Ácido Linoléico
Pesquisa
Conjugado
Ferlando Lima Santos
Doutorando em Ciência e Tecnologia de Alimentos- DTA/UFV
[email protected]
Rogério de Paula Lana
Professor Adjunto do Departamento de Zootecnia- DZO/UFV
[email protected]
Marco Túlio Coelho Silva
Professor Adjunto do Departamento de Tecnologia de
Alimentos- DTA/UFV
[email protected]
Foto cedida pelos autores
Estratégia para elevação do ácido linoléico conjugado em leite de vacas
Considerações Iniciais
Nas últimas décadas, os centros de
pesquisas que estudam o câncer têm
enfatizado a necessidade de se estudarem novas substâncias químicas no
combate a essa doença. Com isso, têm
sido estudadas substâncias presentes
em alimentos; entretanto, a maioria
dos compostos que exibiram alguma
atividade anticarcinogênica foi originada de plantas. No final da década de 80,
contudo, foi identificado um ácido graxo de origem animal com propriedades anticarcinogênicas, denominado
ácido linoléico conjugado (CLA).
CLA é um termo que descreve os
isómeros geométricos do ácido linoléico. Ele é formado no rúmen, como um
primeiro intermediário da biohidrogenação do ácido linoléico, pela enzima
ácido linoléico isomerase, proveniente
da bactéria anaeróbica ruminal Butyrivibrio fibrisolvens. No entanto, essa
enzima pode não ser originada exclusivamente dessa bactéria ruminal, uma
vez que o CLA tem sido encontrado
em animais não ruminantes como porco, galinha, peru e peixe (IP et al.,
1994).
Ácidos graxos com insaturação
conjugada não são normalmente constituintes da dieta de animais ruminantes. Nos alimentos, geralmente, as ligações insaturadas do ácido linoléico
(C18:2, cis-9, cis-12) são separadas por
um grupo metileno (CH2). Contudo,
durante o processo de biohidrogenação o ácido linoléico pode ser convertido em ácido esteárico. Esse processo,
entretanto, não é totalmente eficiente
e ácidos graxos intermediários contendo ligações duplas conjugadas (sem
um grupo metileno intermediário) são
formados como produto dessa reação
(Figura 1).
A conjugação da ligação dupla é
geralmente nas posições 9 e 11 ou 10
e 12, podendo ser configuração cis ou
trans. As principais formas isoméricas
de CLA são: cis-9, cis-11; cis-9, trans-11;
trans-9, cis-11; trans-9, trans-11; cis-10,
cis-12; cis-10, trans-12; trans-10, cis-12;
trans-10. No entanto, apenas os isôme-
Figura 1 - Estrutura química do ácido linoléico e CLA
42
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 24- janeiro/fevereiro 2002
ros cis-9, trans-11 são as formas biologicamente ativas do CLA (PARODI,
1997).
A gordura do leite é a fonte natural
mais rica em CLA dos alimentos que
compõem a dieta do homem, sendo
quase que completamente composta
de isômeros cis-9, trans-11. A concentração de CLA em alimentos é demonstrada na Tabela 1.
Origem do CLA
A relação entre nível elevado de
colesterol e doenças cardiovasculares
foi primeiramente descrito no ano de
1930; desde então, diversos estudos
epidemiológicos apontam o colesterol
como maior fator de risco dessas doenças. Com isso, as pesquisas têm focalizado atenção na diminuição do percentual de gordura dos alimentos. Entretanto, a descoberta do CLA trouxe
uma alteração nas linhas de pesquisas
sobre esse tema.
Em 1978, PARIZA e colaboradores
avaliaram o efeito de extrato de “hamburger” tratado termicamente
na inibição de tumores em
ratos. Os melhores resultados
foram encontrados na temperatura de 191 e 210 0C, enquanto que os extratos originados das amostras que não
sofreram tratamento térmico
não apresentaram inibição significativa (PARIZA et al., 1979).
Posteriormente, HA et al.
(1987) verificaram em camundongos que o efeito antimutagênico era provocado por uma
Tabela 1 - Concentração de CLA em alimentos
Alimento
Produtos lácteos
Leite humano
Leite de vaca integral
Leite de cabra integral
Leite de ovelha integral
Leite condensado
Manteiga
Iogurte
Queijo cheddar
Queijo de leite de cabra
Queijo mussarela
Queijo cottage
Queijo parmesão
Ricota
Produtos cárneos
Carne bovina
Carne de frango
Carne de porco
Bacon defumado
Salmão
Gema de ovo
Produto vegetal
Óleo de canola
Óleo de milho
Óleo de oliva
Total de CLA
(mg/g de gordura)
*c-9, t-11 (%)
1,7-36,4
4,5-10,1
6,1-10,35
10,8-29,7
7,0
9,4-11,9
5,1-9,0
1,4-5,9
2,7
4,3-5,0
4,5-5,9
1,9-8,6
5,6-24,2
83-100
59-100
99-100
99-100
90
78-90
71-100
18-100
100
84-100
83-100
38-100
84
1,2-8,5
0,03 - 0,9
0,2 - 0,6
0,8-2,6
0,3
0,0- 0,6
21-61
84
82
75-78
NI
82
0,5
0,2
0,2
42
39
47
NI- não identificado; *isômeros biologicamente ativos do CLA.
Fonte: CHIN et al. (1992).
mistura de isômeros geométricos do
ácido linoléico contendo ligações conjugadas. Após publicação desses resultados, diversos estudos têm sido conduzidos para avaliar o efeito anticarcinogênico do CLA.
Propriedades
anticarcinogênicas do CLA
O CLA está, usualmente, entre os
compostos anticarcinogênicos que atuam reduzindo a incidência de tumor
em modelos animais e a inibição de
células cancerígenas de melanoma, cólon, próstata, pulmão, ovário e tecido
mamário (WONG et al., 1997; CESANO et al., 1998; IP et al., 1999).
Um exemplo do efeito da incidência de tumor em animais de laboratório
foi demonstrado no estudo realizado
por IP et al. (1991), no qual a redução
de tumor mamário induzido por 7, 12
dimethylbenz[a] anthracene (DMBA)
foi dose dependente dos níveis de CLA
suplementados na dieta de ratos (Figura 2).
Vários estudos sugerem que o CLA
pode atuar por mecanismos antioxidantes (IP et al., 1991; BANNI et al.,
1995), inibição da síntese de nucleotídeo (SHULTZ et al., 1992), redução da
atividade proliferativa (IP et al., 1994),
inibição da formação de DNA tumoral
(ZU et al., 1992) e inibição da carcinogênese (PARODI, 1997).
Porque aumentar a concentração de CLA em alimentos?
Os estudos que avaliaram os efeitos
anticarcinogênicos de CLA em modelos animais demonstraram que a suplementação de CLA na dieta pode aumentar a sua concentração no sangue.
O consumo diário de CLA no homem
ocidental é estimado em apenas 1 g,
embora esteja sendo recomendada a
ingestão de 3,5 g de CLA/dia para um
homem adulto de 70 kg. Assim, a
suplementação de CLA na dieta do ser
humano faz-se necessária para alcançar essa recomendação.
Frente a essa realidade, as indústri-
as farmacêuticas passaram a comercializar em larga escala o CLA na forma
sintética. Entretanto, com o crescimento dos alimentos funcionais que, além
da função nutritiva, proporcionam benefícios adicionais à saúde humana,
levaram os consumidores a preferirem
os alimentos ricos em CLA.
Os produtos lácteos constituem uma
alternativa no segmento da indústria
alimentícia para o consumidores, pois
tais produtos estão entre os alimentos
que apresentam maior concentração
de CLA da dieta do homem. Dentro
dessa perspectiva, os pesquisadores
estão estudando diversas formas de
aumentar, de forma natural, a concentração de CLA em alimentos.
Sabe-se que o nível de CLA no leite
varia em função da dieta; desse modo,
a principal estratégia adotada pelo setor lácteo tem sido a modificação da
ração de vacas com suplementação de
ácidos graxos insaturados para elevar a
concentração de CLA no leite. O aumento do teor de CLA na gordura do
leite poderá melhorar a imagem dos
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento - nº 24- janeiro/fevereiro 2002
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produtos lácteos integrais junto ao consumidor, uma vez que estes estão
preferindo alimentos com menor teor
de gordura.
Nossos resultados
Foi desenvolvido um estudo no
Setor de Bovinos/DZO e no Laboratório de Análise de Alimentos/ DTA da
Universidade Federal de Viçosa com o
objetivo de avaliar a influência de formas de suplementação de lipídios (óleo
de soja e soja integral moída) sobre a
produção, composição físico-química
e nível de CLA na gordura do leite de
vaca (Figura 3).
Houve aumento significativo
(100%) na concentração de CLA no
leite quando as vacas foram alimentadas com ração que continham óleo de
soja (7% de lipídio na ração total), mas
não foi observado efeito significativo
quando se utilizou o mesmo percentual de lipídios na forma de grão de soja
moído. Esses resultados são, possivelmente, devido aos ácidos linoléico e αlinolênico do óleo estarem mais disponíveis para ser biohidrogenados pelas
bactérias do rúmen (Figura 4).
A ração suplementada com produtos ricos em ácidos graxos insaturados
em forma de óleo aumentou significativamente a concentração de CLA na
gordura do leite sem afetar a produção
e demais características físico-químicas
do leite. Desse modo, o leite produzido atende à legislação, podendo ser
utilizado pelas indústrias de laticínios
para comercialização.
Figura 2 - Efeito do CLA na redução do tumor
mamário induzido por DMBA em ratos
marcadores biológicos que atuam na
formação óssea e diminuição nos níveis de HDL. Por outro lado, outras
pesquisas têm revelado ausência de
toxicidade do CLA e classificando-o
como substância segura (GRAS). Portanto, novos estudos são necessários
para investigar os efeitos e mecanismos de ação do CLA sobre o metabolismo humano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Considerações finais
Desde a identificação do CLA, as
pesquisas têm enfatizado a sua propriedade anticarcinogênica. Todavia, no
final da década de 90, houve uma
alteração nas linhas de pesquisas sobre
este composto, relacionando-o com a
estimulação da ação de insulina, redução de gordura corporal, redução de
leptina sérica, modulação do sistema
imune e diminuição de colesterol sérico.
Embora o CLA seja associado a
muitos potenciais efeitos benéficos,
alguns estudos têm demonstrado a
existência de efeitos colaterais em
modelos animais, como diminuição de
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Figura 3 - Vista parcial das
instalações dos animais experimentais
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