Revista Eletrônica da Faculdade Metodista Granbery http://re.granbery.edu.br - ISSN 1981 0377 Curso de Administração - N. 10, JAN/JUN 2011 MÉTODO DO CASO APLICADO AO ENSINO DA ADMINISTRAÇÃO: UMA ALTERNATIVA POSSÍVEL * Everton Rodrigues da Silva ** Daiana Castilho RESUMO Diante da necessidade de renovação nos processos de aprendizagem, torna-se útil avaliar o conteúdo e os instrumentos didáticos utilizados nas salas de aula. No ensino de administração, área focada neste artigo, existe uma carência de materiais que abordem, como exemplo, empresas nacionais, principalmente aquelas situadas onde o aluno reside ou estuda (abordagem regional). Desse modo, o que se pretende é estimular a reflexão em torno do aperfeiçoamento do arsenal didático dos docentes. Como alternativa possível, foi apresentada a utilização dos casos empresariais. Para embasar os educadores que desejam iniciar sua produção nesta área, foi elaborada uma revisão conceitual e histórica sobre o método do caso, seguida de um roteiro prático para a construção textual dos casos com fins didáticos. Palavras-chave: Ensino de administração. Método do caso. Caso empresarial. Caso didático. Conceito e elaboração de casos. ABSTRACT Given the need of renovation in the learning process, it is useful to evaluate the content and didactic tolls used in classrooms. In management teaching, this article focused area, there is a lack of materials that broach as example domestic companies, mainly those located where the student lives or studies (regional approach). Thus, the purpose is to stimulate reflection on the improvement of teacher’s teaching set. As a possible alternative, was presented the use of business cases. To base educators who wish to start their production in this area, was elaborated a conceptual and historical review of the case method, followed by a practical rule for building textual cases with didactic purposes. Key-words: Management education. Case method. Business case. Didactic case. Concept and elaboration of cases. * Mestre em Administração pelo COPPEAD-UFRJ, professor da Faculdade Metodista Granbery (FMG), consultor e coordenador do projeto de iniciação científica “Elaboração de casos de empresas locais (Juiz de Fora-MG) para o ensino da estratégia empresarial”, financiado pela FMG – [email protected] ** Graduanda no curso de Administração da Faculdade Metodista Granbery e bolsista do projeto de iniciação científica sobre “Elaboração de casos de empresas locais (Juiz de Fora-MG) para o ensino da estratégia empresarial” – [email protected] I. Introdução A motivação para este artigo surgiu do interesse sobre um importante e pouco explorado campo na bibliografia acadêmica da administração de empresas no Brasil: a produção de casos. A deficiência desse tipo de material se dá em âmbito nacional e micro, isto é, pouco se estuda sobre as empresas que compreendem o universo da cidade/região em que os graduandos de administração e cursos afins estão se formando. O professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Agrícola Bethlem menciona, em seu livro “Evolução do pensamento estratégico no Brasil”, que a inadequação de modelos oriundos de outros ambientes de negócio e outras culturas tem sido um leitmotiv da sua produção escrita (BETHLEM, 2003). Os docentes de administração, em geral, defrontam-se com essa realidade que se revela estampada na maioria dos livros didáticos, através da preponderância de corporações internacionais utilizadas como base para o ensino. Ainda assim, quando se trata de um caso brasileiro, o foco está, na realidade, nas grandes empresas distantes do contexto do alunado. A reflexão proposta por este manuscrito relaciona-se à necessidade de se estimular no aluno a identificação com o fato estudado para que o processo de aprendizado seja enriquecido. Para minimizar tal lacuna, uma alternativa a ser trabalhada é a elaboração de casos locais e regionais. Gil (2004, p.9) sustenta que um dos principais fundamentos dessa ferramenta é a “crença na capacidade que os alunos têm para o desenvolvimento de habilidades por meio de suas experiências pessoais”. Este artigo trata-se de um apanhado da produção acadêmica brasileira sobre o conceito e a metodologia de produção de casos, a fim de auxiliar o professorado que deseja aventurar-se nestas paragens. Convém mencionar que o mesmo é o primeiro resultado de um projeto de iniciação científica1 destinado a estudar o tema. 1 Este trabalho foi financiado pela FACULDADE METODISTA GRANBERY (Juiz de Fora/MG – www.granbery.edu.br), à qual os autores agradecem. II. Casos empresariais: conceito Casos são relatos de situações reais que as empresas estão enfrentando (ou enfrentaram) num determinado momento “com o objetivo de estimular os alunos a refletirem sobre decisões para o episódio em estudo” (IKEDA, VELUDO-DE-OLIVEIRA, CAMPOMAR, 2006, p. 147). Erskine, et al. (1981, p.10 apud CESAR, 2010) assim os definem: (...) um caso é a descrição de uma situação administrativa recente, comumente envolvendo uma decisão ou um problema. Ele normalmente é escrito sob o ponto de vista daquele que está envolvido com a decisão e permite aos estudantes acompanhar os passos de quem tomou a decisão e analisar o processo, decidindo se o analisaria sob enfoques diferentes ou se enveredaria por outros caminhos no processo de tomada de decisão. O caso pode ser entendido como uma ferramenta pedagógica, por meio da qual “uma parte da realidade é trazida para a sala de aula para ser trabalhada pelos alunos e pelo professor” (GIL, 2004, p.8). O interessante desse instrumento é que poucos casos têm uma resposta certa. Barney e Hesterly (2007) afirmam que, por meio do método, o aluno irá conhecer e discutir os desafios reais enfrentados pelas empresas, o que propiciará o desenvolvimento da capacidade de julgamento e de aplicação dos conceitos. Sobre esse aspecto, cabe replicar Alfred North Whitehead, citado por Barney e Hesterly (2007, p. 303): Essa discussão [referindo-se ao método do caso] rejeita a doutrina de que os alunos devem primeiro aprender passivamente e depois, tendo aprendido, devem aplicar o conhecimento. (...) O verdadeiro significado das coisas conhecidas está envolto em suas relações com as demais coisas. Esse conhecimento não aplicado é um conhecimento sem significado. César (2010) aponta características virtuosas do caso desenvolvido para fins didáticos. Segundo a autora, um relato bem elaborado transporta o aluno para uma realidade muito próxima da situação real, não havendo necessidade de um rigor metodológico, como num método de pesquisa convencional. Inclusive, para ela, essa característica é o que possibilita a aproximação do aluno com a realidade. Os casos, portanto, são descrições de situações reais vivenciadas por administradores em organizações, e não construções elaboradas pelos professores. Apesar de os mesmos serem desenvolvidos a partir de fatos verídicos, em geral, o desfecho da história não é revelado, para que os alunos possam formular a solução mais conveniente (GIL, 2004). O que se espera com o uso dos casos é que o estudante se coloque no lugar da pessoa a quem cabe tomar a decisão ou resolver o problema. Dessa forma, o estudante tem uma oportunidade para desenvolver habilidades administrativas num ambiente de laboratório (GIL, 2004, p.2). Outro aspecto ressaltado é que “o caso didático deve propiciar o estabelecimento de conexão entre a experiência do profissional envolvido na situação e a teoria que embasa a resolução do caso” (CÉSAR, 2010, p. 11). A autora relata que: (...) embora no método do caso não haja a preocupação de construção de conhecimento científico, a teoria deve estar por trás do desenvolvimento do caso, de modo que variáveis que sejam consideradas importantes para a análise do mesmo possam estar presentes no relato do caso (CÉSAR, 2010, p. 11). Esta é uma característica especial desse método. Parafraseando Ésther, Paço-Cunha e Sanábio (2006, p. 10), pode-se dizer que ele é um importante passo no sentido de superar a falsa “dicotomia entre teoria e prática e o falso distanciamento entre a universidade e o ‘mundo lá fora’”. Desse modo, resumidamente, é sensato afirmar que os principais objetivos de um caso para ensino são o desenvolvimento de habilidades úteis no processo de tomada de decisão gerencial, o estímulo à interação do aluno com as empresas e com o contexto mercadológico atual. Além disso, seu uso representa uma alternativa para uma aula expositiva (ROESCH, 2006). Por fim, cabe alertar ao leitor que existe uma confusão frequente entre o método do caso (casos didáticos, casos empresariais ou ainda cases) e a técnica de estudo de caso, conceito mais amplo e rigoroso sob o ponto de vista científico (CÉSAR, 2010). Como visto, o caso tem uma finalidade didática, representando uma alternativa em relação às aulas expositivas. Os estudos de caso, por sua vez, são uma técnica de pesquisa científica, que, apesar de sua base empírica, normalmente, tem como ponto de partida um conjunto de princípios teóricos, que servem como suporte para a coleta e análise de dados (PEREIRA, et al., 2005). III. Evolução histórica do método do caso Em 1880, na escola de Direito de Harvard, foi desenvolvido o método do caso por Christopher Langdell. Este observou que os juízes, para darem seus pareceres, consultavam outras decisões e opiniões de vários juristas. Diante disto, ele desenvolveu uma metodologia para suas aulas, objetivando um estudo prático da lei (NUÑEZ, 2003, apud IKEDA, VELUDO-DEOLIVEIRA, CAMPOMAR, 2006). Langdell expunha aos alunos decisões dos tribunais e esses refletiam sobre o assunto, com isso o professor conseguia unir a teoria e a prática, formando alunos mais bem preparados para tomarem decisões (MENEZES, 2009). O professor Arch W. Shaw, a pedido do diretor da Harvard Business School, escola de Administração fundada em 1908, fez a adaptação do método utilizado no curso de direito para as aulas da faculdade de administração da instituição. Executivos se interessaram pela novidade, levando problemas de suas empresas para suas classes, buscando assim soluções juntamente aos alunos. Tal fato gerou várias publicações de casos que viraram referência (IKEDA, VELUDODE-OLIVEIRA, CAMPOMAR, 2006). Conant (1968), citado por Menezes (2009), argumenta que qualquer novidade precisa de um período para aceitação e sempre há resistência. Com o método do caso não foi diferente, muitos anos demoraram para que este instrumento pedagógico fosse aceito e ganhasse a credibilidade que possui atualmente. No Brasil, o método ainda se apresenta de maneira tímida, sendo popular apenas em algumas escolas de Administração (BOAVENTURA, 2007, apud MENEZES 2009). Uma das explicações possíveis pode residir no fato, apresentado por Menezes (2009), de que o País possui uma cultura dedutiva2 de ensino. Outra hipótese, aventada por Roesch (2006), sugere a insuficiência da construção textual de cases sobre as empresas brasileiras: são raros os professores que desenvolvem casos para o ensino, tornando a literatura nacional escassa. 2 Conant (1968, apud MENEZES, 2009) caracterizou o pensamento dedutivo como aquele que vai do geral para o particular. Na década de 80, foi fundada a Central Brasileira de Casos, na tentativa de desenvolver cases de empresas nacionais. A COPPEAD (instituto de pós-graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro), apoiada pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), conseguiu fazer publicações, porém o projeto não se estendeu além da década mencionada. A escola de Harvard continua até hoje sendo a maior disseminadora dos casos empresariais para fins de ensino. Segundo Menezes (2009), a necessidade de um novo perfil de profissional no mundo contemporâneo está fazendo com que ressurja a ideia de criar canais disseminadores de cases brasileiros, e a cada dia tem aumentado a construção de casos em terras verdes e amarelas. IV. Elaboração de casos Este tópico se propõe a enumerar as principais etapas para a construção de um caso empresarial. Antes, porém, é conveniente mencionar que existem diversas classificações para os casos. A seguir, será apresentada uma dessas propostas3, escolhida pelos autores desse artigo em função de sua natureza simples e objetiva. Tabela 1 - Classificações do caso empresarial Caso-ilustração Caso-análise Restringe-se à apresentação de Propõe aos estudantes a análise uma situação verificada em uma do caso, mediante sua organização. decomposição em partes significativas e a identificação De modo geral, não se solicita da relação entre as variáveis. sua análise com vistas à tomada de uma decisão, pois esta já é apresentada na descrição. Caso-problema Exige dos estudantes mais do que uma capacidade analítica, à medida que demanda a apresentação de soluções possíveis para o problema, ponderando-se as vantagens e desvantagens de cada uma delas. São os modelos adotados, em geral, pela Universidade de Harvard. Fonte: Adaptado de Gil (2004). 3 O leitor com interesse no assunto deve ler Roesch (2006) e Ikeda, Veludo-de-Oliveira (2006), especialmente estes últimos, que apresentaram outras propostas de classificação a partir de uma revisão da literatura estrangeira. Em geral, o mais utilizado nas salas de aula é o caso-ilustração, seguido pelo casoanálise e o caso-problema. O foco deste trabalho é apresentar orientações para incentivar a produção nacional dos dois últimos, potencializando os benefícios que o método do caso proporciona aos alunos. O processo de elaboração de um caso pode ser dividido em oito estágios, conforme revela a Figura 1: Fim Figura 1 – Estágios da elaboração de um caso didático. Fonte: Adaptado de Gil (2004) Cada uma das etapas acima será comentada a seguir, tendo como conceitos norteadores os escritos de Gil (2004). 1. Identificação do problema O que é: consiste na definição da principal questão a ser solucionada pelo caso. Pode ser entendida como a definição do escopo do caso. Como fazer: o educador deve recorrer ao conteúdo da sua disciplina, buscando identificar os aspectos essenciais a serem abordados, sempre usando como crivo a realidade vivenciada pelo aluno. Cuidados: não trabalhar com problemas muito amplos, genéricos e imprecisos. Exemplos de problemas: introdução de novas tecnologias, integração vertical, crescimento empresarial, análise ambiental, redução de custos, comunicação organizacional, etc. 2. Definição dos objetivos O que é: trata-se dos objetivos pedagógicos esperados com o caso. Em suma, o que está em foco é a avaliação dos conhecimentos e habilidades que os alunos terão ao analisar o caso. Determina a estrutura e forma de apresentação. Como fazer: O professor deve refletir sobre os gaps de aprendizado do aluno em relação às demandas do mercado e, a partir do problema identificado, descrever as habilidades que o caso pretende desenvolver. É útil nesta fase conversar com demais professores. Cuidados: O professor deve evitar priorizar habilidades que não serão exigidas dos alunos no atual estágio profissional em que se encontram. Exemplos: identificar os problemas relacionados à produção industrial; comparar o modelo de produção adotado nas empresas líderes do mercado; reconhecer os possíveis desafios do mapeamento de processos; etc. Sobre esta etapa, Roesch (2006, p.4) comenta: A maioria das histórias organizacionais que lembramos é relevante. O desafio é saber relatá-las tendo em vista os objetivos de aprendizagem. Para o professor, o ponto de partida normalmente é a identificação de objetivos educacionais e a escolha de um tópico dentro do programa de sua disciplina, para o qual deseja produzir casos. Seja qual for a inspiração, conforme sinaliza a autora, o escritor não pode perder o foco de que o caso para ensino não busca construir histórias somente, ele é elaborado para auxiliar o processo de aprendizado dos alunos. 3. Pesquisa e coleta de informações O que é: consiste na localização de casos, entrevistas, artigos, dissertações, etc. que podem ser úteis no alcance dos objetivos. Também é válido examinar informações internas da empresa, caso seja possível obter acesso às mesmas. Como fazer: pesquisas em livros, revistas, na internet (em sites de universidades e em bibliotecas públicas de casos empresarias), etc. Outro recurso imprescindível é a realização de entrevistas (fonte primária de informação) com gerentes, empresários, colaboradores, fornecedores etc. Cuidados: no que tange à realização de entrevistas, vários cuidados devem ser tomados: a correta identificação do pesquisador e o esclarecimento do propósito da entrevista; a certificação de que o entrevistado tem autorização para falar pela empresa e de que as informações fornecidas poderão ser publicadas; a certificação de que o entrevistado encaixa-se no perfil demandado pelo caso; o entrevistador precisa, também, tomar o cuidado de pesquisar aspectos sobre a empresa e elaborar um roteiro; e, por fim, se possível, as informações absorvidas devem passar pelo senso crítico do entrevistado e ser conferidas com outras fontes. Roesch (2006) sugere uma tática interessante para os casos construídos com base em pesquisa primária: antes de aprofundar o levantamento de informações, o educador deve realizar a entrevista com o seu contato, pois ele indicará outras fontes de informação (relatórios, dados, publicações técnicas, informações internas etc.) e também abrirá as portas para outras entrevistas. Feita a primeira, recomenda-se esboçar, num texto breve, qual a situação problema a ser estudada. 4. Análise da dificuldade do caso O que é: é uma classificação que representa o nível de dificuldade que o estudante terá ao analisar o caso. Como fazer: Erskine, et al. (1998, apud GIL, 2004) criaram uma metodologia para avaliar o grau de dificuldade de um caso didático, chamada de cubo de dificuldade do caso, baseada nas dimensões analítica, conceitual e de apresentação, conforme explicitado na tabela abaixo: Tabela 2 – Dimensões e níveis de complexidade do cubo de dificuldade do caso. Níveis de complexidade Dimensão analítica Analisa a tarefa do estudante em relação à questão chave do caso. Dimensão conceitual Relaciona-se à exigência dos conceitos, teorias ou técnicas que podem ser úteis na análise. Dimensão de apresentação Refere-se à quantidade e à forma que a informação é apresentada no caso. 1 Casos que descrevem o problema que a organização enfrentou e o modo como ela o solucionou e pergunta ao leitor “você acha que a solução foi adequada?” O caso apresenta um único conceito, claro e preciso, que pode ser facilmente compreendido. O caso é curto, bem organizado e apresentado de forma clara e direta. 2 Este é o problema que a organização está enfrentando. Que solução você daria para o problema? Vários conceitos são combinados, requerendo análise mais profunda. O caso envolve uma quantidade maior de informações apresentadas de forma clara e direta. O caso envolve uma combinação complexa de conceitos, requerendo ativa participação do professor. Há uma quantidade grande de informações, não muito organizadas, algumas informações estranhas. Geralmente é apresentado em formatos múltiplos, utilizando vídeo, por exemplo. 3 Veja esta situação. Que problemas ela envolve? Que soluções devem ser dadas? Fonte: Erskine, et al. (1998, apud GIL, 2004). Originalmente, a representação imagética da referida metodologia é um cubo. Optouse, porém, por transformá-la em um gráfico radial (Figura 2). As dimensões de análise são representadas pelos eixos, nos quais os graus de dificuldade (de 1 a 3) são assinalados. O exemplo abaixo representa um caso de dificuldade 1-1-1, ou seja, baixo. Analítica 3 2 1 Apresentação Conceitual Figura 2 - Representação da metodologia cubo de dificuldade do caso Fonte: Adaptado de Erskine, et al. (1998, apud GIL, 2004). 5. Construção do caso A construção do texto subdivide-se em redação e estrutura/linguagem. Na sequência, estas atividades serão comentadas. a. Redação Parece existir uma unanimidade em relação à afirmativa de que não há um modo correto para se escrever casos. Na tentativa de auxiliar os que se candidatam a tal tarefa, Gil (2004) enumerou um conjunto de perguntas e questões que servem como um guia para a redação do texto. Suas proposições podem ser agrupadas em cinco categorias (Figura 3): Figura 3 - Guia para a redação do caso. Fonte: Gil (2004). Tais questões são ferramentas balizadoras a serem usadas pelo redator do caso. Portanto, não devem ser entendidas como regras formais. b. Estrutura e linguagem Na visão de Roesch (2006), a estrutura de um caso pode ser resumida, conforme figura abaixo: Corpo do texto Presente ou passado recente Passado recente Apêndice Presente ou passado recente Presente ou passado recente Figura 4 - Estrutura de um caso didático. Fonte: Roech (2006). O parágrafo inicial deve conter a apresentação dos protagonistas (pessoas, empresas, instituições, órgãos etc.), da situação-problema e a definição do local e da época em que a situação ocorreu – proposições semelhantes às apresentadas por Gil (2004). Roesch (2006) destaca a importância de elaborar um parágrafo introdutório que “prenda o leitor”, que o motive a ler o caso. A etapa “antecedentes e contexto” aborda a apresentação de dados, fatos críticos, tabelas, gráficos, personagens, mapas e estrutura organizacional. Enfim, é o desenvolvimento do caso propriamente dito. Normalmente, narra-se a evolução da empresa, chegando-se até o momento presente. A autora reforça que o caso deve trazer informações relevantes para sua análise, não se tratando de um manual de consulta detalhado a respeito dos fatos e da história da empresa em estudo. Também é importante elaborar uma correta divisão das seções do caso (organização dos tópicos), pois elas irão conduzir o leitor. Convém ressaltar que “os personagens do caso podem expressar sua opinião (estas podem ser apresentadas através de citação direta e/ou indireta), ao contrário do narrador, que deve manter-se neutro sobre o que vê e descreve” (ROESCH, 2006, p. 10). Em seguida, a “situação-problema” é detalhada, já que, no primeiro parágrafo, ela já foi apresentada ao leitor. Pode-se fazer isto por meio de perguntas ou por meio de um texto discursivo. Ao apresentar a questão, é interessante “evidenciar os possíveis conflitos, para que os leitores tenham condições de tomar posições em sala de aula” (ROESCH, 2006, p. 10). Na sequência, o “parágrafo final” deve recolocar o problema e estimular o estudante a apresentar soluções (GIL, 2004; ROESCH, 2006). Essa é a técnica mais usual de redação de textos (chamado de final circular, em que o início e o término do caso se complementam), mas, dependendo do talento do escritor, outras formas são aceitáveis. Para aqueles que optarem por um final clássico, convém mencionar as sugestões do “Manual de elaboração de casos” (1983, apud ROESCH, 2006) do Instituto COPPEAD, sobre o conteúdo do parágrafo final: i) apresentação dos problemas principais constantes do caso; ii) menção do tempo disponível para a tomada de decisões; iii) menção sobre os recursos disponíveis para a tomada de decisões; iv) deixar claras as alternativas de ação existentes ou a considerar; v) informar o aparecimento de novos fatores que tornam urgente a tomada de decisões. Roesch (2006) comenta que, se o objetivo pedagógico do caso for o treino de habilidades de resolução de problemas, existem quatro opções possíveis para a finalização do texto: i) solicitar aos alunos que definam os problemas do caso; ii) apresentar a situaçãoproblema e pedir que as soluções sejam apontadas; iii) evidenciar a situação-problema e as soluções para o caso. Em seguida, solicitar aos alunos que avaliem as soluções apresentadas; iv) solicitar aos discentes que avaliem as alternativas apresentadas e, em paralelo, numa variação do item anterior, apresentem outras possibilidades. Por fim, as notas de ensino são apresentadas como um apêndice, ou seja, elas não fazem parte do corpo do caso. As notas são dirigidas ao professor e, geralmente, não são publicadas com o caso. Contêm os seguintes elementos: (i) o resumo do caso, (ii) as fontes dos dados, (iii) os objetivos de aprendizagem, (iv) alternativas para a análise do caso, (v) questões para a discussão do caso em sala de aula e (vi) a bibliografia recomendada [artigos, livros, sites, vídeos] para fundamentar a discussão. (ROESCH, 2006, p.12) Além destas informações, as notas de ensino podem trazer: indicação dos cursos, disciplinas ou módulos de ensino em que o caso pode ser usado; nível de dificuldade do caso; conhecimentos prévios requeridos para análise e solução do caso; recursos didáticos requeridos para o desenvolvimento do caso; experiências passadas relacionadas ao uso do caso; informações acerca do que realmente houve na organização após a ocorrência do caso; questões desencadeadoras; estratégia de ensino mais adequada para o envolvimento da classe (discussão com a classe toda, discussão em pequenos grupos, dramatização); tarefas propostas aos alunos (GIL, 2004). Sob o aspecto da linguagem a ser utilizada num caso de ensino, o quadro abaixo reúne os principais cuidados. Figura 5 - Linguagem recomendada num caso didático. Fonte: Gil (2004). 6. Preparação da primeira versão O que é: consiste na elaboração de uma versão piloto do caso. É importante, nesse momento, certificar-se de que as principais informações já foram coletadas e estão disponíveis. Como fazer: O professor deve recordar o problema e os objetivos pedagógicos definidos, além de ter em mente os interlocutores do caso, a fim de definir o nível de dificuldade do mesmo. 7. Lista de verificação O bom senso recomenda que antes da efetiva conclusão do caso, o mesmo deve passar por mais uma etapa de verificação. Gil (2004) sugere uma lista com os principais itens: • O caso possibilita alcançar os objetivos? • Os objetivos estão ajustados ao problema? • O caso está suficientemente completo e focalizado? • O caso mostra-se realista? • Todos os constituintes de uma narrativa estão incluídos no caso, como: estilo de apresentação, descrições contextuais da situação e perfis dos agentes centrais, sequência de eventos e enredo interessante? • Os eventos aparecem numa ordem lógica? • Os eventos estão conectados com fórmulas de transição? • O conteúdo do caso é acurado, relevante e apropriado? • Este caso contém todo o material de que o leitor necessita para sua análise? • Alguma parte pode ser retirada para tornar ocaso mais conciso sem, no entanto, dificultar o seu entendimento? • A apresentação do caso está suficientemente clara? • As informações oferecidas são coerentes entre si? • O estilo de redação é adequado? Na verdade, esta verificação deve ser feita constantemente até que o caso seja enviado para o teste com os especialistas e/ou os envolvidos na situação, assunto abordado a seguir. 8. Teste do caso O que é: consiste na submissão do caso para outras pessoas que possuem conhecimento sobre o assunto e/ou experiência em docência. Como fazer: o educador pode convidar profissionais como revisores, capazes de emitir opiniões críticas. Cuidados: é importante escolher uma rede de avaliadores capacitados. O autor do caso deve estar receptivo às sugestões recebidas, mas avaliá-las com um olhar crítico. Roesch (2006) menciona que, ao passar por este crivo, o caso está pronto para ser disseminado nas salas de aula, o que, na verdade, consiste em outra etapa de teste, já que o professor precisa estar atento à reação dos alunos, a fim de corrigir equívocos e melhor conduzir a análise do caso. V. Conclusão O propósito mais amplo deste artigo é estimular a reflexão em torno do aperfeiçoamento do arsenal didático dos docentes de administração, em particular. Como alternativa possível, foi abordada a utilização dos casos empresariais como um instrumento didático complementar. Não está sendo proposto que os casos substituam os métodos tradicionais, como as aulas expositivas e leituras. Contudo, é importante que o educador conheça mais este recurso. Para aqueles que se sentirem entusiasmados com a possibilidade de elaborar seus próprios casos, espera-se que este manuscrito seja a ponta de um novelo de lã. Sua leitura é uma orientação básica sobre o assunto e não dispensa a consulta e o exame profundo dos conceitos, dicas e reflexões propostas pelos vários autores utilizados como referência nesta obra. REFERÊNCIAS BARNEY, J. B.; HESTERLY, W. S.. Administração estratégica e vantagem competitiva. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2007. BETHLEM, A.. 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