informações
apresentadas de forma
clara e direta.
Há uma quantidade
grande de informações,
não muito organizadas.
Geralmente é
apresentado em
formatos múltiplos,
utilizando vídeo, por
exemplo.
Quadro 2 – Dimensões e níveis de complexidade do cubo de dificuldade do
caso
Originalmente, a representação imagética da referida metodologia é um
cubo. Optou-se, porém, por transformá-la em um gráfico radial, mostrado na Figura
4. As dimensões de análise são representadas pelos eixos, nos quais o grau de
dificuldade (de 1 a 3) é assinalado. O exemplo abaixo representa um caso de
dificuldade 1-1-1, ou seja, baixo.
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20
Analítica
3
2
1
Apresentação
Conceitual
Fonte: Adaptado de Erskine et al. (1998 apud GIL, 2004).
Figura 4 - Representação do cubo de dificuldade do caso.
V. Construção do caso
A construção textual subdividi-se em redação e estrutura/linguagem. Na
sequência, estas atividades serão comentadas.
a. Redação
Parece existir uma unanimidade em relação à afirmativa de que não há um
modo correto para se escrever casos. Na tentativa de auxiliar os que se candidatam
a tal tarefa, Gil (2004) enumerou um conjunto de perguntas que servem como um
guia para a confecção do texto. Suas proposições podem ser agrupadas em cinco
categorias apresentadas na Figura 5:
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21
Fonte: Gil (2004).
Figura 5 - Guia para a redação do caso.
Tais questões são ferramentas balizadoras para serem usadas pelo
redator do caso, por conseguinte não devem ser entendidas como regras rígidas.
b. Estrutura e linguagem
Na visão de Roesch (2006), a estrutura de um caso pode ser resumida,
conforme Figura 6:
Apêndice
Corpo do texto
Passado
recente
Presente ou
passado
recente
Presente ou
passado
recente
Presente ou
passado
recente
Fonte: Roesch (2006).
Figura 6 - Estrutura de um caso didático.
O parágrafo inicial deve conter a apresentação dos protagonistas (pessoas,
empresas, instituições, órgãos, etc.), da situação-problema e a definição do local e
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22
da época em que a situação ocorreu – proposições semelhantes às apresentadas
por Gil (2004). Roesch (2006) destaca a importância de elaborar um parágrafo
introdutório a fim de gerar no leitor o interesse pela leitura do caso.
A etapa “antecedentes e contexto” aborda a apresentação de dados, fatos
críticos, tabelas, gráficos, personagens, mapas e estrutura organizacional.
Normalmente, narra-se a evolução da empresa até o momento presente. Enfim, é o
desenvolvimento do caso propriamente dito.
A autora reforça que o caso deve trazer informações relevantes para sua
análise, não se tratando de um manual de consulta detalhado a respeito dos fatos e
da história da empresa em estudo. Também é importante elaborar uma correta
divisão de suas seções (organização dos tópicos), pois elas irão conduzir o leitor.
Convém ressaltar que “os personagens podem expressar sua opinião (estas
podem ser apresentadas através de citação direta e/ou indireta), ao contrário do
narrador, que deve manter-se neutro sobre o que vê e descreve” (ROESCH, 2006, p.
10).
Em seguida, a “situação-problema” é detalhada, já que, no primeiro parágrafo,
ela já foi apresentada ao leitor. Pode-se fazer isto por meio de perguntas ou por
meio de um texto discursivo. Ao apresentar a questão, é interessante “evidenciar os
possíveis conflitos, para que os leitores tenham condições de tomar posições em
sala de aula” (ROESCH, 2006, p. 10).
Roesch (1997, p. 125) afirma que “um caso é bom se estimula o debate”. Na
visão da autora, a eficácia do mesmo está ligada a existência de:
Um conflito a cargo de alguém resolver e o aluno se colocará na posição
desta pessoa, quando for discuti-lo. [...]. O conflito entre criar uma estratégia
corporativa repleta de metas e controles burocráticos ou confiar na
responsabilidade individual de cada um dos sócios [...]; O desafio da
automação em uma empresa automobilística e seu impacto no programa de
qualidade de vida no trabalho, instituído em colaboração com o sindicato.
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23
Sobre este particular Roig (1977, p. 41) reitera que “o caso deve sempre ser
redigido de forma atraente. Um caso chama a atenção como uma história de
detetive: a maneira pela qual esteja redigida nos absorve. É óbvio, porém, que esse
estilo não deve levar à perda de nível científico”.
Na sequência, o “parágrafo final” deve recolocar o problema e estimular o
estudante a apresentar soluções (GIL, 2004, ROESCH, 2006). Essa é a técnica mais
usual de redação de textos (chamado de final circular, em que o início e o término
complementam), mas dependendo do talento do escritor, outras formas são
possíveis e incentivadas.
Para aqueles que optarem por um final clássico, convém mencionar as
sugestões do “Manual de elaboração de casos” (COPPEAD, 1983 apud ROESCH,
2006) do Instituto COPPEAD, sobre o conteúdo do parágrafo final: i) apresentação
dos problemas principais constantes do caso; ii) menção do tempo disponível para a
tomada de decisões; iii) menção sobre os recursos disponíveis para a tomada de
decisões; iv) deixar claro as alternativas de ação existentes ou a considerar; v)
informar o aparecimento de novos fatores que tornam urgente a tomada de
decisões.
Roesch (2006) comenta que se o objetivo pedagógico do caso for o treino de
habilidades de resolução de problemas, existem quatro opções possíveis para a
finalização do texto: i) solicitar aos alunos que definam os problemas do caso; ii)
apresentar a situação-problema e pedir que as soluções sejam apontadas; iii)
evidenciar a situação-problema e as soluções para o caso. Em seguida, solicitar aos
alunos que avaliem as soluções apresentadas; iv) solicitar aos discentes que
avaliem as alternativas apresentadas e, em paralelo, numa variação do item anterior,
apresentem outras possibilidades.
Por fim, as notas de ensino são apresentadas como um apêndice, ou seja,
elas não fazem parte do “corpo” do texto: “as notas são dirigidas ao professor e,
geralmente, não são publicadas com o caso. Contêm os seguintes elementos: (i) o
resumo do caso, (ii) as fontes dos dados, (iii) os objetivos de aprendizagem, (iv)
alternativas para a análise do caso, (v) questões para a discussão do caso em sala
24
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de aula e (vi) a bibliografia recomendada [artigos, livros, sites, vídeos] para
fundamentar a discussão”.(ROESCH, 2006, p. 12).
Além destas informações, as notas de ensino podem trazer: indicação dos
cursos, disciplinas ou módulos de ensino em que o caso pode ser usado; nível de
dificuldade do caso; conhecimentos prévios requeridos; recursos didáticos
requeridos para o seu desenvolvimento; experiências passadas relacionadas ao uso
do caso; informações acerca do que realmente houve na organização após a
ocorrência do caso; questões desencadeadoras; estratégia de ensino mais
adequada para o envolvimento da classe (discussão com a classe toda, discussão
em pequenos grupos, dramatização); tarefas propostas aos alunos (GIL, 2004).
Sob o aspecto da linguagem a ser utilizada, a Figura 7 reúne os principais
cuidados.
Fonte: Gil (2004).
Figura 7 - Linguagem recomendada num caso didático.
VI. Preparação da primeira versão
O que é: consiste na elaboração de uma versão piloto do caso.
Como fazer: O professor deve recordar o problema e os objetivos
pedagógicos definidos, além de ter em mente os interlocutores do caso, a fim de
definir o seu nível de dificuldade.
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25
VII. Lista de verificação
O bom senso recomenda que antes da efetiva conclusão do caso, o mesmo
deve passar por mais uma etapa de verificação. Gil (2004) sugere uma lista com os
principais itens:
O caso possibilita alcançar os objetivos?
Os objetivos estão ajustados ao problema?
O caso está suficientemente completo e focalizado?
O caso mostra-se realista?
Todos os constituintes de uma narrativa estão incluídos no caso, como:
estilo de apresentação, descrições contextuais da situação e perfis dos agentes
centrais, sequência de eventos e enredo interessante?
Os eventos aparecem numa ordem lógica?
Os eventos estão conectados com fórmulas de transição?
O conteúdo do caso é acurado, relevante e apropriado?
Este caso contém todo o material de que o leitor necessita para sua
análise?
Alguma parte pode ser retirada para torná-lo mais conciso sem, no
entanto, dificultar o seu entendimento? A apresentação do caso está suficientemente
clara?
As informações oferecidas são coerentes entre si? O estilo de redação
é adequado?
Na verdade, esta verificação deve ser feita constantemente até que o
caso seja enviado para o teste com os especialistas e/ou os envolvidos na situação,
assunto abordado a seguir.
VIII. Teste do caso
O que é: consiste na submissão do caso para outras pessoas que
possuem conhecimento sobre o assunto e/ou experiência em docência.
Como fazer: o educador pode convidar profissionais como revisores,
capazes de emitir opiniões críticas.
Cuidados:
é
importante
escolher
uma
rede
de
avaliadores
capacitados. O autor do caso deve estar receptivo às sugestões recebidas, mas
26
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avaliá-las com um olhar crítico. Roesch (2006) menciona que ao passar por este
crivo, o caso está pronto para ser disseminado nas salas de aula, o que, na verdade,
consiste em outra etapa de teste, já que o professor precisa estar atento à reação
dos alunos, a fim de corrigir equívocos e melhor conduzir a análise do caso.
Assim, terminada a construção do caso, chega-se a desafiadora tarefa de
aplicá-lo em sala de aula. Esse momento, conforme mostra o Quadro 3, pode ser
dividido em três etapas, com funções bem definidas para o facilitador e os discentes.
Período
Facilitador
- Indicar materiais para preparação dos
alunos.
Antes da aula
- Preparar a aula.
- Consultar colegas sobre o caso.
- Fazer o arranjo da classe para a
Durante a aula
discussão.
- Liderar a discussão do caso.
Depois da
aula
- Avaliar a participação dos estudantes
e registrar as impressões.
- Avaliar o material em relação ao
objetivo original e atualizar as
anotações pessoais de ensino.
Discente
- Receber as designações.
- Ler e preparar-se individualmente
para a aula.
- Participar das discussões.
- Levantar questões sobre o caso.
- Participar da discussão.
- Revisar os resultados da aula em
relação à preparação e anotar os
principais conceitos.
Fonte: Harling e Akridge (1998, p. 6 apud IKEDA, VELUDO-DE-OLIVEIRA e CAMPOMAR, 2006)
Quadro 3 – Etapas de aplicação de casos de ensino em sala de aula
O professor experiente logo verá que seus desafios na condução de um caso
de ensino são grandes. Roesch e Fernandes (2007) sinalizam três aspectos
essenciais neste sentido: a preparação da aula pelo professor, a motivação dos
alunos para lerem o caso e o incentivo ao debate na sala de aula.
Sobre o primeiro ponto, os autores alertam – baseado nos ensinamentos do
Prof. David Garvin, da Universidade de Harvard - que é importante selecionar os
principais temas para diálogo, a fim de que a discussão não se torne ampla, mas
superficial. Também advertem que o facilitador, por mais que tenha preparado sua
aula, deve permitir certa flexibilidade no debate, conforme interesse dos alunos. Por
fim, faz-se importante estimular a participação de discentes-chave, que poderão
contribuir de modo especial.
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27
Com relação ao segundo item, a dupla sugere que o facilitador distribua o
caso e junto com ele questões para estimular sua leitura ou mesmo solicitar alguma
tarefa para casa ou ainda exigir um resumo do caso. Tudo isso, porque “No Brasil, a
maior dificuldade de aplicar casos em sala de aula se deve ao fato conhecido de que
os alunos não costumam ler os casos antes da aula ou os lêem sem a atenção
desejada” (ROESCH e FERNANDES, 2007, p. 138).
Para promover o debate em sala de aula, Roesch e Fernandes (2007)
sugerem que o professor deve incitar o diálogo, buscando extrair contribuições
individuais dos alunos, ao invés de solicitar opiniões do grupo.
Gomes (2009), de modo semelhante aos estudiosos mencionados, afirma que
a aplicação do business case envolve três estágios: o estudo individual, seguido do
diálogo em pequenos grupos e, por fim, o debate com toda a classe. A Figura 8
explicita tal processo:
Amadurecimento das
soluções propostas
+
-
Fonte: Gomes (2009).
Figura 8 – Estágios de aplicação do caso de ensino, sob a ótica de Gomes
(2009).
Convém ressaltar que na, primeira fase, além da leitura do caso o aluno
deve estudar o material complementar indicado. Também deve escrever, de modo
resumido, suas opiniões sobre as questões colocadas.
No instante posterior, a discussão em cada grupo deve servir para elevar a
qualidade das soluções propostas: “O objetivo desta reunião não é buscar o
consenso entre o grupo, mas refinar a elaboração do caso (...)” (GOMES, 2009, p.
31). Também se objetiva desenvolver habilidades comportamentais.
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28
Por fim, o professor deve conduzir o debate, estimulando a participação
individual. Gomes (2009) menciona que cada participante deve assumir um
compromisso com os quatro P´s do caso: preparação, presença, pontualidade e
participação.
Diante das colocações feitas, percebe-se que a cultura de ensino brasileira
impõe a necessidade de estratagemas por parte do facilitador, que deve buscar
soluções criativas para lidar com os seus aprendizes. É importante salientar
também, como alertaram Ikeda, Veludo-de-Oliveira e Campomar (2006), que o
debate do caso deve ser adequado ao nível da classe, ao curso e aos objetivos
pedagógicos do mesmo.
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29
5 CONCLUSÃO
O amplo propósito deste artigo é estimular a reflexão crítica em torno do
modelo mecanicista de ensino que predomina nos cursos de Administração,
conforme bandeira levantada pela literatura especializada (BORBA, SILVEIRA e
FAGGION, 2005, CLOSS, ARAMBURU e ANTUNES, 2009, GRAHAM, 2010,
NICOLINI, 2003, SACCOL e MUNCK, 2003). Pretende-se difundir a ideia sobre a
importância da criação de meios que estimulem o aluno a participar ativamente do
seu aprendizado. Como alternativa possível foi abordada a utilização dos casos
empresariais. Não está sendo proposto que os mesmos substituam os métodos
tradicionais, como as aulas expositivas e leituras, contudo é importante que o
educador conheça mais este recurso e o utilize como uma ferramenta para elaborar
um material adaptado à realidade em que o aluno está inserido.
Para aqueles que se sentirem entusiasmados com a possibilidade de elaborar
seus próprios casos, espera-se que este manuscrito represente o primeiro passo.
Sua leitura é uma orientação básica sobre o assunto e não dispensa a consulta e o
exame profundo dos conceitos, dicas e reflexões propostas pelos vários autores
utilizados como referência nesta obra, em especial Roesch (1997 e 2006), Roesch e
Fernandes (2007) e Gil (2004).
Diante da tímida produção nacional relacionada aos casos de ensino, o
trabalho em questão também objetiva alertar a comunidade científica brasileira de
administração para a necessidade de capacitar o professorado a elaborar casos
didáticos e de aumentar o espaço nos periódicos para a publicação desta
modalidade de material didático.
NOTAS EXPLICATIVAS:
1
Utilizando como referência conceitual Malhotra (2011).
A publicação foi considerada inativa, se assim foi rotulada pela CAPES (2011) ou se sua última edição ocorreu
em 2009.
1
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30
1
RECITEC. Revista de ciência e tecnologia (B5) e Reuna - Belo Horizonte (B5).
As chaves de busca foram “método do caso”, “caso de ensino” e “caso empresarial”.
1
Fizeram parte desta análise aqueles periódicos cujo escopo é voltado exclusivamente para ensino e pesquisa.
1
Nesta análise, por conservadorismo, do universo total de 61 participantes da pesquisa, foram analisados 53
periódicos, uma vez que oito foram eliminados, por não possuírem um mecanismo de busca que permitisse a
consulta pelo site naquele momento.
1
Não foram avaliadas as recém criadas GV Casos e TAC-ANPAD, publicações não indexadas na CAPES
(2011).
1
Existem casos fictícios, mas os mesmos devem ser baseados em situações reais (ROESCH, 1997).
1
Os casos empresariais também podem ser utilizados para a gestão do conhecimento interno das organizações e
desenvolvimento gerencial (aprendizagem gerencial), conforme apontado por Graham (2010) e Roesch (1997).
No entanto, o manuscrito em questão não foca estas abordagens.
1
Conant (1968 apud MENEZES, 2009) caracterizou o pensamento dedutivo como aquele que vai do geral para
o particular.
1
O leitor com interesse no assunto deve ler Roesch (2006) e Ikeda, Veludo-de-Oliveira e Campomar (2006),
especialmente estes últimos, que apresentaram outras propostas de classificação. A leitura de Roesch (1997)
sobre a construção de casos através de “histórias curtas” (em torno de 2000 palavras) também é recomendada.
1
RECITEC. Revista de ciência e tecnologia (B5) e Reuna - Belo Horizonte (B5).
1
Revista da Ciência da Administração
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31
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